Crítica
Ouvimos: The The, “Ensoulment”

- Ensoulment é o novo disco do The The, banda-de-um-homem-só criada em 1979 pelo músico Matt Johnson, sempre com o auxílio de convidados. O disco sai pelo Cineola, selo criado pelo próprio Matt, que abarca também uma rádio com o mesmo nome. A produção foi feita por Matt e Warne Livesey.
- No começo da epidemia de covid-19, Matt foi internado para remover um abcesso da garganta. Depois disso, ele ficou seis meses sem cantar. A estadia sombria no hospital vazou para uma das faixas do novo disco, Linoleum smooth to the stockinged feet. “Talvez eu tenha morrido. Pensei que era isso que tinha acontecido. Estou morto. Agora estou naquela sala de espera entre o céu e o inferno”, contou ao The Independent.
The The é a banda-de-uma-pessoa-só que tem hits como Uncertain smile, This is the day e Slow emotion replay – músicas que já animaram festas por aí e que costumam rolar em rádios rock, das mais ousadas às mais motoclubistas e conservadoras. O fato de terem vindo dos anos 1980 e terem uma estética que fica a meio caminho de grupos como The Cure e New Order, ajudou nesse sucesso aqui no Brasil, claro.
Bom, não é bem por ai. Matt Johnson, criador e único integrante oficial do grupo, já foi louco de tacar pedra. Um dos maiores hits da banda é o eletrogótico Infected, e a coleção de clipes Infected: The movie, lançada em 1986, traz vídeos em que o cantor se mete em brincadeiras bastante arriscadas. Tipo descer um rio selvagem num barco, só que amarrado numa cadeira, ou contracenar com uma cobra. O período em que Matt chamava Jesus de Genésio por causa das drogas se foi, sua banda passou a ser mais conhecida como autora de trilhas sonoras e, em 2018, anunciou o retorno dos shows ao vivo.
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O sombrio Ensoulment, álbum novo do The The, continua na linha de mostrar que o grupo de Matt Johnson sempre esteve mais para banda pop dirigida por Tim Burton do que pra autores de jingle radiofônico de loja de surf wear (Slow emotion replay, a “da gaitinha”, foi por muito tempo usada no Rio de Janeiro exatamente para essa função). Era o que vinha acontecendo nas trilhas sonoras feitas pelo The The e foi o que rolou no obscuro disco NakedSelf (2000), basicamente um álbum de rock industrial.
Ensoulment é uma trilha para um filme que possivelmente só existe na cabeça de Matt, e cujo design sonoro está mais para discos de Iggy Pop e Leonard Cohen do que para qualquer som de festa, como rola na abertura com a climática Cognitive dissident e na folk e nostálgica Some days I drink my coffee by the grave of William Blake – esta com melodia delicadamente sampleada de The house of the rising sun, tema tradicional imortalizado por The Animals. O blues maldito Zen & the art of dating lembra uma mescla de David Bowie e Marilyn Manson, enquanto Kissing the ring of POTUS é uma balada de terror, e Life after life volta a mexer no baú de Leonard Cohen. Ajuda o fato de Matt ter enfatizado mais ainda o registro grave de sua voz com o passar dos tempos.
Daí para a frente, o álbum traz músicas como a funérea e romântica I want to wake up with you, o blues de piano fantasmagórico Down by the frozen river, o r&b lúgubre de Risin’ above the need e o folk de outros mundos de Where do we go when we die?. Sem contar as lembranças sombrias da estadia num hospital em Linoleum smooth to the stockinged feet. E assim Ensoulment é a volta do The The num clima de fantasia, mais narrativo e sofisticado.
Nota: 8,5
Gravadora: Cineola
Crítica
Ouvimos: Yowie – “Taking umbrage”

RESENHA: Math rock levado ao extremo: o Yowie faz em Taking Umbrage um som caótico, virtuoso e insano, entre o jazz, o hardcore e o humor.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Skin Graft Records
Lançamento: 3 de outubro de 2025
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Se você nunca entendeu direito o que é math rock, esse disco pode resolver seus problemas. Só que, vá lá, ele dá uma explicação bem radical para suas dúvidas a respeito do estilo. O Yowie, banda que mudou de formação nos últimos tempos igualmente de maneira radical – sobrou apenas o baterista (!) Shawn “Defenstrator” O’Connor, que convocou novos guitarristas e baixista – faz em Taking umbrage, seu quarto álbum, um som que… Cara, digamos que até explicar é complicado.
Basicamente o Yowie une bases de guitarra maníacas, slides feitos igualmente de forma caótica, e variações rítmicas em que tudo parece ir para vários lados diferentes ao mesmo tempo. O termo “ritmos quebrados” mal serve como explicação, porque a quebração se dá em ritmo, harmonia, solos e em praticamente tudo que vem pela frente. O math rock volta e meia consegue unir-se com estilos mais palatáveis, numa gama que vai do post-rock ao pós-hardcore, mas aqui não há nada disso – até porque se você escutar Taking umbrage sem prestar atenção na passagem de uma faixa para a outra, pode até se surpreender em ver que as músicas soam como uma suíte repleta de variações rítmicas.
- Ouvimos: Gaupa – Fyr (EP)
Com essas variações, músicas como Hot water healer quase deixam entreouvir um forró torto, enquanto Grumgrubber faz o mesmo oscilando entre samba, blues, funk e hardcore. Lemon strogonoff aumenta consideravelmente a velocidade lá pelas tantas, enquanto Museum fatigue parece uma salsa pesada e atonal. Não dá pra negar: lá pela metade você sente falta de algo diferente, de uma textura a mais, de algo que fuja do receituário. Igualmente é inegável que tudo aquilo pode soar irônico e meio zoeiro, como um novelty record, ou como uma versão radical da Florentina, do palhaço Tiririca (sim, aqueles momentos “oh, não, vai começar tudo de novo…”).
Bom, você escolhe como encarar esse disco. Vale dizer também que num disco desses, evocações do jazz não poderiam faltar. E elas circulam por todas as faixas, aparecendo com mais intensidade em músicas como a fusion demoníaca Throckmorton e a tribal The road to Gumbone. No fim das contas, é rock maníaco para quem decididamente não quer ouvir música para ficar mais calmo/calma.
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Crítica
Ouvimos: Saline Eyes – “The autumn EP” (EP)

RESENHA: O romantismo pop com ecos de Beatles, Todd Rundgren, Beach Boys e David Bowie marca o melancólico e luminoso The autumn EP, do Saline Eyes.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Melengepag Records
Lançamento: 6 de outubro de 2025.
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Criado por James Hackett, um músico da Filadélfia radicado em Ohio, o Saline Eyes parece um projeto sem maiores pretensões. Mas só parece: The autumn EP, novo lançamento do Saline Eyes, une romantismo herdado de Todd Rundgren e Brian Wilson, e uma onda melódica cujo alcance vai de Beatles ao britpop, passando por Psychedelic Furs, Radiohead, Teenage Fanclub e David Bowie. As letras falam sobre tristeza, inadequação e amores.
- Ouvimos: Naïf – Trópicos úmidos (EP)
Essa melancolia toda rendeu canções mágicas como No you and I (que lembra Elton John), o pop barroco e quase progressivo de Alone, o tristonho bubblegum de piano Separate. Além do som agridoce de On my mind e Autumn rain, ambas com musicalidade beatle nos vocais e nos arranjos. No final, If I were yours põe mais luminosidade no disco, unindo rock e soul numa recita musical bastante acessível.
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Crítica
Ouvimos: Sally Dige – “Holding the sun”

RESENHA: Em Holding the sun, Sally Dige mistura rock britânico 80s, dream pop e baladas sombrias, criando um disco breve e hipnótico sobre o amor perdido.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 11 de julho de 2025.
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Cantora berlinense, Sally Dige soa como uma versão pouca coisa mais trágica do rock britânico dos anos 1980 – The Cure, New Order – em seu novo disco, Holding the sun. Ela chora por um amor perdido em It’s you I’m thinking of, invade a área do dream pop em faixas como Voice of my heart e Sow the path (canção meditativa que tem muito de Enya e Madonna, mas também é herdeira de Imitation of life, hit do R.E.M.) e faz pop adulto dos anos 1980 em Strenght in me.
- Ouvimos: Ani Glass – Phantasmagoria
Sally também reúne referências de nomes como Psychedelic Furs, Cranberries e Peter Murphy em vários momentos de Holding the sun, um disco curto (meia hora), com certa cara de EP ou de lançamento intermediário entre álbum e EP. Uma onda que toma conta de faixas como I will be the sun for you, faixa em que ela toca instrumentos como bandolim e balalaica, e cria um som bem hipnótico. You, por sua vez, é uma balada acústica com onda anos 50/60, que faz lembrar Chris Isaak e formações hoje não tão lembradas, como o Hothouse Flowers – mas tem riff de guitarra bordando a faixa, como no New Order.
No final, Sow the path volta em versão com voz, cordas e piano, e Our secret, um tema instrumental, fecha o disco levando tudo para um universo tranquilo e, ao mesmo tempo, sombrio.
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