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Crítica

Ouvimos: Orville Peck, “Stampede”

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Ouvimos: Orville Peck, "Stampede"
  • Stampede é o terceiro álbum do cantor e compositor sul-africano Orville Peck. Orville, na verdade, é um personagem criado pelo músico Daniel Pitout, baterista da banda punk canadense Nü Sensae.
  • Como Orville só se apresenta mascarado, as pessoas perceberam que ele era Daniel por causa das tatuagens. As informações batiam, já que Orville chegou a dizer que havia tocado em uma banda punk.
  • Filho de um engenheiro de som, antes da fama, Daniel/Orville chegou a fazer dublagens para desenhos animados e a participar de turnês de musicais. Também tem um diploma de atuação pela London Academy of Music and Dramatic Art.
  • Pony, primeiro disco de Orville (2019), foi lançado pelo selo Sub Pop – aquele mesmo, de Seattle. Estreou na Columbia em 2020 com um EP chamado Show Pony, que era uma continuação do primeiro álbum.

Stampede é a oportunidade para Orville Peck estourar de verdade e sair fora do gueto do country alternativo – ou seja: dos artistas que unem country e estilos como shoegaze, slacker rock e pós-punk. Os dois discos anteriores, Pony (2019) e Bronco (2022) traziam uma sonoridade country apesar de indie (o contrário também vale). Mas já estava evidente que Orville, com seu vocal lembrando uma mescla de Elvis Presley e Glen Campbell, poderia fazer fama entre fãs do estilo musical, especialmente da turma fanática pela faceta mais fora da lei (de Willie Nelson e Johnny Cash) do country. E ainda mais levando-se em conta que Bronco já trouxe uma sonoridade mais clara e com poucas misturas, em 15 faixas autorais.

O disco novo de Peck traz aquela fórmula que já ajudou vários artistas: ele retorna unindo autorais e covers, num álbum que é basicamente de duetos. Mesmo o material próprio foi composto com a ajuda de amigos, parceiros de duetos e um ou outro top seller do pop ou do country. Levando em conta que os discos anteriores eram extremamente autorais, é o disco menos “próprio” já lançado por Orville até o momento – mas segue no mesmo caminho de country queer aberto por ele.

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Só para começar, a faixa de abertura é a pérola Cowboys are frequently secretly fond with each other, composta nos anos 1980 pelo produtor e historiador musical Ned Sublette, e gravada por Willie Nelson em 2006. O próprio Willie comparece na regravação da música, com sua voz experiente e repleta de história, ao lado da de Orville. The hurtin’ kind ganhou cara de música de Elvis Presley, só que misturando country e rock sulista na receita, com Orville acompanhado do grupo Midland.

O que provavelmente vai ser bastante ouvido por fãs e iniciantes vão ser as participações de Alisson Russel, dando uma cara meio jazzística à Chemical sunset (parceria dela com Orville e mais uma turma), e de Beck, em Death valley high, uma canção que poderia ser do repertório do cantor de Loser, mas que aqui soa como uma música de Tony Joe White (conhece?). Tem também Margo Price, soltando a voz e contribuindo com um irresistível country anti-romântico de sua autoria, You’re an asshole, I can’t stand you (and I want a divorce). Já Midnight ride, com vocais de Kylie Minogue, lembra mais um spin-off country da própria Kylie, como se ela convidasse Orville para uma participação vocal na qual não rola muita química.

Dentre as outras releituras do disco, tem duas que merecem destaque: Elton John solta a voz na versão de sua Saturday night’s alright (For fighting) – uma versão que não acrescenta muito ao original, diga-se, mas vale ressaltar o enconro entre Elton e Orville, e a presença de uma canção que sempre funciona. Já T.J. Osborne e Jake Hagood soltam a voz com Orville na releitura do clássico Rhinestone cowboy, clássico gravado em 1974 por Glen Campbell e que uniu as paradas pop e country. Fica a impressão de uma operação levanta-carreira, para ajudar Orville a chamar de vez a atenção no universo country (e mostrar que, historicamente, o universo dos cowboys está bem mais próximo do mundo queer do que se imagina), mas Stampede tem muitas qualidades.

Nota: 7,5
Gravadora: Warner

Crítica

Ouvimos: Skunk Anansie – “The painful truth”

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Ouvimos: Skunk Anansie, "The painful truth"

RESENHA: Skunk Anansie encara o caos, o etarismo e a dor em The painful truth, disco intenso que mistura punk, grunge, no wave e neo soul.

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“Uma artista é uma artista / e ela não para de ser uma artista / porque ela é velha, sabe? / ela não arregaça as mangas / pega seu porta-retratos e vai embora / larga a caneta e coloca o chapéu / por causa da menopausa (…) / uma artista é uma artista / até que a morte nos faça partir”.

Poucas letras atuais falam mais profundamente a respeito de questões vitais no dia a dia do showbusiness (etarismo, machismo, expectativas da crítica, do mercado e do público) do que An artist is an artist, punk-rap que abre The painful truth, disco novo do Skunk Anansie, destacando os vocais ágeis e carismáticos da vocalista Skin. Trata-se de uma banda britânica dos anos 1990, com som mais associável ao pós-grunge e ao metal alternativo, que sempre foi meio desgarrada em relação a seus pares britânicos – volta e meia era incluída num saco de gatos chamado britrock, em oposição à turma mais viável comercialmente do britpop.

Leia também:

  • No nosso podcast, Oasis da pré-história ao começo da oasismania.
  • Blur entre 1993 e 1997 na volta do nosso podcast.
  • Ouvimos: Blur – Live at Wembley Stadium.
  • O som de 1994: descubra agora!

Lançado após tempos difíceis nas internas do grupo (o baterista Mark Richardson recupera-se de um câncer. e o baixista Richard “Cass” Lewis está em quimioterapia), The painful truth, sétimo álbum do Skunk Anansie, traz a banda encarando na maior parte do tempo questões de vida ou morte. O repertório fala de autocontrole (This is not your life), dores pessoais (Shame, dos versos dolorosos “eu recebi o amor da minha mãe / eu recebi a dor do meu pai / eu recebi a culpa do meu irmão”), caos pessoal (Lost and found), altos e baixos (My greatest moment) e desespero (Meltdown, dos versos “agora que tudo se resume / a quem você reza e quão alto”).

Musicalmente, é um disco que reúne partículas de no wave, grunge e até neo soul, dependendo do momento. This is now your life soa como um Depeche Mode afrotecnopunk, Shame invade a pequena área do nu metal, Cheers insere peso no punk pop e até toques de dub invadem Shoulda been you – uma mistura com a qual os fãs do grupo já estão acostumados. O rock eletrônico sombrio dá conta de Animal e até mesmo algo próximo dos climas robóticos do krautrock surge misturado em alguns momentos do álbum.

Ainda que não seja um álbum brilhante como Stoosh (o segundo, de 1995), A painful truth é um atestado de sobrevivência. E um disco que, mesmo falando alto, é cercado de silêncios nos arranjos e nos vocais.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8
Gravadora: FLG
Lançamento: 23 de maio de 2025.

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Crítica

Ouvimos: akaStefani e Elvi – “Acabou a humanidade”

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Ouvimos: akaStefani e Elvi, "Acabou a humanidade"

RESENHA: akaStefani e Elvi misturam funk, krautrock, screamo e eletrônica em um disco caótico e divertido sobre o fim do mundo e o absurdo do cotidiano.

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O pessoal ligado à banda Duo Chipa não consegue ficar sem produzir coisas. akaStefani é Audria Lucas, integrante e produtora do grupo, e em Acabou a humanidade, ela se une a Elvi, produtor e músico de Santo André (SP), para fazer um som que, nos momentos mais calmos, parece uma mistura insana de funk, screamo, Faust e Kraftwerk. Já a ficha técnica entrega elementos de Ciccone Youth (projeto pop-anti-pop do Sonic Youth, que gravou um disco em 1988) e de Mutantes em meio aos ruídos, vocais e sons eletrônicos.

Faixas como Paga meu salário (“chefe arrombado / paga meu salário”) e Roda punk, repleta de barulhos e loops, têm ar de música infantil destruidora, enquanto Maquiagem, com voz distorcida e zoada, unem rock experimental e batidão de funk. A zoeira volta numa espécie de paródia da ítalo house, Cupido arrombado (“flechou o lugar errado!”) e na house music texturizada de Porque eu tento.

No final, loucura na versão videogame de Panis et circenses, com sample do original dos Mutantes (Pani no circo), e na brilhante Sortudos no fim do mundo, que lembra uma vinheta de rádio, ou uma cantiga de roda pervertida, com versos como “nós somos sortudos / vamos ver o fim do mundo / acabou a humanidade / virus, bomba e armamento / pandemia é só o começo do fim”. Você acaba rindo, nem que seja de nervoso.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 30 de maio de 2025

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  • Ouvimos: Duo Chipa – Lugar distante
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Ouvimos: Chime Oblivion – “Chime Oblivion”

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Ouvimos: Chime Oblivion - "Chime Oblivion"

RESENHA: Chime Oblivion estreia com supergrupo punk-experimental que mistura pós-punk, no wave, funk torto e maluquices à la Devo e Stooges.

Uma grande surpresa: o Chime Oblivion parece ter surgido do nada, soa como mais uma banda de moleques de 20 anos fanáticos por pós-punk e garage rock, mas é bem mais que isso. Trata-se de um supergrupo iniciado por dois veteranos, David Barbarossa (Adam & The Ants/Bow Wow Wow) e John Dwyer (Osees, The Oh Sees e outras nomenclaturas).

É também um grupo de três guitarras – Barbarossa, Dwyer e Weasel Walter, este dos barulhentos Flying Luttenbachers – que inclui ainda um sujeito tocando marimba (Tom Dolas, também do Osees), um saxofonista em clima free jazz punk (Brad Caulkins, da banda Bent Arcana) e vocais femininos charmosos e zoeiros em vibe punk (HL Nelly, do Naked Lights). Só gente acostumada com experimentações e maluquices de estúdio.

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  • Ouvimos: Osees – Sorcs 80
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No primeiro álbum, essa turma tem como principais emanações pós-punk na onda do Gang Of Four, punk a la Buzzcocks e no-wave. Entre vinhetas quase inaudíveis feitas com um sintetizador, evocam também X Ray Spex e Slits em Neighborhood dog, fazem pós-disco-rap-punk cru e ríspido (Kiss her or be her), pré-punk percussivo (The fiend, com um curioso batidão lembrando Nação Zumbi na abertura), funk torto (Heated horses), levam o idioma da no wave para os anos 1960 (The uninvited guest). Por aí.

Somando 15 faixas em menos de meia hora, o Chime Oblivion vai se tornando mais próximo de um pré-punk formal (formal?) conforme as faixas se sucedem – cabendo perversões via Devo e Stooges da batida de Bo Diddley em And again e The mythomaniac, punk garageiro e anfetamínico em Smoke ring e I’m not a mirror e sons tribais em Grass, Cold pulse e The catalogue – esta, depois, ganha cara dub. Uma música tão confortável que quase não parece ter sido feita para tirar o rock do conforto – mas foi, sim.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Deathgod Corp
Lançamento: 18 de abril de 2025.

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