Cultura Pop
Várias coisas que você já sabia sobre Paranoid, do Black Sabbath

Dizem por aí que o segundo disco é um teste para qualquer artista – ou pelo menos era, quando discos vendiam. Havia também outra categoria de “segundo disco”: era quando o primeiro disco fazia sucesso, o artista embarcava numa turnê e rolava um “rapazes, precisamos de um segundo disco urgente, ainda que seja feito entre um show e outro, com a banda deixando de dormir para escrever músicas”. Foi assim com o Led Zeppelin II, do Led Zeppelin. E foi assim com Paranoid, do Black Sabbath (1970).
O segundo disco do Black Sabbath avançava bastante em relação ao primeiro, e tratava de colocar os pés de Ozzy Osbourne (voz), Tony Iommy (guitarra), Geezer Butler (baixo) e Bill Ward (bateria) na Terra. Em vez de recorrer tão-somente a universos assustadores e a demônios, o grupo falava de pessoas que se defrontavam com seus destinos aterrorizantes (Hands of doom, sobre os soldados que retornavam da Guerra do Vietnã viciados em drogas), disputas de poder (War pigs), o rescaldo da era hippie (Paranoid era sobre abuso de drogas). Se o primeiro disco havia sido gravado em poucas horas, o segundo foi feito no período extravagante de cinco dias, com direito à canção mais pop da história do Sabbath (a faixa-título), uma mudança de título (o disco quase se chamou War pigs) e a algumas experimentações de estúdio – luxo do qual a banda não conseguiu desfrutar no primeiro disco.
Paranoid chegou aos 50 anos em 18 de setembro e ganha agora uma reedição de luxo, num conjunto de cinco LPs que inclui o álbum original, um raro mix quadrafônico de 1974, dois shows de 1970 (de Montreux e Bruxelas, prensados em vinil pela primeira vez). Mais: a caixa vem acomapnhada por um livro de capa dura, com extensas notas de apresentação, entrevistas com todos os quatro membros da banda, fotos raras e recordações, um pôster, além de uma réplica do livro vendido durante a turnê do disco.
E segue aí nosso relatório sobre Paranoid. Leia ouvindo o disco.
ANTES DE MAIS NADA, você já leu aqui no POP FANTASMA um texto parecido com esse sobre o primeiro (e epônimo) disco do Black Sabbath.
DEU BOM. Black Sabbath, a estreia da banda (1970), vendeu discos e, mais que tudo, fez bastante barulho. Todo mundo queria saber qual era a daquela banda barulhenta e cabeluda, cujos integrantes falavam de demônios, contos assustadores e histórias de amor que acabavam mal. Paranoid, o novo disco, viria com um condimento a mais. A banda estava preparando letras mais políticas. War pigs, um dos momentos mais emocionantes dos shows do Sabbath, já tinha virado hit de palco e seria lançada no disco.
DEU RUIM. Para vender bem o Sabbath e angariar fãs nos EUA, a Warner, gravadora do grupo por lá, agendou uma turnê em julho de 1970, onde passariam por lugares de enorme prestígio. Só que a turnê foi cancelada por um motivo pitoresco: a gravadora achou que não seria de bom tom uma banda chamada Black Sabbath se apresentar nos EUA na época do julgamento do lunático Charles Manson, cuja “família” de psicopatas suscitou uma caça aos satanistas do rock.
E MAIS ISSO. A história de Manson foi parar, com riqueza de detalhes, na edição de 1º março de 1970 da Esquire, uma das mais longevas revistas dos Estados Unidos. O artigo era assinado pelo superjornalista Gay Talese (vale MUITO a pena ler este texto).
QUE PARADA É ESSA? Mesmo com a banda ausente dos palcos, rolou uma Parada Black Sabbath em San Francisco, liderada pelo chefe da igreja de satã, Anton LaVey, com o apoio da Warner. O evento foi tão caricato e inacreditável que fez a banda rir assim que viu as fotos. Tinha desde dançarinas até um trio elétrico com uma banda cover do Sabbath.
MESMO SEM SHOWS, Paranoid, primeiro single do disco, foi lançado em agosto de 1970 com um baita sucesso, subindo rapidamente as paradas. Isso credenciou o Sabbath a conseguir ir ao prestigioso Top of the pops, paradão de sucessos britânico, para tocar a música.
ALIÁS E A PROPÓSITO, a banda nunca mais voltou a ser convidada para o programa depois dessa ocasião. Ficaram de saco cheio da equipe da BBC dizendo “não olhe para cá, olhe para cá, fique aqui, vá pra lá”. Iommi ainda arrumou encrenca com um diretor, quando reclamou de um spot de luz que apontava direto para sua cara e o deixava cego.
PASSADO PRA TRÁS. A banda vinha sendo empresariada por Jim Simpson, que tinha – biógrafos do grupo apontam – uma perspectiva um tanto mais humilde para o Sabbath, com shows dados em lugares pequenos, enquanto Paranoid, o single, chegava ao Top 5. Uma equipe de empresários liderada por Patrick Meehan e Wilf Pine (a World Wide Artists) fez tantas promessas mirabolantes para o Sabbath (estouro mundial, grana a rodo) que eles largaram Simpson de mão. Jim recebeu uma carta de um dos advogados da WWA pouco antes do LP Paranoid sair, dizendo que ele “não representava mais a banda nem tinha autorização para contatá-los diretamente”.
ELE FICOU PUTO. Jim, um empresário musical da cidade da banda (Birmingham, na Inglaterra), que tinha arrumado as primeiras oportunidades de peso para o Sabbath, emputeceu-se com a afronta. “Eles disseram que não fiz meu trabalho direito, mas quando deixei o Sabbath, eles tinham um single no Top 5”, reclamou, garantindo que nunca teve rancor de Ozzy, de quem pessoalmente gostava.
MUITO PUTO. Em 2017, quando o Black Sabbath estava fazendo seus dois últimos shows em Birmingham, houve outra história envolvendo Jim, que era popularíssimo na cidade e chegou a dar entrevistas à rádios locais sobre a história da banda: ele não recebeu convite para ir às apresentações e precisou ir por conta própria. “Estou desapontado mas não surpreso”, garantiu.
HIPPIE É O C…. Apesar do Black Sabbath tomar drogas como se fossem Mentos e de, em 1972, dedicar Black Sabbath vol. 4 à “grande indústria da coca de Los Angeles” (isso aparece na ficha técnica), Paranoid tinha como um de seus temas as vidas perdidas por causa de dois assuntos-chave da era hippie: as drogas e a Guerra do Vietnã. A música-título, disse Butler certa vez, falava do estado depressivo pelo qual as pessoas passavam por causa das drogas. Para falar da vivência dos soldados americanos em Hand of doom, a banda recorreu à época em que tocaram em bases do exército dos EUA.
LEGALIZE JÁ. Fairies wear boots, que inicialmente começou como uma letra de Butler sobre um desentendimento da banda com skinheads, ganhou um bizarro acréscimo anti-drogas escrito por Ozzy no final (“o médico me disse: ‘filho, você foi longe demais/fumar e viajar é tudo o que você faz'”). A letra soava como uma bronca em si próprio e nos colegas, já que durante a elaboração de Paranoid, o que a banda mais fez foi fumar maconha. “Por isso que as letras são tão estranhas”, reconhece Iommi.
PARANOID, O SINGLE. Rodger Bain, o produtor, e Tony Allom, o técnico de som (por sinal os mesmos do primeiro disco), no meio das gravações, viram que havia um buraco em Paranoid e faltava uma música. E sugeriram a Iommi que compusesse “uma música curta”, o que nem era a especialidade da banda. O guitarrista compôs a introdução e os riffs rapidamente, enquanto todos foram almoçar. Geezer, quando voltou, fez a letra, aproveitando algumas frases que Ozzy falou enquanto improvisava as linhas vocais. Bill Ward garante que a canção foi composta em “vinte e cinco minutos, se tanto”.
ELE FOI CONTRA. Inicialmente Geezer Butler não gostou da música: achou o resultado muito parecido com o de Communication breakdown, do Led Zeppelin. Mas ninguém concordou com o baixista e a banda gravou a faixa assim mesmo.
HORA DO SOLINHO. Iommi, por sua vez, diz que detestou a maneira como o solo de Paranoid soou no disco. Tudo por causa de uma caixa Leslie que Rodger insistiu em usar no solo. “Quando ouvi, reclamei, mas deixaram dessa forma. Agora já me acostumei”, contou.
MAIS EFEITOS. Rodger Bain estava animado: além de incentivar a banda a compor sua canção mais pop e de dar seu toque especial no solo da faixa, pôs o tal oscilador Leslie na voz de Ozzy também em Planet caravan e na introdução de Iron man (é o que causa aquela tremedeira no “iron, iron man!”).
E SEGUEM AÍ os dois vídeos oficiais de Paranoid – o primeiro feito para o psicodélico Beat club, da Alemanha, o segundo filmado na Bélgica.
WAR PIGS. O nome da faixa surgiu bem depois: no começo, a ideia da banda era compor uma canção chamada Walpurgis que, segundo Ozzy, era “um termo sobre casamento na magia negra”. Depois o disco quase se chamou War pigs, até que a Vertigo ouviu Paranoid, viu que a canção tinha potencial e a transformou em single.
A CAPA de Paranoid, você deve saber, não faz o menor sentido. Quando o disco ainda se “chamava” War pigs, a gravadora pagou o mesmo cara que havia feito a foto da capa do primeiro disco, Keith Macmillan (ou Keef, como aparece na contracapa) para fazer uma foto de um “maníaco de guerra” no Black Park, em Buckinghamshire. O garoto da capa é um sujeito chamado Roger Brown, que era assistente de Keef.
ADEREÇOS. Antes das fotos (todas feitas à noite), a dupla foi a uma espécie de Casas Turuna local comprar uma espada, um escudo e uma… máscara de porco. Fizeram as fotos com todos os adereços. Keef diz que as fotos com a máscara eram “muito melhores” do que a que foi escolhida para a capa, mas nenhum dos cliques com o guerreiro mascarado foi guardado. Para dar a sensação de movimento da capa, Keith usou flash ultravioleta.
UÉ. Até mesmo os integrantes da banda ficaram surpresos quando viram que o nome do disco havia mudado para Paranoid. Keith, mais ainda. A gravadora havia modificado o título mas – como era bastante comum numa época em que não havia computação gráfica e capas davam (muito) trabalho – nem se importou em encomendar outra foto e embrulhou o produto assim mesmo. “Chegamos a a perguntar à gravadora: ‘O que é que o título tem a ver com a capa?'”, contou Iommi.
ALIÁS E A PROPÓSITO, o parque onde foi feita a foto da capa de Paranoid aparece em vários filmes da franquia James Bond. Tudo porque fica bem próximo ao Pinewood Studios. O Forte Knok de 007 contra Goldfinger (1964) era lá.
SEI NÃO. Tony revela que possivelmente, nem ele nem Ozzy sabiam o que queria dizer “paranoico” naquela época, e atribui a entrada do vocábulo na história da banda à “grande inteligência” de Geezer. Já o baixista afirma que quis falar em “paranoia” porque não conhecia a palavra “depressão” – que é o verdadeiro sentido da letra.
ROBÔ VIVO. Iron man teve sua letra inspirada por uma história em quadrinhos que um dos dos integrantes do Sabbath leu, sobre um robô que ganhava vida. “Mas eu acho que tinha um subtexto sério por trás disso, de que alguém vivo não poderia sair de seu próprio corpo”, viaja Iommi. A canção quase se chamou Iron bloke (algo como “sujeito de ferro”), até que Ozzy ouviu o solo e disse que soava como “um homem de ferro andando”.
TUM DUM TISS. Paranoid, você deve lembrar, tem um tema instrumental meio jazzístico com um solo de bateria fenomenal de Bill Ward, Rat salad. A música une Paranoid a Led Zeppelin II, já que o segundo disco do Led tinha uma música que obedecia à mesma estrutura de Rat salad: Moby dick tinha começo curto, solo de bateria, volta do mesmo tema do início e morte súbita, com a entrada da última música do disco (Fairies wear boots, no caso do Sabbath, Bring it on home, no do LZ).
ALIÁS E A PROPÓSITO, vale citar que solos de bateria estavam em alta no finzinho dos anos 1960. O Iron Butterfly fez sucesso com os quatro minutos de bateria de In a gadda da vida, em 1968. Os Beatles, com Ringo Starr nas baquetas, aderiram no improviso The end, em 1969. O Chicago enchia seu primeiro disco, o duplo Chicago Transit Authority (1969), de solinhos de batera. O Grand Funk Railroad fazia o mesmo em T.N.U.C., faixa quilométrica de seu primeiro disco, On time (1969). O Black Sabbath só estava seguindo uma tendência.
AINDA ASSIM, Geezer diz que a banda, cujos integrantes eram amigos do Led, imitou os colegas sem constrangimentos. “O Led era nossa banda preferida na época”, contou. Tony, sabendo que o LZ roubava um monte de coisas dos outros, nem esquentou a cabeça.
CABELO BONITO. O título Rat salad, segundo Geezer Butler, era uma zoação com o baterista Bill Ward pelo seu hábito de não pentear o cabelo. A música surgiu quando o Sabbath era uma banda iniciante, era paga por hora de show, e Ward precisava inventar alguma coisa para preencher o tempo ocioso no palco.
PERIGO. No começo dos anos 1970, uma enfermeira americana foi encontrada morta e, em seu toca-discos, foi vista uma cópia de Paranoid. A polícia começou uma investigação para descobrir se o disco causou ou não o suicídio dela. Depois chegaram à conclusão de que ela já sofria de depressão e que a banda não teve nada a ver com o óbito.
OZZY PEGADOR. Butler costumava dizer que, por causa da pouca predisposição do Sabbath para compor músicas românticas, não havia garotas nas plateias do grupo. Em sua autobiografia Eu sou Ozzy, Ozzy Osbourne diz ter outra lembrança e conta que certa vez, num hotel Holiday Inn, na Califórnia, protagonizou cenas dignas de Calígula com os companheiros. Para compensar, o Sabbath era seguido de perto por fãs que levavam aquela história de satanismo muito a sério (como o próprio LaVey).
DEU CERTO. Paranoid tornou-se o primeiro álbum da banda a liderar as paradas do Reino Unido e vendeu mais de 4 milhões de cópias somente nos EUA – onde é um disco de 1971, já que só saiu por lá em janeiro. No Brasil, Paranoid foi lançado pela Philips em 1971 com modificações na capa: a gravadora dispensou a capa dupla e pôs uma foto da banda na contracapa. Em Israel, foi lançado com outra capa e outro título, Attention!. O disco, como costumava acontecer com o Sabbath, foi mal recebido pela crítica, até mesmo por jornalistas que depois se tornariam fãs da banda, como o mitológico Lester Bangs.
TURNÊ. Logo que Paranoid chegou às lojas, o Black Sabbath iniciou uma turnê na qual abria para artistas como Alice Cooper, Savoy Brown e Faces. Às vezes a banda era vaiada, às vezes virava o jogo – abrindo para os Faces, deixou a plateia tão maluca que alguns “fãs” vaiaram a banda principal, logo depois. Drogas variadas começaram a aparecer nos bastidores. Ozzy lembra ter sido iniciado na cocaína por Leslie West, do Mountain, que insistiu para o amigo cheirar com ele. Nos camarins de um dos shows da tour, os quatro receberam a visita da gangue de motociclistas Hell’s Angels. Foram avisados de que eles eram fãs da banda e de que o Black Sabbath teria proteção onde estivessem.
E já que você chegou até aqui, pega aí um dos usos mais apropriados de Paranoid, a canção: numa das primeiras cenas da animação Angry Birds, the movie.
Infos tiradas de vídeos, sites, entrevistas e dos livros Iron man, de Tony Iommi, e de Black Sabbath, de Mick Wall.
Veja também no POP FANTASMA:
– Demos o mesmo tratamento a Physical graffiti (Led Zeppelin), a Substance (New Order), ao primeiro disco do Black Sabbath, a End of the century (Ramones), ao rooftop concert, dos Beatles, a London calling (Clash), a Fun house (Stooges), a New York (Lou Reed), aos primeiros shows de David Bowie no Brasil, a Electric ladyland (The Jimi Hendrix Experience) e a Pleased to meet me (Replacements). E a Dirty mind (Prince).
– Demos uma mentidinha e oferecemos “coisas que você não sabe” ao falar de Rocket to Russia (Ramones) e Trompe le monde (Pixies).
– Mais Black Sabbath no POP FANTASMA aqui.
Cultura Pop
Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada
A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.
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O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.
“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).
Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.
Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.
O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação
Cultura Pop
Urgente!: E agora sem o Ozzy?

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.
Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.
Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.
Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.
Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.
Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).
Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.
Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação
Crítica
Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.
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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.
Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.
E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.
Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.
De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.
Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.
O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.
O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.
Já Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.
Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.
Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025
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