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Crítica

Ouvimos: Primal Scream, “Come ahead”

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Ouvimos: Primal Scream, “Come ahead”
  • Come ahead é o décimo segundo álbum de estúdio da banda escocesa Primal Scream. É o primeiro álbum da banda em oito anos. Bobby Gillespie (voz) e Andrew Innes (teclados), os integrantes oficiais do grupo, compuseram quase todo o material ao lado do músico adicional David Holmes (teclados, loops).
  • O grupo vocal londrino House Gospel Choir participa de 10 das 11 faixas do disco (só não está presente em The centre cannot hold, a antepenúltima).
  • O New Musical Express definiu Come ahead como um “álbum de protesto disco“. Na capa do álbum, uma foto tirada em 1960 do pai de Bobby, um sindicalista “com valores socialistas ferrenhos”, morto em abril passado. “Acho que alguns dos temas são coisas com as quais ele se importava — eles encontraram seu caminho em algumas das letras. Acho que essas coisas estão no seu sangue, sabe?”, diz o cantor.

O novo álbum do Primal Scream se presta a uma série de intepretações e leituras. Já houve quem comparasse Come ahead com o passado jangle pop do grupo, lá na época de Sonic flower groove (1987). Uma comparação que não faz sentido algum: o mais próximo que o novo álbum chega disso rola no blues psicodélico de Love ain’t enough, e no som quase sessentista de Deep dark waters. O que emerge das onze faixas de Come ahead é um outro Primal Scream, mais renovado e mais voltado para outros tipos de infusões retrô.

O grupo de Bobby Gillespie nunca soou tão próximo do soul e da disco music. Mas conseguiu isso fazendo uma viagem sonora toda própria, que inclui cordas feitas para soar bem na pista de dança, corais gospel, psicodelias dosadas, e uma ou outra coisa que parece existir entre Fool’s gold, dos Stone Roses, e um posto avançado de Give out but don’t give up , disco de 1994 do grupo – e álbum subsequente ao famosíssimo Screamadelica (1991).

Em Come ahead, o single Love insurrection tem algo de Hot Chocolate. Ready to go home soa como uma Madchester mais próxima dos anos 1970 do que dos anos 1960. Heal yourself é quase como Gladys Knight & The Pips com sujeira sonora e produção punk. Melancholy man ameaça, no início, soar como o Khruangbin – até que os ecos nas vozes formam os vocais, vindos lá de longe, e o disco ganha uma balada. Love ain’t enough é blues lisérgico e ruidoso. Uma surpresa é Circus of life, esparsa, dançante, com violão acústico, e uma levada próxima até da psicodelia nacional dos anos 1970 que deixa DJs gringos babando (Tom Zé, Mutantes, a dupla Alceu Valença & Geraldo Azevedo). A irônica Innocent money tem algo da zoeira de Madchester.

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Nas novas letras, Bobby, que andou fazendo sucesso com um livro de memórias, Garoto do cortiço, abraçou o discurso político e invocado. O pai do músico aparece na capa do disco (numa foto clicada em 1960), e as histórias de guerra, virtude ferida e esquecimento da letra da bela False flags – um pequeno perfil do cidadão comum dos subúrbios mais abandonados da Escócia – vêm das recordações dele. Ready to go home, inspirada no fim da vida do Gillespie pai, é um curioso gospel-disco sobre morte (“quando minha hora finalmente chegar, estarei pronto/quando meu dia terminar, estarei pronto”).

Em Love insurrection, Bobby prega uma união das pessoas que talvez soe idealista demais em tempos de guerras, conspirações golpistas e Trump no poder. Mas que faz sentido quando o cantor recebe um Bob Dylan/John Lennon rápido em versos como “para onde você vai correr quando as multidões humilhadas se levantarem?/quando você vai se esconder quando a chuva de aço cair do céu?”. Finalizando, os nove minutos de Settler blues, uma história do colonialismo inglês na Escócia e Irlanda, e dos levantes e insubordinações – e um blues orquestral e orgulhoso, com flow herdado de Leonard Cohen.

Nota: 8,5
Gravadora: BMG

Crítica

Ouvimos: Jean Caffeine – “Generation Jean”

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Jean Caffeine mistura punk, sixties, pós-punk e introspecção em Generation Jean, disco variado, intenso e cheio de humor.

RESENHA: Jean Caffeine mistura punk, sixties, pós-punk e introspecção em Generation Jean, disco variado, intenso e cheio de humor.

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Nascida em 1960, a cantora e compositora Jean Caffeine participou ativamente da cena punk de San Francisco, tocou numa banda que abria shows do The Clash (o curiosíssimo Pulsallama, um conjunto de percussão de formação variável, chegando a 13 integrantes) e mudou-se anos depois para Austin, no Texas, onde desenvolveu carreira como compositora e, depois, cantora. Só que ela foi para um lado bem diferente do universo com o qual ela estava acostumada: passou a tocar em cafés e a misturar punk rock e sons mais introspectivos.

Generation Jean, seu novo álbum, é uma mescla dessas duas ondas, com referências sessentistas unidas a sons bem mais selvagens – sendo que as próprias viagens 60’s de Jean já são selvagens o suficiente. Love what is it?, na abertura, inicia com batida marcial, ganha ares de música francesa ou hispânica, e embica numa balada meio Beatles, meio Replacements, com ótimas guitarras. Big picture une Byrds e Beatles, com romantismo na melodia, e amor desarrumado na letra. I always cry on thursday, com clima sixties e batidinha eletrônica, parece uma zoação com Friday I’m in love, do The Cure – com Jean admitindo que a quinta-feira só torna o fim de semana mais distante. E ainda por cima ela gravou The kids are alright, do The Who – só que numa versão em que parece que a música era dos Pretenders.

  • Ouvimos: Replacements – Tim (Let it bleed edition)
  • Ouvimos: Peter Perrett – The cleansing

Desenvolvendo um rock estiloso em todas as faixas do disco, Jean abraça o blues, o jazz e a música sombria em Mammogram – sim, ela fez uma música sobre mamografias e conta em detalhes como é o exame. Também volta a visitar o rock sessentista no power pop I don’t want to kill you anymore e I know you know I know, e visita o pós-punk em Circuitous routes. No final, tem You’re fine, dance-punk que lembra uma paródia suja da levada de Psycho killer, dos Talking Heads. Largue tudo e ouça agora.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: FLAK Records
Lançamento: 5 de setembro de 2025.

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Crítica

Ouvimos: Lutalo – “The academy” (versão deluxe)

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Primeiro álbum de Lutalo, The academy volta em edição deluxe, a tempo de ser descoberto por quem ainda não ouviu o som desse cantor norte-americano que fala de vivências pessoais nas suas músicas.

RESENHA: Primeiro álbum de Lutalo, The academy volta em edição deluxe, a tempo de ser descoberto por quem ainda não ouviu o som desse cantor norte-americano que fala de vivências pessoais nas suas músicas.

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Talvez você ainda não conheça Lutalo, então vamos lá: Lutalo Jones é um jovem (24 anos) músico, compositor e produtor do Minnesotta. Ele é primo de Adrianne Lenker (Big Thief), já abordou em suas músicas temas espinhosos como a situação dos negros e indígenas nos Estados Unidos, e volta e meia recorre à própria história para fazer suas canções. Lançado em 20 de setembro de 2024, seu álbum de estreia, The academy, mergulha em suas memórias de ex-aluno da escola que dá nome ao disco, em St Paul – uma instituição tão clássica que o escritor F Scott Fitzgerald estudou lá.

Lutalo, que enfrentou várias barras pesadas familiares ao longo da vida, estudou lá com bolsa de estudos, teve diversos problemas de adaptação e sofria para tirar boas notas. “Como não tirava as melhores notas, presumi que era simplesmente ruim em aprender. Refletindo, sinto que não sou – a estrutura de aprendizagem simplesmente não funcionava para mim. Passei a entender e respeitar isso e simplesmente aproveitar o que pude”, disse num papo com a Rolling Stone britânica. Faixas do disco como o soul blues climático Big brother e o shoegaze Oh well vão fundo nessas lembranças, falando de uma crise econômica (em 2008) que deixou sua família sem teto, e da separação de seus pais.

  • Ouvimos: Ethel Cain – Willoughby Tucker, I’ll always love you
  • Ouvimos: Jehnny Beth – You heartbreaker, you
  • Ouvimos: Alex G – Headlights

Summit Hill, folk cheio de cortes no ritmo, além de “defeitos especiais” de gravação, abre colocando o/a ouvinte no tema, lembrando que Lutalo e um amigo, ambos outsiders em meio aos ricaços, costumavam andar pelas cercanias da escola observando as casas de alto luxo, sempre pensando no abismo social que os separava daquela turma. Oceans swallow him whole, um guitar rock que une sombra e luz, e tem evocações de bandas como Placebo, fala indiretamente sobre alguém que tentou atingir Nova York seguindo por um lugar menor, mas deparou com montes de injustiças sociais.

The academy volta agora em edição deluxe, com quatro faixas a mais, aumentando o escopo musical do álbum. Se você ouvir apenas o comecinho de The academy, com Summit Hill e Ganon, vai ver em Lutalo um revivalista do blues rock dos anos 1970, e um experimentalista do folk. O disco avança para o shoegaze, para sons assemelhados ao britpop (Broken twin), para o country-rock com clima beatle (3 tem andamento lembrando o hit Come together) e até para algo que fica entre Pixies e Slowdive – em About (Hall of egress) e na faixa bônus Cracked lip. Há também emanações mais sombrias no folk psicodélico Haha halo, e no quase-trip hop Lightning strike.

Como letrista, Lutalo nem sempre é direto – às vezes parece criar diálogos nas letras, como o encontro de gerações de The bed.Oh well relata as tragédias familiares lembrando que o céu parecia desmoronar, e que os maiores problemas vividos por sua mãe não saíram nos jornais, nem foram “mostrados e contados”. No geral, uma poesia que machuca.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Winspear
Lançamento: 19 de setembro de 2025

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Ouvimos: Plonki – “Kicking at my heels” (EP)

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Plonki, novo projeto de Pleun Stork, estreia com o EP Kicking at my heels: basicamente soft rock psicodélico que às vezes soa como Steely Dan no ácido

RESENHA: Plonki, novo projeto de Pleun Stork, estreia com o EP Kicking at my heels: basicamente soft rock psicodélico que às vezes soa como Steely Dan no ácido

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Plonki é o novo projeto da compositora e multimusicista Pleun Stork, que tem no currículo participações em bandas como Thames e Captain Scarlet. Sob o codinome, Pleun reuniu alguns músicos amigos para fazer um som que pode ser definido tranquilamente como um soft rock com uma onda doidona – às vezes, soa como um Steely Dan no ácido, ou uma Electric Light Orchestra indie. É o som que você vai ouvir no EP Kicking at my heels, estreia de Plonki.

Lost to you, a faixa de abertura, chega a lembrar coisas dos Wings, ganhando guitarras pesadas depois e até uma vibe Brian May + Mick Ronson nos solos finais. Made my bed, a melhor do EP, caminha entre o rock e o pop texturizado, com tem ritmo funkeado, beleza e psicodelia na melodia. Short-lived wisdom é um Fleetwood Mac/Steely Dan torto, com ritmos quebrados e corte final psicodélico nos teclados.

O som de Kicking at my heels é quase todo baseado em vocais tranquilos, guitarras leves que depois ficam pesadas, piano Rhodes e batidas levemente dançantes. Quiet life chega a lembrar um Bee Gees indie, enquanto Heard you wrong é um rock gostosinho que ganha ruídos, e um final de voz-e-violão. No final, tem What else can you do?, um soft rock sombrio, que deve tanto à programação das rádios dos anos 1970 quanto a Pearl Jam e Alice In Chains.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 5 de setembro de 2025

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