Crítica
Ouvimos: Foster The People, “Paradise state of mind”

- Paradise state of mind é o quarto disco da banda californiana Foster The People, que tem na formação Mark Foster (voz, synth, guitarra), Ison Innis (synths, bateria, programação) e Sean Cimino (guitarra, synths, programação). É o primeiro lançamento da banda pela Atlantic Records – em 2020 chegou a sair um EP independente, In the darkest of nights, let the birds sing.
- Boa parte do disco, diz Mark Foster, vem de mudanças que aconteceram na época da pandemia de covid-19. “Eu simplesmente mergulhei em mim mesmo, realmente desempacotando muitas coisas emocionalmente, psicologicamente. Descobrindo quem Mark é fora da música e me sentindo confortável com isso”, contou aqui.
- O disco foi produzido por Foster ao lado de Ison Innis, Chrome Sparks e Paul Epworth. Apesar de haver programações no álbum, o músico diz se tratar do disco mais analógico já lançado pela banda – num papo com a Spin, garantiu que 90% de Paradise é analógico.
Tem muita, mas muita gente mesmo, que só conhece a banda californiana Foster The People por causa do hit Pumped up kicks. Essa música virou uma verdadeira praga em 2010, quase no mesmo nível de Hey ya, do Outkast, alguns anos antes – talvez até mais, porque em 2010 já havia um monte de redes sociais e o conceito de “viralização” não era estranho. Era aquele típico indie pop que unia tribos e abria caminhos. Mas quem só ouviu o grande hit demorou para perceber que, na real, o Foster The People era uma banda neo-psicodélica, da melhor maneira que uma banda de argamassa indie conseguiria ser em 2010.
Supermodel, o segundo álbum (2014), até deixava isso mais claro a partir de músicas como Pseudologia fantastica, quase uma pérola de Madchester atualizada e perdida no rock dos anos 2010. Por acaso, o líder e principal compositor Mark Foster tratava de colocar as coisas em seus lugares avisando que o novo disco do FTP havia sido bastante influenciado pelo rock britânico. O detalhe é que até para quem conhece Supermodel, ou o posterior (e experimental) Sacred hearts club (2017), o grupo aparece um tanto mudado em seu quarto disco, Paradise state of mind, basicamente uma pérola influenciada por disco music, Prince, funk no estilo de Parliament/Sly & The Family Stone, Nile Rodgers. Tudo fundido à base de psicodelia, e de uma esquisitice musical encontrável em discos de Todd Rundgren e da fase Berlim de David Bowie. Como acontece no soul progressivo Sometimes I wanna be bad, dividido em várias partes, e com aquele ar de música dançante para festas louconas.
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Boa parte de Paradise state of mind soa como música escapista, ainda que caia quase tudo bem na pista de dança. Afinal, é o disco de canções que falam sobre o fim dos tempos (See you in the afterlife), sobre amores espirituais (Lost in space), saudades de um tempo que não volta mais (Take me back) – tudo claramente influenciado pelas incertezas da época da pandemia. Num clima meio Prince, meio Bruno Mars, a faixa-título mete papos-cabeça sobre racionalização do prazer (“só preciso parar de tentar descobrir/por que algo parece bom, para deixá-lo começar”). E chega a um resultado que se não é dos mais originais (você talvez lembre do Tame Impala), pelo menos dá dimensões diferentonas à união de molho pop e orgulho indie.
Rola o mesmo na psicodelia good vibes de Holy Shangri-la, com ritmo leve e sinuoso, dado pelo piano, pela programação e pelos sintetizadores (a letra: “toda a minha vida/eu vivi em alguma espécie de sonho/quando abro os olhos/vejo seres interdimensionais”). E no final, com mais uma pérola lembrando a vocação dançante do rock britânico dos anos 1990 (Chasing low vibrations). Além de A diamond to be born, soando como uma transmissão de TV (ou de áudio) repleta de mensagens de outro planeta, ou intervenções psicodélicas.
Nota: 8
Gravadora: Atlantic
Crítica
Ouvimos: Lily Allen – “West End girl”

RESENHA: Lily Allen renasce em West End Girl: pop confessional, moderno e afiado, transformando dores pessoais no melhor álbum dela em anos.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: BMG
Lançamento: 24 de outubro de 2025.
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Muita gente anda dizendo que não esperava que Lily Allen, depois de tanto tempo (No shame, o disco anterior dela, saiu em 2018) voltasse com um álbum ótimo – e, de fato, as atenções do mercado fonográfico não estavam mesmo voltadas para ela. West End girl surgiu quase de surpresa no momento em que Lily se sentiu com coisas para falar, e mais do que tudo, segura consigo própria. O fim do casamento com o ator David Harbour, e os abusos e traições que ela viveu durante o relacionamento, são o suposto principal tema do disco (recentemente, a cantora deu uma disfarçada, falou que nem tudo é verdade e disse que West End girl foi “inspirado” em seu ex-casamento).
Lily sempre foi bastante confessional em relação a particularidades de sua vida, em músicas e entrevistas, mas dessa vez os fãs já vinham caçando detalhes de que algo estranho vinha rolando. Recentemente ressurgiu uma entrevista dada pelo ex-casal no tapete vermelho do prêmio teatral Oliviers Awards 2022: Lily foi indicada a melhor atriz por seu papel na peça 2:22 A ghost story e, no tal bate-papo, teve aturar o (então) marido fazendo uma piadinha cheia de ressentimento e inveja. Nas fotos do evento, ela parece bastante incomodada com tudo e sem a menor vontade de estar ali, pelo menos ao lado de Harbour.
- Ouvimos: Blood Orange – Essex honey
Seja como for, o David Harbour (ou o que o valha) que é retratado em West End girl é um sujeitinho invejoso (na faixa-título), infiel (Just enough, Madeline e quase todo o disco), viciado em sexo (Pussy palace), escroto (em Nonmonogamummy ela fala algo sobre David ter exigido relacionamento aberto e que ela quisesse ter filhos com ele) e frequentador de redes sociais bem estranhas (4chan Stan, na qual Lily confessa que as bandeiras foram tantas que ela resolveu fuçar nas coisas do ex-marido e achou uma nota de compra suspeita). Allen também se diz cansada de ter que bancar a mãe de seus maridos e namorados (Fruityloop, de versos como “queria poder consertar todos os seus problemas / mas todos os seus problemas são seus para você consertar”).
Já Dallas Major, cantada na primeira pessoa, usa um truque típico de Madonna e Beyoncé – a criação de um alter-ego que, na real, é uma versão dela própria – e resume tudo em tristes constatações: “eu uso o nome artístico Dallas Major, mas esse não é meu nome verdadeiro / sabe, eu costumava ser bem famosa, isso foi há muito tempo atrás / sim, estou aqui em busca de reconhecimento e provavelmente devo explicar / como meu casamento se tornou aberto desde que meu marido me traiu”, canta, antes de mudar a perspectiva: “o nome dela é Dallas Major / ela morre de medo de fracassar / ela só está aqui em busca de validação”.
Musicalmente, West End girl é o melhor disco de Lily em bastante tempo, e tem algumas modernidades bem interessantes, como a bossa jazz pop da faixa-título, a agilidade sonora de Ruminating (com piano pop lembrando os hits de Joe Jackson), a blues ballad indie de Sleepwalking e o pop alternativo, com ares sessentistas, de Tennis. Madeline é um pop abolerado, quase um brega, que vai ganhando cara trap. Faixas como a celestial Pussy palace, 4chan Stan e Fruityloop (essa, lembrando a Lily do começo) deixam sempre a impressão de algo familiar – mas nunca repetido ou entediante.
Já Nonmonogamummy, mesmo com a letra relatando amarguras pessoas, é pop feliz e com ligeiro ar 60’s, evocando algo de Low rider, hit do War. Dallas Major é um r&b com cara quase disco, E ainda tem Let you w/in, pop adulto de piano, com andamento evocando Elton John e Paul McCartney. West End girl é o momento em que Lily percebe o tempo que perdeu tentando impressionar e conquistar gente estúpida – mas também musicalmente, é a “melhor versão” dela nos últimos tempos.
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Crítica
Ouvimos: Zécarlos Ribeiro – “(Todos os Homens)º = 1”

RESENHA: Em (Todos os Homens)º = 1, Zécarlos Ribeiro une rock clássico, folk e deboche em disco variado que mistura poesia do cotidiano, crítica social e ecos de Erasmo, Zappa e Arrigo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 10
Gravadora: 7 de novembro de 2025
Lançamento: Independente
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Zécarlos Ribeiro é, ao lado de Luiz Tatit, o principal compositor da história do grupo Rumo, e um cara bom de narrar cenas – sempre com um olho na história, e outro no que pode estar acontecendo nas internas. Esse clima toma conta de seu segundo disco solo, (Todos os Homens)º = 1 (“todos os homens elevado a zero é igual a um”).
A curiosidade é que (Todos os Homens)º = 1 é basicamente um disco de rock, e de rock clássico, à maneira de Erasmo Carlos – o espírito do Tremendão baixa em faixas como o boogie Bando de loucos (que tem ótimo arranjo de metais), o rock acústico Vai pra cama descansar e o blues-rock titânico É do mal. Estica a trena abre com uma improvável cara industrial e depois vira um rock irônico e nostálgico. Arrigo Barnabé comparece em Minha cabeça, um eletro-rap-samba zoeiro, que tem algo de Sparks. E vibes lembrando Frank Zappa aparecem na faixa-título.
- Ouvimos: UmQuarto – Fora de lugar
Zécarlos também embarca e tons folk e country em faixas como a sombria Deslumbre (com Ana Deriggi nos vocais), a abolerada e italianada Sonhe em pé (com Carlos Careqa), o roquinho mineiro Vem pra cá e a abolerada Volta pra mim, que lembra Rita Lee. Nas letras, Zécarlos põe poesia e história no trivial, sempre com deboche e protesto, como na insônia de Volta pra mim (“não consigo mais dormir de madrugada / meus pensamentos marcam reuniões inesperadas”) e o papo sobre amor e algoritmos de Bando de loucos.
Já Sonhe em pé conta histórias de italianos em São Paulo, enquanto Estica a trena fala sobre operários que dançam, no sentido literal e figurado – com direito à citação de Construção, de Chico Buarque, e suas lembranças de dias acidentados para o trabalhador brasileiro. Som e poesia do dia a dia.
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Crítica
Ouvimos: Bianca and The Velvets – “Reminder” (EP)

RESENHA: Vinda de Belém, Bianca and The Velvets lança Reminder, EP com base em The Cure, e em estilos como grunge e pós-punk, com voz grave marcante e clima dramático.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 22 de outubro de 2025
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Punk e indie rock de Belém (PA): no EP Reminder, Bianca and The Velvets (Bianca Marinho, Marcel Barretto, Emmanuel Penna e Leonardo Chaves) unem referências que passam pelo pós-punk, pelo grunge e pelo som de bandas dos anos 2000 – tendo como detalhe especial a voz grave de Bianca, que muitas vezes soa parecida com a de Dean Wareham (do Luna, lembra?) e em outros momentos ganha uma vibe entre o sexy e o robótico.
- Ouvimos: Flerte Flamingo – Dói ter
O EP Reminder abre chegando perto simultaneamente de The Cure e do garage rock, com a distorcida Knives – que abre com um “go on” idêntico ao de In between days, do Cure. Like on TV une Gang Of Four e trevas darkwave. Summertime river é o lado sixties do disco, na guitarra e na composição, e tem algo de slacker, de despojado, no arranjo.
As duas próximas faixas reúnem o lado dramático de Reminder. Said you loved me, then you’re gone é uma música sombria de piano e violão, com voz sussurrada, e um clima o mais folk-grunge possível. I was a giver é folk tocado na guitarra, com algo de Velvet Underground nos vocais e na execução. No excuses, indie rock que encerra o álbum, traz emanações de Pretenders e The Killers, simultaneamente.
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