Connect with us

Cinema

Revendo Let It Be

Published

on

Abertura do filme Let It Be, dos Beatles

“Começamos o filme em janeiro de 1969 (…) sob o título provisório de Get back. (…) A ideia era ver os Beatles ensaiando, improvisando, montando seu número e depois, finalmente se apresentando em algum lugar num grande concerto (…) Na verdade, o que aconteceu foi que (…) evidenciou-se como funciona a dissolução de um grupo. Nós não percebemos que estávamos efetivamente rompendo enquanto aquilo estava acontecendo” – Paul*

Há muito tempo, em uma galáxia muito, muito distante (leia-se no fim da década de 1980, no município de São Gonçalo, RJ), a informação sobre música pop era escassa. Por informação, entenda-se texto, áudio, vídeo. Pré-internet, pré-MTV, pré-TV paga, pré-Plano Real, tudo era difícil. Até mesmo, imaginem, ver algum material em vídeo dos Beatles. Adolescente, eu percorria literais léguas — de SG até a zona sul do Rio — para assistir a vídeos como Live at the Budokan ou The compleat Beatles, que costumavam passar em sessões à meia-noite na sala de vídeo da faculdade Candido Mendes. Sim, há muito tempo, existiam essas coisas chamadas “salas de vídeo”, que exibiam produções musicais em VHS; em geral material “raro”, i.e., pirata.

Foi em uma dessas salas de vídeo — a do Centro Cultural do Patrimônio Paço Imperial, ou apenas Paço Imperial, na Praça XV, centrão do Rio de Janeiro — que eu vi Let it be pela primeira vez. Eu não sabia na época, mas sem dúvida tratava-se de uma cópia ilegal. A época, aliás, era 1990; disso eu lembro com clareza, pois o Paço aproveitara a primeira vinda de Paul McCartney ao Brasil para fazer uma mostra com os cinco longas-metragens dos Beatles, na ordem cronológica. Portanto, em uma sexta-feira de 1990, eu peguei a barca em Niterói rumo à Praça XV, para assistir a Let it be. Provavelmente precisei matar a última aula daquela manhã (eu cursava o terceiro ano do ensino médio), já que a sessão era às 13h.

Quer dizer, tô meio que chutando tudo isso, pois lá se vão mais de 30 anos. De detalhes do filme, lembro pouco. Lembro de ter chegado atrasado e de ter perdido os primeiros minutos de projeção. Lembro da qualidade ruim — granulada, esmaecida — da imagem e do som abafado. Aposto que era uma cópia (de uma cópia de uma cópia…) da única edição oficial em home video do longa, lançada em 1981. Eu também não sabia que os fotogramas “estourados” eram um detalhe que acompanhava Let it be desde seu lançamento nos cinemas; filmado em 16mm, o negativo original foi ampliado para 35mm, o que resultou na granulação exagerada das imagens.

Tirante o showzinho no telhado, ficaram na mente a valsa de John & Yoko ao som de I me mine, Paul ensaiando “Oh! Darling” ao piano e o espanto com a versão integral de Dig it. Mais do que tudo, ficou na mente o clima um tanto desolador conjurado pelo longa. Em 1990, eu já sabia que Let it be era o retrato do fim dos Beatles e que mostrava o quarteto gravando aquele que seria seu último álbum. (Mas não sabia ainda que, entre o trabalho no filme e o fim em 1970, eles conseguiram conciliar uma última vez o supostamente irreconciliável, para produzir Abbey Road.) De uma forma meio impressionista, as lembranças daquela cópia meio fudida do documentário — uma polaroide granulada da fase mais tristonha do grupo — se misturaram às informações que vim acumulando anos afora sobre a história dos Fab Four.

Let it be é o mais controverso dos 12 álbuns e o menos exibido dos cinco filmes dos Beatles. O longa-metragem de Michael Lindsay-Hogg é o único documentário TRVE rodado sobre a banda enquanto eles ainda estavam juntos. Hoje, todo mundo sabe dos perrengues que cercaram as gravações, realizadas em janeiro de 1969 e descritas por George Harrison como “o ponto mais baixo” da trajetória do quarteto. Todo mundo (hoje) sabe que George chegou a sair da banda (por 11 dias), que a chegada de Billy Preston deu uma aliviada no clima e que o quarteto (leia-se Paul) ponderou por meses o conteúdo final do doc, antes de abandonarem o título original Get back. Todo mundo sabe que literais semanas de filmagem bruta foram descartadas e arquivadas, para se chegar aos 80 minutos do longa que estreou em maio de 1970, pouco mais de um mês depois que Paul anunciou publicamente sua saída dos Beatles — na prática, dissolvendo a banda.

Nunca relançado nos cinemas, nunca reeditado em qualquer formato desde os anos 1980, não disponível em streaming (chegou a estar, por um tempo, no catálogo da Netflix nos EUA e Reino Unido), exibido na TV apenas em fragmentos, Let it be virou um mistério. Mas todo mundo sabe que ao menos duas tentativas de lançar o documentário em DVD, em 2008 e 2011, fracassaram devido à intervenção de Paul (e Ringo). Muito menos obscuro que o filme, o álbum homônimo também foi “amaldiçoado” por Paul, que nunca engoliu as intervenções sonoras feitas à sua revelia pelo produtor Phil Spector. Macca não sossegou até lançar a “sua” versão do disco, em 2003.

Eis que em 30 de janeiro de 2019 (o dia do 50º aniversário do rooftop concert), Peter Jackson e a Disney (!) anunciaram a possível redenção de Let It Be… na forma de The Beatles: Get back, uma minissérie de seis horas de duração editada a partir de 55 horas de filmagens feitas por Lindsey-Hogg em 1969. O resultado vai ao ar via Disney+ ao fim de novembro de 2021. Em imagens restauradas digitalmente, os Beatles de 69 nunca pareceram tão cristalinos. Jackson prometeu uma narrativa “divertida e inspiradora”, em contraponto ao tom sombrio do filme original.

Bom, eu disse pra mim mesmo, é um sinal. Se em 1990 eu precisei atravessar três municípios para assistir a uma cópia de procedência duvidosa, hoje uma versão digital (rotulada “Deluxe 35mm Widescreen Stereo Edition”) é facilmente encontrável nas, ahem, boas casas do ramo na internet. O arquivo foi extraído de uma versão, ahem, genérica lançada em BD em algum país da Ásia (Japão, provavelmente). Segundo as liner notes que acompanham o vídeo, a fonte foi uma cópia VHS de boa qualidade originária da BBC, com imagens em widescreen e som estéreo (em lugar da versão 4:3 e mono vista/ouvida nos cinemas).

Adiei por anos, mas antes de assistir à minissérie, vou rever Let it be. Não seria possível encarar a “divertida versão Disney” sem passar a limpo as memórias tristonhas do filme original.

“Foi um inferno fazer Let it be. Quando foi lançado, muita gente se queixou de Yoko parecia infeliz (…) Mesmo o maior dos fãs dos Beatles não conseguiria tolerar aquelas seis semanas lamentáveis. Foi a gravação mais deplorável da face da Terra” — John*

Pôster original do filme Let It Be, dos Beatles

A impressão mais forte após a revisão: Let it be é uma “tela em branco” na qual os espectadores projetam suas percepções sobre o último ano no qual os Beatles existiram na prática. O longa parece triste, ou me pareceu triste em 1990, porque vinha carregado de uma aura triste; a narrativa do fim da banda o precedia, e como já sabíamos o desfecho da história — um spoiler gigantesco, que não chega a ser mostrado na tela — todo o esforço do quarteto no estúdio parecia dolorosamente inútil.

Só que essa “narrativa da tristeza” era algo 100% formulado pelo espectador. Toda a contextualização do que se vê no filme depende do conhecimento prévio do público. O filme nunca força a barra para parecer triste ou deprimente. Na verdade, as imagens são tão cruas que pouco pode se falar em narrativa. O que temos é apenas a câmera rodando, praticamente sem intervenções do diretor sobre as cenas. Não há entrevistas, narração, legendas. Sim, a tensão entre os músicos é visível e dispensa comentários, mas Lindsay-Hogg não conduz a “história” nem induz o público a qualquer conclusão. É até surpreendente constatar que a maior banda de rock do mundo tenha consentido em lançar nos cinemas um produto tão amorfo, despojado e — em última instância — aberto a múltiplas interpretações. (Uma resenha contemporânea no jornal The Sunday Telegraph classificou o longa como “um filme muito ruim (mas) tocante”).

Uma outra narrativa consolidada com o passar dos anos se confirma na revisão: Paul monopoliza o filme. Ele teve a ideia para o projeto, ele impeliu os outros três à empreitada, e é ele quem comanda o show, literal e figuradamente. Diante da indiferença de John e da insatisfação de George, Paul é quem sugere planos, se esforça para burilar suas composições e para extrair alguma empolgação dos companheiros. (Ringo, em consonância com sua persona pública, serve quase como um alívio cômico. Pouco se manifesta, embora a câmera se concentre nele em diversos momentos, de forma marcante.) Uma terceira narrativa, a da presença ominosa de Yoko no estúdio, interferindo na harmonia do quarteto, se desfaz. Sim, ela aparece já no segundo minuto de projeção e acompanha John pra lá e pra cá, mas não fala. A câmera pouco se interessa por ela… Ou talvez a edição tenha preservado apenas seus momentos mais inexpressivos.

Paul também estrela os dois “clipes” mais conhecidos do filme, as interpretações da música-título e de The long and winding road, repletos de closes dele. Ele é o único que parece reconhecer a presença da câmera e que concorda em “atuar” para o diretor. Ainda mais que outros sucessos incluídos no filme, Two of us é a música-símbolo de Let it be. Não só pela letra (“We’re going home”, etc.), mas também pelo tempo que merece na tela. Vemos a canção tomando forma, primeiro em uma versão de trabalho — elétrica e mais roqueira — gravada ainda no estúdio Twickenham. O famoso bate-boca entre Paul e George (“Eu toco o que você quiser que eu toque. Se você quiser, posso tocar nada também”) se dá durante um debate sobre o arranjo da canção. E, afinal, já nos estúdios da Apple, é o primeiro número número a ser apresentado 100% completo, já no formato acústico e delicado eternizado no álbum (aliás, é a faixa de abertura do disco).

Musicalmente, o filme mostra que os Beatles já estavam, em 1969, com um pé nos anos 70. O som nos ensaios é pesado e blueseiro, com os caras tentando recuperar de forma meio desajeitada o jeito de tocar em conjunto. Vamos lembrar que o quarteto já não funcionava como uma “banda de verdade” há um bom par de anos e que no Álbum branco, o disco anterior, cada um dos quatro fez o que quis, usando os outros três como meros ajudantes (às vezes, nem isso). O espírito gettin’ back inspira o quarteto a arriscar jams repletas de velharias, como Besame mucho e uma desanimada (e desafinada) You really got a hold on me. É também em uma jam que vê-se o único momento em que John realmente se empolga: Dig it.

Por falta de novas canções — ou talvez já de olho no que lançar nas carreiras solo — John & Paul ressuscitam One after 909, cuja gravação original de 1963 não tinha sido lançada até ali. Enquanto isso, George tinha um baú de composições guardadas, às quais a dupla principal não dava muita atenção. É bacana vê-lo trabalhando em For you blue, ajudando Ringo a encorpar Octopus’s garden e liderando a banda em uma versão de I me mine diferente da do disco, com direito a um interlúdio quase flamenco.

Cena do filme Let It Be, dos Beatles

Cenas do rooftop, 30 de janeiro de 1969: um aspone da Apple segura a letra de ‘Dig a Pony’ para John, a galera na rua olhando pra cima incrédula e os bobbies chegando para acabar com o fuzuê

O grand finale do filme, o concerto no telhado da Apple, não foi a conclusão do projeto. Era a única concessão do documentário a um esquema de narrativa tradicional: filmamos os Beatles compondo, gravando, discutindo e encerramos com o resultado final. Mas as filmagens na Apple continuaram; na verdade, as gravações de Let it be, Two of us e The long and winding road foram feitas depois do show. Obviamente é o ponto alto do longa, no qual Lindsay-Hogg assume o papel de cinejornalista, entrevistando os surpresos londrinos, capturando o caos na rua Saville Row e a intervenção da polícia. Mais que apenas o “último show” dos Beatles, foi o momento em que eles afinal voltam a confrontar o mundo real, depois de anos trancados no estúdio, viajando pela Índia e tecendo mirabolantes planos empresariais. O mundo real bate palmas, mas também envia a Scotland Yard para acabar com a barulheira. É tudo muito espontâneo, mas também há um tom farsesco na coisa toda. Não é como se os Beatles não soubessem que o showzinho iria dar merda. Eles eram os Beatles, pô.

E porque eles eram os Beatles, Let it be sempre será indispensável, mesmo que pouco acessível. Cada um dos filmes dos quarteto tem sua graça específica. A “graça” do documentário é mostrar os Beatles humanos. Não os reis do iê-iê-iê, os xamãs psicodélicos ou o desenho animado. Nos outros quatro filmes, os Fab Four pertencem a outro(s) mundo(s). Em Let it be eles são (quase) gente como a gente: acordam cedo para trabalhar num lugar chato, com um chefe chato (Paul, claro) cobrando resultados; relaxam ao voltarem pra casa (a Apple) e ao receberem amigos (Billy Preston). Para encerrar, fazem uma festinha na laje que acaba com a presença dos meganhas.

“Lembro-me (…em uma reunião sobre o filme) de ouvir de John: ‘Ah, entendi. Ele quer um trabalho’. E eu (disse): ‘É isso mesmo. Acho que devemos trabalhar. Seria bom’. (…) Em seguida, tivemos discussões terríveis — então teríamos a dissolução dos Beatles no filme, em lugar daquilo que realmente desejávamos. Provavelmente foi uma história melhor — uma história triste, mas era a que havia” — Paul*

*Depoimentos extraídos do livro Antologia — The Beatles (Cosac & Naify, 1995).

Publicado originalmente no blog Telhado de Vidro

Mais Let it be no POP FANTASMA:
– Trinta coisas que você já sabia sobre o rooftop concert dos Beatles
– Discos da discórdia 10: Beatles com Let it be… Naked
O fim (??) dos Beatles no podcast do POP FANTASMA

Jornalista, escrevendo coisas que ninguém lê, desde 1996 (Jornal do Brasil, Extra, Tribuna da Imprensa, Rock Press, Cliquemusic, Gula, Scream & Yell, Veja Rio, Bula)

Cinema

Urgente!: Cinema pop – “Onda nova” de volta, Milton na telona

Published

on

Urgente!: Cinema pop – "Onda nova" de volta, Milton na telona

Por muito tempo, Onda nova (1983), filme dirigido por Ícaro Martins e José Antonio Garcia – e censurado pelo governo militar –, foi jogado no balaio das pornochanchadas e produções de sacanagem.

Fácil entender o motivo: recheado de cenas de sexo e nudez, o longa funciona como uma espécie de Malhação Múltipla Escolha subversivo, acompanhando o dia a dia de uma turma jovem e nada comportada – o Gayvotas Futebol Clube, time de futebol formado só por garotas, e que promovia eventos bem avançadinhos, como o jogo entre mulheres e homens vestidos de mulher. Por acaso, Onda nova foi financiado por uma produtora da Boca do Lixo (meca da pornochanchada paulistana) e acabou atropelado pela nova onda (sem trocadilho) de filmes extremamente explícitos.

O elenco é um espetáculo à parte. Além de Carla Camuratti, Tânia Alves, Vera Zimmermann e Regina Casé, aparecem figuras como Osmar Santos, Casagrande e até Caetano Veloso – que protagoniza uma cena soft porn tão bizarra quanto hilária. Durante anos, o filme sobreviveu em sessões televisivas da madrugada, mas agora ressurge restaurado e remasterizado em 4K, estreando pela primeira vez no circuito comercial brasileiro nesta quinta-feira (27).

Meu conselho? Esqueça tudo o que você já ouviu sobre Onda nova (ou qualquer lembrança de sessões anteriores). Entre de cabeça nessa comédia pop carregada de referências roqueiras da época, um cruzamento entre provocação punk e ressaca hippie. O filme abre com Carla Camuratti e Vera Zimmermann empunhando sprays de tinta para pixar os créditos, mostra Tânia Alves cantando na noite com visual sadomasoquista, segue com momentos dignos de um musical glam – cortesia da cantora Cida Moreyra, que brilha em várias cenas – e trata com surpreendente modernidade temas como maconha, cultura queer, relacionamentos sáficos, mulheres no poder, amores fluidos e, claro, futebol feminino.

Se fosse um disco, Onda nova seria daqueles para ouvir no volume máximo, prestando atenção em cada detalhe e referência. A trilha sonora passeia entre o boogie oitentista e o synthpop, com faixas de Michael Jackson e Rita Lee brotando em alguns momentos. E o que já era provocação nos anos 1980 agora ressurge como registro de uma juventude que chutava o balde sem medo. Vá assistir correndo.

*****

Milton Bituca Nascimento, de Flavia Moraes, que estreou na última semana, segue outro caminho: o da reverência, mesmo que seja um filme documental. Durante dois anos, Flavia seguiu Milton de perto e produziu um retrato que, mais do que um relato biográfico, é uma celebração. E uma hagiografia, aquela coisa das produções que parecem falar de santos encarnados.

A narração de Fernanda Montenegro dá um tom solene – e, enfim, logo no começo, fica a impressão de um enorme comercial narrado por ela, como os daquele famoso banco que não patrocina o Pop Fantasma. Aos poucos, vemos cenas da última turnê, reações de fãs, amigos contando histórias. Marcio Borges lê matérias do New York Times sobre Milton, para ele. Wagner Tiso chora. Quincy Jones sorri ao falar dele. Mano Brown solta uma pérola: Milton o ensinou a escutar. E Chico Buarque assiste ao famigerado momento do programa Chico & Caetano em que se emociona ao vê-lo cantar O que será – um vídeo que virou meme recentemente.

Isso tudo é bastante emocionante, assim como as cenas em que a letra da canção Morro velho é recitada por Djavan, Criolo e Mano Brown – reforçando a carga revolucionária da música, que usava a imagem das antigas fazendas mineiras para falar de racismo e capitalismo. Mas, no fim, o que fica de Milton Bituca Nascimento é a certeza de que Milton precisava ser menos mitificado e mais contado em detalhes. Vale ver, e a música dele é mito por si só, mas a sensação é a de que faltou algo.

Por acaso, recentemente, Luiz Melodia – No coração do Brasil, de Alessandra Dorgan, investiu fundo em imagens raras do cantor, em que a história é contada através da música, sem nenhum detalhe do tipo “quem produziu o disco tal”. Mas o homem Luiz Melodia está ali, exposto em entrevistas, músicas, escolhas pessoais e atitudes no palco e fora dele. Quem não viu, veja correndo –  caso ainda esteja em cartaz.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Continue Reading

Cinema

Urgente!: Filme “Máquina do tempo” leva a música de Bowie e Dylan para a Segunda Guerra

Published

on

Urgente!: Filme "Máquina do tempo" leva a música de Bowie e Dylan para a Segunda Guerra

Descobertas de antigos rolos de filme, assim como cartas nunca enviadas e jamais lidas, costumam render bons filmes e livros — ou, pelo menos, são um ótimo ponto de partida. É essa premissa que guia Máquina do tempo (Lola, no título original), estreia do irlandês Andrew Legge na direção. A ficção científica, ambientada em 1941, acompanha as irmãs órfãs Martha (Stefanie Martini) e Thomasina (Emma Appleton), e chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (13), dois anos após sua realização.

As duas criam uma máquina do tempo — a Lola do título original, batizada em homenagem à mãe — capaz de interceptar imagens do futuro. O material que elas conseguem captar é todo registrado em 16mm por uma câmera Bolex, dando origem aos tais rolos de filme.

E, bom, rolo mesmo (no sentido mais problemático da palavra) começa quando o exército britânico, em plena Segunda Guerra Mundial, descobre a invenção e passa a usá-la contra as tropas alemãs. A princípio, a estratégia funciona, mas logo começa a sair do controle. As manipulações temporais geram consequências inesperadas, enquanto as personalidades das irmãs vão se revelando e causando conflitos.

Com apenas 80 minutos de duração e filmado em 16 mm (com lentes originais dos anos 1930!), Máquina do tempo pode soar confuso em algumas passagens. Não apenas pelas idas e vindas temporais, mas também pelo visual em preto e branco, valorizando sombras e vozes que quase se tornam personagens da história. Em alguns momentos, é um filme que exige atenção.

O longa também tem apelo para quem gosta de cruzar cultura pop com história. Martha e Thomasina ficam fascinadas ao ver David Bowie cantando Space oddity (o clipe brota na máquina delas), tornam-se fãs de Bob Dylan, adiantam a subcultura mod em alguns anos (visualmente, inclusive) e coadjuvam um arranjo de big band para o futuro hit You really got me, dos Kinks, que elas também conseguem “ouvir” na máquina. Um detalhe curioso: a própria Emma Appleton operou a câmera em cenas em que sua personagem Thomasina se filma (“para deixar as linhas dos olhos perfeitas”, segundo revelou o diretor ao site Hotpress).

Ainda que a cultura pop esteja presente, Máquina do tempo é, acima de tudo, um exercício de futurologia convincente, explorando uma futura escalada do fascismo na Inglaterra — que, no filme, chega até mesmo à música, com a criação de um popstar fascista.

A ideia faz sentido e nem é muito distante do que aconteceu de verdade: punks e pré-punks usavam suásticas para chocar os outros, Adolf Hitler quase figurou na capa de Sgt. Pepper’s, dos Beatles, Mick Jagger não se importou de ser fotografado pela “cineasta de Hitler” Leni Riefenstahl, artistas como Lou Reed e Iggy Pop registraram observações racistas em suas letras, e o próprio Bowie teve um flerte pra lá de mal explicado com a estética nazista. Mas o que rola em Máquina do tempo é bem na linha do “se vocês soubessem o que vai acontecer, ficariam enojados”. Pode se preparar.

Continue Reading

Cinema

Ouvimos: Lady Gaga, “Harlequin”

Published

on

Ouvimos: Lady Gaga, “Harlequin”
  • Harlequin é um disco de “pop vintage”, voltado para peças musicais antigas ligadas ao jazz, lançado por Lady Gaga. É um disco que serve como complemento ao filme Coringa: Loucura a dois, no qual ela interpreta a personagem Harley Quinn.
  • Para a cantora, fazer o disco foi um sinal de que ela não havia terminado seu relacionamento com a personagem. “Quando terminamos o filme, eu não tinha terminado com ela. Porque eu não terminei com ela, eu fiz Harlequin”, disse. Por acaso, é o primeiro disco ligado ao jazz feito por ela sem a presença do cantor Tony Bennett (1926-2023), mas ela afirmou que o sentiu próximo durante toda a gravação.

Lady Gaga é o nome recente da música pop que conseguiu mais pontos na prova para “artista completo” (aquela coisa do dança, canta, compõe, sapateia, atua etc). E ainda fez isso mostrando para todo mundo que realmente sabe cantar, já que sua concepção de jazz, voltada para a magia das big bands, rendeu discos com Tony Bennett, vários shows, uma temporada em Las Vegas. Nos últimos tempos, ainda que Chromatica, seu último disco pop (2020) tenha rendido hits, quem não é 100% seguidor de Gaga tem tido até mais encontros com esse lado “adulto” da cantora.

A Gaga de Harlequin é a Stefani Joanne Germanotta (nome verdadeiro dela, você deve saber) que estudou piano e atuação na adolescência. E a cantora preparada para agradar ouvintes de jazz interessados em grandes canções, e que dispensam misturas com outros estilos. Uma turminha bem específica e, vá lá, potencialmente mais velha que a turma que é fã de hits como Poker face, ou das saladas rítmicas e sonoras que o jazz tem se tornado nos últimos anos.

O disco funciona como um complemento a ao filme Coringa: Loucura a dois da mesma forma que I’m breathless, álbum de Madonna de 1990, complementava o filme Dick Tracy. Mas é incrível que com sua aventura jazzística, Gaga soe com mais cara de “tá vendo? Mais um território conquistado!” do que acontecia no caso de Madonna.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.

O repertório de Harlequin, mesmo extremamente bem cantado, soa mais como um souvenir do filme do que como um álbum original de Gaga, já que boa parte do repertório é de covers, e não necessariamente de músicas pouco conhecidas: Smile, Happy, World on a string, (They long to be) Close to you e If my friends could see me now já foram mais do que regravadas ao longo de vários anos e estão lá.

De inéditas, tem Folie à deux e Happy mistake, que inacreditavelmente soam como covers diante do restante. Vale dizer que Gaga e seu arranjador Michael Polansky deram uma de Carlos Imperial e ganharam créditos de co-autores pelo retrabalho em quatro das treze faixas – até mesmo no tradicional When the saints go marching in.

Michael Cragg, no periódico The Guardian, foi bem mais maldoso com o álbum do que ele merece, dizendo que “há um cheiro forte de banda de big band do The X Factor que é difícil mudar”. Mas é por aí. Tá longe de ser um disco ruim, mas ao mesmo tempo é mais uma brincadeirinha feita por uma cantora profissional do que um caminho a ser seguido.

Nota: 7
Gravadora: Interscope.

Continue Reading
Advertisement

Trending