Lançamentos
Faixa a faixa: LuizGa, “Real cinema” (EP)

Com uma sonoridade bem acústica e brasileira, Luiz Gabriel Lopes, o LuizGa, estreia com o EP Real cinema, lançamento do selo independente Pequeno Imprevisto. Um disco que teve suas faixas apresentadas ao longo de 2024, e que reúne um pouco do calor do “ao vivo” com o clima certinho das gravações em estúdio, já que LuizGa buscou inovar ao captar as canções. As cinco faixas foram feitas a partir de takes ao vivo gravados no Teatro do IX Mundo, em São Paulo, em 2023. Ele e o produtor Otávio Carvalho adicionaram material ao que já havia sido feito.
“É um disco que pega aquele quente do take ao vivo, aquela imprecisão viva, mas descontextualizando um pouco o tradicional ao vivo e passando a usar isso mais como matéria prima. E isso me pareceu bem interessante como abordagem de produção musical”, explica LuizGa, que já tem três álbuns solo gravados desde 2010, além de dois EPs e alguns singles. Ele também é fundador das bandas Rosa Neon e Graveola, e tem trabalhos ao lado de Luiza Brina e Maglore.
“A junção de ao vivo com estúdio trouxe uma personalidade muito interessante na sonoridade, que a gente achou com os efeitos sonoros acrescentados às bases gravadas ao vivo. Destaco também a presença do violinista português João Silva, que aparece em três das cinco faixas. Ele criou arranjos maravilhosos, todos gravados posteriormente em Barcelona, na Espanha”, complementa Luiz, que apresenta uma parceria com a mineira Clara Delgado (Quadrante) e uma canção escrita em idioma originário, Yame awa kawanay, feita por Maxi Huni Kuin e Daniela Sales Pereira Kaxinawa.
Abaixo, LuizGa comenta as canções do EP. Ouça em sua plataforma favorita.
“O QUE EU QUERO PRO MUNDO”. “Nessa época, eu estava fazendo uma residência em Lisboa, na Fábrica Braço de Prata, e morava numa caravana do lado de fora do prédio da fábrica. Lembro que no fim de um dia de trabalho, já era noite, eu sentei com o violão e me veio essa letra, como uma manifestação das coisas que estavam passando na minha cabeça naquele momento. É uma música que logo se tornou – pela clareza do texto mesmo – um pequeno amuleto pra mim. Uma espécie do profissão de fé, do que que a gente quer pro mundo, pra nossa vida, desenvolvimento da nossa sensibilidade como seres humanos nessa planeta tão maravilhoso que a gente vive”.
“QUADRANTE”. Eu estava em Portugal e tinha acabado de terminar um relacionamento. Fiz a melodia e mandei para a Clara Delgado, que é uma escritora, poeta e letrista maravilhosa de Belo Horizonte. E ela fez essa letra, que é meio de saudade, meio de coração partido, de memórias, de lembranças”.
“Quadrante é uma alusão direta ao mar e à navegação. É um instrumento com o qual você checa a linha do horizonte. É um formato clássico de parceria, muito consagrado na música popular brasileira. Eu tenho alguns parceiros letristas com quem componho com alguma regularidade, e a Clara Delgado é uma dessas pessoas. Ela é uma artista, escritora e poeta que tem esse hábito de escrever letras de música. Isso exige uma sensibilidade muito específica, e ela tem isso muito consolidado. Com a Clara, as experiências tem sido muito bonitas, muito bem sucedidas. Você ouve a música e sente a integração entre melodia e palavra. Ela tem um feeling muito interessante de achar o assunto da melodia”.
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“APRENDER A PERDER”. “É uma música que tem batido muito forte nos shows. Ela parece criar uma conexão emocional com as pessoas através dessa ‘universalidade da vulnerabilidade’. Esse sentimento que, apesar de ser profundamente humano, talvez não encontre muita referência no cancioneiro produzido mais recentemente. E como todas as músicas desse disco, Aprender a perder também foi produzido a partir de um take ao vivo de voz e violão gravado durante um show, sobre a qual foram acrescentadas pequenas camadas sutis de alguns poucos elementos de paisagem de sonora, como os violinos do João Silva. Ele imaginou, performou e gravou um arranjo fabuloso de cordas”.
“ABYA AYALA”. “Comecei a escrever há muito tempo atrás e ela ficou numa espécie de limbo das canções não-terminadas. Parecia sempre faltar ou sobrar alguma coisa. Mas eu sempre quis que essa música falasse sobre a misteriosa natureza de liberdade do espírito sul-americano, especialmente aqueles de matrizes indígenas. Abya ayala é uma expressão que historicamente considerada um dos grandes nomes que o continente tinha numa linguagem originária, antes da invasão dos europeus”.
“Esse desejo de falar disso tem, claro, muito a ver com o meu encontro com o povo Huni Kuin. Os trabalhos que eu tenho feito em parceria com ele nos últimos seis anos, modificaram minha forma de ver a arte, a música, a minha própria música e a minha forma de fazer música. Escrevi ela em espanhol, o que não é muito usual pra mim, mas é algo que tem se tornado mais comum recentemente”.
“YAME AWA KAWANAY”. “É uma canção Huni Kuin, cuja letra é na língua Hantxa Kuin, que é um idioma originário, com melodia de uma jovem artista da aldeia, Maxi Huni Kuin, que foi aluna das residências artísticas que eu tenho feito por lá. É uma canção que sempre teve um impacto muito grande pra mim. Acho a melodia muito forte e muito bonita”.
“Eu me lembro deles cantando na aldeia, era sempre muito emocionante. E aí eu tive a feliz surpresa de ter alguns integrantes do grupo Kayathibu em São Paulo na mesma data em que eu estava gravando a apresentação ao vivo que gerou as bases desse disco. E sem muito planejamento, eu os chamei para participar e pintou a ideia de cantarmos juntos essa música. Ali tem a voz da Maspã, que na altura da gravação tinha de 8 para 9 anos. Estavam ainda o pai dela, Txana Tuin, e Yura Shane e Shane Saite, todos integrantes do grupo e parentes entre si. E essa música se tornou uma espécie de portal quântico do disco, é quase uma vinheta que abre um outro espaço sonoro dentro do EP”.
Crítica
Ouvimos: Yowie – “Taking umbrage”

RESENHA: Math rock levado ao extremo: o Yowie faz em Taking Umbrage um som caótico, virtuoso e insano, entre o jazz, o hardcore e o humor.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Skin Graft Records
Lançamento: 3 de outubro de 2025
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Se você nunca entendeu direito o que é math rock, esse disco pode resolver seus problemas. Só que, vá lá, ele dá uma explicação bem radical para suas dúvidas a respeito do estilo. O Yowie, banda que mudou de formação nos últimos tempos igualmente de maneira radical – sobrou apenas o baterista (!) Shawn “Defenstrator” O’Connor, que convocou novos guitarristas e baixista – faz em Taking umbrage, seu quarto álbum, um som que… Cara, digamos que até explicar é complicado.
Basicamente o Yowie une bases de guitarra maníacas, slides feitos igualmente de forma caótica, e variações rítmicas em que tudo parece ir para vários lados diferentes ao mesmo tempo. O termo “ritmos quebrados” mal serve como explicação, porque a quebração se dá em ritmo, harmonia, solos e em praticamente tudo que vem pela frente. O math rock volta e meia consegue unir-se com estilos mais palatáveis, numa gama que vai do post-rock ao pós-hardcore, mas aqui não há nada disso – até porque se você escutar Taking umbrage sem prestar atenção na passagem de uma faixa para a outra, pode até se surpreender em ver que as músicas soam como uma suíte repleta de variações rítmicas.
- Ouvimos: Gaupa – Fyr (EP)
Com essas variações, músicas como Hot water healer quase deixam entreouvir um forró torto, enquanto Grumgrubber faz o mesmo oscilando entre samba, blues, funk e hardcore. Lemon strogonoff aumenta consideravelmente a velocidade lá pelas tantas, enquanto Museum fatigue parece uma salsa pesada e atonal. Não dá pra negar: lá pela metade você sente falta de algo diferente, de uma textura a mais, de algo que fuja do receituário. Igualmente é inegável que tudo aquilo pode soar irônico e meio zoeiro, como um novelty record, ou como uma versão radical da Florentina, do palhaço Tiririca (sim, aqueles momentos “oh, não, vai começar tudo de novo…”).
Bom, você escolhe como encarar esse disco. Vale dizer também que num disco desses, evocações do jazz não poderiam faltar. E elas circulam por todas as faixas, aparecendo com mais intensidade em músicas como a fusion demoníaca Throckmorton e a tribal The road to Gumbone. No fim das contas, é rock maníaco para quem decididamente não quer ouvir música para ficar mais calmo/calma.
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Crítica
Ouvimos: Saline Eyes – “The autumn EP” (EP)

RESENHA: O romantismo pop com ecos de Beatles, Todd Rundgren, Beach Boys e David Bowie marca o melancólico e luminoso The autumn EP, do Saline Eyes.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Melengepag Records
Lançamento: 6 de outubro de 2025.
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Criado por James Hackett, um músico da Filadélfia radicado em Ohio, o Saline Eyes parece um projeto sem maiores pretensões. Mas só parece: The autumn EP, novo lançamento do Saline Eyes, une romantismo herdado de Todd Rundgren e Brian Wilson, e uma onda melódica cujo alcance vai de Beatles ao britpop, passando por Psychedelic Furs, Radiohead, Teenage Fanclub e David Bowie. As letras falam sobre tristeza, inadequação e amores.
- Ouvimos: Naïf – Trópicos úmidos (EP)
Essa melancolia toda rendeu canções mágicas como No you and I (que lembra Elton John), o pop barroco e quase progressivo de Alone, o tristonho bubblegum de piano Separate. Além do som agridoce de On my mind e Autumn rain, ambas com musicalidade beatle nos vocais e nos arranjos. No final, If I were yours põe mais luminosidade no disco, unindo rock e soul numa recita musical bastante acessível.
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Crítica
Ouvimos: Sally Dige – “Holding the sun”

RESENHA: Em Holding the sun, Sally Dige mistura rock britânico 80s, dream pop e baladas sombrias, criando um disco breve e hipnótico sobre o amor perdido.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 11 de julho de 2025.
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Cantora berlinense, Sally Dige soa como uma versão pouca coisa mais trágica do rock britânico dos anos 1980 – The Cure, New Order – em seu novo disco, Holding the sun. Ela chora por um amor perdido em It’s you I’m thinking of, invade a área do dream pop em faixas como Voice of my heart e Sow the path (canção meditativa que tem muito de Enya e Madonna, mas também é herdeira de Imitation of life, hit do R.E.M.) e faz pop adulto dos anos 1980 em Strenght in me.
- Ouvimos: Ani Glass – Phantasmagoria
Sally também reúne referências de nomes como Psychedelic Furs, Cranberries e Peter Murphy em vários momentos de Holding the sun, um disco curto (meia hora), com certa cara de EP ou de lançamento intermediário entre álbum e EP. Uma onda que toma conta de faixas como I will be the sun for you, faixa em que ela toca instrumentos como bandolim e balalaica, e cria um som bem hipnótico. You, por sua vez, é uma balada acústica com onda anos 50/60, que faz lembrar Chris Isaak e formações hoje não tão lembradas, como o Hothouse Flowers – mas tem riff de guitarra bordando a faixa, como no New Order.
No final, Sow the path volta em versão com voz, cordas e piano, e Our secret, um tema instrumental, fecha o disco levando tudo para um universo tranquilo e, ao mesmo tempo, sombrio.
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