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Cultura Pop

Por dentro do “Fradim de libertação”

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Por dentro do "Fradim de libertação"

Por dentro do "Fradim de libertação"Em 1984, quatro anos antes de morrer, Henfil – que andava envolvido com questões políticas, dilemas pessoais e problemas de saúde – voltou a desenhar os frades Baixinho e Cumprido. Um ano antes dos metaleiros aterrorizarem no Rock In Rio e de Ozzy Osbourne ser chamado de “cultor (sic) do demônio” por jornais populares, dois dos personagens mais blasfemos das histórias em quadrinhos do Brasil ganhavam o livro “Fradim de libertação” (Record, hoje esgotado e vendido por um preço bastante acessível no Mercado Livre).

Politicamente e pessoalmente, o livro veio numa época complicada para Henfil, que vinha (ao lado de vários artistas e formadores de opinião) de um período de engajamento na campanha por eleições diretas para a presidência da república. O humorista não podia nem ouvir falar no nome de Tancredo Neves, candidato a ser eleito indiretamente à Presidência da República, e rival de Paulo Maluf. Costumava falar da “revoada de artistas e intelectuais para os braços de Tancredo” e brigava com amigos que o contestavam – vários deles diziam que ele estava sendo intransigente. O assunto ocupa algumas páginas da biografia “Henfil – O rebelde do traço”, de Denis de Moraes (em catálogo pela José Olympio)

Questões político-partidárias à parte, boa parte do conteúdo de “Fradim de libertação” (cujo título era brincadeira com a Teologia da Libertação de Leonardo Boff – daí o “Henfil do Bofe”, da capa) era bastante corrosivo. Olha aí. E imagina isso hoje.

PUM DIVINO: Fradinho desafia Deus para um concurso de peidos. Pior pra ele. Deus responde cobrindo as ruas de merda e derrubando o frade baixinho no chão.

Por dentro do "Fradim de libertação"

ABSORVENTE: Diálogo épico entre Cumprido e Fradinho, o primeiro falando que seu papel histórico era “estancar o pus dos sofredores e absorver o sangue dos injustiçados” e o segundo respondendo que “isso não é um papel histórico, isso é um Modess”.

TRATAMENTO ESPECIAL PARA CRIANÇAS E IDOSOS: Nas 176 páginas do livro, Fradinho chuta a bunda de velhinhos, rouba a bengala de aleijados, bate numa criança e provoca o assassinato de uma outra, além de provocar um aborto no frade Cumprido (!). Depois desafia Deus mais uma vez, morre e é acudido por um anjo Gabriel travesti.

TORTURA: Numa paródia cruel dos tempos de “abertura lenta e gradual”, Cumprido diz que “a ditadura não existe” e é torturado e estuprado. Baixinho limita-se a olhar e nada faz.

Por dentro do "Fradim de libertação"

ANTICRISTO: Fradim oferece uma pílula anticoncepcional para José e Maria, pais de Jesus Cristo.

Crítica

Ouvimos: Faust, “Blickwinkel” (curated by Zappi Diermaier)

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Ouvimos: Faust, "Blickwinkel" (curated by Zappi Diermaier)

Se você está procurando uma música indecente para assustar vizinhos e atazanar transeuntes, esqueça qualquer grupo de heavy metal ou de punk, e tente a banda alemã Faust. Artífices do krautrock – o rock experimental alemão, parente tanto do punk quanto do rock progressivo – eles começaram em 1971, e desde o começo, fizeram carreira na experimentação, na dissonância, nas microfonias e nos efeitos de estúdio. Tanto que Werner “Zappi” Diermaier, Hans Joachim Irmler, Arnulf Meifert, Jean-Hervé Péron, Rudolf Sosna e Gunther Wüsthoff (a primeira formação do grupo) fizeram questão de agregar um engenheiro de som exclusivo, Kurt Graupner.

O curioso a respeito do Faust é que as origens da banda são até bem (vá lá) comerciais, já que o grupo tinha um criador, produtor e mentor. Era o jornalista e crítico musical Uwe Nettelbeck, que havia sido procurado pela Polydor alemã com uma proposta tentadora: criar uma banda “underground” que poderia ser a resposta do país aos Beatles e Rolling Stones.

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Uwe, digamos, entendeu mais ou menos bem a proposta: reuniu duas bandas alemãs em uma e montou o Faust, que levou para a gravadora. Convencer a empresa de que aquela banda numerosa e “difícil” seria a sensação do ano deve ter sido até fácil. Difícil foi convencer o público a ouvir um grupo tão maluco e experimental, inspirado por jazz e música concreta. Afinal se tratava de um grupo que no terceiro disco, The Faust tapes (lançado em 1973 pela Virgin, quando a própria Polydor já havia desistido), apresentava só duas longas músicas sem título, divididas em pequenos segmentos com ruídos, microfonias e gravações caseiras.

O Faust existiu até 1975, se reagrupou durante os anos 1980 para poucas apresentações e retornou nos anos 1990 com três integrantes originais. Fizeram até uma primeira tour pelos EUA em 1994. De lá para cá, dá para dizer que a banda nunca mais parou, com direito a uma vinda ao Brasil em 2011. Em 2022, saiu Punkt, disco “perdido” deles gravado em 1974, e que havia sido recusado pela Virgin. Agora é a vez de Blickwinkel, álbum que marca uma fase em que a banda tem curadoria do fundador Zappi Diermaier, com a presença de uma turma animada de músicos (um deles, o também fundador Gunther Wüsthoff).

O grupo que ajudou a fundamentar a estética motorik (batidas intermitentes e quase robóticas), copiada pelo pós-punk todo, volta disposto a criar cenários fantasmagóricos e psicodélicos, em sete longas faixas instrumentais que chegam a parecer surrealistas – uma delas, basicamente uma música de violão, percussão e ruídos, se chama Sunny night (“noite ensolarada”). For schlaghammer, na abertura, parece uma música de perseguição, criada por percussões que lembram passos, sintetizadores e ruídos metálicos.

Künstliche intelligenz lembra um pouco a fase A saucerful of secrets, do Pink Floyd (1968), e tem um ar meio Syd Barrett em alguns momentos. Kriminelle kur é progressivo funkeado e distorcido na onda do King Crimson, e é a faixa do disco que mais se aproxima da noção de “rock instrumental”. No final, o ruído inconformista, perturbador e heavy de Die 5 revolution, e o batidão aterrorizante de Kratie.

É música, literalmente, feita para incomodar.

Nota: 9
Gravadora: Bureau B

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Cultura Pop

No nosso podcast, a época em que o Killing Joke revolucionou o pós-punk

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No nosso podcast, a época em que o Killing Joke revolucionou o pós-punk

Drogas, caos, peso, ocultismo, iluminação espiritual e paixão pela violência e pelo proibido marcaram a carreira do Killing Joke – e marcam até hoje, já que a banda ainda existe. Do começo até meados dos anos 1980, Jaz Coleman, Youth (e depois Paul Raven), Paul Ferguson e o recém-falecido Geordie inseriram mais e mais perigo num estilo musical, o pós-punk, marcado pela insinuação e pela exploração de demônios interiores.

No nosso podcast, o Pop Fantasma Documento, o assunto de hoje é a melhor fase do Killing Joke, uma das bandas mais misteriosas da história do rock, responsável por aproximar estilos como pós-punk, gótico e heavy metal. Terminamos no disco Brighter than a thousand suns (1986), mas a história do grupo ainda inclui muitos outros discos – ouça tudo.

Século 21 no podcast: Girls In Synthesis e Plastique Noir.

Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify e no Deezer .

Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: reprodução internet). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.

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Crítica

Ouvimos: Ramones, “Halfway to sanity” (relançamento)

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Ouvimos: Ramones, “Halfway to sanity” (relançamento)

Que ironia: um disco nota 6 dos Ramones causa crises de saudades e revisionismo histórico e… pelo menos aqui no Pop Fantasma, aumenta de cotação. Halfway to sanity (1987) volta agora às lojas brasileiras (as online e as que resistem), e no formato CD. Foi o último disco gravado com Richie Ramone na bateria, pouco antes do grupo fazer uma tentativa de colocar o ex-Blondie Clem Burke para substituí-lo.

Dizer que “o disco tal dos Ramones foi marcado por brigas durante a gravação” é chover no molhado, ainda mais em se tratando de uma banda que tinha o intransigente Johnny Ramone como guitarrista. Halfway, décimo álbum da banda, lançado originalmente em 15 de setembro de 1987, por sua vez, é um caso à parte: a porrada comeu antes, durante e depois. Para começar, em janeiro daquele ano, o grupo baixou em São Paulo para três shows – o primeiro deles terminou em briga generalizada provocada por skinheads.

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  • Temos episódios do nosso podcast sobre Ramones e Blondie.

No meio das gravações, Joey e Johnny Ramone, inimigos íntimos, não se entendiam. O produtor Daniel Rey tinha problemas de comunicação com boa parte da banda. Dee Dee Ramone (ainda no baixo do grupo), passava boa parte do tempo doidão, não conseguia se comunicar com ninguém e – dizem – teve suas partes de baixo tocadas por Rey. Pessoas que lidavam com os Ramones de perto dizem que a banda já estava de saco cheio de trabalhar feito louca, gravar um disco por ano e não ser reconhecida, com direito a amigos da onça perguntando a eles “quando a banda iria estourar”.

E aí que Halfway soa insano, embora sob controle. Curtíssimo (12 músicas em 30 minutos e uns quebrados), o álbum traz os Ramones fazendo algumas incursões pelo hard rock e pelo hardcore, com direito a vocais berradíssimos de Joey Ramone em faixas como I know better now, a agitada Weasel face (na qual a voz do cantor chega a lembrar a de Alice Cooper) e o skate punk legítimo I’m not Jesus. O grupo chega perto do pós-punk gótico em Garden of serenity, adere ao som tribal na onda do Public Image Ltd em Worm man, e soa revivalista na balada Bye bye baby (com cara de canção de girl group, e escrita, claro, por Joey) e no rock vintage Go lil Camaro go, marcado por uma apagada participação de Debbie Harry.

1987 foi um ano de três bateristas para os Ramones: com Halfway em curso, Richie saiu brigado da banda, e deu lugar para Clem Burke – jornalistas lançaram a piada de que ele adotaria o nome Clemmy Ramone, mas ficou mesmo como Elvis Ramone. Não deu certo e após dois shows confusos, Marky Ramone, que estava afastado da banda desde 1983, retornou. Hoje, vale a redescoberta.

Nota: 7,5
Gravadora: ForMusic (no Brasil)

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