Cultura Pop
Ted Hawkins: o melhor cantor que você nunca ouviu

Em 11 de janeiro de 1995, o The New York Times anunciava a morte de um cantor bastante experiente, mas que estava recomeçando a carreira fazia bem pouco tempo e estava ainda “à beira da fama” (como dizia o texto). Ted Hawkins tinha 57 anos, já havia feito várias tentativas de gravar e estourar, e era “um compositor, cantor e guitarrista de country e blues conhecido por suas canções penetrantes de tristeza e alegria”. Tinha lançado em 1994 o seu quinto disco, com o irônico título de The next hundred years, após ter sido descoberto pelo selo DGC, da Geffen.
O disco novo era, de todas as suas tentativas, a que tinha mais cara de “agora vai”, já que saiu com certa repercussão e ganhou excelentes críticas – naquele 1994 lotado de discos bacanas, o The Washington Post ouviu o disco com toda a atenção e o classificou como “um dos álbuns do ano”.
Dono de uma voz rouca que creditava ao fato de ter cantado por vários anos na rua, no meio da poluição (e da areia da praia de Venice), Ted soltava a voz em canções autorais como Strange conversation, Groovy little things e Ladder of success. Mas também emocionava com uma versão tristonha de Long as I can see the light, do Creedence Clearwater Revival. Ted costumava tocar guitarra acústica com uma luva de couro cobrindo a mão esquerda – a que deslizava sobre o braço do instrumento.
The next hundred years está nas plataformas, por sinal – bem como os discos anteriores de Ted, lançados por gravadoras pequenas.
A história de Ted chegou a repercutir um pouco no Brasil. Revistas como Bizz e Rock Press deram o lançamento do disco – bem como a morte de Ted, por ataque cardíaco, noticiada antes que muita gente pudesse ter escutado o álbum. Ted parecia ter aparecido do nada, mas já vinha de longe, muito longe. Nasceu em 28 de outubro de 1936 em Biloxi, Misssissippi, trafegava havia anos numa linha entre o blues, o rock e o country, e era acompanhado por alguns fãs como uma figura errática e misteriosa.
Ted tivera uma infância difícil, com analfabetismo, passagens por reformatórios e histórico de abusos. Aos 15 anos foi mandado para uma prisão para adultos. Ao sair, o fã de Sam Cooke (com quem sempre foi comparado) decidiu que faria o que pudesse para vencer como cantor e compositor profissional. Em meados dos anos 1960, foi para a Califórnia tentar carreira, cantando pelas ruas de Venice Beach, com seu violão. Ted costumava ser elogiado e atrair vários fãs – não é nem difícil imaginar que Jim Morrison (Doors) tenha visto o cantor soltando a voz pelas ruas.
Hawkins chamou a atenção de vários produtores e empresários ao longo da carreira. Os sofrimentos tiraram o artista dos trilhos: Ted viciou-se em heroína, foi parar na prisão outras vezes, e dava desaparecimentos estratégicos assim que assinava contratos. No começo dos anos 1970 gravou músicas para o produtor de blues Bruce Bromberg, mas a coisa ficou no quase.
Só em 1982, Bromberg conseguiu lançar as gravações no LP Watch your step (1982), durante um período sombrio na vida de Hawkins: ele havia sido preso sob a acusação de abuso sexual infantil (negou ter feito isso) e estava cumprindo pena. A foto da capa do disco foi tirada na prisão, e Ted precisou usar uma camisa emprestada para que não aparecesse de uniforme na capa de seu disco. Foi solto em 1984 e lançou mais um disco com Bromberg na produção: Happy hour (1985).
Foi nessa época que tudo parecia que ia dar certo na vida de Hawkins, ou pelo menos algo próximo disso: Happy hour teve alguma repercussão no Reino Unido e ele passou um tempo morando na Inglaterra e fazendo turnês por lá. Foi por causa disso que a Bizz, quando falou de Ted, noticiou que ele havia virado ídolo na Inglaterra durante os anos 1980, mas caíra no esquecimento. Ted Hawkins foi deportado para os EUA em 1990, numa história super mal contada, que envolveu acusações de envolvimento com drogas e alegação de problemas de visto.
A contratação de Hawkins pela Geffen foi noticiada pelo LA Times em 21 de novembro de 1993. Na época, Hawkins vivia em Inglewood, na Califórnia e seguia de ônibus para as ruas de Venice Beach, onde se apresentava três vezes por semana para plateias de 150 pessoas. Ted foi retratado no texto como um cantador do shoppings da região, que recebia moedas e notas de dólar de seu público ao fim de cada número. Depois avisava a eles que tinha um contrato com a Geffen e que seu disco sairia no ano seguinte, deixando os futuros fãs bastante confusos.
The next hundred years foi gravado no estúdio caseiro do produtor Tony Berg, que assumira recentemente como executivo da Geffen e definia a voz de Hawkins como “um trem de carga”. Numa entrevista com a rádio NPR de Detroit (que pode ser ouvida na internet), Ted apontava nomes como Kenny Rogers, Johnny Cash e Sam Cooke como influências, e dizia que estava afastado dos problemas do passado. A gravadora estava apostando nele e shows começaram a aparecer. Mas infelizmente não houve tempo para que o cantor começasse a fazer sucesso de verdade.
Alguns anos antes do contrato com a Geffen, em 1987, Hawkins chegou a ser abordado pelo cineasta Nick Shaw com a ideia da produção de um documentário – que foi terminado mas nunca foi formalmente lançado. Ainda assim, houve um doc sobre o cantor, dirigido por Janice Engel após sua morte, chamado Amazing grace e que está até dividido em três partes no YouTube. Um filme que fala abertamente sobre “o melhor cantor que você nunca ouviu”.
Cultura Pop
No nosso podcast, Alanis Morissette da pré-história a “Jagged little pill”

Você pensava que o Pop Fantasma Documento, nosso podcast, não ia mais voltar? Olha ele aqui de novo, por três edições especiais no fim de 2025 – e ano que vem estamos de volta de vez. No segundo e penúltimo episódio desse ano, o papo é um dos maiores sucessos dos anos 1990. Sucesso, aliás, é pouco: há uns 30 anos, pra onde quer que você fosse, jamais escaparia de Alanis Morissette e do seu extremamente popular terceiro disco, Jagged little pill (1995).
Peraí, “terceiro” disco? Sim, porque Jagged era só o segundo ato da carreira de Alanis Morissette. E ainda havia uma pré-história dela, em seu país de origem, o Canadá – em que ela fazia um som beeeem diferente do que a consagrou. Bora conferir essa história?
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: Capa de Jagged little pill). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
Ouça a gente preferencialmente no Castbox. Mas estamos também no Mixcloud, no Deezer e no Spotify.
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Cultura Pop
No nosso podcast, Radiohead do começo até “OK computer”

Você pensava que o Pop Fantasma Documento, nosso podcast, não ia mais voltar? Olha ele aqui de novo, por três edições especiais no fim de 2025 – e ano que vem estamos de volta de vez. Para abrir essa pequena série, escolhemos falar de uma banda que definiu muita coisa nos anos 1990 – aliás, pra uma turma enorme, uma banda que definiu tudo na década. Enfim, de técnicas de gravação a relacionamento com o mercado, nada foi o mesmo depois que o Radiohead apareceu.
E hoje a gente recorda tudo que andava rolando pelo caminho de Thom Yorke, Jonny Greenwood, Colin Greenwood, Ed O’Brien e Phil Selway, do comecinho do Radiohead até a era do definidor terceiro disco do quinteto, OK computer (1997).
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: reprodução internet). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
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4 discos
4 discos: Ace Frehley

Dizem por aí que muita gente só vai recordar de Gene Simmons e Paul Stanley, os chefões do Kiss, quando o assunto for negócios e empreendedorismo no rock – ao contrário das recordações musicais trazidas pelo nome de Ace Frehley, primeiro guitarrista do grupo, morto no dia 16 de outubro, aos 74 anos.
Maldade com os criadores de uma das maiores bandas de rock de todos os tempos, claro – mas quando Frehley deixou o grupo em 1982, muita coisa morreu no quarteto mascarado. Paul Daniel Frehley, nome verdadeiro do cara, podia não ser o melhor guitarrista do mundo – mas conseguia ser um dos campeões no mesmo jogo de nomes como Bill Nelson (Be Bop De Luxe), Brian May (Queen) e Mick Ronson (David Bowie). Ou seja: guitarra agressiva e melódica, solos mágicos e sonoridade quase voadora, tão própria do rock pesado quanto da era do glam rock.
Ace não foi apenas o melhor guitarrista da história do Kiss: levando em conta que o grupo de Gene e Paul sempre foi uma empresa muito bem sucedida, o “spaceman” (figura pela qual se tornou conhecido no grupo) sempre foi um funcionário bastante útil, que lutou para se sentir prestigiado em seu trabalho, e que abandonou a banda quando viu suas funções sendo cada vez mais congeladas lá dentro. Deixou pra trás um contrato milionário e levou adiante uma carreira ligada ao hard rock e a uma “onda metaleira” voltada para o começo do heavy metal, com peso obedecendo à melodia, e não o contrário.
Como fazia tempo que não rolava um 4 Discos aqui no Pop Fantasma, agora vai rolar: se for começar por quatro álbuns de Ace, comece por esses quatro.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Reprodução
“KISS: ACE FREHLEY” (Casablanca, 1978). Brigas dentro do Kiss fizeram com que Gene, Paul, Ace e o baterista Peter Criss lançassem discos solo padronizados em 1978 – adaptando uma ideia que o trio folk Peter, Paul and Mary havia tido em 1971, quando saíram álbuns solo dos três cujas capas e logotipos faziam referência ao grupo. Ace lembra de ter ouvido uma oferta disfarçada de provocação numa reunião do Kiss, quando ficou definido que cada integrante lançaria um disco solo: “Eles disseram: ‘Ah, Ace, a propósito, se precisar de ajuda com o seu disco, não hesite em nos ligar ‘. No fundo, eu dizia: ‘Não preciso da ajuda deles’”, contou.
Além de dizer um “que se foda” para os patrões, Ace conseguiu fazer o melhor disco da série – um total encontro entre hard rock e glam rock, destacando a mágica de sua guitarra em ótimas faixas autorais como Ozone e What’s on your mind? (essa, uma espécie de versão punk do som do próprio Kiss) além do instrumental Fractured mirror. Foi também o único disco dos quatro a estourar um hit: a regravação de New York Groove, composta por Russ Ballard e gravada originalmente em 1971 pela banda glam britânica Hello. Acompanhando Frehley, entre outros, o futuro batera da banda do programa de David Letterman, Anton Fig, que se tornaria seu parceiro também em…
“FREHLEY’S COMET” (Atlantic/Megaforce, 1987). Seguindo a onda de bandas-com-dono-guitarrista (como Richie Blackmore’s Rainbow e Yngwie Malmsteen’s Rising Force), lá vinha Frehley com seu próprio projeto, co-produzido por ele, pelo lendário técnico de som Eddie Kramer (Jimi Hendrix, Beatles, Led Zeppelin) e Jon Zazula (saudoso fundador da Megaforce). Frehley vinha acompanhado por Fig (bateria), John Regan (baixo, backing vocal) e Tod Howarth (guitarras, backing vocal e voz solo em três faixas).
O resultado se localizou entre o metal, o hard rock e o rock das antigas: Frehley escreveu músicas com o experiente Chip Taylor (Rock soldiers), com o ex-colega de Kiss Eric Carr (Breakout) e com John Regan (o instrumental Fractured too). Howarth contribuiu com Something moved (uma das faixas cantadas pelo guitarrista). Russ Ballard, autor de New York groove, reaparece com Into the night, gravada originalmente pelo autor em 1984 em um disco solo. Típico disco pesado dos anos 1980 feito para escutar no volume máximo.
“TROUBLE WALKING” (Atlantic/Megaforce, 1989). Na prática, Trouble walking foi o segundo disco solo de Ace, já que os dois anteriores saíram com a nomenclatura Frehley’s Comet. A formação era quase a mesma do primeiro álbum da banda de Frehley – a diferença era a presença de Richie Scarlet na guitarra. O som era bem mais repleto de recordações sonoras ligadas ao Kiss do que os álbuns do Comet, em músicas como Shot full of rock, 2 young 2 die e a faixa-título – além da versão de Do ya, do The Move. Peter Criss, baterista da primeira formação do Kiss, participava fazendo backing vocals. Três integrantes do então iniciante Skid Row (Sebastian Bach, Dave Sabo, Rachel Bolan), também.
“10.000 VOLTS” (MNRK, 2024). Acabou sendo o último álbum da vida de Frehley: 10.000 volts trouxe o ex-guitarrista do Kiss atuando até como “diretor criativo” e designer da capa. Ace compôs e produziu tudo ao lado de Steve Brown (Trixter), tocou guitarra em todas as faixas – ao lado de músicos como David Julian e o próprio Brown – e convocou o velho brother Anton Fig para tocar bateria em três faixas. A tradicional faixa instrumental do final era a bela Stratosphere, e o spaceman posou ao lado de extraterrestres no clipe da ótima Walkin’ on the moon. Discão.
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