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Crítica

Ouvimos: Beyoncé, “Cowboy Carter”

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Ouvimos: Beyoncé, "Cowboy Carter"

O disco novo de Beyoncé já era um clássico antes de sair: a maior cantora pop da atualidade, uma afro-americana nascida e criada no Texas, vinha pensando Act II: Cowboy Carter há alguns anos como um projeto redefinidor não apenas para ela, como também para a história da música norte-americana. Considerada “pouco próxima” do universo da música country – especialmente após uma aparição na premiação Country Music Awards que tocou no nervo exposto do preconceito do fã do estilo – ela decidiu mexer não apenas na história do gênero, como no próprio racismo histórico que faz com que ninguém pense na existência de cowboys negros no Velho Oeste.

O álbum (segundo ato de uma trilogia iniciada com Renaissance, de 2022, daí o Act II acrescentado ao título e tantos “II” nos nomes das faixas)) também merece parabéns pela verdadeira festa de referências. Você tem que ouvir o álbum lendo todas as informações possíveis sobre ele – algo que nem Madonna, Prince, David Bowie, Michael Jackson ou George Michael haviam conseguido antes. Se você ouvir Cowboy carter distraidamente, vai perder boa parte da festa. Nomes como Linda Martell, cantora negra de destaque no country, desaparecida do mercado há 50 anos, são evocados e convidados por Beyoncé para mais do que soltar a voz, abençoar o disco – ela surge justamente no batidão Spaghettii, uma das faixas menos associáveis com qualquer coisa de country, cabendo até um sample de funk (Aquecimento – Vem vem vai vai, do DJ Dedé Mandrake). Também gravou uma vinheta com sua voz.

O nome “country”, faz alguns anos, não identifica exatamente um estilo musical. É praticamente um guarda-chuva sob o qual se equilibram várias nuances e gêneros – Taylor Swift, pop a perder de vista, volta e meia faz questão de resgatar sua cidadania country em declarações e entrevistas. É nessa variedade musical, além da fidelidade ao imaginário do estilo (um verdadeiro canhão de comunicação para histórias pessoais de luta e vitória) que Cowboy Carter se segura, desde a abertura com o gospel Ameriican requiem, unindo cítaras, violões, samples de cordas e versos que unem pessoal e político (“diziam que eu era country demais/veio a rejeição, disseram que eu não era country o bastante” ao lado de “réquiem americano/as grandes ideias estão enterradas aqui”). Por acaso, é um dos álbuns mais audivelmente orgânicos já lançados pela cantora, com violões, guitarras e cordas – mesmo que sampleados.

O clima passa pelo trap-country da estradeira 16 carriages e pelo soul de saloon de Texas hold’em. E por dois tributos à musicalidade do Fleetwood Mac em sua fase pós-1975: o rock de FM Bodyguard e o pop country II most wanted – essa última, trazendo Miley Cyrus dividindo os vocais, é referenciada no hit Landslide, composto por Stevie Nicks. E por Ya ya, que traz Beyoncé procurando soar sessentista e pop-clássica, numa música cujo clipe poderia ser assistindo na scopitone instalada no bar mais próximo – referências de These boots are made for walkin’, de Nancy Sinatra, e Good vibrations, dos Beach Boys, surgem no decorrer da faixa. Blackbiird, a regravação-sample de Blackbird, dos Beatles, repatria a luta original pelos direitos humanos da letra.

Cowboy Carter vem sendo considerado como um passeio no dial do rádio – um conceito que, mesmo tendo trechos radiofônicos gravadas por Linda Martell, Dolly Parton e Willie Nelson, surge mais como uma gracinha e desaparece no decorrer da audição. Por sinal, Beyoncé regrava Jolene, de Dolly, mas inclui versos que deixam a letra mais feroz e ameaçadora, como se fosse uma disputa dos novos tempos. Riiverdance, outro destaque do disco, parte de uma violada country para recriar a house music e os batidões dançantes. Levii’s jeans, com Post Malone, traz mais pop herdado do rock e do country, com sinuosidade herdada do hip hop e do trap nos vocais. Repleto de vinhetas, o álbum destaca, entre as curtinhas, os vocais trabalhados de Flamenco e o diálogo voz-e-baixo de Desert eagle.

O novo álbum de Beyoncé, como tudo que vem rolando na carreira dela, é um projeto histórico-cultural (e não é?) e uma jogada de xadrez daquelas – em tempo de eleições nos Estados Unidos, ela surge na capa carregando a bandeira norte-americana e resgatando a influência de seu povo nos rumos do país, ao mesmo tempo que garante mais e mais atenção (e dinheiro, enfim). Vale acrescentar que, seja como for, Cowboy Carter é um disco bom para converter não-fãs, pessoas anti-pop e indignados em geral.

Nota: 9
Gravadora: Parkwood/Columbia

Crítica

Ouvimos: Babymetal – “Metal forth”

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Em Metal forth, o Babymetal mistura peso e pop: nu-metal, j-pop, rap e até soul, provando maturidade após 15 anos de carreira.

RESENHA: Em Metal forth, o Babymetal mistura peso e pop: nu-metal, j-pop, rap e até soul, provando maturidade após 15 anos de carreira.

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Babymetal é heavy metal para não-metaleiros, você poderia dizer. Nem tanto, né? É um banda que vem da cultura asiática de criação de ídolos, é formada por meninas (que já são mulheres) e gerenciada por uma agência poderosa – a Amuse, que tem até escola de música. Mas dá pra dizer, sem medo de errar, que muita gente foi apresentada ao universo do som pesado por causa delas. Até porque o Babymetal é esperto o suficiente para agregar mumunhas pop, e estilos como r&b e rap, a um universo conhecido pelo radicalismo.

Você piscou o olho e o Babymetal já tem quinze anos, várias turnês e, curiosamente, um número de discos bem pequeno. Metal forth é o quarto álbum e funciona bem para metaleiros de ouvidos abertos e sem preconceitos. Dando um passeio pelas faixas: Ratatata tem ar de j-pop e k-pop, e une som pesado, rap e dance music. Song 3 é uma porrada que une vocais guturais (da parte dos convidados do Slaughter To Prevail) e vozes meio Alvin e os Esquilos. From me to you, na abertura, herda sonoridades do metal alternativo e da música pop – é som rápido, pesado, eletronificado.

  • Ouvimos: Gelli Haha – Switcheroo
  • Ouvimos: Ming City Rockers – Clementine

Entre as surpresas de Metal forth, tem Sunset kiss, que deixa o Babymetal com uma cara de Spice Girls trabalhadas no couro e no preto. E My kiss, um nu-metal cuja introdução ameça uma chupada em Ratamahatta (hit do Sepultura com participação de Carlinhos Brown). Tom Morello põe energia em Metal!!!, que também traz emanações de Sepultura, mas une som pesado e soul. Já White flame, no final, aponta para vários lados: j-pop, emo, punk… encerrando com um solo de guitarra final que lembra Queen.

Quem ouvir Metal forth de mente aberta, vai descobrir que, com o tempo, o Babymetal foi se tornando um projeto bastante equilibrado – as integrantes cresceram e o mundo ao redor delas mudou bastante.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Capitol
Lançamento: 8 de agosto de 2025

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Crítica

Ouvimos: Deb and The Mentals – “Old news” (EP)

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Deb and The Mentals volta às raízes em Old news: punk, grunge e new wave com peso, energia e nostalgia.

RESENHA: Deb and The Mentals volta às raízes em Old news: punk, grunge e new wave com peso, energia e nostalgia.

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Com uma formação nova que traz Fi (NX Zero), na guitarra, Deb and The Mentals decidiu voltar ao começo num EP de nome sintomático, Old news. Deb Babilônia adota novamente as letras em inglês nas cinco faixas do disco – e a banda corresponde com um som voltado para uma confluência entre punk, grunge e new wave. A faixa de abertura Together again une anos 1980 e 1990, soando como Ramones na fase Mondo bizarro (1992). Suck me in, com um pouco mais de peso, tem muito de bandas como Generation X. A noventista To erase vai para a pequena área do punk + metal, com peso e intensidade.

O “lado B” de Old news tem um hardcore rápido, cavalar e acelerado, Burn it down, fechado com microfonias. Tem também a música mais bonita do disco, Runaway, união de punk e rock britânico oitentista, chegando a lembrar Smiths. Dying spark, por sua vez, chama atenção pela boa marcação de baixo e bateria, e pela linha do tempo sonora que vai dos anos 1970 aos 1990.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: Algohits
Lançamento: 13 de agosto de 2025

  • Ouvimos: Paira – EP01 (EP)
  • Ouvimos: A Terra Vai Se Tornar Um Planeta Inabitável – Ident II dades (EP)
  • Ouvimos: akaStefani e Elvi – Acabou a humanidade

 

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Crítica

Ouvimos: Klisman – “CHTC”

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Em CHTC, Klisman transforma o Centro Histórico de Salvador em rap visceral, misturando trap, afropop e relatos de vida dura.

RESENHA: Em CHTC, Klisman transforma o Centro Histórico de Salvador em rap visceral, misturando trap, afropop e relatos de vida dura.

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CHTC, título do disco de estreia do rapper baiano Klisman, é uma sigla para “Centro Histórico tá como?” – e uma lembrança do coração de Salvador, um conjunto de pontos turísticos que explicam a história da capital baiana (Pelourinho, Elevador Lacerda, Mercado Modelo), além de um entorno de dez bairros. Klisman cresceu por lá e levou tudo para seu som, que une mumunhas do trap, e um certo elemento de perigo vindo do rap, além de erros e acertos pessoais. O som une beats de trap, afropop e vibes latinas.

Klisman fala da vida como ela se apresentou não apenas para ele, mas para vários amigos seus. Reparação histórica entra na mente dos que são tidos como vilões, em versos como “se eu roubo esse gringo é reparação histórica / visão de cria não pega na ótica” e “poucos sabem o dilema que eu vivo / do tipo: como vender drogas e ser um bom filho? / como tirar vidas e criar meu filho?”. Caminho certo cria imagens musicais para retratar um dia a dia que exige posicionamento rápido (“são escolhas que mudam o caminho de casa”), o mesmo rolando na ameaça sonora de 25kg e na sagacidade de Proibido branco. O próximo é rap lento e climático que une ódio e tiração de onda.

Para quem for ouvir CHTC, o conselho é tentar entender tudo como um filme e não sair julgando: Klisman entrega todas as contradições de quem cresceu numa realidade bem distante do que a classe média enxerga como normal – e o normal ali são leis bem estranhas. Em Praia da Preguiça, aberta com sample de violão e flautas, e Pixadão de guerra, sonhos misturam-se com alfinetadas em trappers famosos e realidades de trincheira (“a emoção de ver o alemão sangrar / é a mesma de ver o irmão prosperar”). Ainda sou o mesmo vai para vários lados da violência urbana: “quantas mãe vai ter que chorar? / ele poderia ter um Grammy / mas ele tá na boca portando uma Glock”.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Nadamal
Lançamento: 22 de maio de 2025.

  • Ouvimos: Snoop Dogg – Iz it a crime?
  • Ouvimos: Djonga – Quanto mais eu como, mais fome eu sinto!

 

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