Crítica
Ouvimos: The Last Dinner Party, “Prelude to ecstasy”

- Prelude to ecstasy é o primeiro álbum do The Last Dinner Party, banda formada em Londres em 2021. O grupo tem Abigail Morris (vocais), Lizzie Mayland (vocais, guitarra), Emily Roberts (guitarra solo, mandolin, flauta), Georgia Davies (baixo) e Aurora Nishevci (teclados, vocais).
- O grupo surgiu no meio da pandemia, o que dificultava ensaios e inviabilizou shows – só tocaram ao vivo pela primeira vez em novembro de 2021. Em julho de 2022, chegaram a abrir um show para os Rolling Stones, quando ainda se chamavam The Dinner Party (o “last” foi acrescentado por causa de um grupo de hip hop chamado Dinner Party).
- O álbum tem participação de 25 músicos de orquestra. Aurora Nishevci regeu os músicos em cinco das doze faixas.
Florence + The Machine foi a referência citada por dez entre dez pessoas assim que deram uma escutada básica na estreia do The Last Dinner Party. Faz sentido, e o clima indie-pop e grandiloquente da banda londrina é citado até como influência pelas integrantes do quinteto. Não é bem assim, e vale não cair na tentação de juntar tudo no mesmo saco. Mesmo comparativamente, o TLDP soa mais sinistro, mais sessentista, mais pop-barroco. Analisado em particular, pertence a uma árvore genealógica da qual fazem parte Laura Nyro, Judee Sill, Love, Echo & The Bunnymen, David Bowie, Siouxsie Sioux, Shirelles, Kate Bush, Sparks, ABBA. Tudo o que pode soar mágico e musical simultaneamente.
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Com som celestial e estilo de amazonas (o olhar firme delas, na linha das Runaways, é o que mais chama a atenção nas fotos de divulgação da banda), as cinco integrantes do The Last Dinner Party iniciam o disco com uma vinheta-título orquestral que soa como abertura de filme – e que insere o ouvinte num universo que alude tanto aos anos 1960 quanto ao rock britânico do começo dos anos 1980.
O produtor do disco é James Ford, integrante do The Last Shadow Puppets – e o mesmo sujeito que cuidou da virada lounge pop dos Arctic Monkeys em Tranquility base hotel & casino. Um cara acostumado a lidar com bandas cujas referências se localizam entre os anos 1960 e os bodes existenciais do começo da década seguinte, como acontece com Georgia, Lizzie, Abigail, Aurora e Emily. Elas expõem em Prelude to ecstasy um mundo que só de vez em quando traz, em letras e conceito, um pouco do “êxtase” do título. Na prática, é um álbum agridoce, que mesmo tendo o romantismo e a intensidade do hit Nothing matters, une argamassa gótica, vocais quase dream pop (como na balada On your side), e uma certa tranquilidade triste, como no acalanto feminista de Beautiful boy – cuja letra fala de um garoto que “lança navios nos quais navega em segurança”, mas que desperta mais inveja do que desejo nas mulheres.
Já Burn alive, por exemplo, soa como uma renovação do pós-punk. Ceasar on a TV screen é uma mini-ópera pop cuja letra tem a mesma grandiloquência de bandas como Roxy Music e Echo & The Bunnymen (“eu sou César na tela da TV, campeã do meu destino/ninguém pode me dizer para parar, eu terei tudo que eu quiser”). The feminine urge traz de volta o som dos girl groups sessentistas – a abertura tem o mesmo riff de bateria de Be my baby, das Ronettes – e leva tudo para um lado mais existencial e sombrio, em versos como “aí vem o impulso feminino, eu o conheço tão bem/de nutrir as feridas que minha mãe segurou/oh, bailarina se curva sob o peso de tudo isso/não é divertido segurar o mundo em suas mãos?”.
A melhor do álbum, My lady of mercy, abre num desenho musical de synth pop “orgânico”, com batidas dadas por palmas, e sonoridade cheia de ganchos – com direito a uma parte 2 mais pesada, que insere uma rara faceta mais anos 1990 no disco. No final, o clima lúgubre de Mirror, soando como um curiosa mescla de ABBA e Velvet Underground. Uma estreia realmente impressionante.
Nota: 9
Gravadora: Island
Foto: Reprodução da capa do álbum.
Crítica
Ouvimos: Home Is Where – “Hunting season”

RESENHA: No segundo disco, Hunting season, o Home Is Where troca o emo por um alt-country estranho e criativo, misturando Dylan, screamo e folk-punk em faixas imprevisíveis.
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O Home Is Where é uma banda emo – mas no segundo disco, Hunting season, eles decidiram que estava na hora de mudar tudo, ou quase tudo. O grupo volta fazendo um alt-country pra lá de esquisito, com referências que vão de Bob Dylan a Flying Burrito Brothers. Sendo que a ideia de Bea McDonald (voz, guitarra) parece inusitada demais para ser explicada em poucas palavras (“um disco que dá para ouvir num churrasco, mas que também dá para chorar”, disse).
Com essa migração sonora pouco usual, o Home Is Where se tornou algo entre Pixies, Sonic Youth, Neil Young e Cameron Winter, com vocal empostado lembrando um som entre Black Francis e Redson (Cólera). Reptile house é pós-punk folk, Migration patterns é blues-noise-rock, Artificial grass tem vibe ligeiramente funkeada e é o tipo de música que uma banda como Arctic Monkeys transformaria num hit – mas é mais esparsa, mais indie, e os vocais chegam perto do screamo.
Hunting season tem poucas coisas que são confusas demais para serem consideradas apenas inovadoras ou experimentais – Bike week, por exemplo, parece uma demo dos Smashing Pumpkins da época de Siamese dream (1993). Funcionando em perfeta união, tem o slacker rock country de Black metal mormon, o folk punk de Stand up special e uma balada country nostálgica com vibe ruidosa, a ótima Mechanical bull. Os melhores vocais do álbum estão na balada desolada Everyone won the lotto, enquanto Roll tide, mesmo assustando pela duração enorme (dez minutos!), vale bastante a ouvida.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Wax Bodega
Lançamento: 23 de maio de 2025.
Crítica
Ouvimos: Satanique Samba Trio – “Cursed brazilian beats Vol. 1” (EP)

RESENHA: Satanique Samba Trio mistura guitarrada, lambada, carimbó e jazz experimental em Cursed brazilian beats Vol. 1
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Como o Brasil insiste em não ouvir o Satanique Samba Trio, vale dizer que a banda brasiliense não é um trio e o som vai bem além do samba – é puramente jazz unido a ritmos brasileiros variados, com ambientação experimental e (só às vezes) sombria. O novo disco é Cursed brazilian beats vol. 1 – que apesar do nome, é o segundo lançamento de uma trilogia (em português: Batidas brasileiras amaldiçoadas).
Dessa vez, a banda caiu para cima de ritmos do Norte, como guitarrada, lambada e carimbó, transformando tudo em música instrumental brasileira ruidosa. O grupo faz lambada de videogame em Lambaphomet, faz som regional punk em Brazilian modulok e Sacrificial lambada, e um carimbó que parece ter sido feito pelos Residents em Azucrins. Já Tainted tropicana, ágil como um tema de telejornal, responde pelo lado “normal” do disco.
A surpresa é a presença, pela primeira vez, de uma música cantada num disco do SST: Aracnotobias tem letra e voz de Negro Leo – talvez por isso, é a faixa do grupo que mais soa próxima dos experimentalismos do selo carioca QTV.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Rebel Up Records
Lançamento: 21 de março de 2025.
Leia também:
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- Ouvimos: Negro Leo, Rela
- Ouvimos: Residents, Doctor Dark
- Relembrando: The Residents, Meet The Residents (1974)
Crítica
Ouvimos: Mugune – “Lua menor” (EP)

RESENHA: O Mugune faz psicodelia experimental e introspectiva no EP Lua menor, entre Mutantes e King Gizzard.
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Trio introspectivo musicalmente vindo da cidade de Torres (RS), o Mugune é uma banda experimental, psicodélica, com design musical esparso e “derretido”. O EP Lua menor abre com a balada psicodélica Capim limão, faixa de silêncios e sons, como se a música viesse lá de longe – teclados vão surgindo quase como um efeito, circulando sobre a música. Duna maior é uma espécie de valsa chill out, com clima fluido sobre o qual aparecem guitarras, baixo e bateria.
A segunda metade do EP surge em clima sessentista, lembrando Mutantes em Lua, e partindo para uma MPB experimental, com algo de dissonante na melodia, em Coração martelo – música em que guitarras e efeitos parecem surgir para confundir o ouvinte, com emanações também de bandas retrô-modernas como King Gizzard & The Lizard Wizard.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 17 de abril de 2025.
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