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Crítica

Ouvimos: Maria Beraldo, “Colinho”

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Ouvimos: Maria Beraldo, “Colinho”
  • Colinho é o segundo álbum de Maria Beraldo, lançado seis anos depois de sua estreia Cavala. A produção foi feita por ela e Tó Brandileone. O álbum tem participações de Ana Frango Elétrico, Zélia Duncan e Negro Léo.
  • Durante o hiato de novos álbuns, Maria (que já tocou com Arrigo Barnabé e Elza Soares) fez a direção musical de peças de Felipe Hirsch e compôs trilhas sonoras para diversos longas-metragens e para o Balé da Cidade, entre outras obras. 
  • Maria conta em entrevista à seção Sexta Sei, do site Baixo Centro, que Can’t stand my father anymore, uma das faixas do disco, parte de um sentimento “que acho que todo mundo que tem um pai já sentiu, de não aguentar mais seu pai. E aí acho que isso se junta com o fato de que as lésbicas, na nossa sociedade, precisam entender o porque de serem lésbicas”, diz. “Mas que fique claro, amo meu pai, me dou muito bem com ele, e por sorte já briguei muito com ele”, completa.
  • “Vivemos em um sistema comandado pela lógica do capital, no qual o consumidor absoluto é o homem cis. É ele quem manda, é pra ele que as coisas são destinadas, é ele quem escolhe, é ele quem come, é ele quem possui. Ser lésbica é a recusa desse sistema, estruturalmente: não, não vou te dar de comer. Não vou viver pra você. Não quero o que você tem pra me dar. Não sou sua”, diz.

Colinho é um disco tão ativista, comportamentalmente falando, quanto a estreia de Maria Beraldo, Cavala, de 2018. A capa discretamente dá uns traços com a de Com você… meu mundo ficaria completo, disco de 1999 de Cássia Eller – ambos são discos em que as cantoras aparecem com visual desafiador, de costas para uma parede amadeirada. Um detalhe que quase passa despercebido em meio ao som e ao tom do álbum. O nome do disco traz uma cláusula de carinho, de conforto, mas a letra da faixa-título é bem direta ao falar sobre sexo, trilhada num corredor funk-trap – e abrindo um disco bem mais experimental que a estreia.

Em Cavala, Maria Beraldo parecia usar uma argamassa de MPB para incluir sua voz e seu conceito. No disco novo, cada faixa tem um formato. Como em Baleia, que traz partículas rítmicas e melódicas de bossa nova, em piano e bateria. Ninfomaníaca traz um lado quase camerístico para o álbum, sem bateria, só cordas, teclados e voz. Guma soa como algo do Clube da Esquina, mas visto por óticas bem diferentes – com letra inspirada livremente num trecho do romance O quarto de Giovanni, de James Baldwin.

O lado mais formal do disco responde pela versão de Minha missão, um samba de João Nogueira e Paulo Cesar Pinheiro que ganha releitura de sete minutos, com voz, cavaco, sax e alguns minutos de percussão no final. Até lá, na segunda metade do álbum, surgem o indie-folk de Matagal (com Zélia Duncan, e com letra em inglês), os batidões e as risadas de Can’t stand my father anymore (“isso é porque sou lésbica?/haha haha haha haha”, em inglês) e o jazz desconstruído de Crying now, com sopros soando como microfonias. Colinho é um daqueles discos em que cada faixa é um universo diferente.

Nota: 8
Gravadora: Risco

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Ouvimos: Artificial Go – “Musical chairs”

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Ouvimos: Artificial Go - "Musical chairs"

RESENHA: O Artificial Go mistura punk, indie, folk e psicodelia em Musical chairs, disco barulhento, divertido e cheio de colagens lo-fi com alma vintage.

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Musical chairs, segundo álbum do Artificial Go, soa como uma colagem barulhenta e divertida de várias obsessões musicais ao mesmo tempo. Esse trio de Cincinatti, Ohio, formado por Angie Willcult (voz, guitarra, xilofone), Cole Gilfilen (guitarra, baixo, bateria, teclados) e Micah Wu (guitarra, baixo, bateria, teclados) une punk, indie rock, country alternativo, psicodelia e referências dos anos 1960 a 1990 com o espírito de quem grava no quarto, mas pensa grande.

A julgar pelo começo do álbum, com Lasso, o tom indie country punk é forte por ali. Só que tem mais elementos, como os ecos de Pixies nas guitarras e no andamento de várias faixas, os vocais falados e teatrais que lembram Debbie Harry. Circles vem na sequência com um pé no folk punk de quarto, com voz feminina doce e um charme caseiro que faz a música soar quase como um experimento lúdico. Tão lúdico quanto a capa do álbum, que é um desenho feito por Angie.

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Referências ao balanço distorcido da Gang Of Four e ao experimentalismo guitarrístico do Television brotam em faixas como Yaya, The world is my runway e Late to the party, e também em Red convertible, que puxa o disco para uma new wave crua, com vocal falado e guitarras ruidosas — entre o espírito lo-fi do The Fall e a urgência suja do Television, mas sem a mesma precisão técnica desta última. Playing puppet tem energia herdada de bandas como Pixies e The Cars.

O Artificial Go tem também um lado vintage forte, que eles botam para rodar na alma mod e punk de Hallelujah e no indie folk retrô de Tight rope walker (unindo climas que lembram The Hollies e Beatles, com uma escaleta desafinada lá pelas tantas). No final, quem sabe como um recado para o que vem no próximo disco, a psicodelia, os ruídos e as atmosferas espaciais e sombrias de Sky burial. No geral, um som que parece familiar, mas que se apresenta com cara própria, feito para ser ouvido alto e com atenção.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Feel It Records
Lançamento: 16 de maio de 2025.

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Ouvimos: BDRMM – “Microtonic”

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Ouvimos: BDRMM - "Microtonic"

RESENHA: BDRMM expande seu som em Microtonic, disco hipnótico que flerta com eletrônica, post-rock e shoegaze, entre luzes e sombras sonoras.

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Vindo de Hull, na Inglaterra, o BDRMM, cujo nome é “bedroom” sem as vogais e com um “M” de sobra, foi chamado assim porque começou como um projeto de quarto do cantor/guitarrista Ryan Smith. Era também um grupo ruidoso, dedicado às paredes sonoras do shoegaze, mas as coisas mudaram: Microtonic, terceiro disco, traz a paleta do grupo devidamente ampliada, já que o BDRMM bandeou-se para a música eletrônica.

O título do disco novo tem história, e teoria. Microtons são os intervalos localizado entre os semitons de um instrumento, ou uma “nota entre as notas”, como muita gente diz. Artistas como o compositor renascentista Nicola Vicentino e o músico suíço-brasileiro Walter Smetak (1913-1984) trabalhavam nessa área cinzenta sonora. Hoje em dia, bandas como King Gizzard and the Lizard Wizard são chegadas nessa história, que mexe diretamente com tudo que pode soar como “desafinado” para o ouvido médio.

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Esse puro suco de experimentação musical é a razão de Microtonic existir, já que do começo ao fim, o álbum do BDRMM mexe com sons que se confundem no ouvido e climas que vão do mais solar ao mais sombrio e noturno. É o disco da hipnose pós-punk, sexy e underground de Clarkykat, dos synths etéreos de Infinite peaking, do ambient urbano e sonhador de Snares, do hi-NRG punk de Goit – esta, com vocais de Sydney Minsky Sargeant, do Working Men’s Club, e uma letra terra-arrasada, com versos como “espasmos / terror / morte / tudo aconteceu”.

No geral, Microtonic flerta com o trip hop sem, de fato, ser um disco do gênero – o estilo aparece mais como uma senha de acesso ao álbum. O mesmo vale para as paredes sonoras do shoegaze, que surgem de forma sutil, como pano de fundo. O BDRMM soa hipnótico na maior parte do tempo, como em faixas como John on the ceiling, In the electric field, Sat in the heat e o drum’n bass ligeiro de Lake dissapointment – uma faixa que começa em tom sombrio e encosta com elegância no rock eletrônico.

Alguns momentos de Microtonic são próximos do post-rock, com aquele mesmo clima de imagem vista de cima, como na faixa-título, e no começo de The noose, música que depois se torna uma peça melancólica e dançante, com discreto acid bass (aquele efeito dançante, distorcido e grave que virou febre nos anos 1990). No geral, entre muitos acertos e pouquíssimos exageros. Microtonic é uma trilha sonora íntima para noites insones e pensamentos em expansão.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Rock Action
Lançamento: 28 de fevereiro de 2025.

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Ouvimos: House Of Protection – “Outrun you all” (EP)

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Ouvimos: House Of Protection - "Outrun you all" (EP)

RESENHA: House Of Protection renova o nu-metal com climas ligados ao hardcore, vibes herdadas de Prodigy e ao começo dos Deftones, e faixas explosivas que colidem passado e urgência.

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Do House Of Protection, dá para dizer que oferecem uma renovação ao cansadíssimo ambiente do nu metal – se não em termos de estrutura, pelo menos na maneira como a banda usa antigas armas do estilo (influências de música eletrônica, de hip hop, vocais dramáticos e em alto volume, etc).

Criado pelos músicos Stephen Harrison e Aric Improta e produzido por Jordan Fish (ex-Bring Me The Horizon), o grupo mostra uma revolta mais próxima do hardcore, dos primeiros anos dos Deftones e – em alguns momentos – da onda eletrorock deflagrada nos anos 1990 pelo Prodigy. É o que rola na apocalíptica Afterlife, na rápida e destruidora Gospeed e na porradaria com ares de hip hop Fire.

Aliás, mesmo nos momentos em que um som parecido com o do Linkin Park é evocado aqui e ali, eles dão um jeito de fazer a coisa do jeito deles, como na derramada e pesada I need more than this. No fim, tudo soa como uma colisão entre passado e urgência.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Red Bull Records
Lançamento: 23 de maio de 2025.

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