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Crítica

Ouvimos: Marina Sena, “Coisas naturais”

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Ouvimos: Marina Sena, “Coisas naturais”

Poderia ter sido sempre assim: Coisas naturais é o terceiro disco de Marina Sena e o primeiro no qual ela está inteira, concebendo um álbum que consegue juntar tecnobrega, funk, reggae, kuduro, sofisticação herdada de Billie Eilish, notas extensas herdadas de Gal Costa. Um timbre bem parecido com o da cantora baiana surge em músicas como a faixa-título, uma ciranda pop que abre o álbum, e Sem lei.

A mudança vocal talvez seja uma resposta às críticas que ela recebeu pelo show no festival The Town no qual cantava o repertório de Gal. E esse lado mais sofisticado, sem deixar de ser pop, invade músicas como Desmistificar (pop com som de videogame), Anjo que, de fato tem um clima parecido com os discos de Billie, mas no final vira um rock tropicalista) e Sem lei – uma bossa-bolero que soa como uma música de Lulu Santos composta para o repertório de Gal.

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As letras são diretas, sem nenhuma censura e, quase sempre, falam sobre amor e sexo, combinando com a vibe do reggae nortista de Numa ilha e do trap indianista de Lua cheia – esta, tem sons que parecem apontar para um Depeche Mode influenciado por sons brasileiros. A vinheta Carnaval é eletrofunk carnavalista e sexualmente ativo. Vamos combinar que o excesso de assuntos safados, às vezes, causa uma certa sensação de ouvir sempre a mesma letra, até por ser tudo quase sempre dito da mesma forma – e sem nenhum discurso a mais para aumentar a potencialidade. Não chega a ser um grande defeito.

Entre as melhores faixas, estão Mágico, que põe synthpop e boogie oitentista convivendo, num clima que lembra Rita Lee e Roberto de Carvalho e o samba pop de Ouro de tolo, que abre com um vocal ágil a ponto de inicialmente nem dar para perceber o ritmo da faixa – já é um grande feito de Marina como cantora. Combo da sorte e Doçura vão do reggae ao raggamuffin. E há um clima bem próximo do k-pop nas eletronices de músicas como Tokitô e Sensei.

Nota: 8
Gravadora: Sony Music
Lançamento: 31 de março de 2025.

 

Crítica

Ouvimos: Sam Fender, “People watching”

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Ouvimos: Sam Fender, “People watching”

Sam Fender é um cantor e compositor da região de Newcastle, no Norte da Inglaterra – dá para perceber tanto pelo sotaque mastigado da cidade, quanto por sua preferência por um som que tangencia o folk. People watching, seu terceiro disco, deixa no entanto a impressão de que Sam é norte-americano, não inglês.

Isso porque as referências mais encontráveis no álbum são R.E.M. (o pop delícia da faixa-título), Byrds (junto com R.E.M na reflexiva Nostalgia’s lie, que se pergunta: será que o passado foi bom mesmo ou será que eu inventei tudo?), soft rock setentista (Arm’s lenght, com um riff de guitarra que é puro country). E em especial, Bruce Springsteen soa como um quase pai espiritual de Fender em todo o álbum, em melodias e letras. Não custa lembrar que o produtor é Adam Granduciel, da banda norte-americana de rock-de-raiz The War On Drugs.

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Há outras referências, na verdade. Chin up traz um lado mais britpop para o disco, com linhas vocais funkeadas e um belo arranjo de cordas no final. Crumbling engine e Wild long lie lembram os flertes do rock inglês oitentista com o pop romãntico e as paradas de sucesso. Os vocais de TV dinner têm balanço de quem já ouviu muito hip hop, mas a abertura da música tem algo de Supertramp, por causa do piano e do synth.

No final, Remember my name, uma homenagem ao falecido avô de Sam Fender, tem uma tristeza solene que, por vezes, lembra Queen. Mas tudo operando debaixo de um chapéu springsteeniano: mesmo quando fala de amor, Sam assume o lugar de um jovem duro da classe trabalhadora da Inglaterra e mira um público ferrado, que possivelmente vai economizar dinheiro para vê-lo cantar em estádios lotados.

Uma das maiores demonstrações disso é Something heavy, que poderia ser gravada tanto por Bruce Springsteen quanto por Patti Smith, e cuja letra fala sobre a miséria humana do dia a dia, assombrada pelos destroços do capitalismo (“carregando um ao outro pela avenida / a cidade nunca esteve tão cansada / metade dos bares bombardeados depois da Covid”).

Nota: 8,5
Gravadora: Polydor
Lançamento: 21 de fevereiro de 2025

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Crítica

Ouvindo: Craig Finn, “Always been”

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Ouvindo: Craig Finn, “Always been”

Always been, sexto disco solo de Craig Finn – vocalista do The Hold Steady, banda que sempre operou entre o pós-punk e o rock clássico – é longo, e cheio de assunto. Às vezes se torna um álbum meio complicado de digerir de primeira, especialmente se você não entende 100% de inglês – acompanhar as letras caudalosas de Craig como quem lê um livro ou uma crônica, é parte da experiência. Finn tem um vocal que deve tanto a Bob Dylan quanto a Phil Lynott (Thin Lizzy), encaixando várias frases nas melodias.

As letras são narrações com começo, meio e fim. Bethany, balada entre os anos 1960 e 1970, fala sobre um padre que está a fim de (digamos) pecar, com um final inesperado e bem estranho – quase como num filme ou num conto inconclusivo. People of substance é uma história de álcool, brigas, afastamento, solidão e ressaca amorosa. Luke & Leanna, por sua vez, é uma new wave sintetizada e triste, que fala sobre um casal que é quase um Eduardo e Mônica às avessas – em vez de companheirismo e espera, uma existência marcada por tédio, desejos não realizados, sorrisos amarelos e traições.

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Os personagens do disco, geralmente, são pessoas que estão fugindo de alguma coisa, nem que seja de si próprias – o que gera, em vários momentos, narrativas bem trágicas. I walk with a cane, soft rock legítimo, é sobre gente que não aguentou a barra. Shamrock é folk com alma punk sobre gente que vive na marginália. The man I’ve always been é uma balada com ar country sobre dúvidas, pessoas deixadas para trás e, talvez, drogas pesadas (“quando eu deixei Seattle / eu estava assombrado pela agulha / que a cidade sempre segurou acima da minha cabeça”).

Mas se você começou a ouvir o disco e já começou a sentir necessidade de dar uma parada porque é muita informação, vale citar que Always been tem uma música longa e falada. É Fletcher’s – uma canção sobre dureza, falta de oportunidades e dia a dia rueiro, com clima tecnobluesreggae que lembra Pink Floyd e tom ambient que remete a Brian Eno. Uma faixa que ajuda a dar mais ainda a impressão de que Always been é um livro que virou disco – e que provavelmente precisa ser escutado como uma coletânea musicada de contos.

Nota: 8
Gravadora: Tamarac/Thirty Tigers
Lançamento: 4 de abril de 2025

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Crítica

Ouvimos: L.A. Guns, “Leopard skin”

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Ouvimos: L.A. Guns, “Leopard skin”

Um dos inspiradores da cena oitentista do rock de Los Angeles, o L.A. Guns sempre esteve mais de olho no punk e na era glam do que nas facilidades do glam metal. E você provavelmente sabe: a banda foi peça-chave na criação do Guns N’ Roses, nascido da fusão de uma das formações do L.A. Guns com a banda coirmã Hollywood Rose. Só que as brigas internas (especialmente entre o vocalista Phil Lewis e o guitarrista Tracii Guns, que só se reconciliaram há cerca de uma década) renderam várias formações diferentes, além versões paralelas da banda (que, por sua vez, renderam alguns processinhos) e, claro, fãs perdidos no meio do caminho.

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Leopard skin, o décimo sexto disco da banda, celebra os 40 anos de estrada do L.A. Guns com Tracii, Phil e companhia entregando um rock que… bom, não traz absolutamente nenhuma novidade – e talvez esse seja justamente o charme. Um destaque curioso é Hit and run, um hardão cromado com ecos de bandas dos anos 1980 que beberam no glam setentista, como The Smiths, Psychedelic Furs e Gene Loves Jezebel. Mas no geral, é hard rock e glam metal feito por quem cresceu ouvindo punk, mas com influências claras de Guns N’ Roses e, principalmente, Aerosmith.

O AC/DC dá as caras (em espírito) no boogie rock de Taste it e Follow the money. Já Lucky motherfucker e If you wanna evocam o clima festivo do Sweet. The grinder vem carregada de sujeira sonora e fala de excessos, abusos e a longa estrada da recuperação. Quando o L.A. Guns tenta vestir uma roupagem de “guenta aí, somos uma banda de rock clássico!”, o resultado soa meio artificial – como em I’m your candy man, quase um decalque do álbum Presence (1976), do Led Zeppelin, ou no country-blues arrastado de Runaway train, que parece não engrenar.

Mas Leopard skin não é exatamente sobre inovação – é sobre reencontro. É o L.A. Guns assumindo quem é, com as marcas do tempo, mas ainda afiado.

Nota: 7,5
Gravadora: Cleopatra Records
Lançamento: 4 de abril de 2025

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