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Crítica

Ouvimos: Clairo, “Charm”

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Ouvimos: Clairo, "Charm"
  • Charm é o terceiro álbum da cantora norte-americana Claire Elizabeth Cottril, a popular Clairo. Ela posta música na internet desde os 13 anos (tem 25 hoje) e já teve seu trabalho mais associado a nomenclaturas como lo-fi e bedroom pop. O release do novo disco apontou para “grooves quentes inspirados nos anos 70 que se movem agilmente entre jazz, folk psicodélico e soul”.
  • A produção do disco foi feita por ela ao lado de Leon Michels (Sharon Jones & The Dap-Kings, Menahan Street Band, Lee Fields & The Expressions).
  • Charme é um sentimento que você tem. Quando você está encantada, é aquela mistura perfeita de ser boba por uma pessoa – platonicamente, romanticamente – e não saber quanto tempo isso vai durar”, disse Clairo num papo com a Crack Magazine, afirmando também que durante um bom tempo agiu como se a necessidade de ser olhada não fizesse parte da sua vida.

Tem algo nada discreto que une o novo disco de Clairo a Novela, disco novo de Céu. Para começar, são discos em que, de uma hora para outra, pintou uma, digamos, linha divisória ali. Essa tal linha (quase imaginária, mas perceptível) separa o “alternativo” do clássico, sem passar exatamente por uma noção surrada de mainstream. Afinal, estamos falando de Céu e Clairo, e não de – sei lá – Ana Carolina e Lana Del Rey.

E aí que Charm, disco novo de Clairo, vai bem dentro dessa linha de pop adulto e imaginário, que já aparecia em alguns discos anteriores da cantora norte-americana, mas num grau bem menor. O pop “clássico” evocado aqui é o som agridoce feminino setentista, as aventuras amorosas-existenciais de Joni Mitchell, Carly Simon e Carole King. Como acontecia em discos como Tapestry, clássico de Carole King, as músicas são soft rock com origem no soul. O material tem levadas, foi construído em torno de tecladeiras velhas, e uma coisa ou outra parece vir como tributo a discos como Innervisions, de Stevie Wonder (sem a excelência técnica de Stevie, é verdade).

Não é um disco feito para arrebentar e esfregar na cara. Como quase tudo que envolve Clairo, é um álbum discreto, detalhista, introvertido – como o “charme” do título, aquela coisa que está lá e parece que não está. Nomad, a faixa de abertura, une batidas do r&b a guitarras lembrando os Rolling Stones de 1971, com uma letra explorando solidão, mudanças e traumas emocionais.

O single Sexy to someone une soft rock e neo-soul, e é o tipo de música que provoca identificação imediata: “ser sexy para alguém é tudo que eu realmente quero (…)/eu preciso de um motivo para sair de casa/é só uma coisa sem a qual não posso viver”. Slow dance une um monte de incertezas amorosas e pessoais numa espécie de música de ninar dançante, com ritmo dado pelo piano. Por sinal, muita coisa de Charm parece que veio de um voo de Clairo e de Leon Michels (o co-produtor) por antigas trilhas de novelas. A balada Juna, cheia de tecladinhos e detalhes “psicodélicos” de araque, cairia bem na trilha de Duas vidas ou O pulo do gato, assim como o soul Terrapin e a funkeada Add up to my love.

Esse surgimento de tons meio psicodélicos no disco, por sinal, rola direto – vale dizer: mais para dar a ideia de que aquilo tudo vem de um lugar bem distante, e bem particular, do que para convencer os fãs de que estava todo mundo tomando LSD nas gravações. É o lado lo-fi de Clairo, mais evidente em sua estreia Immunity (2019), atuando. Nem sempre esse senso de esquisitice, misturado com os novos parâmetros da carreira de Clairo, dá certo: uma das músicas mais agradáveis do disco, Glory of the show, é interrompida bruscamente para entrar a última faixa, a razoável Pier 4. Mas Clairo volta com cara de reestreia, o que é ótimo para um terceiro disco.

Nota: 8,5
Gravadora: Independente.

Crítica

Ouvimos: Radiohead – “Hail to the thief live recordings 2003-2009”

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Registro ao vivo de Hail to the thief (2003) mostra Radiohead intenso e renovado entre 2003 e 2009, revalorizando o disco original.

RESENHA: Registro ao vivo de Hail to the thief (2003) mostra Radiohead intenso e renovado entre 2003 e 2009, revalorizando o disco original.

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Thom Yorke, líder do Radiohead, nunca se sentiu muito confortável fora da sua casca. De certa forma, mesmo suas opiniões “polêmicas” sempre trouxeram aquela visão abstrata das coisas que costuma brotar em entrevistas de gente acostumada a ser chamada de “gênio” – mesmo que nem seja. Em alguns casos, as opiniões de Thom são ruins, mesmo. Ou simplesmente atabalhoadas, como naquela situação em que ele foi praticamente forçado a expor sua visão sobre Palestina x Israel, protestou contra o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, mas deu um jeito de sair pela tangente.

No caso de Hail to the thief, disco de 2003 do Radiohead, havia algumas coisas para notar assim que ele saiu. O Radiohead havia feito um disco político – ainda que com letras extremamente oblíquas e que se pareciam mais com fábulas estranhas do que com qualquer outra coisa. Livros como 1984, de George Orwell, e discursos do então presidente norte-americano George W. Bush em época de guerra serviram como inspiração. O som do disco, tão dolorido quanto o dos álbuns anteriores, soava como um pós-punk maníaco (ou um progressivo com alfinetes na bochecha, vá lá), em que tudo transpirava pressa.

  • Ouvimos: Shearling – Motherfucker, I am both: ‘amen’ and ‘hallelujah’ …
  • Ouvimos: Paul Weller – Find El Dorado
  • Ouvimos: Apeles – Cru

Hail to the thief, vale dizer, estava mais para uma espécie de “obra aberta”, na qual cabem diversos entendimentos – aliás, recentemente Yorke retrabalhou todo o conteúdo de Hail para a produção da Royal Shakespeare Company Hamlet hail to the thief, o que já mostra o caráter (vá lá) elástico do álbum. E foi justamente por causa dessa produção que Thom decidiu ouvir gravações ao vivo das faixas de Hail – o que gerou esse Hail to the thief live recordings, com registros entre 2003 e 2009.

A versão ao vivo de Hail está bem longe de ser um caça-níqueis barato. O Radiohead vai no repertório como quem vai atrás de um prato de comida, como comprovado pela audição das releituras de faixas como There there, 2 + 2 = 5, Where I end and you begin, The gloaming e várias outras. Tem um subtexto histórico: o Radiohead de 2003 é diferente existencialmente do de 2009, já que o primeiro ainda era contratado da Parlophone e o segundo, uma banda independente que estava divulgando In rainbows (2007), o disco do “pague o quanto quiser”. Era também uma banda descontente consigo própria, já que Hail foi considerado por eles como um disco grande demais e meio enfadonho.

Musicalmente, é a vitória do rock experimental em tempos incertos, com faixas chorosas como I will sendo aplaudidas por plateias de arena (em Londres, Amsterdã, Buenos Aires e Dublin, lugares onde as gravações foram feitas). Hail to the thief está bem longe de ser o melhor disco do Radiohead, mas sai revalorizado das versões ao vivo.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: XL Recordings
Lançamento: 13 de agosto de 2025

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Crítica

Ouvimos: Apeles – “Cru”

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Gravado ao vivo em uma tarde, Cru mostra Apeles em voz e guitarra, revisitando faixas antigas e tendo o eco do local como um instrumento a mais.

RESENHA: Gravado ao vivo em uma tarde, Cru mostra Apeles em voz e guitarra, revisitando faixas antigas e tendo o eco do local como um instrumento a mais.

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Eduardo Praça, o músico, cantor e compositor por trás do Apeles, já havia lançado um diferentíssimo álbum triplo em março, 2015-2022: The complete demos and early recordings, com as primeiras gravações que fez usando o codinome. Cru, novo disco do Apeles, sai agora com a mesma disposição para apresentar algo novo. O músico gravou o disco ao vivo durante uma única tarde, no estúdio White Noise, em Los Angeles – e fez todos os registros apenas com voz, guitarra e eco.

Por sinal, bastante eco: todo o repertório parece ter sido gravado numa garagem abandonada, ou numa igreja. Em Cru, Eduardo revisita canções antigas do Apeles, abrindo com a balada abolerada de Vermelha, Ele prossegue com a experimentação de Clérigo e A alegria dos dias dorme no calor dos seus braços, e adere de vez ao clima sombrio na balada Socorro.

Cru também tem um lado meio sixties, meio brega em Vesania I (Cabo horn), e vai para um lado rocker, que chega a lembrar Creedence Clearwater Revival, em Desconocidos. Vibes ligadas a bandas como Smiths surgem em Lábios mentem à distância e Pax, patz, paz. Em alguns momentos, dá para perceber que o esquema de voz-e-guitarra impõe limitações de arranjo, especialmente em faixas com elementos parecidos. Por outro lado, no final, Cru (I rise in pieces), traz uma espécie de lado oculto do projeto, com clima fantasmagórico na voz e na guitarra.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Balaclava
Lançamento: 12 de agosto de 2025.

 

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Crítica

Ouvimos: A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável – “Ident II dades” (EP)

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A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável mistura shoegaze, punk triste e dream pop em EP sombrio e intenso sobre fugas, superações e sonhos.

RESENHA: A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável mistura shoegaze, punk triste e dream pop em EP sombrio e intenso sobre fugas, superações e sonhos.

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Banda paulista cujo nome volta e meia é confundido com o de outro grupo (E A Terra Nunca Me Pareceu Tão Distante), o A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável vai além de nomenclaturas como “shoegaze” e “lo-fi” no novo EP, Ident II dades. Em faixas como Espaço/tempo, o som deles chega a lembrar o de formações hoje esquecidas, como o Kafka, pela união de ruídos, psicodelia e de instrumental quase espacial, levado pela guitarra.

Tempo/espaço, a continuação, tem mais cara de punk triste, ou de emo em tons bem mais sombrios, com microfonias. Distante abre com guitarra de textura quase eletrônica, e um som perto do punk, com peso e intensidade. As letras e os recados do disco são voltados para coisas deixadas para trás, fugas, superações e sonhos bem estranhos, como na vinheta falada de 94 (“entre uma fuga e outra você vai consegui se divertir”) e na trama slowcore de Santana 1994.

No final, Excursionista selvagem é mais ensolarada que o restante do disco, trazendo muito do dream pop dos anos 1980, mas sem deixar de lado a beleza sombria que marca o som da banda. Ouça como quem invade um ensaio do grupo.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Selo Quituts
Lançamento: 6 de junho de 2025

  • Ouvimos: Ethel Cain – Willoughby Tucker, I’ll always love you
  • Ouvimos: Vitor Brauer – Tréinquinumpára 06: Porto Velho

 

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