Cinema
Tarzoon, A Vergonha da Selva: uma paródia pornô de Tarzan (!)

Difícil encontrar alguém que pelo menos não tenha ouvido falar na história do Tarzan. O mítico personagem criado pelo escritor americano Edgar Rice Burroughs para a revista All Story Magazine em 1912 gerou uma série de filmes, inclusive versões em animação. Mas garanto que pouquíssima gente se lembra de Tarzoon – A Vergonha da Selva, paródia pornô produzida na França em 1975 onde nosso herói (aqui rebatizado para evitar processos) enfrentava um exército de pênis ambulantes. Sim, é isso que você acabou de ler.
Na época, desenhos animados com temática adulta estavam na moda. Fritz, the Cat, Heavy traffic, Down and Dirty Duck e outros provaram ao mundo que tal mercado não precisava ser voltado apenas para as crianças. Prova que havia na época um público ávido por isso é que Tarzoon – A Vergonha da Selva foi concebido inicialmente como um curta metragem. Porém, na estreia do filme no festival de cinema de Cannes (!!!), graças ao boca a boca, tornou-se um sucesso estrondoso e inesperado, o que fez os produtores responsáveis (a saber, o desenhista belga Piche e seu compatriota Boris Szulzinger) crescerem os olhos e acharem que seria mais vantajoso fazer uma versão estendida, decisão essa que, como veremos adiante, não poderia ter sido mais desastrada.
A história é absurda e não faz sentido algum. Numa região remota da África chamada Bush Country (lembrando que “Bush” também pode ser uma gíria pra se referir ao órgão genital feminino), vive a Rainha Bazonga, que tem 8 pares de seios (!!!) e é careca. Complexada por não ter cabelos, ela acredita que só vai ser levada a sério quando tiver longas e belas madeixas.
Para tanto, ela manda seu capangas pênis sequestrarem a esposa de Tarzoon, June (June, Jane, alguém aí percebeu?) para que assim possa fazer um transplante capilar (de novo, não tentem entender). June estava dando um tempo na relação com Tarzoon na época, porque ele sofria de impotência e era incapaz de transar com ela. Portanto, quando os pênis ambulantes chegaram na sua residência, ela ficou feliz e ao invés de resistir resolveu aproveitar, dando início a uma mega orgia. Quando June recupera-se da festa, cai em si e somente aí percebe que está sendo raptada, clamando por socorro. Tarzoon ouve seus gritos e aí a história começa.
Um fato curioso é que os produtores acreditavam que a sacanagem desmedida faria com que o filme fosse um sucesso nos EUA, mas aconteceu o oposto. Chegaram inclusive a fazer propaganda alardeando orgulhosos que A Vergonha da Selva foi o primeiro desenho a receber a classificação X (Classificação que só obras pornográficas recebiam), colocando em diversas salas de projeção ao longo do país pôsteres com o slogan “You’re Gonna Laugh Your X Off!” (X fazendo trocadilho com “ass”).
Porém, exceção feita à cidade de San Francisco, o resto do país detestou, tornando Tarzoon um fracasso de público. Uma vez que investiram fortemente no mercado americano, e assustados com o prejuízo iminente, retiraram o filme de cartaz e pensaram numa saída no mínimo curiosa. Cortaram quase 10 minutos, reeditaram, redublaram e pediram para o pessoal do humorístico Saturday night live reescrever um roteiro. John Belushi e Bill Murray foram alguns dos atores consagrados que chegaram nesse momento para fazer a dublagem e tentar salvar a obra do naufrágio total. Para dublar o Tarzoon, também chamaram o filho de Johnny Weissmuler, medalhista olímpico e ator que imortalizou-se interpretando Tarzan nos anos 1930 e 1940.
Dessa forma, conseguiram baixar a censura para R, mas a emenda saiu pior que o soneto. A Vergonha da Selva acabou recebendo críticas ainda piores, sendo exibido apenas por algumas semanas. Chegou inclusive a passar nos cinemas daqui do Brasil, sendo igualmente mal recebido.
“E tem no YouTube pra assistir”? Tem sim senhor! Embora, sendo muito sincero, não saiba informar com certeza que versão é essa. Se alguém tiver maiores informações a respeito, agradeço! Assista e tire suas próprias conclusões.
Cinema
Ouvimos: Raveonettes – “PE’AHI II”

RESENHA: Os Raveonettes mergulham de vez no lo-fi e shoegaze em PE’AHI II, disco que soa mais próximo de uma transição do que de uma realização.
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Raveonettes, aquela dupla que misturava distorções a la Jesus and Mary Chain, clima melodioso herdado dos anos 1950 e estética do filme Juventude transviada, lembra? Pois bem, eles guiaram o timão de vez para gêneros como shoegaze e lo-fi. Não é algo estranho ao som deles, vale falar. Climas “serra elétrica” sempre tiveram lugar nos discos de Sune Rose Wagner e Sharin Foo. PE’AHI II, novo disco, é a continuação de PE’AHI, disco de 2014 que já promovia suas invasões nessas áreas. Sem falar que 2016 atomized – disco anterior de inéditas da banda, 2017 – surfava essa onda.
Só que o Raveonettes de 2025 chega a soar experimental, mesmo quando abre o novo disco com uma balada nostálgica e melancólica, Strange. E na sequência, o ruído programado de Blackest soa como uma curiosa mescla de blackgaze e pop de câmara. Já Killer é uma nuvem de microfonias que lembra bandas como Drop Nineteens, só que com mais cuidado na melodia.
Entre as outras curiosidades do disco, estão o noise rock programado de Dissonant, a viagem sonora e distorcida de Sunday school e a onda sonora de microfonia (alternada com toques dream pop) de Ulrikke. O resultado final deixa um ar de EP, de mixtape, mais do que de um álbum completo e realizado dos Raveonettes. Ainda que PE’AHI II tenha momentos ótimos, soa mais como uma transição para o que vem por aí.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Beat Dies Records
Lançamento: 25 de abril de 2025
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- Ouvimos: Drop Nineteens – 1991
- Ouvimos: Drop Nineteens – Hard light
Cinema
Urgente!: Cinema pop – “Onda nova” de volta, Milton na telona

Por muito tempo, Onda nova (1983), filme dirigido por Ícaro Martins e José Antonio Garcia – e censurado pelo governo militar –, foi jogado no balaio das pornochanchadas e produções de sacanagem.
Fácil entender o motivo: recheado de cenas de sexo e nudez, o longa funciona como uma espécie de Malhação Múltipla Escolha subversivo, acompanhando o dia a dia de uma turma jovem e nada comportada – o Gayvotas Futebol Clube, time de futebol formado só por garotas, e que promovia eventos bem avançadinhos, como o jogo entre mulheres e homens vestidos de mulher. Por acaso, Onda nova foi financiado por uma produtora da Boca do Lixo (meca da pornochanchada paulistana) e acabou atropelado pela nova onda (sem trocadilho) de filmes extremamente explícitos.
O elenco é um espetáculo à parte. Além de Carla Camuratti, Tânia Alves, Vera Zimmermann e Regina Casé, aparecem figuras como Osmar Santos, Casagrande e até Caetano Veloso – que protagoniza uma cena soft porn tão bizarra quanto hilária. Durante anos, o filme sobreviveu em sessões televisivas da madrugada, mas agora ressurge restaurado e remasterizado em 4K, estreando pela primeira vez no circuito comercial brasileiro nesta quinta-feira (27).
Meu conselho? Esqueça tudo o que você já ouviu sobre Onda nova (ou qualquer lembrança de sessões anteriores). Entre de cabeça nessa comédia pop carregada de referências roqueiras da época, um cruzamento entre provocação punk e ressaca hippie. O filme abre com Carla Camuratti e Vera Zimmermann empunhando sprays de tinta para pixar os créditos, mostra Tânia Alves cantando na noite com visual sadomasoquista, segue com momentos dignos de um musical glam – cortesia da cantora Cida Moreyra, que brilha em várias cenas – e trata com surpreendente modernidade temas como maconha, cultura queer, relacionamentos sáficos, mulheres no poder, amores fluidos e, claro, futebol feminino.
Se fosse um disco, Onda nova seria daqueles para ouvir no volume máximo, prestando atenção em cada detalhe e referência. A trilha sonora passeia entre o boogie oitentista e o synthpop, com faixas de Michael Jackson e Rita Lee brotando em alguns momentos. E o que já era provocação nos anos 1980 agora ressurge como registro de uma juventude que chutava o balde sem medo. Vá assistir correndo.
*****
Já Milton Bituca Nascimento, de Flavia Moraes, que estreou na última semana, segue outro caminho: o da reverência, mesmo que seja um filme documental. Durante dois anos, Flavia seguiu Milton de perto e produziu um retrato que, mais do que um relato biográfico, é uma celebração. E uma hagiografia, aquela coisa das produções que parecem falar de santos encarnados.
A narração de Fernanda Montenegro dá um tom solene – e, enfim, logo no começo, fica a impressão de um enorme comercial narrado por ela, como os daquele famoso banco que não patrocina o Pop Fantasma. Aos poucos, vemos cenas da última turnê, reações de fãs, amigos contando histórias. Marcio Borges lê matérias do New York Times sobre Milton, para ele. Wagner Tiso chora. Quincy Jones sorri ao falar dele. Mano Brown solta uma pérola: Milton o ensinou a escutar. E Chico Buarque assiste ao famigerado momento do programa Chico & Caetano em que se emociona ao vê-lo cantar O que será – um vídeo que virou meme recentemente.
Isso tudo é bastante emocionante, assim como as cenas em que a letra da canção Morro velho é recitada por Djavan, Criolo e Mano Brown – reforçando a carga revolucionária da música, que usava a imagem das antigas fazendas mineiras para falar de racismo e capitalismo. Mas, no fim, o que fica de Milton Bituca Nascimento é a certeza de que Milton precisava ser menos mitificado e mais contado em detalhes. Vale ver, e a música dele é mito por si só, mas a sensação é a de que faltou algo.
Por acaso, recentemente, Luiz Melodia – No coração do Brasil, de Alessandra Dorgan, investiu fundo em imagens raras do cantor, em que a história é contada através da música, sem nenhum detalhe do tipo “quem produziu o disco tal”. Mas o homem Luiz Melodia está ali, exposto em entrevistas, músicas, escolhas pessoais e atitudes no palco e fora dele. Quem não viu, veja correndo – caso ainda esteja em cartaz.
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Cinema
Urgente!: Filme “Máquina do tempo” leva a música de Bowie e Dylan para a Segunda Guerra

Descobertas de antigos rolos de filme, assim como cartas nunca enviadas e jamais lidas, costumam render bons filmes e livros — ou, pelo menos, são um ótimo ponto de partida. É essa premissa que guia Máquina do tempo (Lola, no título original), estreia do irlandês Andrew Legge na direção. A ficção científica, ambientada em 1941, acompanha as irmãs órfãs Martha (Stefanie Martini) e Thomasina (Emma Appleton), e chega aos cinemas brasileiros nesta quinta-feira (13), dois anos após sua realização.
As duas criam uma máquina do tempo — a Lola do título original, batizada em homenagem à mãe — capaz de interceptar imagens do futuro. O material que elas conseguem captar é todo registrado em 16mm por uma câmera Bolex, dando origem aos tais rolos de filme.
E, bom, rolo mesmo (no sentido mais problemático da palavra) começa quando o exército britânico, em plena Segunda Guerra Mundial, descobre a invenção e passa a usá-la contra as tropas alemãs. A princípio, a estratégia funciona, mas logo começa a sair do controle. As manipulações temporais geram consequências inesperadas, enquanto as personalidades das irmãs vão se revelando e causando conflitos.
Com apenas 80 minutos de duração e filmado em 16 mm (com lentes originais dos anos 1930!), Máquina do tempo pode soar confuso em algumas passagens. Não apenas pelas idas e vindas temporais, mas também pelo visual em preto e branco, valorizando sombras e vozes que quase se tornam personagens da história. Em alguns momentos, é um filme que exige atenção.
O longa também tem apelo para quem gosta de cruzar cultura pop com história. Martha e Thomasina ficam fascinadas ao ver David Bowie cantando Space oddity (o clipe brota na máquina delas), tornam-se fãs de Bob Dylan, adiantam a subcultura mod em alguns anos (visualmente, inclusive) e coadjuvam um arranjo de big band para o futuro hit You really got me, dos Kinks, que elas também conseguem “ouvir” na máquina. Um detalhe curioso: a própria Emma Appleton operou a câmera em cenas em que sua personagem Thomasina se filma (“para deixar as linhas dos olhos perfeitas”, segundo revelou o diretor ao site Hotpress).
Ainda que a cultura pop esteja presente, Máquina do tempo é, acima de tudo, um exercício de futurologia convincente, explorando uma futura escalada do fascismo na Inglaterra — que, no filme, chega até mesmo à música, com a criação de um popstar fascista.
A ideia faz sentido e nem é muito distante do que aconteceu de verdade: punks e pré-punks usavam suásticas para chocar os outros, Adolf Hitler quase figurou na capa de Sgt. Pepper’s, dos Beatles, Mick Jagger não se importou de ser fotografado pela “cineasta de Hitler” Leni Riefenstahl, artistas como Lou Reed e Iggy Pop registraram observações racistas em suas letras, e o próprio Bowie teve um flerte pra lá de mal explicado com a estética nazista. Mas o que rola em Máquina do tempo é bem na linha do “se vocês soubessem o que vai acontecer, ficariam enojados”. Pode se preparar.
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