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Cultura Pop

Um papo com Tony Fletcher, biógrafo dos Smiths

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Um papo com Tony Fletcher, biógrafo dos Smiths

Um papo com Tony Fletcher, biógrafo dos SmithsOs Smiths eram caras conscientes, não queriam se vender, pregavam o vegetarianismo e acabaram antes que a banda pudesse se transformar numa caricatura de si própria. Se você ainda acredita nisso tudo, anda precisando ler A light that never goes out, biografia da banda escrita por Tony Fletcher (Ed. Best Seller).

Comentando as afirmativas acima: Morrissey (voz), Johnny Marr (guitarra), Andy Rourke (baixo) e Mike Joyce (bateria) não eram vegetarianos o tempo todo não. Sanduíches de atum volta e meia faziam parte do cardápio de turnês do quarteto. O grupo tentou muito arrumar empresários poderosos e interessados, todos sempre esbarrando nos problemas de comunicação entre os integrantes, além da paranoia de controle do vocalista. Tudo isso foi deixando a banda bastante desanimada e estressada, a ponto de terminarem atividades no meio de um contrato em vigor com a EMI – que originou o primeiro acerto solo de Morrissey.

“O sucesso veio rápido demais para eles. E veio sem um empresário oficial. Acho que os Smiths sentiram que poderiam continuar a fazer as coisas do jeito deles, que tudo sempre daria certo. E não foi bem assim: à medida que tudo ia andando, cada um queria um pedaço maior do bolo. Morrissey não conseguia confiar num empresário e como precisava lidar ele mesmo com o selo da banda (Rough Trade), percebeu que nem mesmo neles poderia confiar. Marr ficava lá lidando com Morrissey numa das pontas. E na outra ponta, lidava com a responsabilidade de encontrar alguém para cuidar da banda”, conta Fletcher, num papo com a gente.


O biógrafo, como jornalista, conduziu a primeira grande entrevista de Morrissey à TV, em 1984. “Para mim, era moleza me identificar com a energia de Marr, mas me senti muito identificado com a insegurança do Morrissey, seus problemas em arrumar um trabalho regular, sua timidez. Ele cantou para toda uma geração que nunca havia tido um porta-voz”.

Da estreia The Smiths (1984) ao último LP Strangeways, here we come (1987), toda uma mudança na história do rock foi armada em poucos anos por uma banda que detestava teclados, adorava camas de violões e não tinha lá muito apreço por solos de guitarra – mas estranhamente tangenciou o heavy metal no solinho de um de seus últimos hits, Shoplifters of the world, unite, com guitarras dobradas. Além da sonoridade límpida, havia ainda as letras de Morrissey, cercadas de anglicismo, e de referências que só faziam sentido dentro de seu país (como a dramaturga Shelagh Delaney, do livro Um gosto de mel). E o orgulho irlandês, em respeito a seus antepassados.


“Os Smiths celebravam os glam rockers dos anos 1970, o girl pop dos anos 1960. E essa celebração teve um update com a abordagem honesta de Morrissey em relação ao sistema de classes, à brutalidade das escolas e das ruas. Acho que o principal foi que eles tinham entendimento do que era ser uma grande banda pop, lado a lado com o conhecimento sobre o que é também ser uma grande banda de rock”, esclarece Tony Fletcher. Mesmo que o quarteto tivesse uma imagem bem limpa, totalmente diferente da de roqueiros putanheiros como Led Zeppelin ou até de devoradores de drogas como o Black Sabbath, as substâncias ilícitas fizeram parte do dia a dia de alguns dos integrantes do grupo, como Johnny Marr.

Chamado de “homossexual celibatário” por muito tempo, Morrissey cantou em várias de suas músicas a solidão, a impossibilidade de se conseguir um amor. Arrebatou multidões de fãs solitários, sim. Mas muitos deles não percebiam que a poesia do vocalista também buscava alternativas – apontando para a felicidade em estar sozinho, em não necessitar de ninguém e em não precisar de definições de gênero, como gay e hétero.

“Os Smiths, em especial Morrissey, mudaram os comportamentos das pessoas, ou pelo menos as atitudes das pessoas. Na época em que eles surgiram, tínhamos bandas como Culture Club, Soft Cell, Frankie Goes To Hollywood. Eram bandas que tinham integrantes assumidamente gays, mas não havia nenhuma discussão sobre sexualidade”, recorda Tony Fletcher. “Morrissey, que era um cara que não cabia naquele estereótipo de homem gay, estava a fim de falar sobre sexualidade de todas as maneiras. Falou até sobre celibato, que sequer era considerado uma opção na Inglaterra. Acho que o principal foi que ele encorajou as pessoas a entenderem a sexualidade alheia. E também a manterem menos expectativas sobre suas próprias atividades sexuais. Isso foi muito legal!”.

Notinha: A light that never goes out saiu faz bastante tempo. Chegou às livrarias em 2014. Esse papo com Tony Fletcher eu tinha feito para um freela que não foi publicado, e acabou saindo no primeiro número de uma revista que não existe mais, a Reticência, criada pelo meu amigo fotógrafo Alexandre Moskow. Era uma publicação de distribuição gratuita, que falava de música, esportes radicais, tinha (aham) fotos sensuais de garotas e funcionava em um formato inovador, com uma única folha impressa dobrada em oito partes. E durou poucos números, infelizmente. Era muito legal escrever para lá e gostaria que tivesse continuado. Como essa entrevista chegou a poucas mãos na época – e como Strangeways, here we come, último disco dos Smiths, faz 30 anos nesta quinta (28) – reproduzi aqui no POP FANTASMA.

Crítica

Ouvimos: Ramones, “Halfway to sanity” (relançamento)

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Ouvimos: Ramones, “Halfway to sanity” (relançamento)

Que ironia: um disco nota 6 dos Ramones causa crises de saudades e revisionismo histórico e… pelo menos aqui no Pop Fantasma, aumenta de cotação. Halfway to sanity (1987) volta agora às lojas brasileiras (as online e as que resistem), e no formato CD. Foi o último disco gravado com Richie Ramone na bateria, pouco antes do grupo fazer uma tentativa de colocar o ex-Blondie Clem Burke para substituí-lo.

Dizer que “o disco tal dos Ramones foi marcado por brigas durante a gravação” é chover no molhado, ainda mais em se tratando de uma banda que tinha o intransigente Johnny Ramone como guitarrista. Halfway, décimo álbum da banda, lançado originalmente em 15 de setembro de 1987, por sua vez, é um caso à parte: a porrada comeu antes, durante e depois. Para começar, em janeiro daquele ano, o grupo baixou em São Paulo para três shows – o primeiro deles terminou em briga generalizada provocada por skinheads.

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  • Temos episódios do nosso podcast sobre Ramones e Blondie.

No meio das gravações, Joey e Johnny Ramone, inimigos íntimos, não se entendiam. O produtor Daniel Rey tinha problemas de comunicação com boa parte da banda. Dee Dee Ramone (ainda no baixo do grupo), passava boa parte do tempo doidão, não conseguia se comunicar com ninguém e – dizem – teve suas partes de baixo tocadas por Rey. Pessoas que lidavam com os Ramones de perto dizem que a banda já estava de saco cheio de trabalhar feito louca, gravar um disco por ano e não ser reconhecida, com direito a amigos da onça perguntando a eles “quando a banda iria estourar”.

E aí que Halfway soa insano, embora sob controle. Curtíssimo (12 músicas em 30 minutos e uns quebrados), o álbum traz os Ramones fazendo algumas incursões pelo hard rock e pelo hardcore, com direito a vocais berradíssimos de Joey Ramone em faixas como I know better now, a agitada Weasel face (na qual a voz do cantor chega a lembrar a de Alice Cooper) e o skate punk legítimo I’m not Jesus. O grupo chega perto do pós-punk gótico em Garden of serenity, adere ao som tribal na onda do Public Image Ltd em Worm man, e soa revivalista na balada Bye bye baby (com cara de canção de girl group, e escrita, claro, por Joey) e no rock vintage Go lil Camaro go, marcado por uma apagada participação de Debbie Harry.

1987 foi um ano de três bateristas para os Ramones: com Halfway em curso, Richie saiu brigado da banda, e deu lugar para Clem Burke – jornalistas lançaram a piada de que ele adotaria o nome Clemmy Ramone, mas ficou mesmo como Elvis Ramone. Não deu certo e após dois shows confusos, Marky Ramone, que estava afastado da banda desde 1983, retornou. Hoje, vale a redescoberta.

Nota: 7,5
Gravadora: ForMusic (no Brasil)

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Crítica

Ouvimos: Nick Lowe e Los Straitjackets, “Indoor safari”

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Ouvimos: Nick Lowe e Los Straitjackets, “Indoor safari”
  • Indoor safari é o novo disco do cantor, compositor e produtor britânico Nick Lowe. Um artista cuja carreira vem desde meados dos anos 1960, mas que se notabilizou a partir dos anos 1970, primeiro como integrante das bandas Brinsley Schwarz e Rockpile, depois como artista solo lançado por gravadoras como a indie Stiff e a indie-major Radar.
  • O disco é uma compilação de gravações feitas ao longo de dez anos por Lowe com a banda retrô-lounge-surf Los Straitjackets, que sempre se apresenta disfarçada por máscaras de wrestling. O cantor e o grupo já haviam lançado um álbum ao vivo em 2016.
  • Indoor safari sai pelo selo Yep Roc, iniciado em 1997 e cujo elenco já teve de Fountain Of Wayne a Bob Mould e Gang Of Four.

Figurinha indispensável dos anos 1970, brilhante como cantor, compositor e produtor, rei da transição entre pub rock, punk e new wave (seu som passa pelos três estilos)… Nick Lowe é aquele cara que provavelmente, no Brasil, muita gente conhece sem conhecer. Volta e meia ele é citado por aí como nomão influente, artistas como Elvis Costello já trabalharam com ele, e sua discografia, além de já ser bem extensa, inclui músicas que volta e meia rolam no rádio até mesmo no Brasil, como So it goes, Crackin up e Cruel to be kind.

Drogas e problemas pessoais deixaram a história de Nick mais conturbada, mas ele nunca parou. De qualquer jeito, a carreira discográfica de Lowe meio que ficou no para-e-anda depois de 2013, quando ele lançou Quality street, disco de Natal. Em compensação, ele saiu em turnê para divulgar o álbum ao lado de uma banda chamada Los Straitjackets, uma banda da mesma gravadora que ele (Yep Roc), dedicada a rock extremamente vintage – surf music, rockabilly e coisas próximas do bubblegum – com cada integrante usando uma máscara de wrestling.

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Isso aí era Lowe, que já foi visto como um revisionista futurista, voltando-se para um som clássico de rock, ao lado de uma galera bastante animada. Tão animada que o enrosco com a banda rendeu turnê e alguns singles. E agora rende uma espécie de coletânea expandida, Indoor safari, com os compactinhos que ele vem gravando ao lado dos Straitjackets, mais três músicas inéditas. Uma das novas canções, a surfística Went to a party, surge na abertura soando como o Who ou os Kinks dando vida nova a uma canção dos anos 1950 – ou alguma música perdida de bandas como Kingsmen ou Rivingstones.

Indoor safari não é um disco “novo”, mas isso não o torna menos valoroso. Os Straitjackets e Lowe fazem um disco de rock quase 100% autoral que poderia ter saído em 1961 ou 1962, com músicas que, se tivessem sido feitas naquela época, estariam no set list do show dos Beatles em Hamburgo, ou entre as releituras dos primeiros discos deles. De qualquer jeito, há dois covers, A quiet place, de um grupo chamado Garnett Mimms & The Enchanters, original de 1964; e Raincoat in the river, gravada originalmente por Ricky Nelson.

O clima lounge prometido pela foto da capa surge amplificado em músicas como Love starvation, a tristezinha rocker de Crying inside, a maravilha meio Motown meio Beatles Jet pac boomerang (encerrada com uma citação de Please please me, dos quatro de Liverpool), a selvageria rocker de Tokyo bay e a bateção irresistível de violão e guitarra de Trombone. Cada riff de guitarra soa como anúncio de duelo, numa onda meio surf rock de faroeste. Ouça no volume máximo.

Nota: 9
Gravadora: Yep Roc

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Crítica

Ouvimos: Kate Pierson, “Radios & rainbows”

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Ouvimos: Kate Pierson, “Radios & rainbows”

Cantora do B-52’s e uma das vozes mais célebres do rock dos anos 1980 (nos anos 1990 participou de Shiny happy people, do R.E.M., e de Candy, de Iggy Pop, você talvez saiba), Kate Pierson fez um segundo disco solo que parece um verdadeiro catalogo pop. Radios & rainbows tem doze músicas que se parecem provavelmente com o que Kate gostaria de descobrir no rádio – ou vá lá, o que ela gostaria que, do repertório dela, estivesse tocando no rádio hoje em dia.

Boa parte do repertório vai de canções mais disco, ou pós-disco, até músicas que lembram sua banda B-52’s (claro) e até ABBA. É o que rola em faixas como a balançada Dream on, o rock sombrio-de-brincadeira Every day is halloween, o r&b vintage Evil love, o house Wings. Correndo por fora, tem até um reggaezinho em Pillow queen, um soul-rock em Living on a Monet e uma tentativa de fazer pop grandiloquente em Higher place – uma faixa que se fosse gravada com instrumentos eletrônicos e samplers, seria uma daquelas mesclas de drum’n bass, punk e nu metal que volta e meia surgem no universo do rock. Além de power pop na onda das Bangles e das Go-Go’s em Always till now e The beauty of it all.

Kate faz questão de chamar a atenção para a positividade do disco. É verdade, mas como já acontecia no próprio B-52’s, não existe festa sem luta – ela celebra o poder geral em Dream on e Higher place, fala do dia a dia com a esposa Monica em The beauty of it all e sobre corações partidos em Give your heart to science e Take me back to the party – que cita Get in on (Bang a gong), do T Rex, na letra.

Nota: 8
Gravadora: SongVest Records

  • Temos um episódio do nosso podcast sobre o B-52s
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