Crítica
Ouvimos: Stereophonics, “Make ‘em laugh, make ‘em cry, make ‘em wait”

O Stereophonics nunca fez os fãs esperarem (eita trocadilho idiota) por discos novos – o maior hiato de lançamentos rolou entre 2009 e 2013. Do começo até hoje, a banda galesa sempre pareceu o nome do britpop mais apropriado para brigar num mercado em que bandas como Goo Goo Dolls e Matchbox Twenty arrebanhavam fãs – já que o maior investimento do grupo era num rock que unia punk, glam rock, hard rock e refrãos bacanas.
Tanto que esse Make ‘em laugh, make ‘em cry, make ‘em wait, 13º disco do grupo, une a musicalidade alternativa dos anos 1990 a algo mais próximo do rock norte-americano, trazendo sons com alma estradeira no repertório. O country rock Make it on your own, na abertura, e o blues-rock Eyes too big for my belly, que lembra um Aerosmith + Black Crowes impregnado de britpop, são bons exemplos disso. Às vezes isso não dá certo: Feeling of falling we crave, uma balada country com slide guitar apitando, dá a impressão de algo que você já ouviu umas 500 vezes.
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Make ‘em laugh foi descrito pelo vocalista e guitarrista Kelly Jones como um disco “muito melódico”. Tá certíssimo, porque essa é a maior qualidade do disco: o discurso venturoso e reflexivo do álbum é complementado pelo groove e pela beleza, em faixas como There’s always gonna be something, o pós-britpop de Seems like you don’t know me e a baladinha 50’s colours of october, que parece mesclar referências de INXS e Everly Brothers.
A historieta de Mary is a singer, sobre uma cantora que não acredita em si própria (“Mary acha que é uma pecadora / dificulta a si mesma / nunca é boa o suficiente / ela é uma perdedora ou uma vencedora?”) e a vibe feliz de Backroom boys oscilam entre o pop e o country – sendo que a primeira lembra bastante Tom Petty. Como quase sempre rola na históra dos Stereophonics, Make ‘em laugh, make ‘em cry, make ‘em wait não é um disco maravilhoso, mas a busca de conexão com o público tentada por Kelly Jones e seus chapas é realmente intensa – tão intensa que você pode acabar sendo fisgado pela banda antes que a vida siga.
Nota: 7
Gravadora: EMI
Lançamento: 25 de abril de 2025.
Crítica
Ouvimos: Preoccupations – “Ill at ease”

RESENHA: Preoccupations lança Ill at ease, seu melhor disco: pós-punk denso, melódico e sombrio, com ecos de R.E.M., Smiths e Interpol.
Existe algo bem forte no som da banda canadense Preoccupations (ex-Viet Cong – a alcunha mudou porque a banda começou a ter shows cancelados devido ao nome considerado ofensivo) que lembra uma mescla de Interpol, R.E.M. e Smiths. O tal “algo” inclui: vocais fortes, letras apocalípticas, climas pesados, mas tudo amaciado com vibes bem melódicas.
Ill at ease (algo como “constrangido”, “pouco à vontade”) leva essa receita ao máximo e é o melhor disco de Matt Flegel (baixo, vocais), Mike Wallace (bateria), Scott “Monty” Munro (guitarra, sintetizador) e Daniel Christiansen (guitarra) até o momento. Musicalmente é o retrato da transformação do pós-punk em, mais que um estilo musical, uma senha de compreensão musical, e uma chave de leitura para clima estranhos.
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É o que rola em Focus, uma canção sobre mal do século e culpa (“o diagnóstico é / estou fazendo o meu melhor / para esquecer tudo o que sei / mas não consigo me livrar da vergonha dos erros que cometi / deve ter acontecido aqui há mil anos’). E no pós-punk eletrônico de Bastards, uma canção que põe a nu a pose daquele ser humano que só pensa em grana e fama, mas com metáforas de fim de mundo: “talvez, quando você sentir tudo desmoronando / não há mais nada aqui para aproveitar / acho que estamos prontos para o asteroide”.
O disco aponta também para uma união entre a crueza do punk e o som dos já citados R.E.M. e Smiths (Andromeda), sons que lembram David Bowie (a faixa-título e Retrograde – essa última na onda da fase Berlim) e pós-punk robótico na cola de Can e New Order, simultaneamente (Panic). Sken tem experimentações rítmicas a rodo no começo, a ponto de confundir a/o ouvinte, e, finalizando, Krem2 é um blues pós-punk gótico e sombrio. Enfim, Ill at ease traduz inquietações com arranjos emocionantes, atmosferas densas e um senso constante de tensão.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Born Losers Records
Lançamento: 9 de maio de 2025.
Crítica
Ouvimos: Men I Trust – “Equus asinus”

RESENHA: Men I Trust lança Equus asinus, disco nostálgico e etéreo com folk desolado, pop barroco, emanações da música francesa, e clima de trilha soft porn das antigas.
Demoramos para resenhar o disco do Men I Trust, Equus asinus, lançado em março, e acabou que a banda canadense já cumpriu o que havia prometido e soltou nas plataformas Equus caballus, novo álbum e “outra face” do disco anterior.
São de fato dois discos com astrais bem diferentes um do outro – Caballus fica para uma próxima resenha, mas Asinus investe fortemente numa nostalgia ligada ao pop barroco, à música francesa e… aos temas de antigos filmes soft porn. Pois é: faixas como Girl, Bethelehem e The landkeeper caberiam bem em algum filme da franquia Emmanuelle, ou em alguma produção liberalzaça rodada numa praia deserta.
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Também é um disco marcado por estruturas musicais ligadas ao folk desolado, como em Unlike anything (“quando minha mão se for, você será o mesmo / você é diferente de tudo que eu conheço / você ainda é aquele que não pode ser domado”), I don’t like music, Frost bite, a celestial Burrow. Moon 2 é uma balada jazzística, psicodélica, derretida, que soa como uma viagem bem estranha – e é seguida por um instrumental de piano, What matters most.
Na real, o que o Men I Trust fez foi dividir seu som em dois lados diferentes, e colocar cada lado em cada disco – e a face tranquila e enevoada surge em Equus asinus. É uma opção que acaba cobrando algumas coisas do grupo: mesmo que Asinus tenha algumas músicas excelentes, o cansaço acaba vencendo várias vezes, e fica a impressão de um disco bem maior do que seus quase 45 minutos.
A curiosidade fica por conta da capa, que mostra uma foto num clima nada sexy: um casal no quarto, o homem passando roupa, a mulher de costas. Pode ser uma autozoação, mas fica na memória o que alguém disse do disco no site Album Of The Year: “Desculpe, mas a ironia não pode salvar esta capa”. E é verdade.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Independente
Lançamento: 19 de março de 2025
Crítica
Ouvimos: Scar – “Lado A: O óbvio ululante” (EP)

RESENHA: Scar, de Nilópolis, lança Lado A: O óbvio ululante: synthpop com pegada 80s, vaporwave e referências de videogame, pagode e Turma da Monica.
Synthpop de Nilópolis (cidade da Baixada Fluminense, Rio), feito por uma banda-de-uma-mulher-só, com referências que vão de trilhas de videogames dos anos 1990 a histórias da Turma da Monica. O Scar, comandado pela musicista Isis Cardoso, vai além disso, apresentando no EP Lado A: O óbvio ululante quatro faixas que falam sobre amores, distâncias, batalhas diárias, transporte público, e uma noção de synthpop que passa principalmente pelo pop adulto dos anos 1980 e pelo retrofuturismo.
Shinji, a faixa de abertura, fala sobre o dia a dia de alguém que trabalha o dia inteiro (em telemarketing, como sugerem o início e fim da faixa), em meio a uma trama de programações, vocais e synths que remete tanto a Yellow Magic Orchestra quanto a grupos de pagode, tudo funcionando como se tivesse sido gravado no quarto. Maktub invade as áreas da Orchestral Manoeuvres In The Dark, do Ultravox e de Marina Lima, unindo observações do urbano e do existencial (“já estive tanto no lugar errado / já estive tanto no mesmo lugar”).
Na segunda metade do EP, Coisas tem batida seca e pós-punk, que evolui para algo sintetizado, ensolarado e tropicalizado, com pandeiro e percussão no fim. Tamagochi, aberta pelos incríveis versos “semana passada você passou com seu Chevette / com seus óculos escuros / com o seu walkman / e disse pra ouvir a fita que você gravou” une synthpop, pagode e clima vaporwave, como se desse início a um sonho em que várias perspectivas de futuro se confundem.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Quarto Escuro Sounds
Lançamento: 3 de maio de 2025
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