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Cultura Pop

Várias coisas que você já sabia sobre Electric Warrior, do T. Rex

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Em 1971, não tinha ser humano com a autoestima maior que Marc Bolan, líder do T. Rex. O sucesso de Electric warrior, segundo disco da banda (e sexto desde o começo como Tyrannosaurus Rex) detonara uma verdadeira Bolanmania na Inglaterra, que marcou profundamente as vidas de uma turma enorme de roqueiros, cujas carreiras começariam entre 1976 e 1980.

Ídolo de garotos e garotas que estavam com 14, 15 anos, e posteriormente descobririam David Bowie e o punk rock, ele se achava com cacife o suficiente para cunhar afirmativas como: “Nem Dylan nem Lennon são melhores do que eu, e eles sabem disso. Eles sabem onde estou: sou diferente, como eles. Eu sabia que era diferente desde o momento em que nasci”, contava.

O entendimento de Bolan era impreciso, óbvio. Isso porque o reinado do T. Rex não duraria muito, e o cantor e compositor viraria um ídolo de outrora em pouco tempo. Mas seu legado perduraria. Morto em 1977 num acidente de automóvel, Bolan pairou nada silenciosamente sobre Ramones, Buzzcocks, The Cure, Sigue Sigue Sputnik, Red Hot Chili Peppers (John Frusciante é fã), Sex Pistols, Stone Temple Pilots, Suzi Quatro, Prince, Rita Lee & Tutti Frutti (Arrombou a festa só existe porque o boogie futurista de Bolan existiu um dia) e tudo o que, no rock pós-1971, soou como se tivesse vindo de galáxias muito distantes. E convidasse para a dança, a roda e a festa.

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E esse é o nosso relatório sobre Electric warrior, marco zero do glam rock. Ouça lendo, leia ouvindo.

VIOLÃOZINHO. O Tyrannossarus Rex, basicamente uma dupla de folk hippie sujinho, era formado por Marc Bolan violão e voz) e um sujeito chamado Steve Peregrin Took, que tocava percussões, sininhos, xilofone infantil e tudo o que mais aparecesse pela frente. Surgiu em julho de 1967 e, como pediam os tempos bizarros da aurora do glam rock, era a terceira tentativa de Bolan de fazer sucesso.

ORGASMO. Marc, antes do Tyrannossaurus, tivera uma carreira frustrada como guitarrista solo de uma banda mais-ou-menos da psicodelia. Era o John’s Children, que em 1970, já sem Bolan, escandalizaria geral gravando um disco chamado Orgasm. Mas o momento mais parecido com um “agora vai!” foi quando ele, munido de algumas canções solo, conseguiu atrair a atenção do empresário e produtor dos Yardbirds, Simon Napier-Bell, no finalzinho de 1966.

NÃO FODE, KEITH! Simon já tinha 27 anos e estava de saco cheio dos Yardbirds. Em especial do cantor Keith Relf, que dava ataques trágicos de estrelismo: ligava o dia inteiro para o empresário para reclamar da turnê australiana do grupo e, certa ocasião, disse que não subiria no palco sem que lhe dessem um par de meias novas (!). Bolan foi como uma lufada de vento na vida do empresário: quando ele adentrou seu escritório, Simon teve a impressão de que estava diante do novo Elvis.

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SÓ QUE… A bendita autoestima de Bolan quase põe tudo a perder. Simon pedira-lhe que levasse uma fita para o encontro. Munido de um violão, o cantor não levou tape nenhum e disse que poderia cantar o repertório para o empresário. “Marc tinha material suficiente para quatro discos, mas não queria gravar. Ele estava numa ego trip bizarra naquela época, achava que era só espalhar uns pôsteres dele por aí, que as pessoas veriam as fotos dele e as coisas aconteceriam”, revelou Simon.

MAS O DISCO FOI FEITO. Bolan disse que faria as gravações, mas só com voz e violão. Saíram 14 músicas, gravadas em oito horas, sem overdubs e sem esconder a técnica precária de Bolan no vocal e no violão.

AO TERMINAR TUDO, segundo Simon, Bolan estava tão confiante que disse “é isso aí, tenho um disco e ele vai acontecer”, muito embora qualquer pessoa soubesse que um álbum vacilante daqueles, gravado numa época em que os estúdios se modernizavam rapidamente, jamais chegaria às lojas. Ele só sairia em 1972, num disco acrescido de faixas bônus chamado Hard on love. O álbum foi relançado em 1974 como The beginning of doves. Em 1981, Napier-Bell acrescentou guitarra, baixo e bateria às músicas e relançou o material como You scare me to death.

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O QUASE HIT DESSE REPERTÓRIO foi essa canção aí de cima, You scare me to death, feita alegadamente como jingle de uma fábrica de pastilhas (“você me assusta até a morte com seu bafo horroroso”, diz o bizarro refrão).

MAS Bolan, na real, lançou um single sob os auspícios de Napier-Bell, Hippy gumbo. Uma canção polêmica, que narrava um crush gay numa época em que homossexualidade era crime na Inglaterra.

A EMI prometeu lançar o disco caso Simon, ainda envolvido com os Yardbirds, desse um jeito na banda, que, gravando um disco pela mesma empresa, passava a maior parte do tempo de estúdio brigando. Saiu, mas fracassou miseravelmente.

CABEÇAS DINOSSAURO. Steve Peregrin Took, cujo nome verdadeiro era Steve Porter (e cujo nome artístico vinha de certa adoração hippie ao livro O Senhor dos Anéis, de Tolkien), fizera parte da primeira e fracassada formação do Tyrannossaurus Rex, quando Bolan tentou montar uma banda de rock formal, com guitarra, baixo e bateria. Ficou apenas na percussão, enquanto Bolan cantava suas canções folk cheias de letras viajantes.

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A OPÇÃO pelo novo set veio, em parte, por restrições orçamentárias: Took devia uns meses de aluguel e precisou vender sua bateria. Bolan também tinha assistido a um show do indiano Ravi Shankar e achou que o formato dava pé.

ALIÁS E A PROPÓSITO, quem ajudou muito a dupla foi o DJ John Peel, da BBC. Peel quase contratou o Tyrannossaurus Rex para seu selo Dandelion. Em 1968, Bolan e Took foram contratados pelo selo Regal Zonophone e sob produção de Tony Visconti, lançaram um primeiro disco de nome bizarro: My people were fair and had sky in their hair… But now they’re content to wear stars in their brows.

O PRIMEIRO DISCO não deu muito certo, mas garantiu algum aiprlay e alguns fãs para o grupo. Quem não ficou muito tempo por lá foi Peregrin. Steve foi saído do Tyrannosaurus Rex por, supostamente, ter jogado doses do alucinógeno STP num ponche preparado para o lançamento da versão inglesa da Rolling Stone – o parceiro Bolan, desavisado, provou da bebida e pagou mico na festa. Obrigado contratualmente a permanecer na banda durante uma turnê norte-americana, aproveitou para tocar o zaralho: caiu de boca nas drogas, deu uma de Iggy Pop (chegou a chicotear-se no palco) e horrorizou geral.

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ATÉ SAIR, Peregrin gravou três LPs com o Tyrannossaurus Rex. O quarto, A beard of stars (1970), já trouxe Mickey Finn, novo parceiro de Bolan, em seu lugar. Finn era tido como um músico bem menos cheio de atributos que Took e a piada era que ele havia entrado só por ter boa aparência e uma moto “maneira”. Mas Finn foi fundamental na transição “elétrica” do grupo, acrescentando baixos ocasionais e bongôs latinos à mistura.

EM MARÇO DE 1970 o Tyrannosaurus Rex foi lançar A beard of stars com um showcase para jornalistas na redação da revista Melody Maker. Deram azar: a dupla apareceu na hora do almoço, e só Chris Welch, um dos jornalistas da publicação, estava na hora do show. Antes que Welch pudesse mostrar o quanto estava gostando do show (e ele estava) algum repórter da revista Cycling, cuja redação era na sala ao lado, bateu na parede e gritou, reclamando do barulho.

UM HIT, ENFIM. A dupla passou por uma diminuição de nome (de Tyrannossaurus Rex para T. Rex), de sonoridade (do folk zabelê para o som eletrificado e roqueiro) e de gravadora: o elenco do selo Regal Zonophone foi para a recém-criada Fly Records. O primeiro disco da nova fase, T. Rex, saiu em dezembro de 1970, com nova imagem na capa: Bolan fez questão de posar com sua guitarra, mostrando que era a hora do som elétrico, e não dos violões da fase anterior. E finalmente a banda conseguiu um hit: Ride a white swan, que saiu em single e estava apenas na versão americana no disco, estourou e levou a dupla ao Top of the pops.

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COM Ride a white swan, o T. Rex virou mania entre adolescentes de uma hora para a outra, e conquistou um número de fãs que a dupla não tinha antes. Bolan, por sua vez, estava felicíssimo com o fato de poder aparecer em pé no palco – o cantor incluía em seus números, além dos mergulhos na guitarra, uma dança lasciva e andrógina, além de aparecer vestido com roupas chamativas e brilhantes, e de adotar o glitter no rosto. Ao Record Mirror, chegou a dizer que estava cansado de aparecer sentado no palco, como na época dos shows com Peregrin Took.

QUEM VIU o T. Rex no Top of the pops e se apaixonou por Bolan (e comprou o single com Ride a white swan) foi a futura cantora Toyah Wilcox, 12 anos em 1970. “Parte da rebelião dele, é que ele era um cara feminino, de verdade. Uau, um cara que usava maquiagem, vestia cetim, era gentil ao falar. Era uma rebelião gentil, poética”, recordou.

TOYAH era uma das fãs da verdadeira legião de admiradoras (e admiradores) que o T. Rex conseguiu, partindo do folk riponga para o boogie futurista que passariam a fazer em Electric warrior. Um disco, por sinal, feito com uma certeza na cabeça: sucesso na Inglaterra, o T. Rex começava a interessar ao mercado americano. Especialmente depois que outro single, Hot love, chegou ao número 1.

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O T. REX fez sua primeira tour nos EUA em abril de 1971, e Tony Visconti, americano radicado na Inglaterra desde 1967, resolveu ir visitar a família em Nova York. Foi ao show do T. Rex e, nos bastidores, já soube por intermédio da dupla Mark Wolman e Howard Kaylan (o Flo e o Eddie dos Turtles) que haviam marcado uma sessão no Media Sound para apresentar os estúdios americanos ao T. Rex.

VISCONTI avisou que se havia um disco para sair disso aí, ele fazia questão de produzir. Bolan já havia gravado coisas em Londres mas não havia exatamente um disco planejado: o músico queria só registrar material que havia acabado de compor. O produtor, vendo que Marc andava para lá e para cá com um caderno cheio de letras e ideias, disse que se ele trabalhasse bem naquilo, teria um disco pronto.

NOSTALGIA. Electric warrior era, vale dizer, um fruto típico de uma era em que o rock, uma arte jovem, estava começando a viver sua primeira era de nostalgia. Uma época em que havia Elvis Presley fazendo turnês, artistas do começo do estilo participando de festivais e todo mundo chorando as mortes de Jimi Hendrix, Janis Joplin, Jim Morrison, Brian Jones. E morrendo de saudades dos Beatles.

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ALIÁS E A PROPÓSITO, Bill Legend, baterista que participou das sessões do disco, recorda-se claramente de Bolan dizendo que queria que a energia do álbum fosse parecida com a dos discos de rock dos anos 1950 que ele ouvia na infância.

LEGEND também credita a energia do disco ao fato de tudo ter sido gravado ao vivo, “com os músicos olhando uns para os outros”. “Você não pode ter isso gravando os instrumentos em separado, não é real”, explica.

SOM PRÓPRIO. Quem viu as gravações de Electric warrior lembra que Bolan trabalhou feito um maluco para conseguir dar ao disco um som com personalidade. Usou amplificação valvulada em todo o álbum, e dispensou vários instrumentos que tinha para usar uma Gibson Les Paul 1958, além de seus pedais com efeitos. Também fazia questão de mostrar alguma faixa emperrada para Visconti quando não chegava a alguma conclusão. Cosmic dancer, por exemplo cresceu bastante com o arranjo de cordas.

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ALIÁS E A PROPÓSITO, desde 1970 o T. Rex já era uma banda de verdade. Enfim, uma banda que era dupla (!), mas que na capa de Electric warrior era representada apenas pelo vocalista e guitarrista (!!). Do disco de 1971 participaram Bolan, Finn, Legend e Steve Currie (baixo), além de Flo & Eddie (vocais), Ian McDonald e Burt Collins (sopros e metais). Visconti fez arranjos de cordas.

RICK WAKEMAN, então um pobre músico de estúdio que estava desesperado para pagar o aluguel, supostamente fez o piano de Get it on, primeiro single do disco. Digo “supostamente” porque testemunhas dizem que o músico galês Blue Weaver (que tocou nos Strawbs, onde Wakeman também tocara) passou igualmente pelo estúdio e tocou tudo o que havia de piano na faixa.

SÓ QUE Wakeman teria encontrado Bolan, e lhe pedira trabalho. Foi convidado a ir ao estúdio e, ao ouvir o material, teria dito a Visconti que o disco não estava precisando de mais piano. Visconti pediu a ele que fizesse os glissandos de piano que aparecem na música, ganhou a grana do aluguel e ficou tudo bem.

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O SINGLE. Get it on saiu em 2 de julho de 1971. Mas nos EUA, mercado importante para o T. Rex àquela altura, a canção mudou de nome para Bang a gong (Get it on). Isso porque havia uma música também chamada Get it on, lançada por um grupo chamado Chase.

QUEM É ESSE TAL DE CHASE? Ok, sabemos o que você está pensando: o T. Rex mudou o nome da sua música por causa de um grupo do qual ninguém nem lembra. Acontece que o Chase era uma banda de jazz-rock bem bacaninha e o bom single Get it on, lançado em maio de 1971, passou nada menos que 13 semanas no Billboard Hot 100. O Chase teve vida curta: em 1974 o vocalista Bill Chase morreu num acidente de avião. Entre 1977 e 1979, a turma da primeira formação se reuniu num grupo de tributo e até gravou um disco novo, Watch closely now.

BOLAN disse que sua grande inspiração ao fazer Get it on foi Little queenie, de Chuck Berry, que ele chegou a pensar em gravar. Fez um pequeno roubo no riff da faixa e acrescentou o “and meanwhile, I’m still thinking”, da canção de Berry, no final. A canção foi uma das faixas gravadas durante as sessões em Londres, no Trident Studios.

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QUEM DEIXOU CLARO que não havia gostado muito da música nova foi… ninguém menos que John Peel, outrora amigo de todas as horas de Bolan. Peel ganhou um single promocional e não tocou a faixa. Apesar de ser amigo de Bolan, Peel não se sentia obrigado a tocar nada de ninguém se não gostasse da música. Os dois se falaram apenas uma vez até a morte de Bolan em 1977. Peel tentou fazer contato com ele em 1971, quando soube que Bolan havia se chateado, e não conseguiu.

IAN McDONALD, o saxofonista que toca em Get it on, era integrante de primeiríssima hora do King Crimson. Tocara na estreia In the court of Crimson King (1969) e, antes disso, tocara como convidado no embrião da banda, Giles, Giles & Fripp, banda formada pelo guitarrista Robert Fripp com os irmãos Michael Giles (bateria) e Peter Giles (baixo). Em 1976, wow, tornaria-se um dos fundadores do Foreigner. Olha ele aí no sax.

EXISTEM DOIS CLIPES de Get it on. Num deles, o T. Rex aparece num cenário poluído visualmente, durante uma apresentação num programa de TV austríaco. Mas no clipe tido como oficial, o T. Rex aparece no palco do Top of the pops e ninguém menos que Elton John está no piano.

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ELTON não estava lá à toa: era muito fã de Marc e considerava o cantor uma espécie de mentor. “Era um grande amigo e um pop star perfeito”, disse Elton. Ano passado, ele e o U2 regravaram a própria Get it on juntos.

ACÚSTICO. O livro Cosmic dancer – The life and music of Marc Bolan, de Paul Roland (uma das fontes desse texto) nota que, apesar das mudanças na sonoridade do T. Rex, a banda não deixou de investir em canções acústicas, como Cosmic dancer e Girl. Também apontou um detalhe sobre Bolan como letrista: ele não era um cara exatamente literato ou irônico, como Bob Dylan ou John Lennon. Mas tinha a capacidade de escrever letras que pareciam com temas infantis, e que geralmente vinham de imagens que batiam em sua mente e logo eram aproveitadas.

E ESSA CAPA AÍ? A biografia também aponta para um detalhe básico: Electric warrior é o único disco de Bolan a não trazer seu rosto na capa. A imagem da capa, que traz a silhueta do cantor, foi feita pela empresa Hipgnosis a partir de uma foto do cantor durante um show no Albert Hall, em Nottingham, dia 14 de maio de 1971. Olha a imagem original aí, antes do tratamento.

Várias coisas que você já sabia sobre Electric Warrior, do T. Rex

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UM CLÁSSICO do cinema pairava como referência em Electric warrior: era 2001 – Uma odisseia no espaço, de Stanley Kubrick. O amplificador por trás de Bolan é uma referência ao monolito do filme (o mesmo que inspirou a capa de Who’s next, do Who). E, ora vejam só, o disco tem uma canção sobre “consciência cósmica” chamada… Monolith.

ALIÁS E A PROPÓSITO, Monolith – geralmente tida como uma resposta de Bolan a Space oddity, do amigo-rival David Bowie – tem outra influência básica: o hit pop The duke of Earl, de Gene Chandler. Bolan pegou a melodia original, deu uma ralentada, umas modificações pequenas e fez outra canção na cara de pau.

OUTRA REFERÊNCIA do disco: You’ll be mine, do bluesman Howlin’ Wolf, serviu de inspiração para a letra e a levada de Jeepster.

A ÚLTIMA FAIXA DO DISCO, Rip off, termina com um improviso barulhento de guitarra, sax e cordas. Tony Visconti diz que tudo nessa faixa foi feito quase inconscientemente. “Quando as pessoas dizem que parece que pertence a outro lugar, digo: absolutamente certo! Foi feito com outra parte do cérebro”, contou.

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ALIÁS E A PROPÓSITO, Electric warrior teve algo em comum com outro disco do “várias coisas que você já sabia sobre”, The Who sell out, do Who (1967). Também vinha com um “pôster grátis’, só que trazendo uma imagem de Marc relaxadão numa poltrona, com os outros músicos atrás dele.

DE MODO GERAL, a arte de Electric warrior foi respeitada nos países em que foi lançado. No Irã, uma edição pirata transformou o lay out numa imagem com contornos prateados. Em Israel, o título foi acrescentado à capa, junto de um aviso “inclui Jeepster e Get it on”. Na Alemanha, a versão 8-track passou de preto para branco. No Brasil, a Polydor lançou o disco, mas com uma inscrição “série Rock Power – a nova geração elétrica”, acima do nome da banda. Por causa disso, os pés de Bolan foram cortados da capa.

ESSA TAL SÉRIE Rock Power fez estragos nas capas de discos de Jade Warrior, Manfred Mann’s Earth Band e Audience.

DEU CERTO? E como. Electric warrior saiu em 24 de setembro de 1971 e pôs Bolan na aristocracia do rock mais rápido do que se esperava, com discos vendendo a rodo, entrevistas, adulações de outros grandes astros (Ringo Starr virou quase seu irmão mais velho por alguns anos). Ficou 44 semanas nas paradas da Inglaterra e entrou para a classificação 32 no chart Billboard 200.

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O MINISTÉRIO DO SUCESSO ADVERTE. O livro de Paul Roland diz que nem tudo foram flores na vida de Bolan após o sucesso. Ou melhor: talvez o excesso de flores provocasse problemas. Bolan começou entrar numa egotrip meio bizarra, na qual misturavam-se sentimentos de eu-sou-o-fodão e momentos de inadequação e insegurança. Além de uma ideia, lá no fundo, de que aquilo tudo podia ir embora. Marc em vários momentos afastou-se dos amigos e afogou as mágoas na bebida e na cocaína.

OS AMIGOS afirmam que Marc vivia numa espécie de monastério, bastante perigoso e confuso. Elton John conta que o amigo “vivia num mundo de fantasia do qual não queria sair”. Tony Visconti diz que as pessoas próximas “precisavam alimentar as fantasias de Marc e levá-las adiante, e ninguém podia tirá-lo dessa bolha de plástico”. Steve Currie acredita que alguém perto de Marc alimentava o lado egocêntrico do cantor, “e pôs na cabeça dele a ideia de que ele era a melhor coisa já inventada desde o pão fatiado”.

MESMO ASSIM Bolan não podia reclamar de falta de sucesso. Aliás, era tanto sucesso que a coisa começava a ficar perigosa. No começo da turnê britânica do T. Rex, em maio de 1971 (portanto alguns meses antes de Electric warrior sair), dezenas de meninas adolescentes foram recepcioná-lo. Algumas delas recorriam a uma mania típica daqueles tempos: levavam tesouras para cortar cachos do seu cabelo.

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O EXCESSO DE FÃS nesse primeiro show, no Winter Gardens, mostrou que a equipe de segurança não ia dar conta: algumas adolescentes começaram a forçar tanto para chegar perto do palco, que caíram num fosso e empurraram alguns seguranças com elas. Não foi nada de muito grave, apesar do susto enorme, mas uma dúzia de policiais foi chamada para dar conta da situação.

DURO MESMO foi ouvir o show, prejudicado por causa dos gritos da plateia. E mais duro ainda foi sair do local com fãs de jogando por cima dos carros que levavam os músicos. “A gente estava mais assustado com o fato de que se algum deles se machucasse, seria nossa culpa”, disse Finn. Em outro show, em Newcastle, o percussionista é que sofreria: fãs o puxariam do palco e cortariam até cachos do seu cabelo.

E DEPOIS? O disco seguinte do T. Rex seria o excelente The slider (1972). E seria também o primeiro disco do contrato milionário assinado com a nova gravadora, a EMI. Bolan passaria a ter direitos de licenciamento sobre os masters dos discos, sua própria companhia de produção e edição musical. E, para lançamento no Reino Unido, teria também seu próprio selo, o T. Rex Wax Co. Que se responsabilizaria apenas pelos lançamentos da banda e não faria discos de novos artistas.

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BOLAN e seu grupo entrariam em declínio a certa altura dos anos 1970 e ficariam completamente perdidos em meio às novidades do mercado – até uma tentativa de disco music o T. Rex faria, com Dreamy lady, em 1975. As plateias punks redescobririam a banda, e o T. Rex voltaria a fazer sucesso após 1976. Bolan apareceria na mídia ao lado de grupos como The Damned, Ramones e Buzzcocks, e ganharia até mesmo um programa de TV. Estava reformulando seu som pouco antes de morrer em 1977.

E JÁ QUE VOCÊ CHEGOU ATÉ AQUI, pega aí uma versão bastante inusitada de Ride a white swan, do T. Rex. A supermodelo Naomi Campbell gravou a canção em 1995 em seu disco Babywoman.

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Cultura Pop

Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

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Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.

Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.

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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).

Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).

Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.

Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”

Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.

Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.

“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.

E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).

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Cultura Pop

Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

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Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.

O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.

Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.

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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.

O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.

Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.

Foro: Keira Vallejo/Wikipedia

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Crítica

Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

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Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.

Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.

Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.

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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.

É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).

Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga  estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.

O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.

Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.

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