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Crítica

Ouvimos: Velocity Girl, “UltraCopacetic (Copacetic remixed and expanded)”

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Ouvimos: Velocity Girl, "UltraCopacetic (Copacetic remixed and expanded)"

No ano passado, os indies norte-americanos do Velocity Girl se reuniram para seu primeiro show depois de duas décadas separados. Sarah Shannon (voz), Kelly Riles (baixo), Jim Spellman (bateria), Archie Moore e Brian Nelson (ambos guitarra) aproveitaram para entrar em estúdio e remexer em seu disco de estreia, Copacetic, lançado originalmente pelo selo Sub Pop em 1992, e que agora retorna em edição remixada e expandida, com capa nova, e nome alterado para UltraCopacetic.

A edição nova traz as doze faixas do disco original, incluindo músicas queridas dos fãs, como Audrey’s eyes (cujo clipe passou até mesmo na MTV Brasil), Pop loser, Crazy town e a faixa-título. Além do som sombrio e levemente sessentista (e lembrando Velvet Underground) de Here comes. Complementando, surgem músicas de compactos, uma faixa inédita gravada nas sessões de Copacetic (e que se chama Even die) e faixas gravadas no programa do DJ britânico John Peel –  incluindo duas faixas que não foram ouvidas desde a transmissão original.

No todo, um som angustiado e um espécie de primo em comum do shoegaze e do indie rock britânico. No comecinho, o grupo (que veio de Washington DC) dizia inclusive que bandas da Rough Trade e do começo do selo Creation haviam inspirado o som deles. E não custa lembrar que o nome do grupo foi tirado de Velocity girl, canção do Primal Scream, lançada numa época em que o grupo escocês estava mais próximo do jangle pop – aquele rock batido na guitarra, influenciadíssimo pelos anos 1960. Além disso, o VG era um exemplo de supergrupo indie, com ex-integrantes de bandas como Black Tambourine e Piper Club na formação.

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O Velocity Girl tinha raízes bem mais sessentistas do que fazia supor – e vale recordar que o grupo chegou a ser cortejado pela Silvertone, gravadora dos Stone Roses, mas se sentiu mais segura na Sub Pop. No caso de Copacetic, o que ficou mais na mente dos fãs era que o disco trazia canções bastante melodiosas, em meio a uma parede de guitarras e distorções, que também havia levado de roldão os vocais habilidosos de Sarah. Era basicamente um shoegaze mais melódico que o habitual, compreensível para fãs de bandas como Jesus and Mary Chain e Primal Scream.

Curiosamente, uma entrevista recente de Sarah e Moore à newsletter First Revival surpreende um total de zero pessoas: os integrantes da banda nem sabiam direito o que era shoegaze quando começaram a compor as músicas do disco, e foram descobrindo a posteriori que o som que faziam estava inserindo numa cena (“mas nunca fomos influenciados pelo Slowdive, ou por aquele som de guitarra etéreo”, diz Moore). Sarah, por sua vez, ouvia um tipo de música completamente diferente do rock indie da época – era fã de bandas como Fishbone e Trouble Funk.

O objetivo da nova edição é dar uma guaribada monstra no original, produzido e mixado por Bob Weston, um cara bem próximo do estilo de produção de Steve Albini – tocou com ele na banda Shellac e trabalharia inclusive como assistente dele no In utero, do Nirvana, lançado em 1993. Na época, o VG não entendia muito de produção, e Weston fez exatamente o que o grupo pediu para ele fazer.

O resultado é que a própria banda detestou o resultado final. Um texto do site Stereogum conta que o grupo pegou ranço a ponto de nem sequer ouvir o disco. O jornalista Rodrigo Lariu, que conta ter também ficado decepcionado com o álbum na época, enfatizou na Midsummer Madness que as masters do disco passaram anos sumidas, e só foram encontradas ano passado na casa da ex-sogra de Jim Spellman. “Pensa bem, você se separa da sua mulher e larga as masters de um disco seu na casa da mãe dela… é zero apego isso”, afirmou.

No tal papo com o First Revival, Moore entrega que alguns integrantes sentiram de cara que o disco não representava o que eles queriam. “Queríamos que soasse mais como os discos britânicos que estávamos ouvindo, comprimido, brilhante, um pouco psicodélico de um jeito pop barulhento, um disco adjacente ao shoegaze”, contou, acrescentando que os fãs do disco original podem perceber algumas mudanças na nova versão. “Uma das grandes coisas é que a bateria vai soar mais como bateria em um disco estilizado de new wave ou pós-punk (…) Não é o Copacetic que você ouviu antes, é para ser um disco falso de shoegaze”.

O shoegaze falca do Velocity Girl rendeu um grande álbum em 1992, mesmo não tendo saído como a banda achava que deveria soar – pela capa original, com uma foto distorcida e colorida, dá para notar que climas psicodélicos e nublados faziam mesmo a cabeça do quinteto. Detalhe: nos dois discos que o VG gravou depois de Copacetic (Simpatico!, de 1994, e Gilded stars and zealous hearts, de 1996) fica bem clara a disposição da banda de trabalhar numa zona entre o power pop, o punk e o rock herdado dos sons sessentistas. Não há distorções, as canções são privilegiadas, o esquema de composição e arranjo é quase beatle às vezes, e os vocais de Sarah soam límpidos e bem na frente.

Copacetic sobreviveu mesmo com os problemas de produção (que só hoje se tornam claros para vários fãs), e mesmo com o fato de vir de uma cena que, em termos de batidas na porta do mainstream, parecia esconder-se dentro de si própria. E a edição que retorna mostra, no entendimento do grupo, como ele deveria ter soado em 1992.

Nota: 8,5
Gravador: Sub Pop

Crítica

Ouvimos: Gaby Amarantos – “Rock doido”

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Disco-filme com 22 faixas em 36 minutos, Rock doido mostra Gaby Amarantos unindo tecnobrega, pop e festa em uma obra inventiva e multimídia.

RESENHA: Disco-filme com 22 faixas em 36 minutos, Rock doido mostra Gaby Amarantos unindo tecnobrega, pop e festa em uma obra inventiva e multimídia.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Deck
Lançamento: 29 de agosto de 2025

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Rock doido, o disco novo de Gaby Amarantos, tem um formato que lembra o de discos de bandas casca-grossa como D.R.I.: são 22 faixas curtíssimas em 36 minutos (!). Não é apenas um disco: tem ainda Rock doido, o filme, que traz todas as músicas do álbum filmadas com Gaby, convidados e sua turma, tudo em plano sequência, com o pessoal se movimentando em vários cenários subsequentes.

O disco funciona na medida que você esteja disponível para aprender uma nova forma de ouvir música: Rock doido é totalmente montado como se fosse uma festa, um DJ set, ou um passeio curto pelas festas de aparelhagem do Pará. Junto com a recente volta da Gang do Eletro (resenhada pela gente aqui), é quase um relato de como várias tendências musicais se uniram em momentos diferentes para gerar o tecnobrega e estilos afins.

Não é um disco feito para “tocar no rádio” e está mais para um suposto antecipador de tendências que, provavelmente, vão dar canal no rádio ou na TV em algum momento – a graça de Rock doido é justamente o lado multimídia dele, de ser um álbum que vira filme (está no YouTube na íntegra e pode, quem sabe, ser exibido na TV). A mistura de referências também chega à capa, que lembra tanto Sgt Pepper’s Lonely Hearts Club Band, dos Beatles, quanto Dangerous, de Michael Jackson.

  • Ouvimos: Lambada da Serpente – Lambada da Serpente (EP)

Com tanta rotatividade, eleger uma música preferida fica até complicado – inclusive porque os beats e refrãos vão se seguindo bem rápido. Essa noite eu vou pro rock introduz a/o ouvinte no clima festeiro. Short beira cu, Te amo fudido (com Viviane Batidão), Tumbalatum (terror fake com a já citada Gang do Eletro), Dá-lhe sal e Viciada em seduzir apresentam expressões locais e o clima da noite paraense a quem ouve o disco bem distante do Pará. Bonito feio é uma das faixas que separam um pouco o “tecno” do brega no álbum.

No final, tem Deixa, um samba-reggae que parece meio deslocado no álbum – é a música menos “rock doido” da fornada, mas talvez seja a tal “música de rádio” do disco. Sem crise: Rock doido é um disco-filme que confirma Gaby Amarantos como uma das artistas mais inventivas do pop brasileiro.

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Crítica

Ouvimos: Big Special – “National average”

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Dance-punk ácido e sarcástico, National average faz o Big Special rir da miséria britânica com ironia, fúria e riffs venenosos.

RESENHA: Dance-punk ácido e sarcástico, National average faz o Big Special rir da miséria com ironia, fúria e riffs venenosos.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 10
Gravadora: SO Recordings / Silva Screen Records Ltd
Lançamento: 4 de julho de 2025

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Chega a escorrer veneno de National average, segundo álbum do Big Special, dupla britânica cujo clima basicamente é o da dança punk – às vezes soando como um EMF (lembra deles?) que entrou em órbita, ou como um desdobramento da receita doidona do selo Food, na virada dos anos 1980 para os 1990. Em vibe funky, Joe Hicklin e Callum Moloney falam dos problemas mais bizarros vividos pela população britânica nos dias de hoje.

Na real, nada que seja estranho até mesmo aqui no Brasil. A faixa God save the pony, tributo pago a Talking Heads e à turma de Madchester, inclui no mesmo saco hambúrgueres superfaturados, gentrificação, gente instagramável (“mal ganho o salário mínimo / e sou um clichê do rock and roll / e, para ser honesto / não consigo acreditar em quanto tempo isso já durou”) e um estado de letargia total, como se todo mundo já estivesse acostumado com isso – à Rolling Stone, a banda disse que se trata de um “boa noite e boa sorte para o peso que todos carregamos. Somos os cavalos cansados ​​arrastando uma carga pessoal e, muitas vezes, o peso de outra pessoa”.

Outras canções falam também da merdificação geral que todo mundo vai levando adiante na vida, como The mess (que soa como um Tom Waits alt-metal) e Hug a bastard – esta, um reggae preguiçoso transformado em indie rock, com cara de Beastie Boys, Beck e até de Gorillaz, iniciado com os versos “encontrar deus? / cara, não consigo achar minhas chaves”. Nada se comparado a Shop music, synth pop stoner que equivale a um soco na boca do estômago de quem acredita em virtudes no mundo fonográfico, em versos como “vamos vender suas merdas / (…) e depois de vender suas merdas, vamos vender outras merdas” e “não consigo identificar o monstro quando ele está bem vestido / é o seguinte: dinheiro fala, mas não canta”.

Esse clima de desesperança e ironia é a cara de National average, disco que também fala sobre merdas passadas de geração a geração em família (o blues zoeiro Pigs puddin), de choque com o mercado fonográfico “profissional” (Professionals, uma mescla de The Who e Viagra Boys, se é que é possível), e de como todo e qualquer emprego ou chefe é uma merda (Yesboss, rap-punk sem o menor cacoete de rapper, com voz praticamente falada).

O disco novo do Big Special chega a ser um projeto multimídia – no sentido de que você tem que prestar atenção nas letras, ler as entrevistas, saber qual é a da banda e acompanhar o que eles andam falando para ter uma fruição total do disco. Em letra e música, tudo em National average soa como uma sequência de porradas bem dadas. O Big Special revisita-parodia o blues a la Eric Clapton em Domestic bliss, uma espécie de canção sophisti-punk que revira ao contrário o mito de Sísifo para falar sobre depressão e máscaras do dia a dia. Tem ainda Judas song, dance-punk sobre traição e rancor, com guitarras pesadas e um clima “eletrônico” que faz lembrar o Ultravox – mas com bastante sujeira.

Em resumo: National average é daqueles discos que fazem você rir, pensar e se envenenar ao mesmo tempo — e ainda sair dançando no final.

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Ouvimos: Helado Negro – “The last sound on Earth” (EP)

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Inspirado no filme Wavelength (1967), Helado Negro cria em The last sound on Earth um EP existencial, espacial e cheio de ecos de solidão e esperança.

RESENHA: Inspirado no filme Wavelength (1967), Helado Negro cria em The last sound on Earth um EP existencial, espacial e cheio de ecos de solidão e esperança.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Big Dada
Lançamento: 7 de novembro de 2025

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Realizado em 1967 por um cineasta então ainda inexperiente (o canadense Michael Snow), o documentário Wavelength – disponível no YouTube – mostra várias experimentações com sons, imagens, situações e emoções. Foi esse filme que inspirou o músico norte-americano Roberto Carlos Lange, mais conhecido como Helado Negro, no conceito de seu novo EP, The last sound on Earth. Basicamente um disco que trabalha numa questão que muita gente jamais gostaria de imaginar: qual seria o último som ouvido imediatamente antes da morte?.

Na real, o EP de Helado Negro é mais uma experiência existencial do que apenas espiritual, falando também sobre solidão (More, cujo clipe traz emoções sendo representadas por um coração de origami) e política (Protector). Em todo caso, a música de The last sound é uma experiência transcendental, na qual cabem sons espaciais e futuristas, vocais quase fantasmagóricos e, em muitos casos, um clima meio “o Prince que veio do espaço”, como na dance music de More e na gélida e animada Don’t give up now.

  • Ouvimos: Stealing Sheep – GLO (Girl Life Online)

Em Sender receiver, tema psicodélico e eletrônico com frases e palavras soltas que formam uma mensagem sobre tecnologia, desigualdade e solidão (no estilo de Arnaldo Antunes e do Can: “crescendo sozinho / amigos fantasmas / eleve a esperança / diminutiva preocupação consigo mesmo”), surpresa: Helado canta de forma impostada, quase lembrando seu xará brasileiro Roberto Carlos. A “onda sonora” do doc que inspirou Helado ganha comentários musicais no jungle Protector (com clima lo-fi e derretido, como uma fita que se desfaz) e no instrumental Zenith, cuja espacialidade é dada pelos teclados.

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