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Cultura Pop

Várias coisas que você já sabia sobre Sticky Fingers, dos Rolling Stones

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Várias coisas que você já sabia sobre Sticky Fingers, dos Rolling Stones

Lançado em 23 de abril de 1971, Sticky fingers, nono disco de estúdio dos Rolling Stones, virou cinquentão sem perder a juventude e o charme. E sem perder o lado provocativo. Estressados com a mudança de gravadora, com brigas entre a banda e empresários, e com a mudança para o Sul da França (embora negassem que iriam para um “paraíso fiscal”), os Stones vinham de um período mais movimentado e estressante ainda. Em 1969, a banda tinha se apresentado no festival de Altamont, que terminou com briga generalizada, roubos, depredação e quatro mortes (uma delas, por esfaqueamento).

Os fantasmas da violência e da despedida em tons sombrios dos anos 1960 ainda rondavam as cabeças de Mick Jagger (voz), Keith Richards (guitarra), Mick Taylor (guitarra solo), Bill Wyman (baixo) e Charlie Watts (bateria) quando começaram a fazer o novo disco. Assim que Sticky fingers saiu, os fãs tiveram acesso a um universo que falava de aventuras sexuais (Brown sugar, Bitch), o ranço do dia a dia (Sway), drogas (Sister morphine), charme da decadência (Dead flowers). O disco ainda consolidava a presença de Mick Taylor, ex-John Mayall’s Bluesbreakers, na banda desde 1969.

Sticky fingers já teve diversos relançamentos, incluindo um em 2015 com faixas bônus. Hoje  chega aos 50 anos como um dos melhores e mais inspiradores discos da historia do rock. E tá aí nosso relatório sobre ele. Ouça lendo, leia ouvindo.

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ME EMPRESTA CINCO PAUS? Havia uma preocupação rondando as cabeças de Mick Jagger e Keith Richards na época de Sticky fingers: dinheiro. A banda, que saía da gravadora Decca/London, se julgava roubada pelo empresário Allen Klein, figurinha controversa, e dono da produtora Abkco. Keith Richards conta que o grupo descobriu que ele era o único proprietário de uma empresa nos EUA, feita só para lucrar com os Stones.

GRANA E MAIS GRANA. O banqueiro (e príncipe) Rupert Loewenstein, consultor financeiro dos Stones desde 1968, vivia falando o quanto eles estavam sendo roubados por Klein. E convenceu o grupo das vantagens fiscais de se mudarem para o Sul da França. Também persuadiu a banda a passar a ensaiar no Canadá, para diminuir os gastos, e conseguiu grandes patrocinadores para as turnês. Em contrapartida, os RS iniciavam enorme temporada de processos contra Klein, que se arrastaria por quase duas décadas.

ALIÁS E A PROPÓSITO, os Stones foram para a França para fugir do fisco da Inglaterra. Mas graças a uma reforma fiscal, hoje em dia o que mais tem é celebridade fugindo da França para pagar menos impostos.

MEUS QUERIDOS ROYALTIES. Nos anos 1960, havia ainda uma discussão sobre se contratos valiam para LPs ou músicas gravadas. Aliás, também sobre se tudo o que um artista houvesse gravado enquanto estava sob contrato era realmente de propriedade da gravadora, mesmo que fossem demos inacabadas. Klein seria o proprietário de tudo que o grupo gravasse para Sticky fingers, caso a banda não tivesse brigado, já que ele reclamava tudo que a banda gravasse até o fim de 1971. No fim, foram agregados ao antigo contrato da banda com a Abkco os singles de Wild horses e Brown sugar – que saíram até em coletâneas da banda, como a caixa The London years.

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E COMEÇOU A GRAVAÇÃO! Sticky fingers havia sido iniciado ainda em 1969, com gravações da banda no estúdio Muscle Shoals, no Alabama. You gotta move, Brown sugar e Wild horses vieram de lá. Sister morphine havia sido uma sobra de Let it bleed (1969) e deixada para outro lançamento. Mas a coisa pegou mesmo fogo quando a banda instalou uma unidade móvel numa van em Stargroves, casa de campo de Mick Jagger em Newbury, cidade no condado de Berkshire, na Inglaterra em março de 1970.

CASARÃO. Com a entrada de grana na vida dos Stones, os músicos começaram a comprar casas, embora passassem a maior parte do tempo na estrada. Stargroves havia custado a Jagger a bagatela de 37 mil libras em dezembro de 1967, e o cantor ainda despejou uma carreta de grana na reforma do imóvel, que estava em ruínas. Mick gostava de ir para lá junto com Marianne Faithfull porque podia fazer o que quisesse sem ser incomodado, desde ir a lojas locais tomar sorvete com Nicholas, filho de quatro anos da namorada, até usar drogas sem riscos (já que o local estava fora do radar do esquadrão de drogas).

POBREMAS. Durante as gravações, uma coisa precisava ser resolvida pela banda, em especial pela dupla de compositores: como mostrar que os Stones estavam atualizados com o que acontecia no mundo do rock? Jagger parecia atualizado com a nascente onda do hard rock, Keith parecia imerso em seu próprio mundo e estava cada vez mais drogado (com direito ao que chamava de “tempo para se drogar”, que atrasava gravações e o levava a faltar a sessões importantes). Bill Wyman chegou a afirmar que Mick queria sucessos, mas Keith “não estava nem aí”.

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ESTÚDIO MÓVEL. O nome “Rolling Stones mobile studios” virou sinônimo de tecnologia. A primeira versão funcional do estúdio, com oito canais, foi usada por bandas como The Who, Led Zeppelin e Deep Purple. Volta e meia era cedido também para o Festival de Montreux. Aliás, num incêndio durante um show de Frank Zappa no evento, o estúdio quase pegou fogo enquanto o Deep Purple gravava o disco Machine head. O sucesso Smoke on the water é sobre isso, se você não sabia.

POR SINAL, o tal incêndio não foi só um foguinho. Um maluco disparara um sinalizador para o teto do Cassino Montreux e começou tudo. Frank Zappa avisara à plateia durante seu show sobre o incêndio, pedindo calma. Houve uma evacuação 100% controlada – apesar de um grupo ter ficado preso no porão do local e sido resgatado pelo próprio dono da casa, Claude Nobs. O prédio ficou em chamas e precisou ser reconstruído. O Deep Purple gravava bem perto e viu tudo.

ALIÁS E A PROPÓSITO, mesmo com a produção de Jimmy Miller, músicos convidados como o saxofonista Bobby Keys e o pianista Jim Price gravavam quase tudo sozinhos.

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O GRUPO foi retrabalhando algumas canções, ainda que aos pedaços. Mick Taylor foi indelicadamente retirado de Moonlight mile (cujo nome “de trabalho” era Japanese thing), com Richards lhe dizendo que ele “tocava alto demais”. Já Can’t you hear me knocking, por causa da parte final em clima de jazz latino, reuniu todo mundo no estúdio. O álbum ainda teve gravações feitas em dois estúdios londrinos, Trident e Olympic.

FANTASMA DO PASSADO. Querendo sair da Decca, os Stones mexeram nas fitas de shows que tinham dado em Nova York e Baltimore em novembro de 1969. A ideia era fechar o contrato com a gravadora da maneira mais tranquila possível (disco ao vivo, enfim) e responder à crescente onda dos discos piratas. Get yer ya-ya’s out saiu em 4 de setembro de 1970, com Sticky fingers em andamento.

SÓ QUE ainda assim a banda descobriu que devia um single para a Decca. Mick compôs e gravou (no Stargroves, durante os dias de Sticky fingers) Schoolboy blues, conhecida como Cocksucker blues. A letra falava de sexo oral, anal e prostituição masculina e assustaria qualquer dono de gravadora. A Decca não fez por menos: engavetou a canção e, como retaliação à malandragem dos Stones, soltou a coletânea Stone age, que se tornaria popular o suficiente para amedrontar a banda, já que estavam lançando disco novo.

SELINHO. Sem a Decca e com Allen Klein afastado do universo dos Stones (ainda que volta e meia aparecesse para reclamar direitos sobre músicas supostamente compostas sob sua gestão e lançadas depois), os Stones realizaram um sonho e puseram na rua sua própria gravadora. A Rolling Stones Records era “do grupo”, mas era chefiada por Marshall Chess, filho do fundador da Chess Records, Leonard Chess.

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HÁ QUEM COMENTE que a gravadora era só uma fachada para disfarçar o fato de que a banda estava sem gravadora e entrara em leilão. Mas por fim, quem levaria a melhor seria o Kinney Group, definido pelo biógrafo dos Stones, Christopher Sandford, como “uma empresa fraudulenta, que supostamente envolvia a máfia, com uma divisão de estacionamentos e uma divisão mortuária”. Acontece que a Kinney era dona da Atlantic Records na época, e a banda ganhou um contrato de distribuição mundial de 5,7 milhões de dólares.

ALIÁS E A PROPÓSITO, os Stones, em dada altura, foram cortejados pela RCA, gravadora de Elvis Presley, e futura casa de David Bowie, Lou Reed e Iggy Pop. Quase aceitaram.

SÓ PARA ELES. A ideia original da Rolling Stones Records não era lançar novos artistas, apesar de “lançamentos de novos talentos” constar do release inicial do selo. A gravadora servia para dar aos Stones mais controle sobre seus discos, além de espaço para gravações solo de seus integrantes. O baixista Bill Wyman lançou dois (bons) solo nos anos 1970, mas que passaram despercebidos porque a gravadora já estava ocupada demais com os lançamentos da banda. Mas o primeiro lançamento da Rolling Stones Records foi o seminal Brian Jones presents the Pipes of Pan at Joujouka, gravado no Marrocos pelo falecido Brian Jones em 1969, e guardado até 1971.

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SÓ QUE a gravadora chegou a lançar outros nomes ocasionalmente. Lançaram o Cracker, um grupo cubano-americano que soltou discos lá a partir de 1973. E ninguém menos que Peter Tosh, reggaeman que conseguiu sucesso com o disco Bush doctor, em 1981, mas acabou deixando o selo após desentendimentos com Keith Richards (em cuja casa se hospedou, e da qual não queria mais sair). O vocalista do The Mamas & The Papas, John Phillips, fez contrato solo com a gravadora, deixou lá umas canções prontas – nas quais era acompanhado por quase todos os stones – mas o material só saiu em 2001 sob o título Pay, pack and follow.

OS STONES, diga-se, estavam seguindo uma tendência famosa entre bandas que vendiam bem, tinham público certo e desejavam mais liberdade criativa. O Deep Purple soltou a Purple Records, o Jefferson Airplane, a Grunt, e o Led Zeppelin, só em 1976, pôs para rodar a Swan Song Records. A Apple, dos Beatles, era modelo para essa turma toda, tanto do que fazer quanto do que não fazer (ou seja: contratar um monte de gente ao mesmo tempo, investir em negócios sem sentido e deixar correr uma sangria de dinheiro). Mas vale citar que até Paul McCartney e George Harrison, já em carreira solo, lançaram seus selos (MPL e Dark Horse, respectivamente).

ALIÁS E A PROPÓSITO, Jagger decidiu que os discos dos Stones em seu selo teriam número de série iniciado com as letras COC (uma piada com “cock”, termo chulo para o órgão sexual masculino). A partir de 1978, substituiria as três letras por CUN (redução de “cunt”, o mesmo para o órgão sexual feminino). Sticky fingers era o COC-59 100.

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A HISTÓRIA DE QUE os Stones estavam tentando desfrutar da vida em exílios fiscais já começava a chegar aos ouvidos de alguns críticos. Em 4 de março de 1971, a banda começava a rodar com uma turnê britânica e o Daily Telegraph queixou-se de que a “vantagem tributária pessoal” era a única prioridade para o grupo. Em 6 de abril de 1971, pouco antes de Sticky fingers sair, os Stones fizeram um cruzeiro num navio com seu logotipo, seguindo até Cannes para assinar contrato com a Kinney-Atlantic.

DROGAS E ROCK’N ROLL. Sticky fingers talvez seja o disco de rock que mais dispara referências a drogas. As letras falam em “olhos de cocaína” (em Can’t you hear me knocking), “dança de viciado em anfetamina” (na mesma música), “cabeça cheia de neve” (em Moonlight mile, outra referência à coca) e ainda havia Sister morphine, relato do dia a dia de um viciado em heroína, com letra de Marianne Faithfull, surrupiada por Jagger e Richards. A cantora e ex-mulher de Jagger passou anos amargando a puxada de tapete, mas em 1994 entrou na justiça. Keith Richards admitiu a chupada em sua autobiografia Vida.

DORGAS, MANO. Keith Richards refletiu sobre o excesso de drogas em sua vida nessa época, no livro Vida, e questionou como foi possível fazer tanta música sob o signo de uma das drogas mais pesadas do mundo. Keith diz que não recomenda heroína a ninguém, mas garante que a droga tem pontos positivos. “Em muitos casos ela é um grande nivelador. Depois que você começa a tomá-la, é capaz de enfrentar tudo que surgir na sua frente”, conta ele, que estava extremamente estressado com a mudança para o Sul da França.

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DE VOLTA AO COMEÇO. Apesar de haver arranjos de cordas e metais aqui e ali, Sticky fingers foi recebido pela maioria dos críticos musicais como uma volta ao básico – ainda que os Stones não tivessem condições de soar tão “básicos” quanto soavam quase dez anos antes. A Rolling Stone via em Brown sugar uma das introduções clássicas de guitarra da banda, por exemplo. Mas Jon Landau, que resenhou o disco para a revista, ressaltava que a banda parecia desinteressada em alguns momentos do disco. Lester Bangs, no entanto, classificou-o como “o disco do ano” na pesquisa entre críticos do Village Voice.

VENDEU, AFINAL? Bastante. Em maio de 1971, Sticky fingers foi direto para o primeiro lugar da parada britânica, e passou 69 semanas na Billboard 200. Até hoje, foram mais de nove milhões e trezentas cópias vendidas.

E A CAPA? Passou para a história que o ator Joe Dallessandro, da trupe de Andy Warhol, tinha sido o modelo da capa de Sticky fingers, mas há controvérsias. Warhol fez o design e Billy Name fez a foto, e foram vários os clicados. Há quem diga que Jed Johnson, amante do designer na época, era o garoto da capa. Dallessandro costuma afirmar que ele tinha sido fotografado. O zíper, também ideia do designer, teve que ser cuidadosamente posicionado no lugar do selo do LP, já que alguns lojistas reclamaram que ele arranhava o vinil após os empilhamentos para a distribuição. O trabalho gráfico clássico do disco rendeu a Andy Warhol o equivalente hoje a uns US$ 200 mil, uma soma bem grande de dinheiro para 1971.

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ALIÁS E A PROPÓSITO, mesmo levando o nome de Warhol, a capa acabou sendo feita quase que totalmente por um dos maiores colaboradores do artista, Craig Braun.

BLÉ. Craig também fez os últimos ajustes no logotipo da nova gravadora dos Stones, dando a ele o tom de vermelho que tornou a ideia famosa. Jagger sugerira a John Pasche, um estudante de artes recrutado na Royal College of Art (e que desenhara um pôster para uma turnê da banda) que copiasse a língua da deusa hindu Kali. Pasche fez os primeiros desenhos, mandou para Craig e este ajustou os tons de vermelho com duas listras brancas. No fim das contas, o estudante ganhou só 50 libras (e mais 200 em 1972).

REGATA? Antes de decidir por Warhol, o grupo chegou a chamar Pete Webb, designer inglês conhecido na época, para fazer a capa. Webb teria assustado a banda com uma terrível viagem na maionese. Ele quis fotografar o grupo usando chapéus de palha e blazers listrados, e teve a ideia de clicar a banda numa “montagem surreal da regata de Henley”. O grupo achou melhor que ele fizesse só as fotos internas.

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CENSURA NA ESPANHA. O país vivia a ditadura do general Francisco Franco desde 1936 (permaneceria sob as botas dos milicos até 1975). Não houve jeito: Sticky fingers chegou às lojas por lá pela EMI-Odeon local, mas a gravadora teve que mudar a capa, considerada obscena. O solícito John Pasche foi chamado para conceber o novo visual. Mas teve a ajuda de Phil Jude, o cara que faria em 1973 a foto da sopa de cabeça de bode do disco Goat’s head soup. A censura e a realização dessa capa de Sticky fingers atrasaram em alguns meses o lançamento por lá (na Inglaterra foi em abril, na Espanha só em junho). Mas o engraçado é que o novo design era mais lascivo e tinha realmente “dedos grudentos” (leia mais aqui).

MAIS CENSURA NA ESPANHA. Sister morphine saiu do repertório do disco por lá. Entrou no lugar uma versão ao vivo de Let it rock, de Chuck Berry, gravada ao vivo em Leeds, em 1971.

ALIÁS E A PROPÓSITO, Sticky fingers saiu no Brasil em 1971 pela Philips numa edição bacaninha que tinha até o zíper na capa. Mas Sister morphine também foi tirada das primeiras edições. Só que não foi substituída por nada e o disco chegou aqui com nove músicas. Pouco depois, foi reeditado com a música.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Tiraram o som do clipe de Dancing in the street, de Mick Jagger e David Bowie, e você nunca mais vai ver o vídeo original sem rir

E DEPOIS? As gravações do disco subsequente dos Stones, Exile on Main St (1972), começaram logo na época de Sticky fingers. E estenderam-se enquanto a banda se instalava na França. Os Stones haviam virado uma usina de força cheia de tensão, que sugava quem deles se aproximasse. Mas que rendia grandes músicas e discos tão caóticos quanto clássicos. Como acontecia com Sticky fingers, Exile era mais um disco para tocar em último volume. Mas isso é outra história.

 

4 discos

4 discos: Ace Frehley

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Dizem por aí que muita gente só vai recordar de Gene Simmons e Paul Stanley, os chefões do Kiss, quando o assunto for negócios e empreendedorismo no rock – ao contrário das recordações musicais trazidas pelo nome de Ace Frehley, primeiro guitarrista do grupo, morto no dia 16 de outubro, aos 74 anos.

Maldade com os criadores de uma das maiores bandas de rock de todos os tempos, claro – mas quando Frehley deixou o grupo em 1982, muita coisa morreu no quarteto mascarado. Paul Daniel Frehley, nome verdadeiro do cara, podia não ser o melhor guitarrista do mundo – mas conseguia ser um dos campeões no mesmo jogo de nomes como Bill Nelson (Be Bop De Luxe), Brian May (Queen) e Mick Ronson (David Bowie). Ou seja: guitarra agressiva e melódica, solos mágicos e sonoridade quase voadora, tão própria do rock pesado quanto da era do glam rock.

Ace não foi apenas o melhor guitarrista da história do Kiss: levando em conta que o grupo de Gene e Paul sempre foi uma empresa muito bem sucedida, o “spaceman” (figura pela qual se tornou conhecido no grupo) sempre foi um funcionário bastante útil, que lutou para se sentir prestigiado em seu trabalho, e que abandonou a banda quando viu suas funções sendo cada vez mais congeladas lá dentro. Deixou pra trás um contrato milionário e levou adiante uma carreira ligada ao hard rock e a uma “onda metaleira” voltada para o começo do heavy metal, com peso obedecendo à melodia, e não o contrário.

Como fazia tempo que não rolava um 4 Discos aqui no Pop Fantasma, agora vai rolar: se for começar por quatro álbuns de Ace, comece por esses quatro.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Reprodução

“KISS: ACE FREHLEY” (Casablanca, 1978). Brigas dentro do Kiss fizeram com que Gene, Paul, Ace e o baterista Peter Criss lançassem discos solo padronizados em 1978 – adaptando uma ideia que o trio folk Peter, Paul and Mary havia tido em 1971, quando saíram álbuns solo dos três cujas capas e logotipos faziam referência ao grupo. Ace lembra de ter ouvido uma oferta disfarçada de provocação numa reunião do Kiss, quando ficou definido que cada integrante lançaria um disco solo: “Eles disseram: ‘Ah, Ace, a propósito, se precisar de ajuda com o seu disco, não hesite em nos ligar ‘. No fundo, eu dizia: ‘Não preciso da ajuda deles’”, contou.

Além de dizer um “que se foda” para os patrões, Ace conseguiu fazer o melhor disco da série – um total encontro entre hard rock e glam rock, destacando a mágica de sua guitarra em ótimas faixas autorais como Ozone e What’s on your mind? (essa, uma espécie de versão punk do som do próprio Kiss) além do instrumental Fractured mirror. Foi também o único disco dos quatro a estourar um hit: a regravação de New York Groove, composta por Russ Ballard e gravada originalmente em 1971 pela banda glam britânica Hello. Acompanhando Frehley, entre outros, o futuro batera da banda do programa de David Letterman, Anton Fig, que se tornaria seu parceiro também em…

“FREHLEY’S COMET” (Atlantic/Megaforce, 1987). Seguindo a onda de bandas-com-dono-guitarrista (como Richie Blackmore’s Rainbow e Yngwie Malmsteen’s Rising Force), lá vinha Frehley com seu próprio projeto, co-produzido por ele, pelo lendário técnico de som Eddie Kramer (Jimi Hendrix, Beatles, Led Zeppelin) e Jon Zazula (saudoso fundador da Megaforce). Frehley vinha acompanhado por Fig (bateria), John Regan (baixo, backing vocal) e Tod Howarth (guitarras, backing vocal e voz solo em três faixas).

O resultado se localizou entre o metal, o hard rock e o rock das antigas: Frehley escreveu músicas com o experiente Chip Taylor (Rock soldiers), com o ex-colega de Kiss Eric Carr (Breakout) e com John Regan (o instrumental Fractured too). Howarth contribuiu com Something moved (uma das faixas cantadas pelo guitarrista). Russ Ballard, autor de New York groove, reaparece com Into the night, gravada originalmente pelo autor em 1984 em um disco solo. Típico disco pesado dos anos 1980 feito para escutar no volume máximo.

“TROUBLE WALKING” (Atlantic/Megaforce, 1989). Na prática, Trouble walking foi o segundo disco solo de Ace, já que os dois anteriores saíram com a nomenclatura Frehley’s Comet. A formação era quase a mesma do primeiro álbum da banda de Frehley – a diferença era a presença de Richie Scarlet na guitarra. O som era bem mais repleto de recordações sonoras ligadas ao Kiss do que os álbuns do Comet, em músicas como Shot full of rock, 2 young 2 die e a faixa-título – além da versão de Do ya, do The Move. Peter Criss, baterista da primeira formação do Kiss, participava fazendo backing vocals. Três integrantes do então iniciante Skid Row (Sebastian Bach, Dave Sabo, Rachel Bolan), também.

“10.000 VOLTS” (MNRK, 2024). Acabou sendo o último álbum da vida de Frehley: 10.000 volts trouxe o ex-guitarrista do Kiss atuando até como “diretor criativo” e designer da capa. Ace compôs e produziu tudo ao lado de Steve Brown (Trixter), tocou guitarra em todas as faixas – ao lado de músicos como David Julian e o próprio Brown – e convocou o velho brother Anton Fig para tocar bateria em três faixas. A tradicional faixa instrumental do final era a bela Stratosphere, e o spaceman posou ao lado de extraterrestres no clipe da ótima Walkin’ on the moon. Discão.

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Cultura Pop

Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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