Crítica
Ouvimos: Lauren Mayberry, “Vicious creature”

- Vicious creature é o primeiro álbum solo de Lauren Mayberry, vocaista da banda escocesa Chvrches. Ela conta que o disco “nasceu de coisas que eu não conseguia ou não queria escrever na banda”. Um dos temas que giravam na cabeça dela no começo era o fato de ser uma mulher numa banda e num mercado dominados por homens.
- “Para qualquer vocalista de uma banda, mas especialmente uma mulher, assim que você diz as palavras ‘material solo’, as pessoas ficam muito chateadas com você. Eu sinto que cada segunda frase é: ‘eu não vou acabar com a banda, rapazes, no entanto…'”, continuou.
Lauren Mayberry, para todos os efeitos, ainda é a vocalista da banda de synth-indie-pop The Chvrches. Mas Vicious creature, primeiro disco solo dela, de todo jeito, traz um clima pop que vai bem além de sua banda. Soando às vezes como um desdobre antipop do pop dançante dos anos 1990, em outros momentos como um tributo “sujo” a Alanis Morissette e Fiona Apple, ela fala de sexismo na indústria, da raiva pela qual as mulheres precisam passar (na música e nos relacionamentos pessoais), de amores maníacos ou simplesmente cagados, de esquizofrenia, e de outros temas incômodos e instigantes.
A estileira pop de Lauren é radiofônica, mas é pontiaguda e distorcida. Something in the air abre o álbum num clima meio pop, meio gótico. Crocodile tears ri de homens que estão sempre em busca de validação – mas arranjo e melodia honram o pop adulto dos anos 1980 e o yacht rock. Shame é pop dançante cheio de apodrecimentos nas gravações dos vocais e das programações. Punch drunk é indie pop com elementos de psicodelia e som “espacial” no refrão. Sorry etc é drum’n bass distorcido e ágil, com cima punk-pop. O pop bubblegum Sunday best, que ganha peso na sequência, é assumidamente inspirado em Talking Heads.
E vai por aí Vicious creature, num tom bem mais radiofônico do que se poderia imaginar para um álbum solo de Lauren, mas com uma produção que protege a cantora e o disco de soarem comerciais demais. Isso só não rola nos momentos tristinhos do disco, que são Are you awake? e Oh, mother – duas baladas de piano nas quais Lauren não economiza na emoção (a segunda delas, por acaso, é um tributo à sua mãe).
Já no pop eletrônico e experimental de Mantra, nem comece a pensar que Lauren aderiu a alguma meditação ou algo do tipo. A melodia é algo meio dark, meio psicodélico, e a letra é puro ranço e destruição (“com uma voz que nunca conseguiu impor respeito/você não vai conseguir me ouvir passando por todo esse barulho/com meus dedos em volta do seu pescoço/eu vou te procurar apenas para te destruir”). É uma das canções que mais dão a cara do álbum.
Nota: 8
Gravadora: EMI/Universal
Lançamento: 6 de dezembro de 2024.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Crítica
Ouvimos: Home Is Where – “Hunting season”

RESENHA: No segundo disco, Hunting season, o Home Is Where troca o emo por um alt-country estranho e criativo, misturando Dylan, screamo e folk-punk em faixas imprevisíveis.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
O Home Is Where é uma banda emo – mas no segundo disco, Hunting season, eles decidiram que estava na hora de mudar tudo, ou quase tudo. O grupo volta fazendo um alt-country pra lá de esquisito, com referências que vão de Bob Dylan a Flying Burrito Brothers. Sendo que a ideia de Bea McDonald (voz, guitarra) parece inusitada demais para ser explicada em poucas palavras (“um disco que dá para ouvir num churrasco, mas que também dá para chorar”, disse).
Com essa migração sonora pouco usual, o Home Is Where se tornou algo entre Pixies, Sonic Youth, Neil Young e Cameron Winter, com vocal empostado lembrando um som entre Black Francis e Redson (Cólera). Reptile house é pós-punk folk, Migration patterns é blues-noise-rock, Artificial grass tem vibe ligeiramente funkeada e é o tipo de música que uma banda como Arctic Monkeys transformaria num hit – mas é mais esparsa, mais indie, e os vocais chegam perto do screamo.
Hunting season tem poucas coisas que são confusas demais para serem consideradas apenas inovadoras ou experimentais – Bike week, por exemplo, parece uma demo dos Smashing Pumpkins da época de Siamese dream (1993). Funcionando em perfeta união, tem o slacker rock country de Black metal mormon, o folk punk de Stand up special e uma balada country nostálgica com vibe ruidosa, a ótima Mechanical bull. Os melhores vocais do álbum estão na balada desolada Everyone won the lotto, enquanto Roll tide, mesmo assustando pela duração enorme (dez minutos!), vale bastante a ouvida.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Wax Bodega
Lançamento: 23 de maio de 2025.
Crítica
Ouvimos: Satanique Samba Trio – “Cursed brazilian beats Vol. 1” (EP)

RESENHA: Satanique Samba Trio mistura guitarrada, lambada, carimbó e jazz experimental em Cursed brazilian beats Vol. 1
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Como o Brasil insiste em não ouvir o Satanique Samba Trio, vale dizer que a banda brasiliense não é um trio e o som vai bem além do samba – é puramente jazz unido a ritmos brasileiros variados, com ambientação experimental e (só às vezes) sombria. O novo disco é Cursed brazilian beats vol. 1 – que apesar do nome, é o segundo lançamento de uma trilogia (em português: Batidas brasileiras amaldiçoadas).
Dessa vez, a banda caiu para cima de ritmos do Norte, como guitarrada, lambada e carimbó, transformando tudo em música instrumental brasileira ruidosa. O grupo faz lambada de videogame em Lambaphomet, faz som regional punk em Brazilian modulok e Sacrificial lambada, e um carimbó que parece ter sido feito pelos Residents em Azucrins. Já Tainted tropicana, ágil como um tema de telejornal, responde pelo lado “normal” do disco.
A surpresa é a presença, pela primeira vez, de uma música cantada num disco do SST: Aracnotobias tem letra e voz de Negro Leo – talvez por isso, é a faixa do grupo que mais soa próxima dos experimentalismos do selo carioca QTV.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Rebel Up Records
Lançamento: 21 de março de 2025.
Leia também:
-
- Ouvimos: Negro Leo, Rela
- Ouvimos: Residents, Doctor Dark
- Relembrando: The Residents, Meet The Residents (1974)
Crítica
Ouvimos: Mugune – “Lua menor” (EP)

RESENHA: O Mugune faz psicodelia experimental e introspectiva no EP Lua menor, entre Mutantes e King Gizzard.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Trio introspectivo musicalmente vindo da cidade de Torres (RS), o Mugune é uma banda experimental, psicodélica, com design musical esparso e “derretido”. O EP Lua menor abre com a balada psicodélica Capim limão, faixa de silêncios e sons, como se a música viesse lá de longe – teclados vão surgindo quase como um efeito, circulando sobre a música. Duna maior é uma espécie de valsa chill out, com clima fluido sobre o qual aparecem guitarras, baixo e bateria.
A segunda metade do EP surge em clima sessentista, lembrando Mutantes em Lua, e partindo para uma MPB experimental, com algo de dissonante na melodia, em Coração martelo – música em que guitarras e efeitos parecem surgir para confundir o ouvinte, com emanações também de bandas retrô-modernas como King Gizzard & The Lizard Wizard.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 17 de abril de 2025.
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 8: Setealém
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 2: Teletubbies
-
Notícias7 anos ago
Saiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
-
Cinema8 anos ago
Will Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
-
Videos7 anos ago
Um médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
-
Cultura Pop8 anos ago
Barra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
-
Cultura Pop6 anos ago
Aquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
-
Cultura Pop7 anos ago
Fórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?