Destaque
POP FANTASMA apresenta Criaturas, “Vestígios”

Encontros e reencontros são a marca da banda curitibana Criaturas, que existe desde 2002, chegou a fazer show no festival que deu origem ao bombado Psicodália (o Festival Morretes) e, mesmo com tanto tempo de carreira, lançaram poucos discos. O material mais histórico do grupo está registrado no disco O sexto dedo de 2008, e de lá para cá, algumas mudanças aconteceram no caminho deles. A ponto de, só depois de onze anos, sair o EP Vestígios (que inaugura o selo curitibano Volts).
Logo após O sexto dedo (por sinal uma boa referência à icônica foto dos Mutantes fantasiados de extraterrestres) Xanda Lemos (voz e guitarra) e o marido, Bruno Zagonel (bateria) mudaram-se para os Estados Unidos. Xanda faz um doutorado em História pela Emory University, com pesquisa sobre movimentos contraculturais brasileiros da década de 1970, e volta e meia o casal retorna ao Brasil. “Dei aula por cinco anos na Universidade da Carolina do Norte. O Bruno continuou trabalhando no emprego que nos trouxe pra cá e também fez um MBA”, conta a cantora, por e-mail.
COINCIDÊNCIA
Nas idas e vindas do casal para o Brasil, Xanda e Bruno aproveitam para fazer um som com os amigos e reunir o Criaturas. Dessa vez passaram quase um ano aqui, com Xanda fazendo pesquisas. Nesses retornos, sempre rolam shows. Mas hoje com a nova formação, que inclui Caetano Zagonel (baixo, irmão de Bruno) e dois sobrinhos de Xanda, Yan e Yuri Lemos (guitarra e voz).
“Não havia planos, inicialmente, de gravar um disco. Isso acabou se concretizando porque nossa chegada aí coincidiu com a criação do selo Volts, pelo Marcelo Crivano. E o convite partiu dele, dois meses antes de retornarmos aos EUA”, conta Xanda. “A gravação do disco foi uma feliz e inesperada coincidência”, diz Caetano. Tanto ele quanto Xanda aproveitam para falar que acreditam muito no trabalho da Volts, que se lança no mercado num período complicado (o da pandemia), mas com muita vontade de fazer coisas.
“O selo pretende ter um catálogo que se destaca pela qualidade da produção sonora, obviamente. Mas também quer ter uma relação completamente transparente com a artista. Nada de relatórios e números que artistas nunca têm acesso, que são sempre prometidos e nunca aparecem. Talvez a grande frustação de artistas independentes seja nunca saber se seu trabalho está rendendo dinheiro. Na Volts, artistas têm acesso a tudo. É open book”, conta o baixista. “Além de uma honra, foi um orgulho pra nós termos estrado o selo Volts com esse trabalho lindo, totalmente fora do convencional”, completa Xanda.
SEPARAÇÃO?
O “hiato” de onze anos do Criaturas, na verdade, foi uma situação mais imposta pelas circunstâncias do que uma escolha. “Nós nunca nos demos por terminados, tampouco por ativos nesse hiato”, brinca Caetano, rindo. Quando o casal não estava no Brasil, o músico, que passou a tocar projetos como Central Sistema de Som e Dinamite Combo, ia visitar o irmão e a cunhada nos EUA. Desse modo, sempre surgiam jams. Como resultado dessas idas e vindas, quatro produções caseiras feitas pelos irmãos e Xanda no estúdio caseiro do casal foram parar no novo disco.
Com o disco já nas plataformas, a banda luta para angariar uma base de fãs e mira nas playlists e nas redes sociais. Ainda mais por se tratar de uma época sem shows. “O plano é fazer com que nossa música chegue ao maior número de pessoas possível, atravesse fronteiras e atinja públicos diversos, refletindo exatamente o contexto da produção desse disco. Sabemos que o modelo de mercado hoje é outro, Se por um lado é mais fácil hoje gravar e colocar música em plataforma de streaming, por outro lado é muito mais difícil se sobressair no meio de tanta saturação”, conta Xanda.
Aliás, uma novidade é que há uma playlist no Spotify com referências usadas para se trabalhar no disco. Ela foi criada pelo produtor Bruno Sguissardi para servir de guia para os técnicos de som e para a banda na hora de buscar texturas sonoras para a gravação.
CLIMAS
Quem ouve as cinco faixas do EP do Criaturas já fica ligado na diversificação de ritmos e climas. Que vão do indie folk (nos assobios da delicada Sunday) à neopsicodelia oitentista (Vestígios). “Cada música retrata momentos completamente diferentes das nossas vidas. Cada música foi composta ao longo dos anos dessa década no exílio. Durante esse tempo a gente mergulhou em culturas diferentes, falou e cantou em línguas diferentes, conheceu lugares e pessoas diferentes. E isso mudou a nossa identidade e o nosso modo de enxergar e cantar o mundo”, esclarece Xanda.
Ela lembra também que nem todas as composições do novo disco do Criaturas partiram do mesmo instrumento, o que deu dinâmicas diferentes a cada uma delas. Better times e Réquiem partiram do piano, Sunday partiu do ukelele, enquanto a faixa-título “foi composta em afinação aberta numa guitarra com cinco cordas”, conta ela. Omalola foi uma linha de voz que ganhou criação coletiva.
INSTRUMENTAIS
Vestígios sai em breve em vinil com outra novidade: lado A com as canções do EP, lado B com as mesmas músicas em versão instrumental. Mas antes do lançamento físico, os dois formatos podem já ser achados no Spotify.
“Nós queríamos as versões instrumentais pra explorar o mercado de trilhas sonoras. Ao mesmo tempo, queríamos lançar o trabalho em vinil, mas eram muitas músicas para um single e poucas para um LP”, conta Caetano. “Isso partiu de uma pesquisa mercadológica que meu marido e nosso baterista, o Bruno Zagonel, fez. Ele encontrou um artigo sobre as possibilidades de veiculação e monetização do trabalho com as versões instrumentais, que podem ser utilizadas como trilha sonora e de background em rádio, cinema e televisão. E como o resultado final da produção ficou além das nossas expectativas e decidimos lançar o material também em vinil, essa ideia fez ainda mais sentido”, completa Xanda.
OMALOLA
Uma das mais belas e diferentes faixas do EP, Omalola tem uma história emocionante, ligada ao nascimento do filho do casal Xanda e Bruno, em 2015. A própria Xanda conta.
“Essa música nos chegou através de uma enfermeira nigeriana, cujo nome é Omalola. Quando nosso filho nasceu em 2015 nós descobrimos que ele tinha uma cardiopatia grave, o que nos obrigou a deixá-lo um tempo na UTI. Quando ele finalmente chegou em casa, teve que vir com vários equipamentos hospitalares. Durante um mês, contamos com o acompanhamento diário dessa enfermeira em nossa casa”, diz.
“Quando meu filho finalmente recebeu alta e os serviços delas não seriam mais necessários, eu pedi pra ela gravar uma música folclórica da Nigéria, que lembrasse a sua infância. E ela cantarolou essa canção, que gravei no meu telefone. A partir da voz dela, criamos as linhas vocais, as linhas de baixo, guitarras, teclados, percussão e flauta. A música fala sobre o que temos que fazer pra deixar um bebê feliz. Mas como não sabíamos o nome da música, resolvemos batizá-la com o nome da enfermeira e colocar a voz dela pra fazer o refrão”, completa.
Pega aí Vestígios, do Criaturas, nas duas versões (com os vocais e instrumental).
Foto: Giovanna Lombardi/Divulgação
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Cultura Pop
Quando Suicide gravou… “Born in the USA”, do Bruce Springsteen

A way of life, disco de 1988 da dupla de música eletrônica Suicide, é tido como um disco, er, acessível. Acessível à moda de Martin Rev e Alan Vega, claro. O disco pelo menos podia ser colocado tranquilamente na prateleira dos artífices da darkwave e era bem mais audível do que o comum de um grupo que havia lançado a assustadora Frankie teardrop. O disco era produzido por Ric Ocasek, líder dos Cars (que já havia produzido o segundo disco deles, de 1981, Alan Vega/Martin Rev), e tinha até uma eletro-valsinha, Surrender, além de um estiloso misto de rockabilly e synthpop, Jukebox baby 96.
O que ninguém esperava era que a dupla tivesse feito nessa mesma época uma estranhíssima versão de… Born in the USA, de Bruce Springsteen. A faixa surge numa versão ao vivo, gravada num show de Vega e Rev em 1988, em Paris. A dupla nem sequer disfarçou que a ideia era fazer uma versão bem lascada – saca só o sintetizadorzinho da música, e a referência a músicas como Lucille, de Little Richard, e o tema When the saints go marching in, logo na abertura. A “versão” da faixa resume-se a quase nada além do título da canção. Parece um karaokê do demo (e é).
A versão poderia ser uma bela pirataria, mas vira oficial nesse mês: vai aparecer em uma reedição de A way of life, prevista para o dia 26. A edição de luxo estará disponível em vinil azul transparente com Born in the USA e em CD com quatro faixas bônus, além do formato digital. O material extra inclui versões ao vivo de Devastation e Cheree, bem como uma versão inicial de estúdio de Dominic Christ. O pesquisador Jared Artaud encontrou as faixas enquanto trabalhava no arquivo de Vega, após a morte do cantor em 2016.
E se você não sabia, vai aí a surpresa: Springsteen tá bem longe de ser um sujeito que diria “what?” ao ser informado da existência do Suicide. Pelo contrário: era fã da dupla e costumava dizer que a estreia do Suicide, o disco epônimo de 1977, era “um dos discos mais sensacionais que já ouvi”. Em 1980, o cantor esteve com a dupla e Vega descobriu que Springsteen era seu fã – e se surpreendeu.
“Ele estava gravando o disco The river (1980) e nós estávamos gravando nosso segundo álbum em Nova York. Então tivemos uma reunião de audição do nosso álbum. Havia três ou quatro figurões da nossa gravadora, e Bruce também estava lá. Depois que tocamos o álbum, houve um silêncio mortal… exceto por Bruce, que disse, ‘Isso foi ótimo pra caralho.’ Ele fazia questão de nos dizer o quanto nos amava”, contou em 2014 ao New York Post.
Mais: um texto do site Treblezine, a partir de audições da obra de Bruce e de entrevistas do Suicide, descobre: a dupla influenciou muito o sombrio disco Nebraska, tido como o “primeiro disco solo” (sem a E Street Band) de Springsteen (1982), basicamente um disco sobre crise, desemprego e gente à beira do desespero pela falta de oportunidades. Houve uma versão elétrica e pesada de Nebraska, mas Bruce quis lançar o disco acústico, de voz, violão e registros crus, e que de fato lembram o clima esparso do Suicide do primeiro disco.
Na dúvida, ouça State trooper, cujos uivos lembram bastante os gritos (sem aviso prévio) de Frankie teardrop. “Lembro-me de entrar na minha gravadora logo após o lançamento do meu disco”, disse Vega depois de ouvir State trooper pela primeira vez. “Eu pensei que era um dos meus álbuns que eu tinha esquecido. Mas era Bruce!”
Cultura Pop
No podcast do Pop Fantasma, a fase de transição do Metallica

A morte do baixista Cliff Burton, em 27 de setembro de 1986, desorientou muito o Metallica. Além do que aconteceu, teve a maneira como aconteceu: a banda dormia no ônibus de turnê, sofreu um acidente que assustou todo mundo, e quando o trio restante saiu do veículo, só restou encarar a realidade. A partir daquele momento, estavam não apenas sem o baixista, como também estavam sem o amigo Cliff, sem o cara que mais havia influenciado James Hetfield, Lars Ulrich e Kirk Hammett musicalmente, e sem a configuração que havia feito de Master of puppets (1986) o disco mais bem sucedido do grupo até então.
Hoje no Pop Fantasma Documento, a gente dá uma olhada em como ficou a vida do Metallica (banda que, você deve saber, está lançando disco novo, 72 seasons) num período em que o grupo foi do céu ao inferno em pouco tempo. O Metallica já era considerado uma banda de tamanho BEM grande (embora ainda não fosse o grupo multiplatinado e poderoso dos anos 1990) e, justamente por causa disso, teve que passar por cima dos problemas o mais rápido possível. E sobreviver, ainda que à custa justamente da estabilidade emocional de Jason Newsted, o substituto do insubstituível Cliff Burton…
Nomes novos que recomendamos e que complementam o podcast: Skull Koraptor e Manger Cadavre?
Estamos no Castbox, no Mixcloud, no Spotify, no Deezer e no Google Podcasts.
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch. Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Estamos aqui toda sexta-feira!
Destaque
Dan Spitz: metaleiro relojoeiro

Se você acompanha apenas superficialmente a carreira da banda de thrash metal Anthrax e sentia falta do guitarrista Dan Spitz, um dos fundadores, ele vai bem. O músico largou a banda em 1995, pouco antes do sétimo disco da banda, Stomp 442, lançado naquele ano. Voltaria depois, entre 2005 e 2007, mas entre as idas e as vindas, o guitarrista arrumou uma tarefa bem distante da música para fazer: ele se tornou relojoeiro (!).
A vida de Dan mudou bastante depois que o músico teve filhos em 1995, e começou a se questionar se queria mesmo aquela vida na estrada. “Fazíamos um álbum e fazíamos turnês por anos seguidos, e então começávamos o ciclo de novo – o tempo em casa não existia. É uma história que você vê em toda parte: tudo virou algo mundano e mais parecido com um trabalho. Eu precisava de uma pausa”, contou Spitz ao site Hodinkee.
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Na época, lembrou-se da infância, quando ficava sentado com seu avô, relojoeiro, desmontando relógios Patek Philippe, daqueles cheios de pecinhas, molas e motores. “Minha habilidade mecânica vem de minha formação não tradicional. Meu quarto parecia uma pequena estação da NASA crescendo – toneladas de coisas. Eu estava sempre construindo e desmontando coisas durante toda a minha vida. Eu sou um solucionador de problemas no que diz respeito a coisas mecânicas e eletrônicas”, recordou no tal papo.
Spitz acabou no Programa de Treinamento e Educação de Relojoeiros da Suíça, o WOSTEP, onde basicamente passou a não fazer mais nada a não ser mexer em relógios horrivelmente difíceis o dia inteiro, aprender novas técnicas e tentar alcançar os alunos mais rápidos e mais ágeis da instituição.
>>> Veja também no POP FANTASMA: Discos de 1991 #9: “Metallica”, Metallica
A música ainda estava no horizonte. Tanto que, trabalhando como relojoeiro em Genebra, pensou em largar tudo ao receber um telefonema do amigo Dave Mustaine (Megadeth) dizendo para ele esquecer aquela história e voltar para a música. Olhou para o lado e viu seu colega de bancada trabalhando num relógio super complexo e ouvindo Slayer.
O músico acha que existe uma correlação entre música e relojoaria. “Aprender a tocar uma guitarra de heavy metal é uma habilidade sem fim. É doloroso aprender. É isso que é legal. O mesmo para a relojoaria – é uma habilidade interminável de aprender”, conta ele. “Você tem que ser um artista para ser o melhor – seja na relojoaria ou na música. Você precisa fazer isso por amor”.
>>> POP FANTASMA PRA OUVIR: Mixtape Pop Fantasma e Pop Fantasma Documento
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