Cultura Pop
O caralho voador de Jeff Bezos (e o do Faith No More)
Resta saber quem vai ser o primeiro porco capitalista desgraçad…, digo, ziliardário brasileiro a ir para o espaço. Afinal, Jeff Bezos e Richard Branson já atingiram o objetivo de dar uma voltinha fora da Terra e retornaram tranquilamente.
E o formato da aeronave que levou Bezos ao espaço lembra exatamente aquilo que vocês estão pensando. E remete a nada menos que… Caralho voador, o não-clássico do Faith No More. Sim, a canção em português que o grupo lançou no disco King for a day… Fool for a lifetime, de 1995.
King for a day era o quinto disco do Faith No More, e foi lançado em plena lua de mel do grupo com as plateias brasileiras. Uma lua de mel marcada por muitos hits, shows emocionados, fãs conquistados (e que são fãs até hoje) e muito confusionismo. Para começar, o FNM vinha de um disco muito bem sucedido, The real thing, lançado em 1989 mas popularizado por aqui entre 1990 e 1991. E que acabou dando aquela estourada em duas canções que só apareciam como bônus no CD e no K7, Edge of the world e War pigs, a cover do Black Sabbath.
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O disco seguinte do FNM, Angel dust (1992) era bastante maluco, tinha cara de suicídio comercial, mas vendeu mais que todos os outros (2,5 milhões de cópias em todo o mundo). E ainda por cima mostrou que aquilo ali tinha virado “a banda do Mike Patton”, com grande concentração de esquisitices em meio a canções.
Só que nada ali foi um grande hit de rádio, e em dezembro de 1992 a banda ainda por cima lançou um single com uma versão de Easy, dos Commodores, que superou o disco todo e arrumou um espaço para o FNM no coração dos consumidores de música pop.
No Brasil, essa música foi parar na trilha da novela Mulheres de areia (1993). Ou seja: muita gente sequer sabia que, pouco tempo antes, o grupo tinha lançado um disco com bombas sonoras como Everything’s ruined e Malpractice. Mas conhecia Mike Patton cantando Lionel Richie.
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Com King for a day, um pouco mais de confusão. O FNM voltava disposto a fazer mais maluquice em estúdio e a decepcionar de vez quem esperava um som eminentemente voltado ao metal alternativo. Tinha soul, hardcore, música asiática, jazz-rock e… uma bossa nova torta com letra metade em português, metade em inglês, em homenagem ao Brasil, cujo título era… Caralho voador.
Olha a banda tocando a música em 1995 no festival PinkPop.
As execuções de Caralho voador ao redor do mundo são sempre muito interessantes. Nesse show de 2009 em Portugal, no Optimus Festival, a banda dedica a canção ao jogador Cristiano Ronaldo.
Vale informar que o FNM permaneceu investindo no setor de covers alucinadas. Lançado em fevereiro de 1995, um mês antes do lançamento de King for a day, o single de Digging the grave foi lançado numa edição limitada que trazia a versão da banda para… I started a joke, balada da primeira fase dos Bee Gees.
História de amor, grande sucesso da Globo (1995), escrita por Manoel Carlos, teve I started a joke na voz de Mike Patton na sua trilha sonora. E era o tema do casal Carlos (José Mayer) e Helena (Regina Duarte). Muita gente viu a novela e ouviu a canção sem desconfiar da existência de nenhum c… voador.
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Com um disco bem doidão para divulgar, o FNM atraía no Brasil fãs no estilo “meu bem, estão tocando a nossa música…”. Isso ficou bem evidente na bizarra passagem do grupo pelo Brasil em setembro de 1995, quando a banda tocou no festival Monsters Of Rock, abrindo para Ozzy Osbourne. Foi vaiada pelos metaleiros tr00 e pouco compreendida pelos fãs menos radicais. O Bruno Eduardo, do site/canal de vídeos Rock On Board, conta sobre o assunto no vídeo abaixo.
Ok, não vamos esquecer do assunto principal: Caralho voador ficou meio perdidinha lá e virou lenda no disco, embora não tenha sido um hit e tenha tocado pouco no rádio. A canção era mesmo uma homenagem ao público brasileiro, mas até ficar pronta, teve outro título de trabalho (The velvet hammer). A letra não fazia muito sentido e a parte em português era (você deve saber) sobre um sujeito que tentava dirigir enquanto enfiava o dedo no nariz.
O que muita gente nem se recorda é que havia outra canção em português no bolo de King for a day, disco que acabou tendo um monte de músicas gravadas e não-aproveitadas. Olha aí Mike Patton tentando cantar Evidence em português.
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Crítica
Ouvimos: Bad Bunny, “Debí tirar más fotos”
Benito Antonio Martinez Ocasio, o popular Bad Bunny, não veio ao mundo pop a passeio. Debí tirar más fotos, seu novo disco, é um passeio pela musicalidade e pela identidade portorriquenhas – e esfrega na cara do mercado fonográfico que ele não tem nenhuma vontade de soar mais “americano” (estadunidense, enfim) para bombar nas paradas.
Já era uma prerrogativa de Bad Bunny desde os primeiros tempos, até porque ele é um dos nomes mais conhecidos do rap de idioma hispânico, mas Debí, mergulhado no reggaeton e em sons caribenhos, é um disco de memórias e sensações. Nuevayol, uma referência à pronúncia hispânica de “Nova York”, traz BB requerendo sua posição de rei do pop, e homenageando a comunidade latina que vive na megalópole. Baile inolvidable, que parece uma trilha sonora, cita as diversões calientes de Porto Rico e traz alunos da Escuela Libre de Música Ernesto Ramos Antonini, de San Juan, tocando salsa. Weltita tem cara de samba-rap e narra uma proposta de date praiano, com as falas do homem (Bunny) e da mulher (Lóren, da banda portorriquenha Chuwi) na história.
Com duração de mais de uma hora, Debí soa irregular em alguns momentos, mas compensa no storytelling (cabendo momentos em que o discurso de Bad Bunny é interrompido para uma mudança rítmica ou a entrada de uma gravação) e na variedade. E em especial no lado mobilizado, definido pelo próprio Bad Bunny como sendo “uma carta a Porto Rico”. A bebaça e doidaralhaça Cafe com ron é pura variação rítmica, cabendo pelo menos três estilos caribenhos, e no fim, um house cubano.
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La mudanza é orgulho portorriquenho purinho (“fala pra ele que essa é a minha casa, onde nasceu minha avó/daqui ninguém me tira, eu não saio daqui”), com letra falada no início e destaque para a percussão (que ganha alguns segundos só dela no final). Lo que le paso a Hawaii é som marolado e cigano, com vocal grave, e letra pregando que não quer que Porto Rico torne-se mais dominada ainda pelos Estados Unidos. A romântica e praguejadora Bokete (que traz encartado na letra um protesto bizarríssimo contra os buracos nas ruas de Porto Rico) abre em clima meio psicodélico, graças a uma gravação de guitarra ao contrário, como num sampling invertido. Não falta diversão em Debi tirar más fotos, e não falta raiz musical.
No lado mais descontraído e menos mobilizado das letras, Debí é um disco que aponta para dois lados, er, complementares. Ou Bad Bunny encarna o fodão que apronta todas nas boates e ganha as gatas, ou ele está chorando pelos cantos – geralmente de arrependimento por alguma merda que fez. El club abre em clima de trap, falando de boates, mulherada, drogas, bebedeira, até que… “mas o que minha ex está fazendo?’. “Os caras acham que estou feliz/mas não, estou morto por dentro/a discoteca está cheia e ao mesmo tempo, vazia/porque meu bebê não está lá”, choraminga.
Se você acha que parou por aí, tem mais. Pitorro de coco, repleta de violões ciganos (e cujo título faz referência a um drinque popular em Porto Rico), é dor de corno etílica das boas. Turista, cheia de cordas e sons acústicos, é… Bom, haja sofrimento: “na minha vida você era turista/você só viu o melhor de mim e não o que eu sofri/você foi embora sem saber o motivo das minhas feridas” – embora o rapper esclareça que a letra fala também dos turistas que vão à Porto Rico e saem de lá sem conhecer os problemas locais. E tem a quase faixa-título, DTMF, um reggaeton que vira algo parecido com funk carioca logo depois, e que traz Bad Bunny chorando pitangas pelo leite derramado (é a do verso-meme “devia ter tirado mais fotos quando tinha você/devia ter te dado mais beijos e abraços quando pude”).
Nota: 8,5
Gravadora: Rimas.|
Lançamento: 5 de janeiro de 2025.
Cultura Pop
No nosso podcast, o recomeço de John Lennon entre 1969 e 1970
No começo de sua carreira solo, John Lennon era um artista brigão, politizado, dado a excessos, que estava de cara virada para seus ex-colegas de Beatles, e que havia encontrado um pouco de paz em seu relacionamento com a artista asiática Yoko Ono. Em meio a isso, alternava protestos, álbuns experimentais (ambos feitos com a nova esposa) e seus primeiros singles, com músicas guerrilheiras como Cold turkey e Instant karma!
Entre 1969 e 1970, parecia que acontecia de tudo na vida dos Beatles. E por tabela, na vida de John, que vivia um dia a dia de brigas, entrevistas malcriadas, gravações novas, ameaça de falência, problemas no novo casamento e um processo de autodescoberta que aconteceu depois que um certo livro apareceu na sua caixa de correio… A gente termina a temporada de 2024 do nosso podcast, o Pop Fantasma Documento, recordando tudo que andava rolando pelo caminho de Lennon nessa época. Termine de ouvir e ataque a super edição turbinada de John Lennon/Plastic Ono Band (1970) que chegou às plataformas em 2020. E, ei, não esqueça de escutar Yoko Ono/Plastic Ono Band, que saiu junto do disco de John.
Século 21 no podcast: Juanita Stein e Caxtrinho.
Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify e no Deezer .
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: reprodução internet). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
(temos dois episódios do Pop Fantasma Documento sobre Beatles aqui e aqui).
Crítica
Ouvimos: The Cure, “Songs of a lost world + Songs of a live world: Live Troxy London MMXIV” (ao vivo)
Sério que Songs of a lost world, álbum novo do The Cure, já ganhou rapidamente uma edição deluxe com um registro ao vivo de todas as faixas do álbum? Sim, ganhou essa edição acrescida do rabicho Songs of a live world: Live Troxy London MMXIV. Até porque se o disco já fez bastante sucesso, a noite de lançamento do álbum foi inesquecível – com um show da banda em 1º de novembro no Troxy London, tocando todo o repertório do começo ao fim, além de vários hits. E é justamente o repertório do disco executado nessa noite, ao vivo, que surge como “disco 2” do álbum.
O Cure, redescoberto por novas gerações e por uma turma que não necessariamente é fã deles, mas curte os hits e gosta de curtir uma fossa, meio que vai tentando dar uma de U2: além de oferecer mais um mimo para os fãs, a banda vai doar todos os royalties deste lançamento para a instituição de caridade War Child. Na loja online do grupo existe um hotsite (ainda se usa esse termo?) só para as diferentes versões de Songs of a live world e para duas edições diferentes em vinil vermelho de Songs of a lost world: uma deles apenas com o disco original, e outra em formato duplo, trazendo as músicas em versões instrumentais no disco 2 (reparem bem: Songs tem músicas em que o vocal começa quase no fim da faixa, e que já são quase instrumentais, mas aí vai quem quer).
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- Resenhamos Songs of a lost world aqui.
O show inteiro daquela noite possivelmente você já viu no YouTube (se não viu, veja lá embaixo deste texto). E possivelmente você ficou impressionado/a como o The Cure voltou disposto a se transformar num espetáculo. Só que sem as presepadas do Coldplay e sem os truques de mágica do U2: é só a banda, num cenário escuro e esfumaçado, com muito peso e imponência visual e auditiva. As músicas do álbum transportadas para o “ao vivo” soam um pouco mais humanizadas, especialmente no caso de canções que, no disco, eram torrentes de ruído, como Warsong e Alone.
And nothing is forever destaca a magia dos teclados que, rearranjados, poderiam estar até num disco do Péricles – esse lado popularzão sem deixar de ser “dark” sempre foi uma das grandes forças do Cure. A ambiência do Troxy deixou músicas como I can never say goodbye (feita por Robert com o pensamento na morte de seu irmão mais velho Richard) e Endsong bem menos robóticas e desprovidas de qualquer traço de frieza. Se o disco novo do Cure é triste, a contrapartida ao vivo é a prova de que o show é feito para fãs que curtem chorar baldes ouvindo música. E tá tudo bem.
Nota: 9
Gravadora: Fiction/Polydor
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