Crítica
Ouvimos: Bartees Strange, “Horror”

Bartees Strange une sonoridades como indie rock, jazz e hip hop, além de uma paixão pelo estranho. O norte-americano de Oklahoma já transitou por cenas como folk e pós-hardcore, e volta e meia deixa claro que o noise-rock é peça fundamental na construção de sua música – não deve ser coincidência que ele grave pela 4AD, aliás. Em seu terceiro álbum, Horror, ele junta tudo isso aí em prol de uma música variada, e que aponta para manifestações aterrorizantes do dia a dia: isolamento (não havia muitas pessoas negras no Oklahoma quando ele foi criado por lá), racismo, pés na bunda, coisas do tipo.
O lado noise-rock dele indica que em quase todas as músicas do álbum sempre haverá uma explosão no refrão, depois de um momento de quietude. Um exemplo é o indie rock intenso e emotivo de Wants needs, que transborda alma e carrega uma veia forte de influência de David Bowie e Prince. O som, por sua vez, abarca soul experimental, detalhes de rap (em clima old scholl na faixa Hit it quit it) e coisas que parecem fazer lembrar o quanto o já citado Prince era fã de Joni Mitchell, como o soft rock de Sober, 17 (esta, uma das músicas mais mais-ou-menos do disco), Loop defenders e Baltimore. A produção foi feita por um cara tão eclético quanto Bartees é: ninguém menos que Jack Antonoff.
O excesso de referências e voos estilísticos em Horror foram mal compreedidos por jornais como o The Guardian, que considerou o álbum “frustrante” e descascou: “Todas essas 12 faixas têm algo a elogiar, mas há uma incapacidade persistente de transformar momentos fugazes em uma música envolvente”. Não exatamente: Horror consegue manter uma boa unidade mesmo reunindo sons ruidosos ao lado de canções como o soul-gospel-rock Lie 95, a house music sombria Lovers e a bossinha nova discreta Doomsday buttercup. Já Backseat bantom, encerrando o disco, traz o sacolejo do soul e o peso do rock unidos e em equilíbrio. Pelo menos do ponto de vista em que a gente enxerga Horror, ainda que nem tudo seja perfeito, Bartees persegue o envolvimento com o ouvinte durante todo o álbum – e chega lá na maioria das vezes.
Nota: 8
Gravadora: 4AD
Lançamento: 14 de fevereiro de 2025.
Crítica
Ouvimos: The Lumineers, “Automatic”

Curto, tranquilo e girando em torno de variações do alt-country, Automatic, o novo disco do duo norte-americano The Lumineers (Jeremiah Fraites e Wesley Schultz são os integrantes), é um álbum carregado na ironia fina – e ela suplanta, muitas vezes, a própria nova seleção de melodias da dupla, que nem sempre acerta no alvo.
No álbum, dá para destacar a abertura com Same old song, country com referências de punk e até de emo, fala sobre insucessos, canções tristes e lança mão de versos como “ei, mamãe, você pagaria meu aluguel? / você me deixaria ficar no seu porão? / porque qualquer um de nós poderia fazer sucesso ou poderia acabar morto na calçada”. A auto-explicativa Asshole é marcada por um piano nostálgico e alguma grandiloquência, com letra falando de um desencontro bem estranho: “a primeira vez que nos encontramos / você me achou um babaca / provavelmente está certa”.
O lado melódico-ao-extremo do pós-britpop bate ponto na faixa-título e em You’re all I got, e também no piano “voador” de Sunflowers, cujo arranjo impressiona pela beleza. So long tem um clima mais classic rock e estradeiro que o resto do disco, com um arranjo que cresce e vai ganhando outros elementos. A doçura do grupo dá aquela enjoadinha básica no country-gospel de Plasticine e patina de vez nas acústicas e chatinhas Ativan e Keys on the table – para recuperar tudo na mistura de despojamento e rigor pianístico quase clássico de Better day, um anti-hino ao vazio que rege a vida de muitas pessoas (“sonhando com dias melhores / assistindo pornô e programa de imóveis na TV”).
Nota: 7
Gravadora: Dualtone
Lançamento: 14 de fevereiro de 2025.
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Crítica
Ouvimos: Tátio, “Contrabandeado”

A estreia solo do mineiro Tátio, produzida por Chico Neves, é um disco curto, direto, que poderia ter sido lançado pela antiga CBS em 1979 ou 1980 – ou seja: quando revelações da MPB eram lançadas a todo momento e encontravam espaço no rádio e nas trilhas de novela. Contrabandeado é um disco de afirmação, que fala sobre progresso sem regalias, amores fluidos e liberdade (sexual, inclusive) nas grandes cidades.
O tom quase mangue-bit de Radar é emoldurado por versos que dizem “vai ser difícil de controlar/tudo o que vive debaixo do sol”. A democracia e a fartura aparecem no samba-reggae-forró Será que eu sou louco. A MPB mineira clássica é evocada em Seres distantes e na meditativa Anhangabaú. A psicodelia surge no tom mutante do blues Sonho antigo e no ambient brasileiro da faixa-título.
A voz impressionante de Tátio ganha destaque em faixas como a balada do ex bem resolvido Longe de mim (com Zeca Baleiro como convidado) e o forrock apocalíptico de Reza milagreira, que ganha uma excelente participação de Juliana Linhares, e um arranjo em que o uso de eco faz parte do cenário. Contrabandeado é uma renovação da MPB da era da abertura, e um disco que funciona como vingança do oprimido.
Nota: 9
Gravadora: Estúdio 304
Lançamento: 29 de janeiro de 2025.
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Crítica
Ouvimos: Pedra Lunar, “O caminho rumo ao infinito”

Banda psicodélica de Novo Hamburgo (RS), o Pedra Lunar é um quarteto formado por Gabrieli Kruger (voz e percussão), Bruno A. Henneman (guitarra e backing vocal), Leonardo Winck (baixo e backing vocal) e Felipe Frodo (bateria, percussão e backing vocal). O caminho rumo ao infinito, primeiro álbum do grupo, revela uma sonoridade que quase sempre está mais para 1966 do que para 1968. Algo entre o mod e o psicodélico em faixas como Tudo está no lugar, a quase-faixa título Caminhando rumo ao infinito (esta, com vocais bastante criativos), Livres por aí e Eterna juventude – essa última, com piano lembrando Nicky Hopkins (Rolling Stones) e clima herdado não só de Kinks como do começo do glam rock (David Bowie, T Rex).
Aumentando a variedade do som, o Pedra Lunar ganha tons progressivos em Chuva passageira, clima estradeiro e rock-barroco em Toda essa confusão, vibe entre o power pop e o country rock em Dias de inverno e um som entre Bob Dylan e Raul Seixas em Eu também quero voar. O saldo do disco do Pedra Lunar é bem positivo e promissor, e pega direto na veia de quem curte rock brasileiro setentista, por causa das letras e da argamassa vintage.
Nota: 7,5
Gravadora: Áudio Garagem
Lançamento: 14 de dezembro de 2024.
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