Cultura Pop
Um papo com Jeff Guinn, autor da biografia definitiva de Charles Manson

Morto no domingo passado (19), Charles Manson não foi apenas um assassino, e não só uma das maiores representações do mal no século passado. Era uma figura importante para a compreensão do lado sombrio da paz e amor dos anos 1960. Um ex-presidiário que, no meio do sonho hippie, se vendeu como “pregador” para uma série de jovens perdidos, que foram persuadidos por ele a cometerem crimes: os assassinatos da atriz Sharon Tate e do casal La Bianca. E chegou a sair no Brasil há dois anos (pela editora Darkside) uma obra importantíssima para se entender tudo o que está relacionado com a entrada dele, por vias tortas, no grupo das figuras bizarras da cultura pop.
O livro Manson, do autor americano Jeff Guinn, foi fundo em histórias esquisitas da infância dele (e em imagens que muita gente nem imaginava ver, como a da capa, com um Manson adolescente de terno e gravata). E passou a limpo todo o histórico do relacionamento do criminoso com Dennis Wilson, dos Beach Boys, e com o núcleo roqueiro de Los Angeles nos anos 1960.
O resumo da história, para quem sabe pouco do assunto, segue aí. Manson sonhava em ser um rockstar – mudara-se para Los Angeles, onde moravam os grandes nomes da indústria, pensando nisso. E costumava cantar suas improváveis canções tendo os membros da “família” no coral. Após ter se aproximado de Dennis Wilson, baterista dos Beach Boys (que foi mentalmente controlado por ele, durante alguns meses), decidiu que faria de tudo para convencer o produtor Terry Melcher a gravar um disco com ele. Wilson, já querendo não dever favor nenhum a Manson, gravou uma parceria sua com o criminoso num disco dos Beach Boys – mas não lhe deu crédito, o que levou Manson a ameaçá-lo. Melcher, que já havia barrado uma visita do maníaco à sua casa, disse-lhe claramente que não iria produzir disco nenhum.
A resposta de Manson foi convencer integrantes de sua “família” a matar todo mundo que estivesse na casa de Melcher, na Cielo Drive 10050, em Los Angeles. Só que o endereço, que trocara de moradores várias vezes nos últimos anos, estava sendo habitado pela atriz Sharon Tate e pelo seu marido Roman Polanski. Sharon, que estava em casa quando a “família” a invadiu, acabou assassinada.
Para mim, que li o livro em poucos dias em 2015, foi uma enorme surpresa saber que boa parte das conversas que Manson usava para engambelar seus seguidores veio dos estudos que fez das obras de Dale Carnegie (autor da bíblia da autoajuda Como fazer amigos e influenciar pessoas). Ele havia feito um curso da Fundação Carnegie na cadeia, e aprendeu muito com as lições de empatia e camaradagem momentânea ensinadas pelo escritor e palestrante. Mais: na raiz das viagens do maníaco, estão os conhecimentos que adquiriu – também na prisão – dos ensinamentos do escritor e pensador americano L. Ron Hubbard. Que é nada menos que o criador da Cientologia, controverso sistema de crenças que mobiliza vários nomões do ramo do entretenimento nos Estados Unidos.
Quando saiu Manson, a biografia, bati um papo com Jeff Guinn para o jornal O Dia, onde trabalho. Achei no meu computador a íntegra do bate-papo com ele. Guinn é um premiado jornalista investigativo, que já escreveu livros sobre o pregador Jim Jones e sobre o casal de bandidos Bonnie & Clyde. Sempre com o maior rigor na apuração e no texto. Segue aí o papo. E leia o livro.
Quando foi que você começou a pesquisa para o livro? Aliás, o que te deixou interessado na vida de Charles? Bom, eu quis escrever um livro sobre os turbulentos anos 1960, mas usando um personagem icônico ou um evento como ponto de partida, como pano de fundo. A vida de Manson toca em praticamente todas as facetas da década. A história nunca acontece num vácuo. Quando comecei a aprender mais sobre a vida de Manson, quando fui pesquisar todos os altos e baixos das mudanças políticas e culturais, minha esperança foi que eu pudesse dar aos leitores um novo contexto. O que as pessoas mais acreditavam a respeito dele era uma mistura do mito com a estranha habilidade dele em se manter na mídia, mesmo aos 80 anos.
Qual é o fato mais intrigante a respeito dele, que você descobriu? Manson não é e nunca foi um maluco, um insano. Ele sempre esteve no mais completo controle de suas faculdades mentais. E tudo o que ele fez foi cuidadosamente planejado. Para mim, isso o torna algo pior que um monstro.
Manson tem um site, no qual se classifica como um preso político. Como você lida com o fato de que ele não se considera um criminoso típico? Manson sempre se considerou superior a todo mundo. Como músico, ele acreditava que era melhor que os Beatles! Como líder de um culto, ele costumava se apresentar frequentemente como um novo Cristo. O certo é que Manson adoraria que o mundo acreditasse que ele é um preso político altruísta, que foi preso e mal compreendido por um governo que tem medo dele. Só que ele não passa de um criminoso violento e egoísta, e ele sempre foi assim.
Fale dos maiores desafios que você teve ao fazer o livro. Esteve com os parentes dele? Quais são suas lembranças desses encontros? Olha, muitas pessoas tinham histórias importantíssimas a respeito de suas ligações com Manson. E passaram mais de quatro décadas tentando esconder que tiveram associações com ele. Falar com elas foi duro e convencê-las a falar foi outro trabalhão. Mas quando consegui falar com elas, a história real de Manson – como algo oposto aos mitos popularmente aceitos por longo tempo – começou a aparecer. Para esse livro, sua irmã e um de seus primos mais próximos toparam dar depoimentos pela primeira vez. Fiz também a primeira entrevista extensa com Patricia Krenwinkel, que participou tanto do assassinato da Sharon Tate quanto do casal La Bianca. Sem fazer qualquer julgamento a respeito de seus crimes, sinto e sempre senti grande tristeza por ela.
Há muitas histórias novas e impressionantes em seu livro, como o fato de ele ter roubado muita coisa das teorias de Carnegie e Hubbard, que são ícones típicos da cultura do “sonho americano”. Como se sentiu ao descobrir essas relações entre Manson e essas teorias? Essa relação explica muita coisa. E provou para mim que não havia nada original a respeito dos ensinamentos dele. Ele roubou tudo de Carnegie, Hubbard, da Bíblia, dos Beatles. Aliás, do Carnegie acima de tudo, inclusive muito da “mitológica” habilidade dele para ler mentes. Ele era uma fraude.
Há uma cena MUITO impressionante no livro, em que ele vai à cena da morte de Sharon Tate e põe uma bandeira americana no local. É um retrato mórbido da América. Impressionou você de que forma? Para mim, parece que ele criou “a família” e persuadiu todos a cometerem esses crimes pela honra dos Estados Unidos. E pela honra da imagem dos EUA como terra das oportunidades. Manson subverteu tudo o que ele tocou. Ele achava que tinha direito de fazer qualquer coisa que quisesse.
Na sua opinião, por que é que o Departamento de Polícia de Los Angeles demorou tanto para associar a família Manson aos crimes Tate-La Bianca? Eles chegaram a ser presos por roubos de carros antes, mas nada foi perguntado a respeito dos crimes… É porque as equipes investigativas de cada caso não se davam bem e não se comunicavam como deveriam. Se tivessem trocado informação a tempo, teriam chegado mais rápido a Manson e a seus seguidores. As pistas estavam muito evidentes.
Cultura Pop
No nosso podcast, Alanis Morissette da pré-história a “Jagged little pill”

Você pensava que o Pop Fantasma Documento, nosso podcast, não ia mais voltar? Olha ele aqui de novo, por três edições especiais no fim de 2025 – e ano que vem estamos de volta de vez. No segundo e penúltimo episódio desse ano, o papo é um dos maiores sucessos dos anos 1990. Sucesso, aliás, é pouco: há uns 30 anos, pra onde quer que você fosse, jamais escaparia de Alanis Morissette e do seu extremamente popular terceiro disco, Jagged little pill (1995).
Peraí, “terceiro” disco? Sim, porque Jagged era só o segundo ato da carreira de Alanis Morissette. E ainda havia uma pré-história dela, em seu país de origem, o Canadá – em que ela fazia um som beeeem diferente do que a consagrou. Bora conferir essa história?
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: Capa de Jagged little pill). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
Ouça a gente preferencialmente no Castbox. Mas estamos também no Mixcloud, no Deezer e no Spotify.
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Cultura Pop
No nosso podcast, Radiohead do começo até “OK computer”

Você pensava que o Pop Fantasma Documento, nosso podcast, não ia mais voltar? Olha ele aqui de novo, por três edições especiais no fim de 2025 – e ano que vem estamos de volta de vez. Para abrir essa pequena série, escolhemos falar de uma banda que definiu muita coisa nos anos 1990 – aliás, pra uma turma enorme, uma banda que definiu tudo na década. Enfim, de técnicas de gravação a relacionamento com o mercado, nada foi o mesmo depois que o Radiohead apareceu.
E hoje a gente recorda tudo que andava rolando pelo caminho de Thom Yorke, Jonny Greenwood, Colin Greenwood, Ed O’Brien e Phil Selway, do comecinho do Radiohead até a era do definidor terceiro disco do quinteto, OK computer (1997).
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: reprodução internet). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
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4 discos
4 discos: Ace Frehley

Dizem por aí que muita gente só vai recordar de Gene Simmons e Paul Stanley, os chefões do Kiss, quando o assunto for negócios e empreendedorismo no rock – ao contrário das recordações musicais trazidas pelo nome de Ace Frehley, primeiro guitarrista do grupo, morto no dia 16 de outubro, aos 74 anos.
Maldade com os criadores de uma das maiores bandas de rock de todos os tempos, claro – mas quando Frehley deixou o grupo em 1982, muita coisa morreu no quarteto mascarado. Paul Daniel Frehley, nome verdadeiro do cara, podia não ser o melhor guitarrista do mundo – mas conseguia ser um dos campeões no mesmo jogo de nomes como Bill Nelson (Be Bop De Luxe), Brian May (Queen) e Mick Ronson (David Bowie). Ou seja: guitarra agressiva e melódica, solos mágicos e sonoridade quase voadora, tão própria do rock pesado quanto da era do glam rock.
Ace não foi apenas o melhor guitarrista da história do Kiss: levando em conta que o grupo de Gene e Paul sempre foi uma empresa muito bem sucedida, o “spaceman” (figura pela qual se tornou conhecido no grupo) sempre foi um funcionário bastante útil, que lutou para se sentir prestigiado em seu trabalho, e que abandonou a banda quando viu suas funções sendo cada vez mais congeladas lá dentro. Deixou pra trás um contrato milionário e levou adiante uma carreira ligada ao hard rock e a uma “onda metaleira” voltada para o começo do heavy metal, com peso obedecendo à melodia, e não o contrário.
Como fazia tempo que não rolava um 4 Discos aqui no Pop Fantasma, agora vai rolar: se for começar por quatro álbuns de Ace, comece por esses quatro.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Reprodução
“KISS: ACE FREHLEY” (Casablanca, 1978). Brigas dentro do Kiss fizeram com que Gene, Paul, Ace e o baterista Peter Criss lançassem discos solo padronizados em 1978 – adaptando uma ideia que o trio folk Peter, Paul and Mary havia tido em 1971, quando saíram álbuns solo dos três cujas capas e logotipos faziam referência ao grupo. Ace lembra de ter ouvido uma oferta disfarçada de provocação numa reunião do Kiss, quando ficou definido que cada integrante lançaria um disco solo: “Eles disseram: ‘Ah, Ace, a propósito, se precisar de ajuda com o seu disco, não hesite em nos ligar ‘. No fundo, eu dizia: ‘Não preciso da ajuda deles’”, contou.
Além de dizer um “que se foda” para os patrões, Ace conseguiu fazer o melhor disco da série – um total encontro entre hard rock e glam rock, destacando a mágica de sua guitarra em ótimas faixas autorais como Ozone e What’s on your mind? (essa, uma espécie de versão punk do som do próprio Kiss) além do instrumental Fractured mirror. Foi também o único disco dos quatro a estourar um hit: a regravação de New York Groove, composta por Russ Ballard e gravada originalmente em 1971 pela banda glam britânica Hello. Acompanhando Frehley, entre outros, o futuro batera da banda do programa de David Letterman, Anton Fig, que se tornaria seu parceiro também em…
“FREHLEY’S COMET” (Atlantic/Megaforce, 1987). Seguindo a onda de bandas-com-dono-guitarrista (como Richie Blackmore’s Rainbow e Yngwie Malmsteen’s Rising Force), lá vinha Frehley com seu próprio projeto, co-produzido por ele, pelo lendário técnico de som Eddie Kramer (Jimi Hendrix, Beatles, Led Zeppelin) e Jon Zazula (saudoso fundador da Megaforce). Frehley vinha acompanhado por Fig (bateria), John Regan (baixo, backing vocal) e Tod Howarth (guitarras, backing vocal e voz solo em três faixas).
O resultado se localizou entre o metal, o hard rock e o rock das antigas: Frehley escreveu músicas com o experiente Chip Taylor (Rock soldiers), com o ex-colega de Kiss Eric Carr (Breakout) e com John Regan (o instrumental Fractured too). Howarth contribuiu com Something moved (uma das faixas cantadas pelo guitarrista). Russ Ballard, autor de New York groove, reaparece com Into the night, gravada originalmente pelo autor em 1984 em um disco solo. Típico disco pesado dos anos 1980 feito para escutar no volume máximo.
“TROUBLE WALKING” (Atlantic/Megaforce, 1989). Na prática, Trouble walking foi o segundo disco solo de Ace, já que os dois anteriores saíram com a nomenclatura Frehley’s Comet. A formação era quase a mesma do primeiro álbum da banda de Frehley – a diferença era a presença de Richie Scarlet na guitarra. O som era bem mais repleto de recordações sonoras ligadas ao Kiss do que os álbuns do Comet, em músicas como Shot full of rock, 2 young 2 die e a faixa-título – além da versão de Do ya, do The Move. Peter Criss, baterista da primeira formação do Kiss, participava fazendo backing vocals. Três integrantes do então iniciante Skid Row (Sebastian Bach, Dave Sabo, Rachel Bolan), também.
“10.000 VOLTS” (MNRK, 2024). Acabou sendo o último álbum da vida de Frehley: 10.000 volts trouxe o ex-guitarrista do Kiss atuando até como “diretor criativo” e designer da capa. Ace compôs e produziu tudo ao lado de Steve Brown (Trixter), tocou guitarra em todas as faixas – ao lado de músicos como David Julian e o próprio Brown – e convocou o velho brother Anton Fig para tocar bateria em três faixas. A tradicional faixa instrumental do final era a bela Stratosphere, e o spaceman posou ao lado de extraterrestres no clipe da ótima Walkin’ on the moon. Discão.
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