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Cultura Pop

Várias coisas que você já sabia sobre Fun House, dos Stooges

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Várias coisas que você já sabia sobre Funhouse, dos Stooges

O produtor Don Gallucci, que cuidou das gravações de Fun house, segundo disco dos Stooges (1970), já tinha visto a banda ao vivo antes de gravar o disco. Mas só percebeu onde estava se metendo quando Iggy Pop (voz), Ron Asheton (guitarra), Dave Alexander (baixo), Scott Asheton (bateria) e Steve Mackay (sax) entraram no estúdio da Elektra, em Los Angeles, em 11 de maio de 1970.

As paredes do local (que tinha o que havia de melhor em aparelhagem de som) costumavam abrigar gravações de artistas bem mais tranquilos e técnicos. Os Stooges, no entanto, chegaram dispostos a fazer o disco mais sujo e agressivo já feito no mundo, com guitarras no talo e várias distorções. “Isso é um pesadelo!”, chegou a afirmar Gallucci, que por sinal foi tecladista dos Kingsmen, banda cuja gravação de Louie Louie é tida como quase um pré-punk (e influenciara os Stooges). Entre mortos e feridos, surgiu dali um dos discos mais barulhentos da história do rock, e que completou 50 anos em julho.

Várias coisas que você já sabia sobre Funhouse, dos Stooges

O aniversário de Fun house aumentou há pouco a discografia dos Stooges. A Rhino pôs nas lojas uma caixa comemorativa incluindo o disco original em vinil duplo, masterizado em 45 rpm, além de treze (!!) LPs com tudo o que foi gravado nas sessões.

FUN HOUSE – 50 ANNIVERSARY

Já o selo Third Man, de Jack White, pôs nas lojas o disco Live at Goose Lake – August 8th 1970, com um dos shows mais significativos da época do lançamento do disco, dado no festival de Goose Lake (em Jackson, Michigan), onde tocaram também Jethro Tull, Chicago, Faces, Bob Seger, MC5. Uma gravação do evento foi descoberta e o disco pôde finalmente chegar às lojas (e às plataformas digitais).

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E isso aí é um pouco da história de Fun house.

LADO A/LADO B. Um sobrevoo rápido pelo conteúdo de Fun house. O primeiro lado tem Down on the street (uma das melhores aberturas de disco do mundo), segue com a sacana Loose, com TV eye (cuja letra fala do interesse de Iggy pela irmãzinha dos dois Asheton) e Dirt (que lembra vagamente Doors, mas sem teclado, com baixo e groove). No lado B, 1970 (lançada em single como I feel alright, e uma resposta a 1969, do primeiro disco), Fun house (free jazz com punk, com participação ativa de Mackay no sax) e LA blues (tentativa de reproduzir uma jam barulhenta que encerrava os shows da banda).

VIDA SAUDÁVEL. Tudo o que está impresso nos sulcos de Fun house foi iniciado por quatro dos Stooges (Iggy, Alexander e os irmãos Asheton) quando todos decidiram morar numa casa numa região semiabandonada de Ann Arbor, Detroit. O local tinha vários quartos gigantescos, um enorme porão e um milharal (!) na parte de trás. Por acaso, os Stooges pagavam a bagatela de US$ 325 por mês para morar lá.

VIDA SAUDÁVEL (2). O dia a dia dos Stooges na casa, segundo o próprio Iggy Pop, consistia nisso. “Havia uma cozinha, sala de recreação, sala de TV, sala de ensaio, dois quartos adequados, dois apartamentos separados e um sótão e porão reformados. Seis de nós dormíamos lá, a maior parte do tempo. Havia muito consumo de drogas, boa escrita e um pouco de ensaio naquela casa que mais tarde ficou conhecida como The Fun house após o álbum”, afirmou.

CLIPE. Foi nos fundos da casa, com o milharal de cenário, que Nico gravou em 1969 o clipe da assombrosa The evening of light. Por sinal, o filme, feito pela Elektra para alavancar as vendas do disco Marble index (1968), trazia Iggy como figurante de luxo (você já leu sobre isso no POP FANTASMA). Nico teve um namoro de curta duração com Iggy e chegou a morar na Fun house na época.

PRODUTORES REJEITADOS. A Elektra chegou a considerar alguns outros nomes antes de Don Gallucci virar o produtor de verdade do disco. Meio cansados da associação com MC5 e Velvet Underground, decidiram não apostar novamente em John Cale, do Velvet, que produzira The Stooges (o primeiro disco, de 1969). Jim Peterman, tecladista de Steve Miller e produtor da Elektra, foi cotado pela gravadora. Jackson Browne, que começava carreira de cantor e compositor folk (e também tinha namorado Nico), incrivelmente, também esteve entre os nomes. Eddie Kramer, que cuidara de discos de Jimi Hendrix, também foi cogitado pelo selo. Mas a banda recusou todos.

DON. Além de ter sido tecladista dos Kingsmen, Gallucci – mais uma vez sugestão da gravadora – tinha produzido recentemente um hit para a Elektra. Era a novata banda Crabby Appleton, com Go back. A Elektra emitiu uma passagem para Gallucci assistir a um show da banda em Nova York. O produtor achou que o som dos Stooges fosse “música maquínica” e não gostou de imediato.

“GO BACK” – CRABBY APPLETON

DEU (ER) BOM. Os Stoones gostaram do fato de Don ter tocado nos Kingsmen (Louie Louie costumava ser tocada pela banda) e já tinham visto o produtor na TV com a banda Don And The Good Times. Don, que achava o som dos Stooges incapaz de ser gravado em estúdio e já tinha avisado isso à gravadora, encarou o trabalho como obrigação profissional. Aliás, elegeu Ron Asheton como seu interlocutor na banda, por achar Iggy maluco demais.

TECLADO. Gallucci tocou órgão numa versão de Down on the street que foi sacada do LP mas acabou lançada como single.
“DOWN ON THE STREET” – SINGLE

DORGAS, MANO. Iggy seria apresentado à cocaína no decorrer do processo de Fun house – seu padrinho no pó foi ninguém menos que Danny Fields, assessor de comunicação da Elektra. Quando foi apresentado a Gallucci e começou o disco com os Stooges, seu negócio era ácido em grandes quantidades. Por sinal, a dificuldade de se comunicar com o produtor vinha do excesso de LSD. Mais tarde, com Fun house já nas lojas, a heroína viraria a droga da vida de Iggy. Que viraria até traficante para sustentar o vício.

COMANDANTE. Quase todo mundo que conversou com Iggy na época de Fun house lembra que boa parte do disco vinha de criações do vocalista, que parecia ter todo o disco na cabeça. O cantor lembra que Ron, guitarrista, não estava sendo tão prolífico porque tinha arrumado uma namorada.

“Eu escreveria um número que achasse que o grupo tocaria bem, traria do meu quarto no sótão e tentaria ensaiar. Uma vez que estivesse sólido, tocaríamos em nossos shows no fim de semana”, lembra Iggy.

MANUAL NO LIXO. Vendo que não dava para gravar os Stooges de forma convencional, Gallucci decidiu tratar Fun house de maneira diferente. E embarcou, a seu modo, na loucura da banda. Botou todos para tocar ao vivo, pôs um microfone na mão de Iggy (em vez do procedimento normal de estúdio) e um PA para o grupo se ouvir.

ENGENHEIRO DE SOM. Brian Ross-Myring, técnico de som do disco, vinha da velha-guarda dos estúdios americanos. E já tinha meia idade quando Fun house começou a ser feito. Fontes garantem que seu último trabalho antes do disco dos Stooges foi com Barbra Streisand. Fuçando rapidamente no Discogs, não se acha o nome dele relacionado a nenhum disco da cantora. Ross-Myring foi fundamental para não deixar a turma perder totalmente a linha no estúdio. “Uma guitarra deve soar como uma guitarra e um sax como um sax. Brian conseguiu isso e também aumentou o calor que buscávamos”, recordou Gallucci.

SAX PUNK. A história de como Steve Mackay entrou (embora não totalmente) para a turma dos Stooges é pitoresca. Ele trabalhava na mesma loja de discos na qual Iggy havia trabalhado anos antes, a Discount, e era amigo do cantor. Foi chamado em cima do laço para viajar para a Califórnia e se juntar à equipe.

“Quando cheguei lá, era óbvio que ele tinha um plano. Me pedia: ‘Toque algo como Maceo Parker no ácido!’. Daí, elaboramos Funhouse e 1970. Eu fiz alguns shows com eles e me apaixonei pelo resto das músicas também”, recordou Mackay, que morreu em 2015.

DESPEDIDO. Mackay, apesar de listado na contracapa como integrante da banda, não aparece nas fotos do disco. Ele foi demitido da banda alguns meses após os primeiros shows de Fun house. Até morrer, afirmava que o pé na bunda tinha sido a melhor coisa que lhe aconteceu, graças aos problemas que os Stooges passariam a enfrentar. “Eu até recuperei meu emprego na loja de discos”, conta.

DROGAS E ORGIA. Na Califórnia, durante a gravação de Fun house, a banda fez shows no Whiskey A Go-Go, em San Francisco. Iggy se entupiu de drogas, foi parar numa orgia gay do grupo de teatro Les Cockettes, se envolveu com prostitutas (uma delas de 14 – ! – anos) e se aproveitou da amizade com Augustus Owsley Stanley III, guru americano do LSD, para passar o tempo todo viajando. De volta a Los Angeles, a banda sentou praça no Tropicana Motel, em West Hollywood, e vivia em festas com as mais variadas groupies. Andy Warhol, que vivia ali pelo hotel, tentou se aproximar da banda, mas não fez sucesso.

VENDAS. Fun house conseguiu vender mais que o primeiro disco, mas não balançou os cofres da Elektra e os Stooges não passariam muito tempo mais lá.

GOOSE LAKE. Os Stooges estavam entre os artistas que tocariam nesse festival. O show acabou rolando de forma bastante problemática, com Iggy apagando no palco por causa do excesso de drogas, e Alexander travando por causa de uma quantidade surreal de maconha e bebida. Iggy demitiu o baixista imediatamente alegando que ele não tocara nada no show. A gravação lançada agora pelo Third Man revela que, sim, Alexander tocou.

“1970 (I FEEL ALRIGHT)”

E NO BRASIL? Fun house não foi lançado aqui de imediato. Chegou às lojas brasileiras apenas em 1982, numa edição da Warner nacional.

MACKAY. O saxofonista de Fun house morreu de verdade em 2015. Mas boatos sobre uma suposta “morte” sua já circulavam havia tempos. Biografias dos Stooges publicadas em sites grandes afirmavam que ele havia morrido de overdose nos anos 1970 ou de aids. Enfim, em 1999, Steve começou a fazer gravações solo e as notícias falsas foram desmentidas. Depois trabalhou com os Violent Femmes e até com os próprios Stooges.

MAIS BRASIL. A formação com Mackay tocou no Brasil,em 2005, no festival Claro Q É Rock. Mike Watt estava no baixo.

E já que você chegou até aqui, pega aí uma música que sampleou a introdução de Loose, do Fun house. Nada menos que Manguetown, de Chico Science & Nação Zumbi. Presta atenção no começo de uma e no fim de outra.

Com informações de Mixonline, Punk Globe, Poeira Zine e do próprio Iggy Pop. E do livro Open up and bleed, a vida e a música de Iggy Pop, de Paul Trynka.

Veja também no POP FANTASMA:
– Demos o mesmo tratamento a Physical graffiti (Led Zeppelin), a Substance (New Order), ao primeiro disco do Black Sabbath, a End of the century (Ramones), ao rooftop concert, dos Beatles, e a London calling (Clash).
– Demos uma mentidinha e oferecemos “coisas que você não sabe” ao falar de Rocket to Russia (Ramones) e Trompe le monde (Pixies).

Cultura Pop

Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Cultura Pop

Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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