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Cultura Pop

Getúlio Côrtes: “O Roberto Carlos me ajudou bastante”

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Getúlio Côrtes: "O Roberto Carlos me ajudou bastante"

Quem escutar As histórias de Getúlio Côrtes, disco de estreia como solista do autor de músicas como Negro gato e Quase fui lhe procurar, que não espere nada de saudosismo. Revelado na Jovem Guarda, o compositor – que, aos 80 anos, possivelmente é o roqueiro mais idoso de todos os tempos a estrear em disco solo – vem com um som bastante pesado e renovado. “Aquela sonoridade da Jovem Guarda ficou pra trás”, admite Getúlio Côrtes, que solta (muito) a voz, ao lado do produtor e guitarrista André Paixão e de Gustavo Benjão (guitarra), Melvin (baixo) e Marcelo Callado (bateria). Essa turma foi para o estúdio com Getúlio e também se apresentou no show de lançamento, no Teatro Ipanema.

Batemos um papo com Getúlio Côrtes e ele contou algumas histórias da gravação do disco, da sua carreira (o disco é seu primeiro álbum solo mas não é a estreia dele como cantor, aliás) e da sua vida. Também recordou ter sido ajudado pelo menos duas vezes por ninguém menos que Roberto Carlos. O material desse papo saiu primeiro numa matéria do jornal O Dia. Divirta-se.

O disco é seu primeiro solo mas não é sua estreia como cantor, certo? Não. Eu fazia vocal na CBS (hoje Sony Music) no começo da carreira, em 1964. Eu era roadie do Renato & Seus Blue Caps. Na verdade isso de roadie é hoje, né? Eu era carregador de instrumentos, mesmo (rindo). Mas eu tinha certo conhecimento com alguns produtores e de vez em quando rolava um: “Você não quer fazer um coro ali?” Eu fazia sem nenhuma pretensão de virar cantor, nada disso.Mas eu fazia trabalhos com todo mundo que estava lá: Wanderléa, Renato, Roberto Carlos… Estava sempre lá.

Teve também um disco chamado O pulo do negro gato, lançado em 2002 com vários artistas, que tem você cantando Coração embalsamado. Pois é, rapaz. Não foi um disco bem sucedido, a distribuidora não trabalhou direito. Foi feita uma gravação às pressas, não ficou muito profissional. Meio triste, porque muitos artistas participaram desse disco e não adiantou nada. Não ficou como eu queria. E no fundo o que eu queria mesmo era um disco só meu, né? Tive essa oportunidade graças ao Marcelo Fróes (do selo Discobertas) que é um grande produtor, e ao André Paixão, que é meu amigo de muitos anos.

O som do disco está bem pesado, roqueiro mesmo. Eles fizeram com uma roupagem totalmente nova. Era isso o que eu queria. O som da Jovem Guarda infelizmente ficou lá pra trás. Queria pegar músicas antigas e reler de maneira nova, dentro da nova geração, no som deles. Que agora é o meu também! (rindo).

Getúlio Côrtes: "O Roberto Carlos me ajudou bastante"

Getúlio Côrtes e banda

Como foi que você começou a compor? Foi nessa época de roadie ou antes? Antes disso, eu compunha mais no amadorismo. Fui me infiltrando na antiga CBS e, na época, o Renato estava gravando lá. Estavam faltando músicas e falei: “Renato, será que você pode ouvir isso aqui, sem compromisso?”. Era Negro gato.

A música foi gravada por ele antes do Roberto, então? Foi, sim. Ele ouviu, falou: “Pô, legal, é uma faixa diferente, vou gravar”. Alguns músicos da banda não ficaram contentes, não… Teve gente que falou: “Pô, a gente tá gravando Menina linda e você vai querer botar Negro gato?”. Mas ele gostou. Na mesma época o Roberto ouviu Pega ladrão e gravou.

O Negro gato era um gato que ficava miando perto da sua casa, não? Como surgiu essa música? O gato tem uma história… Eu morava em Madureira numa casa e não tinha acesso a disco, não tinha toca-disco, não tinha nada. Não dava para cantar as vitórias, tinha que cantar as derrotas, não é mesmo? (rindo). O meu quarto tinha um teto de zinco e ficava lá um gato preto andando em cima do teto e miando. Cara, já imaginou gato andando em cima de teto de zinco, a barulheira que é? E isso toda madrugada. Duas horas da manhã, ele tava lá enchendo meu saco. Eu tacava pedra, não adiantava nada. Só que um dia ele ficou me olhando no escuro, aqueles dois olhos me olhando no escuro. E me pus no lugar dele: pô, todo mundo diz que o bicho dá azar, machuca o gato. Aí fiz uma música em homenagem a ele.

O gato preto te deu sorte, então. Deu mesmo! O Luiz Melodia, quando foi gravar a música, me falou: “Pô, que legal que você fez uma música contra o racismo, a música tem essa conotação, etc”. Nem era nada disso, a música era pra um gato mesmo.

Você já teve gato, aliás? Ou tem? Bom, minha mãe criava gatos lá em Madureira. Tinha uns três, quatro gatos. Mas não eram gatos negros, não… Esse foi o primeiro gato da minha vida. Tenho uma casa em Madureira e aparecem gatos lá de vez quando. Moro em Botafogo e não dá pra ter gato em apartamento.

Você também foi assistente do Carlos Manga na direção do Jovem Guarda. Como foi essa fase? Tinha aquele contato com o Roberto Carlos, e um dia ele me chamou e falou: “Bicho, além do Jovem Guarda vou estrear um programa da TV Rio, é o mesmo de São Paulo. Quem vai dirigir é o Carlos Manga, mas ele não entende nada de hit parade. Ele só gosta de bossa nova e jazz, essas coisas. Como você saca desse negócio de hit parade americano, vai ser assistente lá”. Fui apresentado ao Manga e ele ficou me testando: “Você já trabalhou em televisão? Como você faria um programa do Roberto?”. Sugeri que tinha que ser um programa dinâmico, com meninas dançando. Isso aí foi o Jovem Guarda em Alta Tensão, na TV Rio. Não durou muito tempo, isso foi lá pra 1967, 1968.

Como foi ficando sua relação com o Roberto depois de Negro gato? Eu continuei compondo, todo ano ele pedia uma música. Uma vez ele falou: “Mudei meu estilo, agora quero que você faça mais canções. Não quero nada de rock, não, roqueiro é o Erasmo!” Fiz O tempo vai apagar com Paulo Cesar Barros e ele gostou.

Mas direito autoral é uma barra. Do que você ficou vivendo esse tempo todo? Naquela época, dava pra viver um pouco. Roberto vendia um milhão de discos. Mas não tinha noção, nem como controlar. Hoje, vendagem de discos nem existe, mas de execução sempre pinga um pouco. Comecei a investir em imóveis em Madureira e deu pra sobreviver. As pessoas não ligam muito pra compositor. O Faustão… O MC Leozinho gravou Negro gato e foi no Domingão do Faustão. Aí o Faustão, com aquele jeito dele, falou: “Orra meu, mas essa música é um clássico da Jovem Guarda, é do Gilberto Souza!”. Pô, confudindo Getúlio Côrtes com Gilberto Souza? (rindo) Os únicos artistas que sempre mencionaram compositor no show, que eu tenha visto, são Zeca Pagodinho e Frank Sinatra. O Frank falava até o arranjador da música!

E o Roberto? O Roberto gravou a última música minha em 1976, Por motivo de força maior… Tem um fato curioso, até. Em 1995 ele estava andando em Nova York e viu um cara parecido comigo. Até falou com o produtor dele: “Aquele cara não parece o Getúlio?”. Depois, ele soube que eu não estava numa situação boa, estava com uns problemas, e regravou Quase fui lhe procurar. Me ajudou bastante. Ele não esquece dos amigos.

Mas vocês têm se falado? Você ainda vem compondo? Eu fiz agora três inéditas. Mas é mais canção, porque é o que fica. O rock, o pessoal esquece logo. Eu fui no show do Roberto e conversei com ele. Ele me disse: “Não tô gravando nada, mas qualquer coisa te ligo”. Ficou assim. Mas alguns artistas gravam coisas antigas minhas, Leonardo gravou música antiga minha.

Falando um pouco sobre o disco, você regravou coisas suas que pouca gente lembra, como Hei você, que foi gravada num disco do Dom Salvador & Abolição (Som, suíngue e raça, de 1971, é o disco acima). Pois é, nem tudo ali é sucesso. Dom Salvador foi uma guinada diferente. O conheci na CBS, ele me disse que estavam faltando três músicas para o disco. E fiz uma música especialmente para ele, em parceria como Nelsinho do Balanço, que era tipo um crooner do grupo. Ali só tinha fera: Robertinho Silva, Rubão Sabino… Gravei com muita gente diferente na CBS: Reginaldo Rossi, Jerry Adriani, Wanderléa.

Uma vez o Raul Seixas, quando foi produtor da CBS, me pediu uma música para uma dupla que ele estava produzindo, Tony & Frankie. Mas falou: “Quero uma letra bem doida”. Fiz Patati patatá. Se você prestar atenção… ali nada tem a ver com nada. Fiz coisas em outras gravadoras também, com Bobby de Carlo, Paulo Sérgio. E muita música por encomenda, que você faz correndo e não fica legal (Getúlio Côrtes)

E que história é essa de você ter sido parado numa blitz e escapado porque te confundiram com Jorge Ben? Em 1968 eu tinha comprado meu primeiro carro, um Karman Ghia, em São Paulo. Estava todo feliz, dirigindo, quando fui parado por um guarda. O cara arrancou minha placa dizendo que estava ilegível. Aí o chefe dele: “Pô, libera ele aí, é o Jorge Ben. Quando você voltar de São Paulo quero um disco seu, hein?”. Tava fazendo um calor horrível…

Você é irmão do Gerson King Combo, e já fizeram coisas juntos, não? Como é o relacionamento de vocês? Sim, faço show com ele, ele sempre me chama. Falei com ele ontem, até. Eu gravei com ele, mas gravei até mais com o Tony Tornado (que gravou músicas de Getúlio Côrtes no primeiro disco). Na época todo mundo queria música. Tinha que fazer correndo!

Cultura Pop

Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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