Cinema
Michael Lindsay-Hogg: descubra agora!

O cara que dirigiu Let it be (o filme dos Beatles que hoje todo mundo conhece como uma série chamada Get back) rende, ele mesmo, uma série cheia de histórias. O americano Michael Lindsay-Hogg, hoje com 81 anos, diretor de TV e cinema, é filho da atriz irlandesa Geraldine Fitzgerald, grande nome da Broadway que migrou para o cinema. Herdou o sobrenome do inglês Sir Edward Lindsay-Hogg, com quem sua mãe foi casada, e cresceu acreditando que o britânico era seu pai biológico. Só que havia uma belíssima confusão por trás disso: sua mãe disse a ele, quando Michael tinha 16 anos, que havia suspeitas de que o cineasta Orson Welles – com quem ela tivera um affair – era seu verdadeiro pai.
A informação chegou aos ouvidos de Michael de maneira tão confusa que ele passou um bom tempo na dúvida sobre se aquilo era verdade ou não. E para piorar, Orson era bastante próximo da família, a ponto de Michael ser amigo de infância da filha do cineasta, Chris. O bom tempo aí não é figura de linguagem, não. Em 2010 (!), após até mesmo a própria Chris afirmar que acreditava que ele poderia ser ser irmão, Lindsay-Hogg decidiu fazer um teste de DNA, que não revelou praticamente nada. Seja como for, Patrick McGilligan, autor da biografia Young Orson, afirma que o cineasta não poderia ser pai de Michael pelo motivo de que Geraldine estava na Irlanda quando engravidou, e isso teria acontecido durante um período em que Orson estava nos EUA.
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Com o tempo, Michael foi se interessando por dirigir programas de TV e acabou cuidando do Ready steady go!, sucesso jovem da televisão britânica. Saiu-se tão bem que acabou inventando o videoclipe. Bom, não foi bem assim: ele dirigiu alguns dos primeiros promos (filmetes promocionais) para músicas pop, nos anos 1960. Coisas como Rain e Paperback writer, dos Beatles, 2.000 light years from home, dos Rolling Stones e outros.
Aliás, Hogg acabou cuidando de dois filmes para as maiores bandas dos anos 1960, Beatles e Stones. Por sinal dois caroços na vida das duas bandas: o proscrito Rock and roll circus, dos Rolling Stones, gravado em 1968 e só lançado em 1996, e… Let it be, dos Beatles, lançado no cinema em 1970 e sempre deixado de lado na era do DVD. E hoje, impossível não saber, transformado em prato principal das discussões pop, por causa de Get back.
Pega aí sete coisas que Michael dirigiu – só não incluímos Let it be/Get back, porque esse você tem a obrigação de saber.
“RAIN”, BEATLES (1966). Por causa desse filme e do de Paperback writer, George Harrison costumava dizer que os Beatles “inventaram a MTV”. Na verdade, inventaram o hábito de fazer várias versões para o mesmo clipe, já que Rain teve três clipes, todos dirigidos por Michael Lindsay-Hogg. Num dos mais populares, os quatro parecem saídos da contracapa do LP Revolver (1966). Paul, que tivera um acidente de moto, aparece com um dente quebrado.
“CHILD OF THE MOON” – ROLLING STONES (1968). Lado B do single Jumpin’ Jack Flash, e a música mais bonita já feita por Mick Jagger e Keith Richards. Ganhou um clipe extremamente surrealista, o melhor feito pela banda na época. Uma mesma personagem é interpretada na juventude por Dame Eileen Atkins, e na velhice por Sylvia Coleridge. E deixa Jagger, Richards, Brian Jones, Bill Wyman e Charlie Watts intrigados. O clipe também é de Lindsay-Hogg, em parceria com Tony Richmond. Outros clipes da banda, como Angie e Start me up, também seriam dirigidos por Hogg.
“ROLLING STONES ROCK AND ROLL CIRCUS” (1968, lançado em 1996). Concebido por Mick Jagger como uma ideia original para promover o disco Beggar’s banquet, esse filme tem caráter histórico. Soa como uma despedida digna dos anos 1960 – um ano antes dos Stones transformarem a década quase num morto-vivo com o festival de Altamont – e é a última aparição da banda ao vivo com Brian Jones, que morreria no ano seguinte. Os motivos pelos quais a banda decidiu engavetar o filme sempre foram nebulosos, e o mais provável é que tenham se sentido engolidos pelo Who (na ponta dos cascos). O próprio Hogg diz que ouviu Keith Richards dizendo que o show não era “o Who Rock And Roll Circus”. Parte da filmagem ficou perdida por vários anos, e teve que ser rastreada e restaurada.
“JOURNEY TO THE UNKNOWN” (série britânica, 1968). Produção de horror exibida pela ABC nos Estados Unidos, entre 1968 e 1969, e na Inglaterra pela ITV em 1969. Lindsay-Hogg dirigiu o episódio Matakitas is coming, sobre uma pesquisadora e um bibliotecário presos numa biblioteca com um assassino em série (o Matakitas do título, interpretado por Lion Lissek). Foi ao ar em 28 de novembro de 1968 nos EUA.
“NASTY HABITS” (filme de 1977). Michael, que já havia feito vários telefilmes, dirigiu essa comédia exibida nos cinemas, com Glenda Jackson, Melina Mercouri e Geraldine Page no elenco. O roteiro era baseado em The abbess of crewe, livro da escritora escocesa Muriel Spark, e leva o escândalo de Watergate para o dia a dia maluco de um bando de freiras sem caráter. Tem inteiro no YouTube.
“THE CONCERT IN CENTRAL PARK” – SIMON & GARFUNKEL (1981, lançado em 1982). Feito com o objetivo de arrecadar fundos para a manutenção do parque de Nova York, o concerto que marcou a reaproximação da dupla (uma reaproximação que só duraria três anos, vale dizer) não teve sua importância dimensionada pelos dois na hora. Art Garfunkel se achava fora de forma, mas topou cantar. Paul Simon só se tocou da repercussão quando leu os jornais no dia seguinte. Hogg dirigiu o filme do concerto para transmissão na HBO e lançamento em vídeo. O próprio Simon despejou uma carreta de grana na gravação.
“YOU GIVE GOOD LOVE” – WHITNEY HOUSTON (1985). Lindsay-Hogg dirigiu também um dos primeiros clipes de Whitney, que foi definido pela Time como “a história de um romance com um cinegrafista”, já que a cantora aparecia sendo filmada por um admirador, no vídeo. Acostumado com os Beatles e os Stones dos primeiros tempos, Hogg estranhou o batalhão de funcionários com quem teria de trabalhar: cabeleireiros, maquiadores, estilistas… Mas tratava-se de um orçamento nada apertado e Houston era uma das maiores estrelas pop da época.
Cinema
Urgente!: Cinema pop – “Onda nova” de volta, Milton na telona

Por muito tempo, Onda nova (1983), filme dirigido por Ícaro Martins e José Antonio Garcia – e censurado pelo governo militar –, foi jogado no balaio das pornochanchadas e produções de sacanagem.
Fácil entender o motivo: recheado de cenas de sexo e nudez, o longa funciona como uma espécie de Malhação Múltipla Escolha subversivo, acompanhando o dia a dia de uma turma jovem e nada comportada – o Gayvotas Futebol Clube, time de futebol formado só por garotas, e que promovia eventos bem avançadinhos, como o jogo entre mulheres e homens vestidos de mulher. Por acaso, Onda nova foi financiado por uma produtora da Boca do Lixo (meca da pornochanchada paulistana) e acabou atropelado pela nova onda (sem trocadilho) de filmes extremamente explícitos.
O elenco é um espetáculo à parte. Além de Carla Camuratti, Tânia Alves, Vera Zimmermann e Regina Casé, aparecem figuras como Osmar Santos, Casagrande e até Caetano Veloso – que protagoniza uma cena soft porn tão bizarra quanto hilária. Durante anos, o filme sobreviveu em sessões televisivas da madrugada, mas agora ressurge restaurado e remasterizado em 4K, estreando pela primeira vez no circuito comercial brasileiro nesta quinta-feira (27).
Meu conselho? Esqueça tudo o que você já ouviu sobre Onda nova (ou qualquer lembrança de sessões anteriores). Entre de cabeça nessa comédia pop carregada de referências roqueiras da época, um cruzamento entre provocação punk e ressaca hippie. O filme abre com Carla Camuratti e Vera Zimmermann empunhando sprays de tinta para pixar os créditos, mostra Tânia Alves cantando na noite com visual sadomasoquista, segue com momentos dignos de um musical glam – cortesia da cantora Cida Moreyra, que brilha em várias cenas – e trata com surpreendente modernidade temas como maconha, cultura queer, relacionamentos sáficos, mulheres no poder, amores fluidos e, claro, futebol feminino.
Se fosse um disco, Onda nova seria daqueles para ouvir no volume máximo, prestando atenção em cada detalhe e referência. A trilha sonora passeia entre o boogie oitentista e o synthpop, com faixas de Michael Jackson e Rita Lee brotando em alguns momentos. E o que já era provocação nos anos 1980 agora ressurge como registro de uma juventude que chutava o balde sem medo. Vá assistir correndo.
*****
Já Milton Bituca Nascimento, de Flavia Moraes, que estreou na última semana, segue outro caminho: o da reverência, mesmo que seja um filme documental. Durante dois anos, Flavia seguiu Milton de perto e produziu um retrato que, mais do que um relato biográfico, é uma celebração. E uma hagiografia, aquela coisa das produções que parecem falar de santos encarnados.
A narração de Fernanda Montenegro dá um tom solene – e, enfim, logo no começo, fica a impressão de um enorme comercial narrado por ela, como os daquele famoso banco que não patrocina o Pop Fantasma. Aos poucos, vemos cenas da última turnê, reações de fãs, amigos contando histórias. Marcio Borges lê matérias do New York Times sobre Milton, para ele. Wagner Tiso chora. Quincy Jones sorri ao falar dele. Mano Brown solta uma pérola: Milton o ensinou a escutar. E Chico Buarque assiste ao famigerado momento do programa Chico & Caetano em que se emociona ao vê-lo cantar O que será – um vídeo que virou meme recentemente.
Isso tudo é bastante emocionante, assim como as cenas em que a letra da canção Morro velho é recitada por Djavan, Criolo e Mano Brown – reforçando a carga revolucionária da música, que usava a imagem das antigas fazendas mineiras para falar de racismo e capitalismo. Mas, no fim, o que fica de Milton Bituca Nascimento é a certeza de que Milton precisava ser menos mitificado e mais contado em detalhes. Vale ver, e a música dele é mito por si só, mas a sensação é a de que faltou algo.
Por acaso, recentemente, Luiz Melodia – No coração do Brasil, de Alessandra Dorgan, investiu fundo em imagens raras do cantor, em que a história é contada através da música, sem nenhum detalhe do tipo “quem produziu o disco tal”. Mas o homem Luiz Melodia está ali, exposto em entrevistas, músicas, escolhas pessoais e atitudes no palco e fora dele. Quem não viu, veja correndo – caso ainda esteja em cartaz.
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Cinema
Urgente!: Filme “Máquina do tempo” leva a música de Bowie e Dylan para a Segunda Guerra

Descobertas de antigos rolos de filme, assim como cartas nunca enviadas e jamais lidas, costumam render bons filmes e livros — ou, pelo menos, são um ótimo ponto de partida. É essa premissa que guia Máquina do tempo (Lola, no título original), estreia do irlandês Andrew Legge na direção. A ficção científica, ambientada em 1941, acompanha as irmãs órfãs Martha (Stefanie Martini) e Thomasina (Emma Appleton), e chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (13), dois anos após sua realização.
As duas criam uma máquina do tempo — a Lola do título original, batizada em homenagem à mãe — capaz de interceptar imagens do futuro. O material que elas conseguem captar é todo registrado em 16mm por uma câmera Bolex, dando origem aos tais rolos de filme.
E, bom, rolo mesmo (no sentido mais problemático da palavra) começa quando o exército britânico, em plena Segunda Guerra Mundial, descobre a invenção e passa a usá-la contra as tropas alemãs. A princípio, a estratégia funciona, mas logo começa a sair do controle. As manipulações temporais geram consequências inesperadas, enquanto as personalidades das irmãs vão se revelando e causando conflitos.
Com apenas 80 minutos de duração e filmado em 16 mm (com lentes originais dos anos 1930!), Máquina do tempo pode soar confuso em algumas passagens. Não apenas pelas idas e vindas temporais, mas também pelo visual em preto e branco, valorizando sombras e vozes que quase se tornam personagens da história. Em alguns momentos, é um filme que exige atenção.
O longa também tem apelo para quem gosta de cruzar cultura pop com história. Martha e Thomasina ficam fascinadas ao ver David Bowie cantando Space oddity (o clipe brota na máquina delas), tornam-se fãs de Bob Dylan, adiantam a subcultura mod em alguns anos (visualmente, inclusive) e coadjuvam um arranjo de big band para o futuro hit You really got me, dos Kinks, que elas também conseguem “ouvir” na máquina. Um detalhe curioso: a própria Emma Appleton operou a câmera em cenas em que sua personagem Thomasina se filma (“para deixar as linhas dos olhos perfeitas”, segundo revelou o diretor ao site Hotpress).
Ainda que a cultura pop esteja presente, Máquina do tempo é, acima de tudo, um exercício de futurologia convincente, explorando uma futura escalada do fascismo na Inglaterra — que, no filme, chega até mesmo à música, com a criação de um popstar fascista.
A ideia faz sentido e nem é muito distante do que aconteceu de verdade: punks e pré-punks usavam suásticas para chocar os outros, Adolf Hitler quase figurou na capa de Sgt. Pepper’s, dos Beatles, Mick Jagger não se importou de ser fotografado pela “cineasta de Hitler” Leni Riefenstahl, artistas como Lou Reed e Iggy Pop registraram observações racistas em suas letras, e o próprio Bowie teve um flerte pra lá de mal explicado com a estética nazista. Mas o que rola em Máquina do tempo é bem na linha do “se vocês soubessem o que vai acontecer, ficariam enojados”. Pode se preparar.
Cinema
Ouvimos: Lady Gaga, “Harlequin”

- Harlequin é um disco de “pop vintage”, voltado para peças musicais antigas ligadas ao jazz, lançado por Lady Gaga. É um disco que serve como complemento ao filme Coringa: Loucura a dois, no qual ela interpreta a personagem Harley Quinn.
- Para a cantora, fazer o disco foi um sinal de que ela não havia terminado seu relacionamento com a personagem. “Quando terminamos o filme, eu não tinha terminado com ela. Porque eu não terminei com ela, eu fiz Harlequin”, disse. Por acaso, é o primeiro disco ligado ao jazz feito por ela sem a presença do cantor Tony Bennett (1926-2023), mas ela afirmou que o sentiu próximo durante toda a gravação.
Lady Gaga é o nome recente da música pop que conseguiu mais pontos na prova para “artista completo” (aquela coisa do dança, canta, compõe, sapateia, atua etc). E ainda fez isso mostrando para todo mundo que realmente sabe cantar, já que sua concepção de jazz, voltada para a magia das big bands, rendeu discos com Tony Bennett, vários shows, uma temporada em Las Vegas. Nos últimos tempos, ainda que Chromatica, seu último disco pop (2020) tenha rendido hits, quem não é 100% seguidor de Gaga tem tido até mais encontros com esse lado “adulto” da cantora.
A Gaga de Harlequin é a Stefani Joanne Germanotta (nome verdadeiro dela, você deve saber) que estudou piano e atuação na adolescência. E a cantora preparada para agradar ouvintes de jazz interessados em grandes canções, e que dispensam misturas com outros estilos. Uma turminha bem específica e, vá lá, potencialmente mais velha que a turma que é fã de hits como Poker face, ou das saladas rítmicas e sonoras que o jazz tem se tornado nos últimos anos.
O disco funciona como um complemento a ao filme Coringa: Loucura a dois da mesma forma que I’m breathless, álbum de Madonna de 1990, complementava o filme Dick Tracy. Mas é incrível que com sua aventura jazzística, Gaga soe com mais cara de “tá vendo? Mais um território conquistado!” do que acontecia no caso de Madonna.
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O repertório de Harlequin, mesmo extremamente bem cantado, soa mais como um souvenir do filme do que como um álbum original de Gaga, já que boa parte do repertório é de covers, e não necessariamente de músicas pouco conhecidas: Smile, Happy, World on a string, (They long to be) Close to you e If my friends could see me now já foram mais do que regravadas ao longo de vários anos e estão lá.
De inéditas, tem Folie à deux e Happy mistake, que inacreditavelmente soam como covers diante do restante. Vale dizer que Gaga e seu arranjador Michael Polansky deram uma de Carlos Imperial e ganharam créditos de co-autores pelo retrabalho em quatro das treze faixas – até mesmo no tradicional When the saints go marching in.
Michael Cragg, no periódico The Guardian, foi bem mais maldoso com o álbum do que ele merece, dizendo que “há um cheiro forte de banda de big band do The X Factor que é difícil mudar”. Mas é por aí. Tá longe de ser um disco ruim, mas ao mesmo tempo é mais uma brincadeirinha feita por uma cantora profissional do que um caminho a ser seguido.
Nota: 7
Gravadora: Interscope.
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