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Crítica

Ouvimos: Edvard Graham Lewis, “Alreet?”

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Ouvimos: Edvard Graham Lewis, "Alreet?"

O Wire é uma das bandas mais influentes da história do rock britânico. Ecos da sonoridade de discos como Pink flag (1977) podem ser encontrados em inúmeras bandas, desde contemporâneas (Robert Smith queria que o The Cure se parecesse com eles, no começo da carreira) até gente bem mais recente (Connection, hit dos anos 1990 do Elastica, parecia demais com Three girl rhumba, não-hit do Wire de 1977, a ponto de ter rolado um acordo extrajudicial).

Nos últimos tempos, após algumas mudanças de formação, o Wire vinha alternando ruído e melodia em discos como Noturnal koreans (2016) e Silver/lead (2017). Em carreira solo, o baixista e co-fundador do grupo, Graham Lewis, adotou seu nome completo (Edward Graham Lewis, com um “v” no lugar do “w”). E no álbum Alreet?, chega mais perto do lado experimental e perturbador da música de sua banda.

Sendo o Wire tão influente assim, nem espere que o disco de Edvard não se pareça com sua banda. Alreet? é um disco fincado num ponto de união entre o pós-punk e o rock progressivo, chega perto de rótulos como krautrock e ambient music em vários momentos, e suas oito faixas são mobilizadas a ponto de tudo parecer com a trilha de um documentário de guerras ou guerrilhas, com o baixista ora declamando as letras, ora soando como um countryman de péssimo humor.

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Kids of whether, na abertura, traz tudo o que bandas como o Ministry e KMFDM roubaram do Wire. É um jungle leve, com distorções, alternando som eletrônico e orgânico, com uma letra que ordena: “você não irá passar por aqui novamente/nunca terei o prazer/você não irá passar por aqui novamente/em busca de tesouros sonoros”. Diamond shell lembra coisas da dupla David Byrne e Brian Eno, ou lançamentos solo de Jah Wobble (Public Image Ltd),. A faixa promove a união de guitarras e instrumentos de orquestra a batidões eletrônicos – e os beats ganham tons orientais, na sequência.

A sombria Switch tem batidão arábico, e lembra um eletro-folk. E um clima parecido surge no jungle estradeiro e selvagem de Last scene, que soa como uma eletrônica de faroeste, com guitarras unidas a sons que vêm de longe, e que lembram sanfonas e violinos. Bang parece um trailer de filme, ou um audiodocumentário de guerra, com batidas selvagens, além de ruídos que lembram um bater de asas de helicópteros sampleado e ritmado. São três faixas em que as coisas começam a ficar cada vez mais tensas no álbum.

O lado B do vinil de Alreet? tem três longas faixas e amplia mais ainda o conceito musical do disco. Soa até quase progressivista em I still remember, que parece o Wire produzido por Brian Eno ou Robert Fripp. Key weapon inicia com algumas batidas afro, até se tornar uma peça industrial, numa faixa que, musicalmente, comta uma história de caos. Who the hell encerra o disco parecendo uma oração distorcida e caótica, ou cântico de fim de mundo, que encerra com Graham perguntando várias vezes: “sem humanidade/que porra somos nós?”. Alreet? encerra em clima de TV sendo desligada, de fio desligado da tomada, de falta repentina de luz – como já acontecia com os discos do Wire, vale dizer.

Nota: 9
Gravadora: UPP Records
Lançamento: 21 de janeiro de 2025.

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Ouvimos: The Lumineers, “Automatic”

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Ouvimos: The Lumineers, “Automatic”

Curto, tranquilo e girando em torno de variações do alt-country, Automatic, o novo disco do duo norte-americano The Lumineers (Jeremiah Fraites e Wesley Schultz são os integrantes), é um álbum carregado na ironia fina – e ela suplanta, muitas vezes, a própria nova seleção de melodias da dupla, que nem sempre acerta no alvo.

No álbum, dá para destacar a abertura com Same old song, country com referências de punk e até de emo, fala sobre insucessos, canções tristes e lança mão de versos como “ei, mamãe, você pagaria meu aluguel? / você me deixaria ficar no seu porão? / porque qualquer um de nós poderia fazer sucesso ou poderia acabar morto na calçada”. A auto-explicativa Asshole é marcada por um piano nostálgico e alguma grandiloquência, com letra falando de um desencontro bem estranho: “a primeira vez que nos encontramos / você me achou um babaca / provavelmente está certa”.

O lado melódico-ao-extremo do pós-britpop bate ponto na faixa-título e em You’re all I got, e também no piano “voador” de Sunflowers, cujo arranjo impressiona pela beleza. So long tem um clima mais classic rock e estradeiro que o resto do disco, com um arranjo que cresce e vai ganhando outros elementos. A doçura do grupo dá aquela enjoadinha básica no country-gospel de Plasticine e patina de vez nas acústicas e chatinhas Ativan e Keys on the table – para recuperar tudo na mistura de despojamento e rigor pianístico quase clássico de Better day, um anti-hino ao vazio que rege a vida de muitas pessoas (“sonhando com dias melhores / assistindo pornô e programa de imóveis na TV”).

Nota: 7
Gravadora: Dualtone
Lançamento: 14 de fevereiro de 2025.

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Ouvimos: Tátio, “Contrabandeado”

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Ouvimos: Tátio, “Contrabandeado”

A estreia solo do mineiro Tátio, produzida por Chico Neves, é um disco curto, direto, que poderia ter sido lançado pela antiga CBS em 1979 ou 1980 – ou seja: quando revelações da MPB eram lançadas a todo momento e encontravam espaço no rádio e nas trilhas de novela. Contrabandeado é um disco de afirmação, que fala sobre progresso sem regalias, amores fluidos e liberdade (sexual, inclusive) nas grandes cidades.

O tom quase mangue-bit de Radar é emoldurado por versos que dizem “vai ser difícil de controlar/tudo o que vive debaixo do sol”. A democracia e a fartura aparecem no samba-reggae-forró Será que eu sou louco. A MPB mineira clássica é evocada em Seres distantes e na meditativa Anhangabaú. A psicodelia surge no tom mutante do blues Sonho antigo e no ambient brasileiro da faixa-título.

A voz impressionante de Tátio ganha destaque em faixas como a balada do ex bem resolvido Longe de mim (com Zeca Baleiro como convidado) e o forrock apocalíptico de Reza milagreira, que ganha uma excelente participação de Juliana Linhares, e um arranjo em que o uso de eco faz parte do cenário. Contrabandeado é uma renovação da MPB da era da abertura, e um disco que funciona como vingança do oprimido.

Nota: 9
Gravadora: Estúdio 304
Lançamento: 29 de janeiro de 2025.

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Ouvimos: Pedra Lunar, “O caminho rumo ao infinito”

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Ouvimos: Pedra Lunar, “O caminho rumo ao infinito”

Banda psicodélica de Novo Hamburgo (RS), o Pedra Lunar é um quarteto formado por Gabrieli Kruger (voz e percussão), Bruno A. Henneman (guitarra e backing vocal), Leonardo Winck (baixo e backing vocal) e Felipe Frodo (bateria, percussão e backing vocal). O caminho rumo ao infinito, primeiro álbum do grupo, revela uma sonoridade que quase sempre está mais para 1966 do que para 1968. Algo entre o mod e o psicodélico em faixas como Tudo está no lugar, a quase-faixa título Caminhando rumo ao infinito (esta, com vocais bastante criativos), Livres por aí e Eterna juventude – essa última, com piano lembrando Nicky Hopkins (Rolling Stones) e clima herdado não só de Kinks como do começo do glam rock (David Bowie, T Rex).

Aumentando a variedade do som, o Pedra Lunar ganha tons progressivos em Chuva passageira, clima estradeiro e rock-barroco em Toda essa confusão, vibe entre o power pop e o country rock em Dias de inverno e um som entre Bob Dylan e Raul Seixas em Eu também quero voar. O saldo do disco do Pedra Lunar é bem positivo e promissor, e pega direto na veia de quem curte rock brasileiro setentista, por causa das letras e da argamassa vintage.

Nota: 7,5
Gravadora: Áudio Garagem
Lançamento: 14 de dezembro de 2024.

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