Connect with us

Crítica

Ouvimos: Delivery, “Force majeure”

Published

on

Ouvimos: Delivery, “Force majeure”
  • Force majeure é o segundo álbum do grupo australiano Delivery, formado por Rebecca Allan (vocais, baixo), James Lynch (vocais, guitarra, sintetizador), Sam Harding (vocais, guitarra, violoncelo), Lisa Rashleigh (vocais, guitarra) e Daniel Devlin (bateria, percussão).
  • O disco foi gravado e produzido pelos integrantes Sam Harding e James Lynch, e além de estúdios de verdade, passou por gravações bem caseiras, tipo no porão da casa dos pais de James.
  • Uma diferença entre o álbum novo e a estreia, Forever giving handshakes (2022), é que no primeiro álbum a banda ainda estava sob o signo da pandemia, e quis fazer tudo ao vivo, numa sala de ensaio.  James insistiu que o Delivery deveria gravar tudo em etapas, de maneira profissional. “Sinto que foi um processo um pouco mais cuidadoso. Talvez o resultado signifique que o álbum tenha um pouco mais de escopo de som”, contou à Merry Go Round Magazine.

Basicamente, o Delivery é uma ponte entre o punk dos anos 1970 e o faça-você-mesmo indie pós anos 2000. Tanto que não é difícil achar em Force majeure, segundo disco do grupo, sonoridades que lembram tanto Buzzcocks quanto The Hives – e essa junção de épocas acaba não apenas dando uma cara bem particular para o grupo australiano, como também um certo alívio em quem procura bandas legais de rock dos dias de hoje.

Force majeure abre com Digging the hole, punk com palhetadas e agilidade vocal, que ganha uma segunda parte mais glam-hard rock do que punk. Operating at a loss lembra o lado mais lascado do indie rock anos 2000, e um encontro entre punk 1977 e grunge. Há um evidente lado pré-punk em faixas como What for, Focus, right (que soa como The Who e Kinks, só que cheio de microfonias) e Stuck in the game. The new alphabet é quase uma versão beat de bandas como Television e Talking Heads, com vocal impaciente no estilo de Jello Biafra.

A marcação cerrada de guitarra, baixo e bateria da banda rende excelentes momentos (tem também a sujeira quase psicodélica de Only a fool e Put your back into it) e dá bastante coesão ao disco. De diferente, aliás bastante diferente, tem o synth pop podre, no estilo do Tubeway Army, de What else?. Deve ser muito bom ouvir isso em vinil.

Nota: 9
Gravadora: Heavenly Records
Lançamento: 17 de janeiro de 2025.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Crítica

Ouvimos: Larkin Poe, “Bloom”

Published

on

Ouvimos: Larkin Poe, "Bloom"
  • Bloom é o oitavo álbum da banda de blues-rock Larkin Poe, formada pelas irmãs Rebecca e Megan Lovell. O grupo surgiu em 2010, e antes disso, as duas formavam um trio de bluegrass com a irmã Jessica, o Lovell Sisters. O trio chegou a fazer apresentações acompanhando Elvis Costello em 2009.
  • No duo, Rebecca faz os vocais principais e toca guitarra base, enquanto Megan faz backing vocals e fica com a guitarra slide.
  • As duas tocaram recentemente em Rosetta, uma das faixas do álbum country de Ringo Starr, Look up.

O bom e velho “para quem gosta de…”, que costuma aparecer em sites de resenhas, vai direcionar o Larkin Poe para fãs de rock clássico e country-rock. Bloom, novo álbum do grupo, soa como se o punk jamais tivesse existido. Nas onze faixas do disco, as irmãs Rebecca e Megan Lovell demonstram influências de Aerosmith, Gary Moore, AC/DC, Led Zeppelin, Rolling Stones fase 1971, Lynyrd Skynyrd, Allman Brothers, blues e country clássico. Tudo isso sem nenhum cacoete lo-fi, e sem nenhuma brincadeira do tipo sujar o som, ou gravar o vocal como se viesse de uma fita K7, ou de um megafone antigo.

Justamente por isso, é importante dizer – e isso pode angariar narizes torcidos aos montes – que Rebecca e Megan não fazem parte de nenhuma banda indie, a perspectiva de Bloom é de rock clássico radiofônico, e o material parece ter sido feito pensando em quem ouve rock alto ao volante. Isso fica claro em faixas como Mockingbird, um rock sulista que não destoaria de um antigo comercial de cigarros; Bluephoria, tributo ao lado mais suingado de bandas como Led Zeppelin e Deep Purple; e Little bit, uma canção romântica que remete ao toque country de Elton John, Ringo Starr ou Paul McCartney.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Quanto às referências femininas, o som do Larkin Poe carrega a força de Joan Jett, a versatilidade country-rock de Linda Ronstadt e a vibe mística de Stevie Nicks. Especialmente quando as duas irmãs sentam a mão em faixas como o boogie pesado Nowhere fast e a mescla de blues e spiritual God is a woman (excelente letra: “se deus é uma mulher/o diabo também é melhor você se ajoelhar”). Já Pearls é country-rock pesado com letra feminista e raivosa: “Você tenta me dizer o que fazer/você tenta me dizer o que não fazer/eu faço o que eu quero, quando eu quero (…)/eu não te digo como girar seu mundo/fique com suas pérolas”.

Ainda que seja um álbum com estileira setentista, Bloom está bem longe da nostalgia – até mesmo quando se torna um disco ligeiramente 60’s, em faixas como You are the river e na balada country Bloom again, que vêm no encerramento. No geral, é rock competente tocado por duas irmãs que parecem ter sido criadas entre instrumentos musicais. Se o Larkin Poe vivesse no Brasil e tocasse samba, seria um samba de raiz, sem concessões a novidades. E isso tem seu charme.

Nota: 7,5
Gravadora: Tricki-Woo Records
Lançamento: 24 de janeiro de 2025.

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Lilly Hiatt, “Forever”

Published

on

Ouvimos: Lilly Hiatt, "Forever"
  • Forever é o sexto disco da cantora norte-americana Lilly Hiatt, que é filha do cantor e compositor John Hiatt, e é também formada em psicologia.
  • “Este foi um disco que foi escrito e gravado uma faixa de cada vez com meu marido Coley. Depois de descartar cerca de 20 músicas que escrevi nos últimos anos, eu queria chegar ao cerne das coisas”, conta ela no texto de lançamento.
  • “Tive uma ótima conversa com uma amiga no telefone e ela mencionou que não tinha certeza de onde eu estava. Percebi que também não tinha certeza disso. Foram alguns anos nebulosos depois de 2020, e as peças pareciam estar apenas começando a ser reunidas. Eu me apaixonei, me casei, tive um cachorro, uma casa… coisas com as quais sempre sonhei”, continua ela, dizendo que demorou ate aceitar que estava preparada para sua nova vida. “O tempo está voando, e eu quero estar aqui para tudo, em vez de ficar perdida em meus pensamentos o tempo todo. Meu amor é para sempre”, finaliza.

Lilly Hiatt é filha de John Hiatt, um veterano da música estadunidense cuja carreira atravessa décadas e estilos — do country à new wave, passando por yacht rock, blues e o rock revisionista dos anos 1970. Do pai, herdou a disposição para explorar novos caminhos. E da geração que revelou o pai, ela absorveu, quase por osmose, a vibe dos roqueiros que, não importa para onde sigam, carregam com orgulho suas raízes e tudo o que elas representam.

Daí que, equilibrada entre o country e o alt-country em álbuns anteriores, em Forever, ela retorna partindo para o garage rock, e até para sonoridades aparentadas do grunge em alguns momentos – sem deixar de lado a argamassa country. O disco, bem conciso (29 minutos), abre com Hidden day, rock indie-blues, com certa psicodelia misturada lá. Shouldn’t be, por sua vez, é rock de festa, com algo glam misturado, já que é um boogie que poderia ser uma releitura do T Rex. Ghost é um rock que consegue apontar simultaneamente para o country e para o punk. Os vocais de Lilly parecem ser feitos num megafone, com bastante eco.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

O disco novo de Lilly, por sinal, é um disco bastante alegre, quase sem melancolia, em que ela fala sobre dia a dia pessoal, vida amorosa, realização musical e até sobre um “dia secreto” da semana, entre quinta e sexta (“para esta porra de semana/é onde eles guardam o dia escondido/não conte aos seus amigos/guarde para si mesmo”, canta na já citada Hidden day, deixando certa dúvida sobre porque diabos ela não localizou o tal dia no fim de semana). Trabalhando ao lado do marido, o músico de Nashville Coley Hinson, ela reflete sobre o que deve perdurar para sempre na faixa-título — que, liricamente, se torna a peça central do álbum.

Musicalmente, Forever é mais representado pelo revisionismo anos 1960/1970 de Somewhere (uma canção que poderia estar no repertório de Warren Zevon ou Tom Petty), pelo baladão country romântico de Man, pela neopsicodelia oitentista de Evelyn’s house e pela balada Thoughts. Muito embora haja bastante variedade no álbum, cabendo um paredão de guitarras e distorções na faixa-título, e vibes herdadas de David Bowie em Kwik-E-Mart, uma canção sobre a felicidade que existe nas coisas simples. E Forever conquista justamente pela pureza e pela sinceridade em que investe.

Nota: 8
Gravadora: New West Records
Lançamento: 31 de janeiro de 2025

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Hifi Sean & David McAlmont, “Twilight”

Published

on

Ouvimos: Hifi Sean & David McAlmont, "Twilight"
  • Twilight é o terceiro disco da dupla de música eletrônica Hifi Sean & David McAlmont. O álbum segue uma tradição da banda, de lançar álbuns conforme as estações do ano na Inglaterra. O anterior, do ano passado, era Daylight e se relacionava com o verão.
  • Hifi é Sean Dickson, vocalista e guitarrista dos Soup Dragons (lembra daquela releitura dance de I’m free, dos Rolling Stones, que estourou no Brasil no começo dos anos 1990?). David é cantor de soul, ex-integrante da dupla londrina Thieves – teve também outros dois trabalhos em duo, com Bernard Butler (Suede) e o compositor britânico Michael Nyman.
  • Diz Hifi sobre o disco: “Eu queria fazer este álbum parecer como se você estivesse em um espaço escuro da cabeça enquanto é abraçado por sua pessoa favorita ao mesmo tempo”.
  • Diz David sobre o disco: “Tudo o que sei é que decidimos fazer uma irmã mais nova para Daylight e acabamos com nosso melhor álbum até agora…”

Conforme Hifi Sean e David McAlmont já haviam adiantado há tempos, Twilight, o novo disco da dupla, mergulha de vez no lado mais psicodélico de seu trabalho. É uma experiência sonora voltada para a contemplação, a introspecção e a imersão – um convite para observar estrelas, flutuar em paisagens sonoras etéreas e se perder em devaneios invernais. Não por acaso, o álbum chega no inverno europeu, seguindo a tradição deles de lançar discos sazonais.

A abertura com The comedown já dá o tom: nada de batidas dançantes, apenas uma viagem sonora hipnótica e meditativa, como um ar-condicionado musical. A faixa cresce aos poucos, impulsionada pelos vocais etéreos de McAlmont, sintetizadores envolventes e a participação de The Blessed Madonna, que sussurra: “posso ouvir meu coração batendo como um tambor”.

A faixa-título, Twilight, mantém o clima alucinógeno, mas com beats dançantes, percussão tribal e um groove que se dissolve e se recompõe em formas inesperadas. Os vocais ressoam como um coral soul que funciona dentro da cabeça do/da ouvinte, ainda mais envolvente quando ouvido com fones. No meio da faixa, sons de pássaros, latidos de cachorro e uma rajada sintética de tom apocalíptico trazem aquele toque de bad trip essencial para a jornada.

Bad trip? Sim, porque o álbum Twilight, essencialmente, é um voo psicodélico: relaxante, mas também desconcertante. Uptown/Downtown soa como uma viagem noturna de carro, misturando eletrônica atmosférica e guitarras melancólicas. Driftaway flutua entre rock, soul e eletrônica, evocando Marvin Gaye e Pink Floyd ao propor uma jornada entre o espaço e o oceano (“Não se preocupe com as ondulações / Mas e quanto às ondas?”). Já Goodbye drama queen é a primeira faixa de pista do disco – um trip hop acelerado, carregado de mistério.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

Sorry I made you cry se apropria do soul setentista de forma única: McAlmont a define como doo-wop eletrônico, onde sintetizadores distorcidos substituem as harmonias vocais tradicionais. O resultado foge do neo-soul óbvio e constrói um híbrido entre psicodelia, samples e a doçura do R&B. Equinox’s children, com vibrafones distorcidos e um piano que costura a melodia, adiciona uma pitada de jazz e funk a essa tapeçaria sonora.

Mas Twilight reserva ainda mais surpresas. A bossa-jazz-lounge de High with you (olha esse título!) traz um trompete-vocal de Hifi Sean que amplifica o clima de sonho. Night drive oscila entre texturas sintéticas e riffs gélidos, encerrando abruptamente, como um toca-discos desligando sem aviso. Star, por sua vez, é pura contemplação eletrônica, com vocais que evocam Moses Sumney. Cada faixa encerra com alguns segundos de silêncio, talvez para a devida absorção dos sons e do impacto das imagens de cada música. Sirens, última faixa, é cantada a cappella, com um aviso de que o dia está começando.

No fim das contas, Twilight é um disco para fechar os olhos e se perder – seja no espaço, na mente ou em lugares que ainda nem imaginamos existir.

Nota: 10
Gravadora: Plastique Recordings
Lançamento: 13 de fevereiro de 2025.

Continue Reading
Advertisement

Trending