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Cultura Pop

Várias coisas que você já sabia sobre End Of The Century, disco dos Ramones

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Várias coisas que você já sabia sobre End Of The Century, disco dos Ramones

Em 1980, os Ramones não eram mais novidade. Joey (voz), Johnny (guitarra), Dee Dee (baixo) e Marky Ramone (bateria) tinham gravado quatro discos, perdido a chance de se tornar a maior banda punk do mundo (Rocket to Russia, de 1977, foi atropelado em prestígio e vendagens por Never mind the bollocks, estreia dos Sex Pistols) e precisavam passar a vender discos.

Nem todo mundo na banda acreditava tanto assim no sucesso (o baixista Dee Dee Ramone sempre achou que o grupo fosse condenado ao fracasso), mas o grupo resolveu fazer uma tentativa convidando o produtor Phil Spector para cuidar do quinto disco, End of the century, lançado em 4 de fevereiro de 1980. E que acaba de fazer 40 anos.

TÁ FODA. Um ano antes do lançamento de End of the century, em fevereiro de 1979, Joey Ramone era a imagem do desencanto, durante uma entrevista à Rolling Stone. “Estou cansado de não vender discos”, queixou-se num papo de camarim com o jornalista Timothy White. “Quero atrair mais pessoas aos shows. Se o novo álbum não for um sucesso, me mato”.

JÁ TAVA ROLANDO. O jornalista Roy Carr garantiu em entrevistas que Phil já andava interessado nos Ramones em 1977, na época de Rocket to Russia. O produtor era fã da voz de Joey Ramone e a achava parecida com o a do astro pop ítalo-americano Dion DiMucci. Após cada disco lançado (e já sabendo que a banda tinha vendagens pífias), costumava ligar para a banda fazendo ofertas.

SELO. A ideia de Phil era que o grupo saísse da Sire e fosse para seu selo, com Roy empresariando o grupo. A banda nunca aceitou. Mas topou ser produzida por ele.

DIFÍCIL. Phil, hoje todo mundo sabe, sempre curtiu armas. Só que além do passatempo perigoso, o produtor costumava ir armado para o estúdio, além de levar guarda-costas. Apontou armas para John Lennon na gravação do disco Rock’n roll (1975) e para Leonard Cohen enquanto produzia Death of a ladies man (1977). “Havia muitas armas no estúdio e muita bebida, uma atmosfera um tanto perigosa. Ele também tinha guarda-costas fortemente armados. Ele gostava de armas – eu também gostava, mas geralmente não carrego uma, e é difícil ignorar uma 0,45 no console. Quando eu estava trabalhando com ele sozinho, era muito agradável, mas quanto mais pessoas na sala, mais selvagem Phil ficava”, chegou a lembrar Cohen.

TERRITÓRIO DO CHEFE. Os Ramones começaram a gravar End of the century no estúdio Gold Star, quartel-general de Phil desde os anos 1960 e local onde ele desenvolveu o Wall Of Sound (enfim, a “parede” de overdubs que usava em suas canções). Tem quem lembre que Joey Ramone quase desmaiou quando descobriu que o Who gravou I can see for miles lá. Os Beach Boys também conceberam Pet sounds no estúdio.

EITA. Phil, na real, reservou três estúdios para gravar o disco. E em busca de um enorme perfeccionismo, botou os Ramones para repetir as músicas do álbum inúmeras vezes. Ed Stasium anotou que This ain’t Havana foi repetida 300 vezes.

TÁ OUVINDO? Phil gostava de som alto. Bom, alto é apelido: ele mandava botar o volume da sala de controle em 130 decibéis e só se comunicava com o técnico de som, oi mitológico Larry Levine, por gestos. Isso causou estados que iam da irritação à paranoia em quase todo o mundo durante as gravações.

NINGUÉM TAVA OUVINDO. “O Phil tocava as gravações em um volume tão ridiculamente alto que ninguém podia dizer nada. Ele tinha um jeito de conversar com o Larry em que ele batia o pé no chão, pulava para cima e para baixo e tinha essa estranha linguagem de sinais. Se ele quisesse mais reverb em alguma coisa, ele passava a língua na mão. Ele ficava cuspindo no console, xingando e gritando. Então ele ia ao banheiro e voltava uma pessoa completamente diferente”, contou o diretor musical do disco e uma espécie de intermediador entre Phil e a banda, Ed Stasium, no livro Na estrada com os Ramones, de Monte Melnick e Frank Meyer.

O MESMO ACORDE. Com a ideia de conceber uma abertura apoteótica a la A hard day’s night (Beatles) para Rock´n roll high school, Phil Spector fez exatamente aquilo que você já ouviu falar: botou Johnny Ramone para tocar o acorde inicial da música por oito horas. “Ninguém mais ouvia a diferença”, reclamou o guitarrista, que quase deixou o grupo. Ed Stasium negou e disse que nunca houve isso das oito horas. “O Johnny fez parecer como se tivesse ficado lá por oito horas, mas provavelmente foram umas duas horas. Mas era um tempo interminável para fazer um acorde”, contou no livro Na estrada com os Ramones, de Monte Melnick e Frank Meyer.

ARMAS. Diz a lenda que Phil também apontou um revólver para Dee Dee Ramone. E mandou a banda ir para a sala de piano do estúdio – depois obrigou todos a ouvirem o produtor tocando Baby I love you até 4h da manhã. Marky diz que nunca viu essa cena.

NEM TANTO. Havia vozes discordantes na banda sobre se Phil era uma presença benéfica ou não. Dee Dee e Johnny brigaram muito com ele, e o guitarrista detestou End of the century. Marky curtia sair com o produtor e seus seguranças à noite para beber e Joey o idolatrava – mas já estava cansado das bebedeiras do produtor, além das loucuras que vinham depois.

NA TV. O verso “hanging out on 100B, watching Get smart on TV” de Danny says é uma das lembranças de Joey Ramone de quando dividia o quarto com o gerente de turnê dos Ramones, Arturo Vega. “100B era o nosso quarto, às vezes dividíamos o quarto”, lembrou no livro Hey ho, let’s go, a história dos Ramones, de Everett True. Get smart, por sua vez, era a boa e velha série Agente 86, que os dois assistiam.

HOMENAGEM. A música era uma dupla homenagem: a Danny Fields, primeiro empresário da banda, e a Lou Reed (autor de canções como Caroline says e Lisa says). Danny, junto com Linda Stein, ficaria com o grupo até a época de End of the century e foram trocados pelo agressivo Gary Kurfirst. Danny limitou-se a declarar que entendia o fato da banda ter trocado o time, já que nunca hyaviam vendido discos.

“CHINESE ROCK”. Gravada em End of the century, essa música era uma parceria de Dee Dee Ramone com Richard Hell, na época em que o cantor fazia parte dos Heartbreakers, banda liderada por Johnny Thunders (ex-New York Dolls). Chegou a rolar uma controvérsia sobre se Hell contribuiu mesmo para a música, embora seja aceito que Dee Dee tenha composto quase toda a canção e o parceiro tenha colocado apenas uma frase. A música, que falava sobre o vício em heroína, já tinha até ganhado uma versão dos Heartbreakens na estreia L.A.M.F (1977), gravada depois que Richard Hell já havia saído do grupo – só que o nome era Chinese rocks, com um “s” no final.

 

REAPROVEITAMENTO. End of the century tinha The return of Jack and Judy, que reaproveitava os personagens de Judy is a punk. Para essa música, Phil convidou um grupo de batedores de palmas (!) para marcar o ritmo. Marky Ramone achou a ideia cafona.

“BABY I LOVE YOU”. O hit das Ronettes, regravado pelos Ramones, virou uma das faixas mais reconhecíveis de End of the century. Para desespero da banda, que detestou ser associada à faixa. E só para piorar, a versão entrou no Top 10 da Inglaterra e abriu espaço para os Ramones em vários países da Europa. O grupo foi, constrangidíssimo, dublar a faixa no Top of the pops.

QUASE NINGUÉM. Baby I love you só teve participação de um integrante dos Ramones: Joey Ramone. Phil não convocou nenhum outro ramone e botou sua velha turma de músicos para tocar: Jim Keltner na bateria, Barry Goldberg nos teclados, entre outros membros do chamado Wrecking Crew.

TÔ LIGADO. Dee Dee Ramone, viciadíssimo em heroína na época, diz que não faz ideia de quem tocou baixo no disco, nem sequer se recorda de ter participado. Marky garante que o ex-colega esteve lá, sim. “Minha memória é boa”, assevera.

CAPA. A foto de End of the century foi clicada por Mick Rock (que deu a ideia das roupas coloridas) e não deixou todo mundo da banda feliz. Johnny Ramone odiou que, pela primeira vez, a banda aparecesse numa capa de disco sem casacos de couro.

DUZENTOS MIL DÓLARES. Foi o quanto custou o disco no fim de todo o trabalho. Phil Spector passou seis meses (!) remixando o álbum. Foi o disco mais caro da primeira fase da banda.

E TEVE “DO YOU REMEMBER ROCK´N ROLL RADIO?”. Se você desconhecia alguns dos personagens da musica de abertura de End of the century – que ganhou um clipe bem simpático – a gente te ajuda. Ol’ Moulty era  Victor “Moulty” Moulton, o baterista da banda de garagem americana The Barbarians, sucesso nos anos 1960 com Hey little bird. Murray The K foi um empresário e DJ de rock conhecido nos anos 1960, e um dos primeiros amigos e apoiadores dos Beatles. Hullabaloo era uma revista musical exibida na NBC entre 1965 e 1966. Shindig era um programa parecido exibido pela ABC. Upbeat era outra revista musical da ABC, exibida entre 1964 e 1971. O resto (T. Rex, John Lennon, Ed Sullivan) você sabe, né?

Cultura Pop

Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Cultura Pop

Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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