Lançamentos
Radar: Lucy Dacus, Horsegirl, Suzanne Vega e mais 5 sons lá de fora

Tem duas guinadas sonoras inesperadas no Radar internacional de hoje: uma voz folk que aderiu ao punk, e um metaleiro que se voltou para o rock sulista dos anos 1970. Vale citar, por acaso, que a variedade é uma meta que tem sido defendida por muita gente nos dias de hoje: em vez de se fechar num só nicho, o lance é criar coisas novas, ousar bastante e fazer o que você nunca fez na vida – e sempre quis fazer. E tá aí o nosso passeio semanal pelos sons internacionais que têm rolado por aqui…
(na foto, Lucy Dacus)
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
LUCY DACUS, “BEST GUESS”. Indie pop agridoce, uma aura de mistério e um clipe que parece saído direto de um intervalo comercial dos anos 1990—essa é a receita de Best guess, a nova amostra do próximo disco de Lucy Dacus, Forever is a feeling, que chega em 28 de março. No vídeo, que evoca os inesquecíveis anúncios da Calvin Klein daquela década, brotam rostos conhecidos como Naomi McPherson (da banda MUNA), Cara Delevingne e Towa Bird. Mas não só: algumas aparições vieram direto de uma chamada de elenco feita por Lucy no TikTok. É a estética vintage dialogando com a era digital — e funcionando muito bem.
HORSEGIRL, “FRONTRUNNER”. Folk setentista e indie rock dos tempos atuais se encontram no novo single do Horsegirl, Frontrunner. A faixa antecipa Phonetics on and on, novo álbum do trio de Chicago, que chega na sexta (14). Guitarra, violão e uma percussão delicada embalam a melodia romântica, cantada como se fosse uma serenata à beira da fogueira. O clipe, por sua vez, é puro dia-a-dia: compras de supermercado, cafés preguiçosos e passeios de carro transformam-se em cenas de um filme caseiro.
COMMUNIONS, “NOT A PHASE”. O Communions chegou discreto com seu novo single, Not a phase, mas vale prestar atenção: piano, violão e um toque de cordas trazem uma pegada melódica ao pós-punk da banda dinamarquesa. Desde Pure fabrication (disco anterior, 2021), o grupo passou por mudanças—dois integrantes saíram, novos músicos entraram, e o som parece buscar um novo equilíbrio entre intensidade e melancolia. Ainda sem data definida, o terceiro álbum está a caminho.
BOB MOULD, “NEANDERTHAL”. Bob Mould não brinca em serviço. No single Neanderthal, ele entrega uma pancada punk de dois minutos e treze segundos, direta ao ponto e carregada de tensão. “Imaginei uma criança crescendo em um ambiente instável, exposta a um comportamento errático e agressivo, sempre em estado de luta ou fuga”, contou Bob, que já revisitou temas semelhantes em sua autobiografia See a little light: The trail of rage and melody. O disco novo, Here we go crazy, foi produzido pelo próprio Mould no mítico Electrical Audio, do saudoso produtor Steve Albini, e chega em 7 de março.
HIFI SEAN & DAVID MCALMONT, “HIGH WITH YOU”. Essa dupla de música eletrônica é formada por duas figurinhas experientes: Hifi é Sean Dickson, vocalista e guitarrista dos Soup Dragons e David é cantor de soul, ex-integrante da dupla londrina Thieves. Os dois soltam seu terceiro álbum, Twilight, nesta sexta (14). E o que vem aí parece ser um disco bem mais psicodélico que o anterior, Daylight (2024), a julgar pelo clima fluido de Sorry I made you cry, pela vibe interestelar de Star e pelo tecnosoul herdado de Marvin Gaye de High with you, o single mais recente a anunciar o disco.
THE HAUSPLANTS, “NORMALCY”. De onde vem esse som? O trio canadense The Hausplants pega emprestado ecos de Velvet Underground, The Sundays, The Smiths e chamber pop, misturando tudo com ritmos ciganos e hispânicos em Into equilibrium, um EP que parece um pequeno universo próprio. Mas o que realmente impressiona é a voz de Zel, cantora do grupo: o timbre lembra, e muito, Mariska Veres, a enigmática vocalista do Shocking Blue (aquela banda do hit psicodélico Love buzz, regravado até pelo Nirvana).
MARK MORTON feat CODY JINKS, “BROTHER”. Quem acompanha o Lamb Of God, banda de heavy metal na qual Mark é guitarrista solo, e der o play no novo single do rapaz, vai se surpreender (ou estranhar, se for muito radical na devoção ao som pesado). Em Brother, Mark Morton mergulha fundo no blues e no country rock, evocando os ares carregados e intensos do sul dos EUA nos anos 1970. “Essa é uma música extremamente pessoal, que fala diretamente sobre separação e afastamento familiar”, conta Mark, que traz também na faixa a voz do cantor country Cody Jinks. O álbum Without the pain chega em 11 de abril e ainda reserva uma surpresa: uma releitura de The needle and the spoon, do Lynyrd Skynyrd.
SUZANNE VEGA, “RATS”. Se alguém dissesse que essa música é de uma banda indie obcecada por Cramps, B-52’s e Blondie, acredite: ninguém duvidaria. O que poucos imaginariam é que Rats vem justamente dela, Suzanne Vega, a voz por trás de Luka e de algumas das canções mais delicadas e introspectivas dos anos 1980. Lançado em setembro do ano passado, o single anuncia seu primeiro álbum desde 2016. Suzanne diz que o álbum novo é variadíssimo: tem folk, soul inspirado na Motown, ecos da Califórnia setentista e, como se ouve aqui, uma pegada ramônica filtrada pelo pós-punk do Fontaines D.C. Um novo capítulo para uma artista que nunca se repete.
Crítica
Ouvimos: Geese – “Getting killed”

RESENHA: Terceiro álbum do Geese, Getting killed mistura slacker rock, sarcasmo e experimentalismo, unindo Pavement, Stones e Tom Waits num som estranho e cativante.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Partisan Records / Play It Again Sam
Lançamento: 26 de setembro de 2025
- Quer receber nossas descobertas musicais direto no e-mail? Assine a newsletter do Pop Fantasma e não perca nada.
“O que está ocorrendo com o Geese é mais ou menos parecido com o que tivemos no início dos 00, quando Strokes, White Stripes, Yeah Yeah Yeahs e LCD Soundsystem nos lembraram que o rock poderia ser, sim, sexy, fresh, carregado de energia e relevante para o agora”, escreveu recentemente o jornalista Thiago Ney na newsletter MargeM, lembrando que a banda de Nova York tem se tornado uma queridinha dos críticos musicais, e tem despertado muito interesse num universo que costumeiramente tem mais coveiros do que parteiros: o do rock.
Cameron Winter, o vocalista do grupo, tem uma voz estranha – o tipo de voz que você não sabe se ama ou odeia ao ouvir pela primeira vez, até porque você ainda não decidiu se o próprio Geese é bom de ouvir ou irritante. Essa dualidade irritação vs prazer parece herdada de Captain Beefheart and His Magic Band, ou de uma hipotética combinação Rolling Stones + Pavement, com o suíngue e a musicalidade do primeiro e o som vertiginoso e despojado do segundo. Getting killed, o terceiro álbum da banda, destaca-se por investir em sustos musicais, em letras repletas de sarcasmo, e numa receita sonora que consegue ser captada por uma antena – e que achou uma antena de longo alcance para chamar de sua.
- Ouvimos: Guerilla Toss – You’re weird now
Traduzindo: fãs de slacker rock e de bandas mais clássicas (veja bem: falamos em Pavement e Rolling Stones) podem amar o disco, que abre em tom de sonho e pesadelo com Trinidad, marcada por metais desafinados e algo que remete a The Fall e Nirvana. E prossegue com o samba-blues-country místico de Cobra, que tem algo de George Harrison musicalmente encartado. A misteriosa Husbands parece uma música de cerimonial, cuja letra ironiza os comentários normais sobre velhice e morte. Getting killed, a faixa-título, música em que a vida parece fazer mal à saúde, é punk + blues percussivo. Islands of men parece um Steely Dan punk e mágico, enquanto 100 noises corta a magia de tudo o que você puder imaginar: parece Crosby Stills Nash & Young e Jefferson Airplane, mas a letra ensina a “sorrir em tempos de guerra”.
O novo álbum do Geese traz herança do clima bêbado de Tom Waits em Au pays du cocaine, apresenta uma valsa folk que poderia ter sido composta no fim dos anos 1960 (Half real) e também soa como uma demo gravada numa comunidade originária, e deixada guardada por quatro décadas. Nesse caso, em Taxes e no country-gospel-jazz Long Island city here I come – esta, um acid-rock que tem até algo de Mutantes e Secos & Molhados.
A grande diferença entre Getting killed e os discos anteriores do Geese (além de Heavy metal, estreia solo de Cameron) parece vir do espírito do tempo: tudo aqui soa como se o humor e a musicalidade do mundo tivessem finalmente coincidido com o humor e a musicalidade do Geese. Bendita conexão tardia.
- Gostou do texto? Seu apoio mantém o Pop Fantasma funcionando todo dia. Apoie aqui.
- E se ainda não assinou, dá tempo: assine a newsletter e receba nossos posts direto no e-mail.
Crítica
Ouvimos: Jeff Tweedy – “Twilight override”

RESENHA: Jeff Tweedy lança Twilight override, álbum triplo que mistura country-rock e introspecção à la Wilco, Dylan e Harrison — bonito, ainda que exaustivo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Dbpm records Inc.
Lançamento: 26 de setembro de 2025
- Quer receber nossas descobertas musicais direto no e-mail? Assine a newsletter do Pop Fantasma e não perca nada.
Um camarada meu afirmou que, no entendimento dele, “Jeff Tweedy tá virando o novo Billy Corgan em termos de cansatividade”. O líder do Wilco não chega a ter um rockstar prolixo e cheio de manias como o déspota dos Smashing Pumpkins, mas é um artista que tem três álbuns duplos solo e acaba de se juntar à turma que lançou um álbum triplo de estúdio. Enfim, por causa do novo Twilight override, Tweedy entra num clube maluco que inclui The Clash, George Harrison, o próprios Smashing Pumpkins, Prince e, no Brasil, Nando Reis e Nelson Gonçalves (!).
O disco novo de Tweedy tem sido pouco comentado aqui no Brasil, seja em sites de cultura pop, seja em conversas informais entre amigos. Não tem ninguém nem falando mal. Pode significar muito, pode não significar muita coisa: vai ver os fãs brasileiros de rock desaprenderam a ouvir discos enormes, vai ver os fãs do Wilco são um nicho bem pequeno, vai ver os fãs do Wilco que curtem os trabalhos solo de Jeff são menos que um nicho. Vale dizer que Twilight ainda por cima não é um disco para se ouvir de bobeira, correndo ou dirigindo. Sem pedir de fato, Tweedy pede que você se recolha a um canto para encarar as quase duas horas de música do pacote, e tente sentir o clima meio desolado, meio doidão das letras.
- Ouvimos: Cate Le Bon – Michelangelo dying
Com uma cara musical análoga a do Wilco, Twilight override é um disco de country-rock com emanações de Bob Dylan (em especial), George Harrison, Velvet Underground, Pavement, Sonic Youth, Nirvana, Tom Waits – e de iniciativas acústicas e solitárias ao redor do mundo, como Oar (1969), disco de Alexander “Skip” Spence. No primeiro álbum, do set, músicas como One tiny flower, Forever eves ends, Mirror e Betrayed vão quase se desmanchando no ouvido – algumas delas em clima de sonho acordado – e dão um padrão que se repete várias vezes ao longo do álbum. Só que Tweedy também une tons acústicos e vibe punk em vários momentos: tem a onda slacker folk de Secret door e Ain’t it a shame, os climas herdados de White light / White heat (Velvet Underground) e Queen bitch (David Bowie) de Lou Reed was my babysitter – além da vertigem sonora de músicas como Wedding cake, tudo rodando em volta do violão e da voz.
Tweedy parece fazer um movimento de parábola em Override: o álbum vai soando mais introspectivo e angustiado ao chegar no disco 2, que tem o country bandido e angustiado de Better song, o som hipnótico de New Orleans, os voos de Over my head (Everything goes) e da valsa-country Western clear skies e a tristeza mágica de Blank baby, lembrando Davis Crosby e Neil Young. Os sete minutos de Feel free, canção simples e quase sussurrada, soam como se “essa tal liberdade” fosse observada por diferentes lados, num universo em que você pode ser fã de Beatles ou Rolling Stones, imaginar-se como uma semente e “levar seu tempo para ser enterrado”, girar até ficar tonto, fazer som com seus amigos. Tem até um curioso “sinta-se livre / nasça nos EUA / ame com um amor que eles não podem tirar”.
Twilight override é um disco bonito, mas como todo disco triplo, também vai ficando cansativo – uma sensação que bate bastante lá pelo disco 3, onde sobram músicas razoáveis como Saddest eyes, Ain’t it a shame, o folk de rádio AM dos anos 1970 da faixa-título. Compensando quem ficou até o fim, tem faixas como o country-gospel Too real e a bela e hipnótica Enought, feita na cola tanto do George Harrison do triplo All things must pass quanto dos Kinks de Waterloo sunset.
- Gostou do texto? Seu apoio mantém o Pop Fantasma funcionando todo dia. Apoie aqui.
- E se ainda não assinou, dá tempo: assine a newsletter e receba nossos posts direto no e-mail.
Crítica
Ouvimos: Banana Bipolar – “103”

RESENHA: No álbum 103, o Banana Bipolar mistura psicodelia e peso, existencialismo e protesto, além de estilos como stoner, pós-punk, blues e rock nordestino.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 15 de agosto de 2025
- Quer receber nossas descobertas musicais direto no e-mail? Assine a newsletter do Pop Fantasma e não perca nada.
Banda goiana que recentemente fez show nos 30 anos do Goiânia Noise Festival, o Banana Bipolar tem um “quê” progressivo, sem necessariamente afiliar-se ao estilo. Em 103, primeiro álbum, Hatamari (vocais e percussão), Gab Morais (vocais e baixo), Vinni (vocais e guitarra), Júlio (backing vocal e bateria) e Pedro Leon (guitarra solo) lançam músicas extensas – uma delas, Efêmero, tem treze minutos e divide-se em várias partes.
Mas o clima do quinteto está mais para uma visão existencial da psicodelia e do rock pesado, na qual cabem a oração stoner de Haha, a guitarrada lembrando Smashing Pumpkins da feminista e libertária Alicia e o acid rock funkeado de Cigarro. Cicatriz consegue unir pós-punk, metal a la Black Sabbath e psicodelia, numa música que opera nas sombras e, ao mesmo tempo, abre-se em vários climas diferentes.
- Ouvimos: Mirror People – Desert island broadcast
Esse lado existencial do Banana Bipolar ganha seu auge justamente na quilométrica Efêmero – cuja letra, afirma o grupo, “fala sobre a inconstância das coisas, sobre como tudo é fugaz, transitório, efêmero. É um contraste entre a vida e a única certeza que ela oferece: a mudança”. Mas também cede espaço ao protesto: o blues-rock 103, gravado ao vivo (e com guitarras ótimas), é uma poesia musicada sobre desesperança e desconforto. As duas partes de Cidadão comum, que vão do blues-rock à psicodelia tropicalista, têm lembranças de Mutantes, Titãs e MPB setentista, e angústia questionadora (“quanto vale o seu espírito? / quanto o mercado ganha?”).
Espectros, no final, é rock nordestino psicodélico, com emanações de Belchior e Zé Ramalho (e do space-rock paulistano do Casa das Máquinas). São sete minutos de força na letra e no som, com versos diretos e mobilizados como num rap (“não vale a pena aceitar filho de governante enriquecendo enquanto você se mata de trabalhar”, vociferam). Psicodelia e luta lado a lado.
- Gostou do texto? Seu apoio mantém o Pop Fantasma funcionando todo dia. Apoie aqui.
- E se ainda não assinou, dá tempo: assine a newsletter e receba nossos posts direto no e-mail.
Cultura Pop5 anos agoLendas urbanas históricas 8: Setealém
Cultura Pop5 anos agoLendas urbanas históricas 2: Teletubbies
Notícias8 anos agoSaiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
Cinema8 anos agoWill Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
Videos8 anos agoUm médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
Cultura Pop7 anos agoAquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
Cultura Pop9 anos agoBarra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
Cultura Pop8 anos agoFórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?





































