Crítica
Ouvimos: Highly Suspect, “As above, so below”

- As above, so below é o quinto disco do Highly Suspect. Vindo de Cape Cod, Massachussets, o grupo tem hoje na formação Johnny Stevens (vocais e guitarra), os irmãos gêmeos Rich (baixo, backing vocals) e Ryan Meyer (bateria, backing vocals), e Matt Kofos (guitarra, sintetizador e backing vocals).
- Johnny Stevens explicou assim como está sendo lançar o novo disco: “Peguei o ônibus para Nashville hoje e ouvi do começo ao fim e comecei a chorar. Não sei como estou me sentindo, mas não parecia real até hoje. Ouvindo e sabendo que o mundo está ouvindo comigo. Acho que não percebi quanta dor suportei nos últimos anos. Como se eu soubesse, mas quando ouvi tudo resumido… Foi uma experiência realmente poderosa”.
Visto de longe, o grupo norte-americano Highly Suspect é cheio de qualidades. Não houve quem deparasse com My name is human e Lydia, as duas músicas mais populares do grupo, e não ficasse com vontade de ouvir mais deles. Trata-se de um grupo que segue uma cartilha que costuma dar certo, e que gerou bandas como Royal Blood e Rival Sons: blues-rock com “algo mais”, influências de música eletrônica e hip hop, preocupação com o design musical como parte da composição e do arranjo.
De perto, o Highly Suspect é uma banda altamente suspeita (perdão pelo trocadilho): diluição e uso em demasia de fórmulas já usadas por bandas como Them Crooked Vultures, Soundgarden e Audioslave, discos grandes demais, músicas que poderiam ser BEM menores, uma certa tendência do vocalista Johnny Stevens de soar igualzinho a todo vocalista carismático que já pegou num microfone (em especial igual a Chris Cornell, do Soundgarden).
Se você estava esperando algo diferente para esse As above, so below, algumas notícias boas e ruins. Entre as ruins: a banda não perdeu tanto assim essas manias de sempre, tanto que muitas barrigas do disco novo poderiam ter dançado (como na balada “introspectiva” Melatonia, que depois vira um blues meio brega). O Highly Suspect dá mostras de que está mirando o público de novos fãs de clássicos do rock, ou pelo menos de antigos fãs de rock que aceitam o lado mais do mesmo do estilo – aquela turma costumeiramente desprezada com apelidos como “roquista” ou “motoclubista”. Tem um pouco disso no blues-rock de Summertime voodoo, que abre o álbum, e na postura “perigosa” de Champagne at our funeral, entre outras.
De bacana no disco, tem o punk hard rock de Suicide machine (que soa como nada mais que um Guns N Roses mais distorcido, vale dizer), o balanço de The blue-eyed devil e Mexico, e o clima meio Helmet/Tool do instrumental The reset, e o tom punk metal de Run for your death (More pills). Uma surpresa aqui, outra ali, mas nada demais.
Nota: 6
Gravadora: Roadrunner.
Crítica
Ouvimos: Residents, “Doctor Dark”

Morto em 2018, Hardy Fox era um dos raros integrantes dos Residents que costumavam ter seu nome citado em matérias sobre o grupo – que sempre tentou trabalhar secretamente, não revelando nem mesmo as identidades de seus integrantes, escondidos atrás da famosa máscara de globo ocular usada em shows e aparições públicas.
Sua partida é o combustível de Doctor Dark, novo disco dos Residents, espécie de ópera-rock de terror musical, falando sobre temas “agradáveis” como morte, eutanásia, abuso de drogas, suicídio e assassinatos. Para dar o tom sombrio da coisa, os Residents chamaram músicos do Conservatório de São Francisco.
O resultado é uma trilha sonora tensa, quase cinematográfica, como em White guys with guns — que, além de cordas ameaçadoras, traz ruídos de tiros — e Maggot remembers, que evolui para um híbrido de industrial e stoner rock. Em The gift, as cordas soam tristes e fúnebres, lembrando os momentos mais sombrios de Berlin, de Lou Reed.
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Por trás das faixas, há outro subtexto inquietante: o famoso julgamento da banda de heavy metal Judas Priest em 1990, quando a banda foi acusada de incitar suicídios com mensagens subliminares. Tension, que soa como um conto infantil em seu momento mais assustador, fala diretamente disso. O mesmo vale para She was never lovelier e Remembering mother, que têm o clima gélido de um funeral.
Tem espaço até para um momento quase amigável: Ol’ man river tem um quê de rock progressivo à moda da banda canadense FM — embora, claro, com o selo de bizarrice habitual dos Residents. E o fim da faixa já emenda em Take me to the river, uma avalanche de ruídos que lembram uma guerra de balas traçantes.
Doctor Dark é aquele disco que até os fãs mais fiéis vão ouvir com fascínio — mas provavelmente só ouvirão uma vez. Intenso, desconfortável e profundamente perturbador, é uma obra que encara de frente temas que muita gente prefere manter à distância. Mas, enfim, os Residents não vieram ao mundo para fazer concessões.
Nota: 7
Gravadora: Cryptic Corp
Lançamento: 28 de fevereiro de 2025.
Crítica
Ouvimos: Tigre Robô, “Telefone pra cachorro”

Muito do que está no primeiro disco do Tigre Robô, Telefone pra cachorro, confirma uma velha teoria nossa: bandas como Wire, The Fall e Public Image Ltd talvez sejam mesmo algumas das mais influentes da história. Com apenas onze faixas e nenhuma enrolação, o álbum da banda brasiliense mistura pós-punk de quarto com o experimentalismo lo-fi do Weatherday — como na abertura, Desconforto.
Há espaço também para uma mescla esperta de punk e rap, como em Atlas, com o excelente verso “como se dança com o mundo nas costas?”. A faixa remete a Akira S & As Garotas Que Erraram, e só não parece ainda mais com eles porque destaca uma guitarra — econômica, seca, honrando o pós-punk.
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O Tigre Robô, aliás, parece gostar de contrariar expectativas: Desperdício é punk de garagem que soa como o já citado Wire, ou como um Titãs alternativo, gravado na tora e meio bêbado. Definitivamente um indivíduo traz um baixo herdado da disco music (pense em Gang Of Four) e uma letra crua, com versos como “não sou uma ideia formada de certezas” e “nos fluidos pegajosos escorrem gosmentos os meus desejos”.
Carne de pescoço é blues rock ruidoso que remete à Patife Band – e que parece uma faixa gravada numa máquina de oito canais, em 1985, pronta para ser lançada num LP independente. Já Desconserto tem pegada power pop, melodia que flerta com os Beatles e uma vibe que, curiosamente, lembra o Blur dos primeiros discos.
Na salada sonora do Tigre Robô, ainda cabe Turismo, um punk com teclados e baixo em diálogo, na linha dos Stranglers. E uma pequena joia quase psicodélica: Todos seus amigos são supermodelos, que começa como se o Jefferson Airplane tivesse caído no punk e prossegue com solos de guitarra tomando o comando.
Nota: 9
Gravadora: Manga Rec
Lançamento: 20 de janeiro de 2025.
Crítica
Ouvimos: Kill Your Boyfriend, “Disco kills” (EP)

A dupla italiana Kill Your Boyfriend se autodefine como pós-punk, mas vai muito além dessa etiqueta em Disco kills, EP cujo título já dá uma pista do que vem pela frente. Influenciados por nomes como New Order, Kraftwerk e Giorgio Moroder, os dois transitam entre o rock industrial e eletrônico — como na faixa de abertura Ego, marcada por um grave que faz as vezes de baixo — e uma disco music mal-humorada, com tempero punk. Obsession, por exemplo, parece um encontro tenso entre Depeche Mode e Ministry, definindo bem os dois polos que sustentam o EP.
Apathy, com batida acelerada que flerta com o dubstep, entrega uma house music industrial nervosa, com uma letra curta e direta que chega quase como um rap — mais uma vez na trilha do Ministry. Illusion gira em torno de um riff grave e distorcido, com vocais simplificados e letra mínima. Discretion começa com um batidão eletrônico que ganha a companhia de um synth agitado, e tem ritmo pulado como num country-metal-dance.
No encerramento, a vibe sombria dá lugar a Youth, que se aproxima da dance music e do hi-NRG graças aos teclados cintilantes — embora os vocais ainda sejam marcados por ecos góticos. Um EP sujo, pesado, cheio de boas referências e, acima de tudo, divertido.
Nota: 8,5
Gravadora: Sister 9 Recordings
Lançamento: 9 de maio de 2025.
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