Crítica
Ouvimos: Tontom, “Mania 2000” (EP)

- Mania 2000 é o EP de estreia de Tontom, aliás Antonia Périssé de Farias, 17 anos, filha da atriz Heloísa Perissé e do cineasta Mauro Farias. Além de tocar piano desde os 17 anos, ela já atuou como atriz no musical Djavanear e no longa Uma fada veio me visitar, protagonizado por Xuxa e baseado no livro de mesmo nome de Thalita Rebouças.
- O EP foi puxado pelo single Tontom perigosa, que recentemente chegou a primeiro lugar do Top 1 Viral Brasil do Spotify, e já teve quase 850 mil reproduções na plataforma. O disco tem produção de Guilherme Lirio, que já tocou com artistas como Gilberto Gil.
Uma recente discussão (puxada, entre outras coisas, pela maneira como o Spotify tratou faz pouco tempo um disco recente da banda piauiense NöVA, acusando o grupo de ter lançado mão de plays maliciosos) puxou a carta do lado sombrio de certas plataformas – algo que surge também nesse vídeo do produtor e músico Felipe Vassao. Chegar em primeiro lugar nos virais do Brasil quer dizer muita coisa, e ao mesmo tempo pode também não querer dizer nada a respeito de gosto médio. É algo que mostra o que o povo supostamente quer ouvir, ao mesmo tempo que mostra o que fica mais de frente para todo mundo em plataformas como Spotify e Tik Tok.
Um viral recente foi Tontom Perigosa, primeiro single de Antonia Périssé de Farias, a Tontom, 17 anos, filha da atriz Heloísa Perissé, primeiro lugar do Top 1 Viral Brasil, do Spotify. Como observou um texto do site Popload, a música pegou mais que praga de piolho em creche também no Tik Tok, onde Tontom costuma postar bastante – e onde a geração à qual ela pertence está até mais presente que no Instagram, por exemplo. O single adiantou o EP Mania 2000, que saiu em maio.
A posição de filha de famosos que liderou uma parada no Spotify pode acabar escondendo que Mania 2000 pode até, de fato, virar mania – talvez não tanto quanto Acorda Pedrinho, sucesso do grupo Jovem Dionísio, virou tem dois anos, mas tem potencial. Produzida pelo mesmo Guilherme Lírio que toca guitarra com artistas como Ana Frango Elétrico, Tontom chega ao mercado fazendo um som que poderia ter arranjos e/ou produção de nomes como Liminha e Lincoln Olivetti – as faixas são pop, dançantes, trazem referências de MPB dos anos 1970 e 1980, e são músicas mais para tocar no violão do que propriamente para se tornarem a mais nova novidade pop.
Como iguais e Crises 2000, abertura e encerramento do disco, seguem entre referências que vão do pop olivettiano a Gilberto Gil (com quem Lírio tocou). Tontom perigosa é um disco-rock com sotaque carioca, mais delicado do que provocativo (e o lado “perigoso”, claro, soa mais como uma brincadeira em todo o disco). Cantada em inglês, Sunshine é o lado Lana Del Rey-Billie Eilish do EP. Mania 2000 tem ainda uma bossa nova fofa, Vê se atrasa. MPB pop com cara renovada.
Nota: 8
Gravadora: Independente.
Crítica
Ouvimos: Wado – “Obstrução samba”

RESENHA: Com 21 minutos, Obstrução samba, de Wado, impressiona pela completude e reinvenções criativas de faixas feitas com Momo. Um disco breve e denso.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
Nem sempre álbuns curtos costumam ser completos – alguns às vezes ficam com uma baita cara de mixtape, de ponte entre um trabalho e outro, ou de EP bem fornido. Pois bem: Obstrução samba, disco novo de Wado, tem 21 minutos (é menor que o lado A de muitos álbuns) e chama a atenção justamente pela completude e pelos universos visitados ao longo da audição.
O conceito de Obstrução samba nasceu do documentário As cinco obstruções, de Lars Von Trier e Jørgen Leth, no qual Lars propõe a Leth a refação de um filme dele. A “obstrução” aqui foi que Wado retrabalhou músicas que havia composto com o músico Marcelo Frota, o popular Momo, para um álbum deste lançado em 2023, Gira. E incluiu outras faixas na lista final.
No caso do primeiro single, o samba-funk Jão, originalmente gravado por Momo, já dava pra sentir as mudanças de cara. A leitura de Wado, que traz a participação de Fábio Trummer (Eddie), é menos afrobeat que o original de Momo e joga na área do samba-rock, com emanações de Mundo Livre S/A e Paralamas do Sucesso (este, nos metais, que têm algo do hit Pólvora).
Gira, Para e Passo de avarandar estão entre as outras, gravadas com participações especiais (João Menezes, Marina Nemesio e a dupla Priscila Tossan/Janu respectivamente). A primeira é afoxé-pop com metais, orgânico e mântrico. Para, curtinha (1:11), é samba e maracatu com vibe afro e orquestral. Passo de avarandar invade áreas como a do soul e do dub, propondo a observação da natureza e do dia a dia.
Sereia vem na sequência de Jão e continua o som dela, também com Marina Nemesio, enquanto vibes espiritualistas surgem em Atotô Obaluaê, com Alvaro Lancelotti. No final, Moraes Moreira é a sombra que paira sobre os frevos Esse mar e Deixa acontecer – não é por acaso, já que Davi Moraes, filho do compositor baiano, é coautor de ambas.
Esse mar, por acaso, fala do mar como quem fala da vida (“mesmo sem saber nadar, eu fui pro mar / aprendi com as ondas e com a mão de Iemanjá”) – e traz Wado, Davi Moraes, Adriano Siri e Otto, autores da faixa, unindo ritmo, existência e luta, numa das melhores faixas de Obstrução samba.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Lab344
Lançamento: 11 de julho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Crizin da Z.O. – “ACLR + 6”

RESENHA: ACLR + 6, EP de Crizin da Z.O., mistura funk, punk e poesia crua pra retratar um cotidiano sufocante, acelerado e cheio de dor — mas também de criação.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
ACLR + 6 é a continuação (talvez um bônus) de Acelero, quarto álbum de Crizin da Z.O., projeto criado por Cris Onofre em parceria com os produtores Danilo Machado e Marcelo Fiedler. Num espelho do que fazem grupos como o norte-americano clipping, e os também cariocas Caxtrinho e Disstantes, o lance de Crizin é falar da vida de hoje quase como um meme aterrador, ou um chip indesejado, do qual não podemos fugir. Transporte público incipiente, dia a dia de operário, baixos salários, fome, miséria, miséria existencial, vida acelerada e apertada, remédios prescritos, indignação, racismo geográfico… tudo isso bate ponto na poética e no som de Crizin.
ACLR + 6 acelera, sem trocadilho, com o funk gélido de Repetição zero, entre ônibus e trens lotados, decepções e boletos: “marmita azedou dentro da mochila / enquanto eu sofria den’do busão / o ódio sobe, a lágrima escorre / e assim nóis caneta mais um refrão”. Fatal, com Edgar, é uma pancada meio metal, meio funk 150 bpm, que desfere chicotadas nas big techs, no capitalismo e no jogo sujo disfarçado de limpo. Sem atalho, com Sarine, invade os ouvidos com vocal quase percussivo, enquanto Reflexán di dia é metal, funk, punk e candomblé, tudo junto, com o projeto Scúru Fitchádu levando tudo para a vibe e o idioma de Cabo Verde.
Lcuas Pires e Mbé, igualmente convidados do disco, surgem em Baía, com sons que vão embarcando em outros sons e criam um universo sombrio e belo, que contempla as adversidades (“eu olho pra Baía de Guanabara e penso / essa água é tão preta”) e fala das big techs atravessando nossa vida, pensamentos e gestos. Repetição um encerra o disco com vibração de samba pós-punk: baixo à frente, violão (de Kiko Dinucci) tocado de forma sombria e repetitiva, letra apontando para as mortes do dia a dia e para os apagamentos da memória. Uma ilha de edição musical.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: QTV
Lançamento: 17 de julho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Veigh – “Eu venci o mundo”

RESENHA: Veigh lança Eu venci o mundo, trap com discurso de vitória, ostentação e dilemas modernos, entre crítica social e autoafirmação intensa.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
- E assine a newsletter do Pop Fantasma para receber todos os nossos posts por e-mail e não perder nada.
O trap tem movido montanhas e conquistado fãs no Brasil – e tem se posicionado como o mais novo som preparadíssimo para irritar pais, professores e pessoas mais velhas em geral. Uma irritação que vem acompanhada de boas doses de racismo e preconceito social, e que também surge lado a lado com a mesma complacência com que ouvimos os “bitches” desferidos por rappers – afinal que lado é pra correr?
Enquanto ninguém decide, vale conferir o que Veigh faz em Eu venci o mundo, basicamente um trap com o mesmo discurso de vitória na guerra que tem dominado álbuns de rap no Brasil, como os mais recentes de Djonga e BK*. É uma linguagem da nova geração: temas como mindset, mindfullness, foco e outras coisas que aparecem em palestras de coaches são pulverizados e levados para um universo mais realista, em letras como as de Reuniões comigo mesmo, a gangsta e safada Hiperfoco (pura ostentação em versos como “quando você tem mais de uma dama / o dia dos namorados é mais difícil”) e a balada triste fake Perdoe-me por ser um astro (“se eu não fosse eu / também me invejaria /perderia horas falando de mim”).
Com flow bacana e bases criativas, Veigh é o puro “se eu posso, você também pode, irmão” em gotas. Eu venci o mundo fala de neymarização e fãs interesseiras em Belieber, que conta a história de uma atual admiradora que já foi do fã clube de Justin Bieber – e mandando recado: “tô solteiro agora / alguém por favor avisa a Anitta”. Também é pura sacanagem macha em Dono da verdade e na sombria Taylor, dedo na cara de traidores em Artista genérico e Indiretas com a voz, e mais ostentação em Sangue do cordeiro, formando um cenário que causa admiração em muitas pessoas, estranhamentos em outras tantas, indiferença em várias, e sentimentos que nem me arrisco a dar nome numa turma enorme.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Supernova Entrertainment
Lançamento: 26 de junho de 2025
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 8: Setealém
-
Cultura Pop5 anos ago
Lendas urbanas históricas 2: Teletubbies
-
Notícias7 anos ago
Saiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
-
Cinema8 anos ago
Will Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
-
Videos8 anos ago
Um médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
-
Cultura Pop8 anos ago
Barra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
-
Cultura Pop6 anos ago
Aquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
-
Cultura Pop7 anos ago
Fórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?