Crítica
Ouvimos: Einstürzende Neubaten, “Rampen (apm: alien pop music)”

- Rampen (apm: alien pop music) é o décimo-terceiro disco do grupo experimental alemão Einstürzende Neubaten, hoje formado por Blixa Bargeld (voz, guitarra, teclados), N.U. Unruh (percussão, voz, instrumentos artesanais), Alexander Hacke (baixo, voz), Jochen Arbeit (guitarra, voz) e Rudolph Moser (instrumentos artesanais, percussão, voz).
- “Rampen” é como a banda chama suas improvisações no palco, diante do público. A ideia do novo disco é compilar vários desses “rampen”, só que gravados em estúdio. Como quase todos os shows da turnê de 2022 tiveram improvisos, o grupo juntou vários deles no novo disco.
- O grupo diz que seu método de trabalho “não é muito diferente do dos Beatles ou de qualquer outra banda de 60 anos atrás: estamos todos na mesma sala e gravamos as músicas juntos”. Também informam que o material do disco novo, mesmo tendo sido gravado “ao vivo”, tem overdubs e edições.
O grupo alemão Einstürzende Neubaten hoje se parece mais com aquela ameaça que age nas sombras. Como um bicho voador super estranho que ataca pessoas, ou um animal que pula das árvores, ou aquela peste que vai agindo sem dar sinais. O tom pesado, dançante e eletrônico de outros discos do grupo ficou (quase) lá para trás.
Deve ser o tal do amadurecimento, mas nesse Rampen, em vários momentos, eles escapam por pouco de soarem parecidos com Peter Gabriel, ou com David Sylvian. Não que isso seja ruim, é apenas uma constatação de que até mesmo o rock industrial pode baixar o tom, e primar mais pela beleza do que pelo peso. Isso acontece logo na abertura, com Wie lange noch?, seguindo com a climática Ist ist, com os cânticos Tar & feathers e Pestalozzi e com o baião (de alemão) ambient Es könnte sein – que encerra com vocais sobrepostos e barulhos eletroacústicos.
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Se você achou viagem na maionese imaginar o Neubaten quebrando tudo no forró… Bom, é viagem e não é, mas vale lembrar que o grupo vem do mesmo país cuja principal banda eletrônica, o Kraftwerk, notabilizou-se por fazer canções com células rítmicas bem demarcadas – e que tem até um sambinha latino em Autobahn, principal composição deles.
O disco novo tem um lado mais funkeado e tranquilo em Isso isso, recebe um Black Sabbath/Led Zeppelin rápido em Better isses, volta-se para um tom mais post rock em músicas como Planet umbra e Trilobiten, e assusta (oba!) o ouvinte com rajadas de percussão em Ick vees nich (noch nich). Como curiosidade, tem Everything will be fine com ruídos, voz grave, vocais misturando alemão e inglês, e aquela sensação de quando a gente está passando um baita perigo e começa a dizer que “tudo vai ficar bem” só para se acalmar. O Neubaten ainda é perigoso, só não ostenta isso na cara do ouvinte.
Nota: 7,5
Gravadora: Potomak
Crítica
Ouvimos: Benefits, “Constant noise”

O maior benefício (sim, é um trocadilho idiota) do Benefits é mostrar que ainda é possível inovar no pós-punk. Mesmo que à custa da popularização do seu som, já que o que se ouve em Constant noise, segundo disco da dupla (Kingsley Hall e Robbie Major, os nomes dos sujeitos), é uma mistura de ambient, punk, eletrorock, metal e krautrock com vocais falados.
Não, não são raps. A música da dupla é uma onda constante de spoken word, com vocais cuspidos e frases raivosas como “estou olhando para uma montanha de merda”, “promessas se transformam em mentiras, que se transformam em promessas / e aí eles morrem”, “um homem na TV diz que mísseis estão disparando / e interrompe minha thread social”. Quase sempre o alvo é o ser humano perdido em meio a redes sociais, notícias a todo momento, burnout e cérebro apodrecendo.
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Constant noise é um disco que Kingsley definiu à Rolling Stone britânica como sendo “muito mais raivoso que o anterior” (a estreia Nails, de 2023). Ele também contou que sua voz saiu “fodida” da gravação do disco, ainda que os gritos se resumam à faixa Lies and fear, punk-metal pesado, batido intermitentemente na bateria e nas guitarras, com torrente de ruídos no final. A faixa-título, que abre o álbum, traz um coral perturbador de uma nota só ao fundo, até que a música se transforma numa faixa sintetizada e introspectiva. Land of the tyrants, com Zera Tonin nos vocais sussurrados, fala sobre o fim de todo tipo de virtude (“salve o ladrão / nesta terra dos tiranos”) em meio a um clima dançante e estranho. The victory lap é quase um drum’n bass.
Já a guerrilheira Missiles, estranhamente, é uma das primeiras vezes em que a narração do disco se torna calma – ainda que seja uma canção anti-guerra de seis minutos, com teclados em tom apocalíptico. Outra mudança rola em Blame, única faixa do disco a ter vibe de rap, com batidão dance cavernoso e teclados que parecem sonorizar a imagem de várias luzes se digladiando. Prosseguindo, tem o clima espacial e sombrio de Continual, uma espécie de samba-jazz ambient em Divide, um aceno à fantasmagoria do Radiohead em Everything is going to be alright e um jazz experimental e fúnebre em Terror forever.
Constant noise tem também duas canções que caminham do pop oitentista ao eletrônico lúgubre, Relentless e Dancing on the tables. Além da tempestade sonora (anunciada por um coral fantasmagórico e por uma letra que fala em cidades-quase-fantasma) em The brambles, e de uma rara música cantada, a destrutiva Burnt out family home. O Benefits não faz concessões, mas pode se tornar uma obsessão para quem busca música densa, perturbadora e implacável.
Nota: 9
Gravadora: Invada Records UK
Lançamento: 21 de março de 2025.
Crítica
Ouvimos: Nova Materia, “Current mutations”

Duo trevoso, meio francês, meio chileno, o Nova Materia descende do Panico, uma banda chilena de pós-punk que promovia uniões sonoras com ritmos latino-americanos. No EP Current mutations, Caroline Chaspoul e Eduardo Henriquez parecem mais interessados em promover mutações sonoras que passam pela experimentação synthpop. Lo que no entiendes, na abertura, está mais para um krautrock torto, com vocais falados e teclados distorcidos. Fictions of myself abre com um batidão que lembra um baile funk (alguns trechos vocais lembram alguém testando o som), descambando num eletrorock furioso.
Invisible flows tem tom tranquilo, mesmo com a batida constante e as vozes distorcidas – um som que começa como uma viagem etérea e aos poucos ganha contornos mais sombrios. Change mutate transformation, no final, traz o Nova Materia em um rock eletrônico de pegada quase industrial, guiado por ruídos de guitarra e teclado. O resultado é uma mistura intrigante: dançante e gótica, como um relaxamento imerso nas sombras.
Nota: 8
Gravadora: Beta Pictoris Music/Modulor
Lançamento: 7 de março de 2025.
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Crítica
Ouvimos: T. Greguol, “Coisa”

Seguindo a onda de Bum, disco anterior do músico paulista T. Greguol (resenhado aqui), Coisa é uma experiência, mais do que um álbum de música comum. Bum partiu de um teorema matemático, que chegou a ser a transcrito no encarte do álbum pelo matemático especialista em ciências de dados David Cecchini. Dessa vez, a ideia foi quebrar algumas regras e não seguir o manual tão à risca.
Greguol chamou 14 músicos, distribuiu tarefas e separou as performances deles em blocos. Coisa, tema de 11:30 que abre o disco, traz todo mundo junto, fazendo um som que vai do afro jazz ao som de grupos como Captain Beefheart & His Magic Band e Pink Floyd (o final tem algo de Interestellar overdrive). Guitarras distorcidas tomam conta da faixa, enquanto metais e uma bateria quase metálica chegam na sequência – e vozes percussivas unem-se aos batidões de tambor, como numa selva sonora. Nas gravações, Greguol gravou percussão tocando pela casa e “no saxofone, tentei errar tudo”, como conta.
Trazendo as performances separadas de blocos de músicos, as outras faixas praticamente recriam a música, como no batuque afro de Apeieio amimí aiôio, o jazz punk sabbathiano de Iva subiva caíva, a quase psicodelia de Malólia e a selvageria de Pexô mimí, com metais soando como animais levantando da hibernação.
Nota: 8
Gravadora: Independente.
Lançamento: 1 de fevereiro de 2025
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