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Cultura Pop

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

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Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

A partir do dia 15 de abril de 1993, os fãs de rock alternativo do Rio tinham o que fazer toda quinta-feira 21h: dar uma escutada no Overdrive, programa apresentado pelo radialista José Roberto Mahr na Fluminense FM. Olha aí uma matéria publicada no antigo Zine (caderno “jovem” do Jornal do Brasil) anunciando o programa.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

A atração estreava em terras cariocas, mas não era novidade no dial nacional: já era apresentada em outros estados. E – numa época em que ninguém nem sonhava com a possibilidade de baixar música da internet, nem mesmo havia rede disponível para seres humanos normais – privilegiava material inédito no Brasil, ou gemas fora de catálogo. Grupos como Blur, The Sid Presley Experience (grupo britânico que encerrou atividades nos anos 1980 e deu origem ao The Godfathers), The Jam e The House Of Love viviam aparecendo por lá.

Lembro muito bem de ter escutado isso primeiro no Overdrive: Far gone and out, single de Honey’s dead, disco de 1992 do Jesus & Mary Chain.

Mahr, na época, se desdobrava em dois: fazia o Overdrive e ainda acumulava o Novas Tendências, seu programa carro-chefe. O NT fez inúmeros fãs, foi pioneiro na mistura de rock com música eletrônica, e jogava no ar todo o rock alternativo oitentista desde seu surgimento, em 1986. Por aqueles tempos, era transmitido via satélite pela rede Cidade, simultaneamente para 22 municípios todos os domingos às 22h.

Naquela época, tanto o Zine quanto o Rio Fanzine (do Globo) faziam muitas promoções de discos e livros. Para participar de uma delas, você precisava ser rápido, já que era tudo na base da carta. Os dois suplementos saíam aos domingos, você via qual era a promo da vez, escrevia a cartinha (ou várias cartas, para aumentar as chances) e postava no correio de manhã bem cedo, para ser um dos dez primeiros. E no Zine do dia 15 de agosto de 1993, a promoção era essa aí.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

O Overdrive tinha produzido junto com a Zine e a PolyGram (hoje Universal) uma fitinha restrita a 300 cópias, Drive 93, que era um presente para os fãs da atração. A materinha publicada no Zine privilegiava os nomes mais conhecidos na hora de falar da fita, mas também tinha House of Love, o som alternativo do Eat (banda britânica lançada pelo selo Fiction, que revelou o The Cure), o tom agridoce da banda neozelandesa The Chills, etc. A fita trazia bandas clássicas e mais conhecidas no lado A (lado Over) e novidades no lado B (lado Drive)

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Olha aí as músicas dessas bandas que foram escolhidas para a fitinha. Você esbarrava com várias dessas bandas no Lado B, da MTV.

https://www.youtube.com/watch?v=y7FXEdwbqk0

Teve também o Starclub, banda efêmera (só durou um disco), que teve como baterista Alan White – o mesmo que tocaria no Oasis entre 1995 e 2004.

Teve também o metal do Danzig, com Left hand black.

Born of frustration, do James, virou hitzinho no rádio e teve muita gente achando que aquela banda, de Manchester, era nova. Foi formada no mesmo ano que os Smiths (1982) e já era considerada “a próxima banda de Manchester a estourar no Brasil” desde 1985 (nunca estouraram aqui).

Três coisas que muita gente só achou lá: 1) a releitura do U2 para Paint it black, dos Rolling Stones (que saiu no lado-B do single de Who’s gonna ride your wild horses); 2) o remix de A small victory, do Faith No More, feito por Youth, do Killing Joke; 3); 3) o remix de Regret, hit do New Order, feito pelo duo de house music Fire Island.

Drive 93 marcou época para muita gente, e é uma daquelas mixtapes que não saem da cabeça de muitos fãs de música daquele período. O Mercado Livre já chegou a listar algumas à venda, por preços até um pouco acessíveis – numa época em que não havia culto às fitas K7. Olha a capinha aí.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Bati um papo com José Roberto Mahr – hoje uma das cabeças da webradio Stereozero – e ele relembrou a época da fitinha e do Overdrive. Em meio à conversa, você confere as imagens de capa, contracapa e os encartes da Drive 93, incluindo a relação das músicas.

Quais são suas lembranças do Overdrive?
José Roberto Mahr: O Overdrive foi um programa dedicado ao rock e suas vertentes. Tenho muitas lembranças boas, as reações dos ouvintes e as bandas que tocávamos… Era pura energia!

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Como surgiu a oportunidade de fazer o programa e como, na sua cabeça, ele se diferenciava do Novas Tendências?
Em novembro de 1991, o programa Novas Tendências, passou a ser transmitido via satélite para 22 cidades e cresceu muito. Percebi que deveria abrir uma “outra janela”, então criei um programa dedicado às trilhas do rock, mais alternativo que o NT. Entrou no ar 10/10/1992, em emissoras que tinham o perfil mais adequado para o Overdrive e ficou no ar até 1996.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Na época do Overdrive, você também mantinha o Novas Tendências simultaneamente, não? Como era fazer os dois programas ao mesmo tempo?
Sou apaixonado pelo rádio, por discotecagem e produção de conteúdo de áudio. E como tenho um grande acervo, foi muito tranquilo fazer os dois programas. Sempre quero compartilhar com outras pessoas e ajudar a descobrir novos sons.

O Overdrive passava em outros estados. Onde você gravava?
Gravava aqui no Rio nos estúdios da Rádio Cidade e fazia algumas edições ao vivo no Rio e SP.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Ao fazer o programa, sentia que havia diferenças entre o gosto do público carioca e do paulistano? Procurava atender aos dois públicos?
Apesar de morar no Rio, sempre mantive uma relação muito bacana com São Paulo. Tenho amigos que conheci naquela época e mantenho até hoje. Procuro conversar e trocar informações com os ouvintes, frequentar os locais que tocam música boa e fazer uma pesquisa constante. Então consegui um equilíbrio entre as duas cidades, RJ e SP.

Como surgiu a ideia da fitinha Drive 93?
As promoções são uma extensão dos programas e sempre quero oferecer algo diferente e de qualidade para os ouvintes. E assim nasceu a ideia.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Como foi compilado aquele repertório e como surgiu a ideia de dividir lado A pra coisas mais antigas e lado B pra novidades?
Fiz uma pesquisa no catálogo da gravadora para montar um repertório que refletisse a sonoridade do Overdrive. A seleção e divisão lado A e B, foi montada para que os ouvintes ouvissem os clássicos e as bandas mais novas, numa mesma sequência, assim poderia ter mais destaque e o repertório ficar mais organizado.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Em 1993 já havia CD à disposição no mercado. Por que optou pela fitinha?
Muito mais original, queria fazer um brinde bem especial.

Quantas fitas foram confeccionadas e como foram distribuídas?
Foi uma tiragem pequena de 300 cassetes.

Eu ganhei a minha numa promoção do Jornal do Brasil, fui à redação pegar. Mas ela chegou a outras mãos por outros modos?
Na época fizemos uma promoção com o JB e em várias promoções do Overdrive. A distribuição foi gratuita.

Recordando (e ouvindo!) a fitinha Drive 93, de José Roberto Mahr

Das bandas que existem no lado B, qual você se orgulha mais de ter colocado lá?
The Chills e The House of Love.

E qual você lamenta mais que as pessoas tenham ouvido pouco? (eu particularmente fiquei muito fã de The Chills e Starclub, que já conhecia do programa – comprei até os CDs com aquelas músicas).
The Chills.

Alguma raridade do lado A te deixou particularmente mais feliz por ter entrado na fita?
O lado “A” tem valor diferente, pois não tem os singles mais óbvios das bandas e foi muito demorado liberação. O cover de Paint it black, The Velvet Underground, são alguns exemplos de autorizações que foram bem difíceis na época.

Como foi feita aquela foto da capa e quem é aquela criança?
O garoto da capa é o Pedro, filho de um amigo chamado Edson, que na época trabalhava na promoção da Rádio Cidade. Queria uma capa diferente e alternativa. Tive a ideia em casa. Levei uma camisa do The Cure e como eu não queria que ele olhasse para a câmera eu tirei os meus sapatos e coloquei na frente dele, que estava descalço. Aproveitamos a deixa e a foto foi feita.

E como você tá vendo o revival das fitas?
Eu acho ótimo este revival, é um formato muito bacana. Normalmente tem faixas extras diferentes das versões dos CDs e vinis. Sempre ouço as fitinhas cassetes… São eternas!

“Nunca ouvi essa fita na vida. Acho que vou lá pegar todas as músicas nas plataformas de streaming”, você deve estar dizendo. Bom, o POP FANTASMA não tem fitinha pra dar de brinde, mas eu digitalizei minha cópia da Drive 93 e joguei no MixCloud, na íntegra. Esse som que você ouve aí é o de um K7 digitalizado, não substituí nenhuma música. De nada!

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Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

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Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.

Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.

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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).

Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).

Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.

Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”

Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.

Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.

“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.

E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).

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Cultura Pop

Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

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Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.

O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.

Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.

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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.

O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.

Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.

Foro: Keira Vallejo/Wikipedia

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Crítica

Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

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Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.

Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.

Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.

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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.

É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).

Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga  estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.

O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.

Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.

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