Connect with us

Cultura Pop

Várias coisas que você já sabia sobre “Love it to death”, de Alice Cooper

Published

on

Várias coisas que você já sabia sobre "Love it to death", de Alice Cooper

Bem antes de Love it to death, o terceiro disco (1971), a ideia de Alice Cooper (que, nessa época, era uma banda) já era apavorar as pessoas. Nem sempre dava certo. Até o segundo álbum, Easy action (1970), Alice e seus colegas Glen Buxton (guitarra), Michael Bruce (guitarra, teclados), Dennis Dunaway (baixo) e Neal Smith (bateria) ainda eram vistos como uma “coisa” excêntrica, o último espirro de bica da psicodelia. Eram olhados com desdém pela crítica, não vendiam discos e os sustos ainda eram dosados. Muito embora a má impressão que a banda deixava em algumas pessoas tenha rendido até mesmo a atenção de Frank Zappa, rápido ao contratar o grupo para seu selo Straight.

Só que algumas coisas foram mudando e o sucesso foi aparecendo. A Warner viu potencial ultrajante na Straight, gravadora do padrinho Zappa, e comprou o selo. Em 1969, praticamente sem saber o que estava fazendo, Alice Cooper soltou uma galinha (viva) no palco do Toronto Music Festival, que foi estraçalhada pela plateia. Em decorrência disso, o cantor virou assunto da noite para o dia. Mas além disso, cansados de tentar impressionar a plateia hippie da Califórnia, aonde faziam quase todos os seus shows, os cinco resolveram se mudar para Detroit. Que aliás era a terra do próprio líder do grupo (o cidadão americano Vincent Furnier, mais conhecido como Alice Cooper).

>>> Veja também no POP FANTASMA: Aquela vez que Alice Cooper e Grateful Dead quiseram manter você longe das drogas

Lá, a turma de beberrões que formava a banda sentiu-se bem mais à vontade, perto de bandas pré-punk e de um público mais selvagem. A chegada de novos nomes no universo do rock e a emergência da estética glam também ajudaram a fazer com que o humor de Alice começasse a coincidir com o do público. Love it to death, lançado em 9 de março de 1971, foi o primeiro fruto dessa fase de sucessos, com hits como I’m eighteen e Caught in a dream, além de shows nos quais Alice aparecia de camisa de força, ou era executado numa cadeira elétrica.

Sem Love it to death não existiria Detroit stories, novo disco de Alice, lançado há pouco tempo sem shows por causa da pandemia da covid-19. A noção de que deve existir uma música para chocar e deixar plateias “respeitáveis” irritadas também veio dos primeiros grandes hits de Alice, gerados em apenas dois meses de estúdio no fim de 1970. Mas finalmente, com produção adequada e objetivos definidos.

E segue aí nosso relatório sobre esse clássico. Ouça lendo e leia ouvindo.

ESTRANHÃO. Ouvidos hoje, Pretties for you (1969) e Easy action (1970), os dois primeiros álbuns de Alice Cooper, soam como estranhas tentativas de se compor uma espécie de “ópera” assustadora de rádio, com momentos de calmaria, tons assustadoramente belos (o tema-de-musical Beautiful flyaway, tocado ao piano e cantado por Michael Bruce) e vinhetas estranhas (BB on Mars).

>>> Veja também no POP FANTASMA: Aquela vez em que Alice Cooper fez um tema para James Bond

ALIÁS E A PROPÓSITO, no primeiro disco, a banda sequer teve produtor no estúdio e gravou um ensaio com várias canções que mal estavam terminadas. Frank Zappa, que mal esteve no estúdio durante a gravação, passou lá no final e deu um confere no que tinha sido gravado. Ouviu, considerou que a banda já tinha um disco, mandou prensar, embalar e pronto. Lester Bangs, da Rolling Stone, considerou que a banda era “totalmente dispensável”. Outro crítico viu no disco “uma perda trágica de vinil”. Vale lembrar: estávamos numa época em que jornalistas resenhavam discos afirmando que se matariam se a banda que eles odiavam fizesse sucesso.

INCRIVELMENTE, Alice Cooper, mesmo seguindo uma cartilha totalmente abilolada, tinha ambições bem significativas. Ele dizia pelos cantos que adoraria que sua banda tivesse a mesma fama dos Beatles e dos Rolling Stones, e acreditava no sucesso popular das táticas de choque que pretendia fazer no palco (algumas delas, evidentemente, ficavam para quando a banda tivesse mais dinheiro).

SHEP GORDON, o diligente empresário da Alice Cooper Band, fazia das suas para tentar conseguir sucesso para o grupo. Primeiro, voou até Toronto, no Canadá, para aporrinhar Jack Richardson, um produtor de sucesso, que havia concebido os compactos mais vendidos do Guess Who (American woman entre eles). Shep queria porque queria que Richardson topasse produzir Alice Cooper. Mas Jack ouviu Alice, não curtiu e “não queria ter nada a ver com a gente”, nas palavras do próprio cantor.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Em 1974: Alice Cooper, o filme

AINDA ASSIM, Shep agendou uma série de shows para o grupo em clubes locais e ainda conseguiu enfiar a banda no Toronto Music Festival, após bater na porta dos produtores e oferecer-se para ajudá-los na produção e a “vender ingressos”. Deu certo e mais de 60 mil tíquetes foram vendidos. Na hora de combinar pagamento, Shep lustrou a cara de pau e disse: “Não quero dinheiro nenhum. Apenas ponha Alice Cooper entre os shows dos Doors e de John Lennon e estamos conversados”. Supreendentemente, deu certo.

PENAS PARA TODO LADO. Alice era tão pobre, mas tão pobre, que o máximo de “terror” a que se permitia no fim das apresentações era furar travesseiros de penas e disparar tudo em direção à plateia com tanques de gás. Dava certo por onde a banda passava e daria certo em Toronto. Só que pouco antes disso, Alice deparou com a tal galinha viva, no palco, que jogou na plateia. Alguém tinha colocado o bicho lá, e Alice ou simplesmente achou que a penosa não seria atacada ou não se importou.

NO DIA seguinte, só se falava de uma coisa: Alice tinha matado uma galinha em pleno palco. Não foi bem o que ele fez, mas não importava – até porque àquela altura dos acontecimentos, já circulava uma versão jurando que ele havia bebido o sangue dela na frente da plateia. “Eu só achava que se uma galinha tinha asas, ela iria voar”, contou, singelamente. “Zappa me ligou perguntando se eu tinha mesmo estraçalhado uma galinha e eu disse: ‘Não exatamente'”, disse Alice, que ficou surpreso com a resposta do patrão: “Então não diga nada a ninguém. Todo mundo odeia você. Isso significa que a molecada vai te adorar”, disse Zappa.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Billion Dollar Babies: a banda de Alice Cooper sem ele nos vocais

ALIÁS E A PROPÓSITO, Shep resolveu, como quem não queria nada, ligar para Richardson e perguntar o que ele havia achado da história da galinha. Não muito impressionado, Jack soltou um “ouvi falar”. Em seguida, disse a Shep que iria mandar para encontrar com eles um garoto de vinte e poucos anos, que trabalhava com ele (“é um aprendiz”, afirmou) e entendia um pouco de produção. Um sujeito que mudaria a vida de Alice.

O CARA QUE FEZ DAR CERTO. Bob Ezrin, o tal “aprendiz”, era um garoto cabeludo de 21 anos, canadense, fã de música clássica, que estava sendo mentorado por Richardson. A primeira vez que viu Alice e sua turma ao vivo, foi durante um show no Max’s Kansas City, em Nova York – aliás, Andy Warhol e sua trupe estavam na plateia.

DEU CERTO? Deu, mas foi complicado. Antes do show, Ezrin havia encontrado com a galera num hotel, e Alice recorda-se do produtor ter ficado meio chocado quando viu o look da rapaziada. “Parecia que ele tinha aberto um pacote-surpresa e encontrado um monte de vermes dentro”, recorda. Mas Bob curtiu o som e ficou mais impressionado ainda com o ambiente, cheio de garotas com roupas de spandex, gente com aranhas pintadas no olho e fãs sabendo palavra por palavra das canções de Alice. “Aquilo era rock-teatro, com participação da audiência”, exaltou.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Flash Fearless: Alice Cooper e The Who numa ópera-rock da qual ninguém lembra

APESAR de Bob ter cuidado de tudo em Love it to death, Jack não saiu tão de perto assim. Ezrin, ao voltar a Toronto, fez questão de dizer a ele que havia visto um movimento cultural, mais do que uma banda. Jack, que era a principal escolha de Shep e de Alice, topou manter seu nome na história. Mas desde que seu mentorado ficasse na frente e cuidasse de tudo (por isso é que o LP tem créditos para os dois).

ALIÁS E A PROPÓSITO, Ezrin, durante o tal show em Nova York, curtiu especialmente uma canção cuja letra dizia “I’m edgy…” e disse isso ao grupo. “Mas não tocamos nenhuma canção com esse nome!”, respondeu Alice. “Tocaram sim, era ‘I’m edgy…'”, cantarolou. Só que o produtor estava se referindo ao futuro hit I’m eighteen, praticamente um rugido bêbado de Cooper.

ROCK DO CELEIRO. A Alice Cooper Band costumava ensaiar num celeiro em Pontiac, perto de Detroit. Ezrin foi lá conhecer o local e fez uma proposta à banda, que vinha de dois discos mal resolvidos: eles fariam shows no fim de semana, e nos dias úteis, ensaios de doze horas no tal do celeiro até o material do novo disco ficar perfeito.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Aquela vez em que Alice Cooper fez um tema para James Bond

O QUE SE VIU foi um trabalho de desconstrução. Capaz de arroubos quase rudes de sinceridade, Ezrin focou primeiro nos vocais de Alice, e fez questão de informar que ele não tinha assinatura vocal. “Quando as pessoas ouvem Jim Morrison, sabem que é Jim Morrison. O mesmo com John Lennon. Quando ouço Alice Cooper, não há assinatura. As pessoas podem adorar o show, mas não há algo que defina a voz e a música”, atacou impiedosamente. Bob botou Alice para cantar de todos os jeitos possíveis. Aliás, praticamente ensinou novamente cada músico da banda a tocar seu instrumento, em busca de um som particular para cada um.

O PRODUTOR também interferiu nas composições. Bob ensinou a banda a cortar o que não interessava e a deixar as letras simplificadas, “como as dos Stooges”, diz Alice. Mas o principal estava lá: numa época em que todo mundo parecia se levar a sério, Alice Cooper tinha muito humor. Afinal, era uma banda que falava de inadequação (I’m eighteen, Is it my body), diversões que acabam mal (Caught in a dream, batendo firme no tropo narrativo do “eu era famoso e rico, até que acordei”), horrores da guerra (Ballad of Dwight Fry e Second coming), diatribes bíblicas (Halloweed by my name).

DWIGHT FRY OU FRYE? Existiu um ator de cinema chamado Dwight Frye, que teve uma notável carreira entre os anos 1920 e 1940. Uma coisa ele tem em comum com seu quase-xará – com diferença de um “e” que Alice suprimiu: após fazer papéis de figurinha fora do padrão em filmes como Dracula e Frankenstein, nunca mais conseguiu se livrar de fazer o maníaco, o cara estranho. Morreu em 1943 ao conseguir seu primeiro papel “sério” em Hollywood, no filme Wilson (falamos do Dwight aqui).

>>> Veja também no POP FANTASMA: Slade em 1970: nós, os carecas…

O FINAL do disco era tão venturoso quanto fosse possível, com Sun arise, única cover do disco. Originalmente tinha sido lançada em 1961 pelo coautor, o cantor e compositor australiano Rolf Harris. Harry Butler, parceiro dele, havia falado a ele detalhes das crenças aborígenes, e a letra surgiu inspirada pelos cultos ao “nascer do sol” nessas tribos.

O ORIGINAL de Rolf Harris foi lançado pela EMI britânica e produzido por ninguém menos que George Martin, que por aqueles tempos dirigia o selo Parlophone, ligado a álbuns de comédia, novelty records e maluquices em geral. Foi hit imediato nos EUA e Inglaterra. Rolf teria carreira prolífica como humorista e cantor por várias décadas. Em 2014, sua carreira acabou: foi condenado e preso por agressão sexual de garotas menores de idade.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Várias coisas que você já sabia sobre The man who sold the world, de David Bowie

E SAIU O DISCO. O lançamento de Love it to death trazia algumas novidades para a banda. O selo Straight deixaria de existir e a banda assinaria contrato com a Warner, sob os auspícios de Shep – apesar de Love… sair com selo Straight/Warner em edições subsequentes. Zappa iniciou outro negócio envolvendo a Warner, o selo DiscReet, que durou até 1979, mas Alice Cooper não estava envolvido com isso. Outra novidade é que a crítica pela primeira vez abraçava o grupo. A Billboard chegou a chamar o disco de “rock de terceira geração, artisticamente absurdo”. A Rolling Stone classificou-o como “oásis no deserto de lobotomia”. O álbum conquistou discos de ouro e platina e gerou interesse pela discografia anterior de Cooper.

NO BRASIL, o lançamento de Love it to death chegou a ser anunciado em alguns lugares. A coluna A música de hoje em dia, do Jornal do Brasil de 18 de abril de 1971 avisou que o álbum estava saindo nos EUA. Mas o álbum só chegaria às lojas daqui em vinil nacional em 1974, via Continental.

O HIT. I’m eighteen, a música que gerou aquele virundum bizarro de Ezrin, foi o grande sucesso do disco. Foi o primeiro Top 40 da banda nos EUA e chegou ao sétimo lugar nas paradas no Canadá. Alice lembra da equipe de Shep ligando para as rádios para promover a música. Numa emissora de Detroit, o filho da diretora musical era fã de Alice, e queria que a banda fosse tocar em sua escola – e eles foram. A canção foi galgando espaço nas rádios aos poucos e virou o primeiro grande sucesso da banda.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Várias coisas que você já sabia sobre a primeira vez de David Bowie no Brasil

OS SHOWS. Alice e sua turma passaram a fazer alguns dos números de palco que tornaram a banda popular. Em Ballad of Dwight Fry, o cantor era retirado do palco por uma enfermeira e voltava vestido com uma camisa de força. Alice também fritava numa cadeira elétrica no palco. Aliás, o número em que Alice é guilhotinado surgiria só em 1973, na turnê Billion dollar babies. Rolava tanta grana na turnê de Love it to death que a banda comprou uma uma mansão de quarenta e dois quartos em Connecticut.

A COBRA VAI SUBIR. Outro número típico de Alice surgiu na época de Love it. No backstage de um dos shows, uma groupie apareceu com uma jibóia enrolada nos braços. A cobra não era enorme, mas mesmo assim Alice se assustou. Mas teve uma ideia: “Se eu fiquei com medo, outras pessoas vão ficar!”. A equipe adotou uma jiboia de 4 metros e meio, com a qual Alice se enrolaria nas apresentações.

SEU VENENO (NÃO) É CRUEL. A jiboia constritora, que Alice usava em seus shows, não é uma cobra venenosa. Ela apenas pode matar sua presa por constrição, impedindo o fluxo sanguíneo ou enforcando. Não que isso já não seja algo assustador. Mas Alice jura que não sentia medo e que desenvolveu uma maneira de lidar com a cobra. Para evitar que ela ficasse com medo de cair de cima dele, e acabasse enforcando o cantor quando estivesse enrolada em seu pescoço, ele a pegava pela cabeça e pelo rabo. “Não é da natureza da cobra matar você. Elas te olham esperando que você lhe dê um rato para comer uma hora mais tarde”, conta. Alice jura que nunca foi atacado por cobra nenhuma, e que geralmente os animais com os quais lida são dóceis.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Várias coisas que você já sabia sobre Dirty mind, do Prince

MAS E A CAPA? Ah, sim, tem a capa de Love it to death, primeiro layout bem resolvido da banda. Se na contracapa a banda esbanjava atitude rock’n roll, a capa posicionava Alice Cooper com folga no rol do glam rock. Os cinco integrantes da Alice Cooper Band, todos no rigor da antimoda glitter, apareciam iluminados por um spot como se fossem luzes de um carro de polícia, num efeito que também daria super certo dois anos depois na capa de Band on the run, dos Wings.

Várias coisas que você já sabia sobre “Love it to death”, de Alice Cooper

JUSTAMENTE por causa desse efeito “moderno” pretendido, não foi por acaso que a Warner decidiu que as fotos seriam feitas por Roger Prigent, fotógrafo nascido no Vietnã, que costumava trabalhar com imagens de moda, e já havia clicado capas de discos de Nancy Wilson e Barbra Streisand.

SÓ QUE… a imagem da capa de Love it gerou polêmica. E não foi por causa das roupas de corte feminino e do vestido que Alice usa. O cantor aparece com o dedo médio para baixo, simulando um pênis, nas primeiras edições. A Warner depois mandaria para as lojas uma edição sem o maldito dedo.

Várias coisas que você já sabia sobre "Love it to death", de Alice Cooper

>>> Veja também no POP FANTASMA: Várias coisas que você já sabia sobre End of the century, disco dos Ramones

E DEPOIS? E depois a popularidade de Alice ficaria tão grande que ele conseguiria fazer algo que seus ídolos dos Beatles e dos Rolling Stones fizeram: dois discos por ano. Killer sairia em novembro de 1971 com hits como Under my wheels e uma cobra na capa – o animal já era “atração especial” dos shows da banda. A Alice Cooper Band duraria até 1975, quando Alice sairia em “carreira solo”, tendo sempre Bob Ezrin como escudeiro, produtor e uma das primeiras pessoas a ouvir músicas novas do cantor – mesmo quando não produz os discos.

Com infos dos livros Who wrote the book of love?, de Richard Crouse, e Alice Cooper: Golf monster – A rock’n’roller’s 12 steps to becoming a golf addict, de Alice Cooper, com Keith e Keny Zimmerman.

Cultura Pop

Urgente!: E agora sem o Ozzy?

Published

on

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

Continue Reading

Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

Published

on

Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
  • E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.

Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

Continue Reading

Cultura Pop

Urgente!: Nova do Hot Chip, “DVD” do Oasis em Cardiff, The Rapture de volta com turnê

Published

on

Hot Chip (foto) anuncia coletânea e lança single e clipe. Fã produz vídeo do primeiro show do Oasis em Cardiff só com imagens feitas por fãs. The Rapture anuncia turnê pelos Estados Unidos e Canadá.

RESUMO: Hot Chip (foto) anuncia coletânea e lança single e clipe. Fã produz vídeo do primeiro show do Oasis em Cardiff só com imagens feitas por fãs. The Rapture anuncia turnê pelos Estados Unidos e Canadá.

Texto: Ricardo Schott – Foto Hot Chip: Louise Mason/Divulgação

  • Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
  • E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.

Vai sair pela primeira vez uma coletânea do Hot Chip, Joy in repetition, prevista para 5 de setembro. Vale até a pergunta que muita gente já se fez: qual a importância de coletâneas nessa época de playlists e aplicativos de música com poucas infos? Bom, a importância de uma boa coletânea de hits é enorme, vale por uma setlist bem montada e pode contar uma história. E elas eram as playlist de duas décadas atrás.

No caso de Joy, ela traça o caminho do Hot Chip do tempo dos cachês baixos até a época em que jornais como The Guardian já estavam classificando Alexis Taylor, Joe Goddard, Owen Clarke, Al Doyle e Felix Martin como o maior grupo pop de seu tempo. E entre hits como Ready for the floor, I feel better e Look at where we are, ainda tem uma música nova de altíssimas proporções de grude: Devotion, já lançada em single, que é uma mescla de pop adulto, eletrônica psicodélica e futuro hit de pista, com clipe gravado no Japão.

Taylor rasga seda: Devotion é “uma celebração da devoção a este projeto coletivo”. E ele ainda faz um baita elogio ao colega Joe Goddard: “Penso no Joe como alguém parecido com o Brian Wilson, com uma dedicação enorme em descobrir como criar a música pop mais incrível possível”. Errado não está.

***

Alguém com (felizmente, não estamos julgando) muito tempo livre pegou varias imagens diferentes do primeiro show do Oasis em Cardiff, feitas por fãs da banda, e compilou um (digamos) DVD do show.

O registro tá o mais fiel possivel, apesar das imagens à distância e do som nem sempre maravilhoso – vale como um belo bootleg das antigas. Tem ate o som da fitinha de Fuckin in the bushes na abertura, e a voz do apresentador do show. Detalhe: quem botou o video no ar tentou se livrar de problemas avisando que o video nao é monetizado. Pode ser que não ganhe strike do YouTube. “É de um fã apenas para fãs”, avisa.

***

E ainda Oasis: vale ler o texto de Liv Brandão, fera do jornalismo musical brasileiro recente, sobre como a setlist do show do Oasis não foi apenas uma setlist. Foi uma aula de storytelling daquelas – como numa (olha aí) coletânea daquelas que vinham com textos contextualizando tudo.

“Muito se falou da escolha das canções, que privilegia os dois primeiros álbuns, como se só eles importassem (…). Mas tão especial quanto a seleção das 24 músicas que compõem o set, idêntico nos dois dias, é a ordem em que elas aparecem, montada para contar a história de quando o Oasis foi a maior banda do mundo – justamente na época desses discos – e tudo o que aconteceu desde então”. Leia o restante na newsletter dela

***

Banda importante do dance punk dos anos 2000, The Rapture voltou, mas não há ainda nenhuma novidade a respeito de disco novo – nem de shows no Brasil, já avisamos. Na real, esse grupo novaiorquino já está de volta desde 2019, com o cantor Luke Jenner como único membro fixo, mas não havia retornado de fato. Fizeram alguns shows, mas pararam as atividades por conta da pandemia, e foi só. Dessa vez, o grupo tem uma turnê de verdade pela frente, que começa dia 16 de setembro no mitológico First Avenue, em Minneapolis, e passa por várias cidades dos EUA e Canadá até novembro.

“Anos atrás, quando me afastei da banda, eu precisava de tempo e espaço para reconstruir minha vida”, conta Jenner sobre a volta, sem comentar diretamente sobre as brigas intermináveis que a banda tinha lá por 2014. “Eu precisava consertar meu casamento, estar presente para meu filho e, por fim, trabalhar em mim mesmo. Esta turnê marca um novo capítulo para mim, moldado por tudo o que vivi e aprendi ao longo do caminho. Conquistei tudo o que esperava alcançar através da música e agora posso usá-la para ajudar qualquer pessoa que talvez precise, como eu precisei naquela época”.

Continue Reading
Advertisement

Trending