Crítica
Ouvimos: Melvins, “Tarantula heart”

- Tarantula heart é o 27º disco de estúdio da banda norte-americana Melvins – que, para o lançamento, adotou o nome “The” Melvins. O disco vem sendo gravado desde 2022 e, diz o vocalista Buzz Osborne, “é um disco diferente de tudo que nós já gravamos”.
- Buzz conta que, no novo álbum, a banda fez as músicas ao contrário: tocou tudo antes de começarem a escrever as canções. A banda se enfiou no estúdio, foi gravando, depois escreveu novas partes para fazer o material se adequar.
- Para Tarantula heart, o Melvins transformou-se num quinteto: Buzz Osborne (voz, guitarra), Dale Crover, Roy Mayorga (baterias), Gary Chester (guitarra) e Steven Shane McDonald (baixo).
Das bandas que conseguiram fama na onda de Seattle, Melvins era a que mais tentava ganhar os fãs no susto. Dedicaram-se a fazer canções de hard rock aterrador (o tal do sludge metal, em sua pureza), ao contrario de seus colegas. O Nirvana só foi se tornar uma banda realmente gritalhona no fim da carreira, o Mudhoney era protopunk + rock de garagem dos anos 1960. Em discos como Houdini (1993), Stoner witch (1994) e (A) Senile animal (2006), a ideia do grupo era construir cenários musicais nos quais ninguém gostaria de morar, com direito a uso de paredes de guitarra e duas baterias.
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Nem tudo dos Melvins é realmente necessário de ouvir, ou bom de verdade, já que a fórmula foi perdida durante vários discos que soavam mais como caricaturas – Pinkus abortion technician, disco de 2019 repleto de covers, tinha uma versão de I wanna hold your hand, dos Beatles, que não servia sequer como afronta. Tarantula heart, o novo, põe o grupo nos eixos oferecendo 40 minutos de terror psicodélico. Já rola logo na primeira faixa, Pain equals funny, vinte minutos de pancada sonora, com uma letra que parece revirar seres humanos do avesso.
O novo disco da banda parece se inspirar numa receita musical que tem mais a ver com grupos como Faust e Suicide do que com punk, metal ou coisas do tipo. Allergic to food é o momento Minstry do disco, mas sem eletrônica. She’s got weird arms tem guitarras maníacos e ritmos quebrados percorrendo os quase quatro minutos da faixa. Já Working the ditch é metal arrastado e de poucos amigos (e poucos acordes), a cara de discos do grupo nos anos 2000. E Smiler é a faixa mais prototipicamente metal do álbum. Disco curto e conciso mesmo nas canções grandes, para ouvir muito barulho.
Nota: 8
Gravadora: Ipecac
Crítica
Ouvimos: Nova Twins – “Parasites & butterflies”

RESENHA: No terceiro álbum Parasites & butterflies, Nova Twins misturam rap-metal, r&b e peso noventista em faixas cheias de atitude.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Marshall Records
Lançamento: 29 de agosto de 2025.
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Tem quem já tenha falado que Nova Twins é a mistura perfeita de Spice Girls e Rage Against The Machine – até faz sentido, mas o lance ali é mais assustador que essa combinação, em termos de norte atitudinal e peso musical. No terceiro álbum, Parasites & butterflies, há uma combinação de beleza e susto no título, e uma receita sonora própria do metalcore em faixas como Glory, Piranha e Parallel universe, além do jungle de Drip.
- Ouvimos: The New Eves – The New Eve is rising
Aliás, quase todo o disco é baseado numa receita certeira de rap-metal para rodas de pogo. Que rende também proximidades com o r&b nas ótimas Soprano (pop do mal, pesado e distorcido, que lembra o peso dos anos 1990), Monster e Sandman. Ou em Hide & seek, um dos raros momentos não tão interessantes do álbum, marcada pelo empoderamento e pelos versos espertos na letra (“você não pode me pegar / eu corro, você me segue”).
Das experimentações realizadas por Amy Love e Georgia South, as que mais chamam a atenção são a vibe Body Count de N.O.V.A., o metal-gospel de Hummingbird (a melhor do disco) e a auto-homenagem do funk-house-metal Black roses. Tudo é feito com tanta personalidade que em vários momentos de Parasites & butterflies, as duas poderiam descambar para o nu-metal ou algo parecido. Acaba não rolando porque, no rolé das Nova Twins, só vale peso quando tem memória e balanço. Felizmente.
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Crítica
Ouvimos: David Byrne – “Who is the sky?”

RESENHA: David Byrne lança Who is the sky?, disco irregular mas envolvente, entre boas histórias, ecos de XTC e Beatles e momentos de otimismo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Matador
Lançamento: 5 de setembro de 2025
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Falando em primeira pessoa: tive sentimentos conflitantes ouvindo este Who is the sky?, novo disco de David Byrne gravado ao lado da Ghost Train Orchestra. Vi isso consultando minhas anotações (sim, eu ouço discos anotando, à mão). Por exemplo: não pude deixar de exclamar um animado “caralho, que foda isso!” ao lado de I met the Buddah at a downtown party, uma canção bonitinha que Byrne fez contando a história de um sujeito que viu Buda cometendo excessos numa festa.
David Byrne sempre foi bom contando histórias, desde o comecinho dos Talking Heads – e sempre foi bom em achar o melhor caminho para fazer com que elas chegassem ao público. Só que lá pelas tantas bateu um certo ranço: será que Who is the the sky? é tudo isso aí mesmo? E o “pensa bem” veio acompanhado de algumas constatações. Uma delas é a de que mesmo o que há de bom em Who is the sky? soa meio repetido: Byrne parece ter se inspirado MUITO em Day in, day out, do XTC, para fazer When we are singing, e juntou elementos de She’s leaving home, dos Beatles, em A door called no. O tipo de coisa que você talvez desculparia no Oasis, mas aqui não rola.
Tem as letras: Who is the sky?, na real, varia entre o otimismo e o papo de coach. Isso rola quando Byrne fala sobre as portas fechadas da vida (A door called no), sobre como a criatividade das pessoas vai sendo podada (Don’t be like that) e até sobre como as paredes de um apartamento podem contar histórias (My apartment is my friend). Na real, fica até a expectativa de que Byrne aprofunde o discurso de boa parte dessas letras em algum outro canto – numa entrevista, numa newsletter, ou sei lá o quê – porque são histórias que, ao jogarem a bola para o/a ouvinte concluir, soam incompletas. Aliás, essa incompletude é comum a vários discos de Byrne, com boas ideias que atiram para vários lados.
- Ouvimos: The Who – Live at The Oval 1971
Como artista solo, Byrne nunca perdeu a vibe maníaca que ele desenvolveu na época dos Talking Heads – uma coisa de brincar com os próprios sentimentos, sensações e constrangimentos, e jogar tudo nas músicas. É o que surge na vibe comemorativa de Everybody laughs, e também nas lembranças de Beatles e Wings de When we are singing e The avant garde. O ragga The truth mexe numa ferida aberta universal (“a verdade é a última coisa que um homem quer ouvir”, diz a letra) e acaba deixando o otimismo de lado para bater forte. Tem ainda o folk beatle-beachboy She explain things to me e a latinesca What’s the reason for it? (com Hayley Williams), que mantêm o astral do disco – e funcionam bem.
Byrne é sempre um bom encantador de serpentes: você passa até por cima das falhas de Who is the sky?, e de um certo ranço pessoal com a figura proeminente-àààà-beça dele, porque fica bem difícil resistir a um disco que, em 2025, tem evocações do XTC. Ou porque o clima pastoril de algumas músicas acaba ganhando. E isso tudo, ainda que você estivesse esperando ver alguma estrutura sendo abalada com um disco novo dele – aliás, vale citar que o próprio Byrne, no release de lançamento, explica que o principal assunto de Who is the sky?, é ele próprio, suas circunstâncias e trabalhos colaborativos.
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Crítica
Ouvimos: Mateo – “Neurodivergente”

RESENHA: Em Neurodivergente, Mateo (ex Francisco El Hombre) estreia solo com coragem, misturando pop latino, rock e dores pessoais em canções intensas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Dorsal Lab
Lançamento: 7 de julho de 2025.
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Um dos fundadores da banda Francisco El Hombre, o mexicano naturalizado brasileiro Mateo Piracés-Ugarte estreia solo com Neurodivergente pegando em fios pessoais de altíssima tensão. O músico convive com o diagnóstico de bipolaridade tipo 1, depressão e traços de borderline, além de ser adicto em recuperação, e jogou toda essa vivência nas letras do álbum. Foi preciso bastante coragem para expor vulnerabilidades, problemas pessoais e golpes da vida – como ele próprio confessou em entrevista à revista Noize. Tanto que, analisando bem, Neurodivergente é um disco depressivo cuja elaboração passou por certos filtros para que os gatilhos fossem mais leves, e que o contato com a própria dor de Mateo fosse mais atenuado.
- Ouvimos: La Dispute – No one was driving the car
- Ouvimos: Bella e o Olmo da Bruxa – Afeto e outros esportes de contato
Assim, até mesmo uma autoconfessa carta de suicídio, Ato final, soa inicialmente apenas como uma canção bastante dramática e eletrônica, com ritmo dado pelos samples de voz – até que a ficha cai. Neurodivergente prossegue numa onda que mistura rock, pop latino, eletrônicos e tons da música brasileira, como no desespero de É o que é (“o que foi já não voltará a ser, eu sei”), nas respirações e tosses da acústica Una vez más e na rotina desgastada do pop cabisbaixo de Apenas mais um triste.
O pop latino e intenso La insanidad é o walk on the wild side do disco, com Mateo narrando o tempo em que circulou na cracolândia paulistana e viu de tudo um pouco. “A insanidade / é uma arma para sobreviver ao medo”, canta, falando de um sentimento mais do que conhecido até de quem nunca pisou no redutos de drogas das grandes cidades. Me salva (Por solo un minuto), um pedido de ajuda musicado, tem muito do calor do rock argentino. No final, a vibe emo-pop-gospel de Querida, música de superação falando em depressões, bipolaridades e tudo o que vem junto.
***
Neste sábado (4), Mateo lança Neurodivergente no Armazém do Campo (Alameda Nothmann 806, Campos Elíseos, São Paulo), às 16h. Além do show, vai rolar um bate-papo sobre saúde mental com a psicóloga Mari Pontes, da rede CAPS e do projeto Nós na Rede. “O evento é gratuito e traz uma proposta que vai além da música: aproximar arte e saúde mental em um espaço de diálogo aberto”, diz o release.
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