Cultura Pop
Aquela época que a Rede OM fez aniversário
Para quem fica indignado com o fato de só a Rede Globo ter algum interesse em preservar sua memória, vai aí um vídeo interessante. Um sujeito subiu no YouTube um especial levado ao ar pela Rede OM, em 1988, contando toda a história da Rede Paraná – que deu origem à emissora – desde seu comecinho. Aliás, vai saber qual o motivo, o vídeo (que foge do trivial das datas redondas e comemora os 28 anos da empresa) começa tendo Who’ll stop the rain, clássico do Creedence Clearwater Revival, no BG.
A história da TV Paraná é anterior à da Globo. Começou em 1960, cinco anos antes da empresa dos Marinho. Em 1982, foi comprada pelo político e empresário José Carlos Martinez, e relançada como Rede OM. Seis anos depois, a ideia da empresa era (diz a narração do vídeo) “expandir a área de cobertura da TV e ampliar a programação local”, além de “criar oportunidades de vendas a seus clientes”. Ademais, tinham para oferecer em contrapartida um departamento comercial que trabalhava “a nível de (sic) computação”. E uma permuta de programação com a Rede Bandeirantes.
Em 1992, numa operação que envolveu a compra da TV Corcovado (a antiga TV Record carioca), a OM ganhou a grade da televisão aberta no Rio. Depois, a emissora mudou de nome para CNT. Aliás, se quando você zapeia na TV, esbarra com a CNT e fica querendo saber qual é a daquela estação, já sabe.
O vídeo prossegue com um demonstrativo da grade de programação. E se você nunca tinha escutado falar da Rede OM – que no período em que foi transmitida no Rio, passava tanto filme de sacanagem que ganhou o apelido de “Rede OGeme” – olha só quem era um dos notáveis da emissora no período.
Parodiado ao extremo até hoje, o Cadeia, do bizarro e histriônico Luis Carlos Alborghetti, era uma das atrações da OM naquele período. Não só trazia o apresentador berrando palavrões e dando esporro na equipe, como também o mostrava pregando a pena de morte e tendo ataques na frente das câmeras. Inegavelmente, é um clássico da televisão brasileira.
Se você nunca tinha ouvido falar de uma empresa chamada Sorvetes Caramba, ela não só existe (ou existiu) como tem um comercial veiculado no tal vídeo da OM (veja direto abaixo). Precisei voltar isso para ter certeza de que não estava viajando, ou de que não tinham editado um vídeo do Hermes & Renato no meio do aniversário da OM.
Um detalhe que pouca gente lembra sobre a rede OM – e isso aconteceu poucos anos depois do vídeo lá de cima – é que Galvão Bueno passou por lá. Olha aí ele falando um inacreditável “bem, amigos da Rede OM!”.
https://www.youtube.com/watch?v=Y0GeTcYeJog
Galvão tinha saído da Globo em 1992 para ir para a OM narrar jogos e dirigir o núcleo esportivo, mas não durou muito tempo. Isso porque logo depois a emissora começou a afundar. Bastante ligada ao então presidente Fernando Collor de Mello (amigo do sócio José Carlos Martinez, que foi deputado pelo Paraná), a OM acabou envolvida nos esquemas de corrupção do tesoureiro de campanha de Collor, PC Farias. Tem mais detalhes sobre isso aqui. Por causa disso, a emissora perdeu grana e dispensou nomes. Posteriomente, tentaria se reposicionar no mercado como CNT. Tá aí até hoje.
Enfim, se você chegou até aqui, pega aí ninguém menos que Ratinho – que por aqueles dias era repórter do Cadeia, de Alborghetti – entrevistando INRI Cristo, em 1989. O pregador justifica a crescente onda de violência no Paraná explicando que Satanás tomava conta da Terra. “Muito mais violência virá por aí. Nem começou ainda”, disse.
Crítica
Ouvimos: Sweet, “Full circle”
“Peraí, esse Sweet é aquele?”, muita gente deve estar se perguntando ao ler esse título e o começo deste texto.
Depende do seu ponto de vista. A formação clássica da banda de glam rock e hard rock já se foi quase toda para aquela grande gig no céu – sobrou apenas o vocalista e guitarrista Andy Scott, que desde 1985 leva adiante uma versão pessoal do grupo, que é a desse álbum. Isso porque houve também um Steve Priest’s Sweet, comandado pelo baixista morto em 2020, e houve também um New Sweet – batizado assim por recomendações jurídicas – criado pelo ex cantor Brian Connolly, também já falecido.
O Sweet que parece ser considerado o oficial é esse mesmo, de Andy, que vem gravando desde 1992 (e por acaso, fez shows no Brasil em 2007). Scott é o dono da bola, mas o frontman é Paul Manzi, um londrino de 61 anos que já fez shows com artistas como Ian Paice e foi integrante do grupo neo-prog Arena até 2020. O aquele do começo do texto vai sumindo aos poucos quando Full circle começa a rodar, e o Sweet que emerge das caixas de som (ou dos fones de ouvido) é uma banda de hard rock-heavy metal bem formulaica, nada a ver com o poderoso grupo de glam rock que barbarizava ao vivo e soltava hits como Ballroom blitz e épicos como Sweet Fanny Adams.
Da seleção de Full circle dá para destacar sons como Don’t bring me water, com refrão levanta-estádios, a cavalar Changes (que rouba a frase “i’m going through changes” do hit homônimo do Black Sabbath, e dá uma lembrada básica na introdução de voz de Whiskey in the jar, hit do Thin Lizzy), o metal cromado de Destination Hannover, e o belo hard rock balada da faixa-título. Mas é basicamente uma outra banda, que insiste em lembrar as fases mais recentes do Kiss ou do Whitesnake, por exemplo. Vale pelo (indiscutível) valor histórico e pela sobrevivência de um monolito do rock setentista.
Nota: 6,5
Gravadora: Sony Music.
Cinema
Ouvimos: Lady Gaga, “Harlequin”
- Harlequin é um disco de “pop vintage”, voltado para peças musicais antigas ligadas ao jazz, lançado por Lady Gaga. É um disco que serve como complemento ao filme Coringa: Loucura a dois, no qual ela interpreta a personagem Harley Quinn.
- Para a cantora, fazer o disco foi um sinal de que ela não havia terminado seu relacionamento com a personagem. “Quando terminamos o filme, eu não tinha terminado com ela. Porque eu não terminei com ela, eu fiz Harlequin”, disse. Por acaso, é o primeiro disco ligado ao jazz feito por ela sem a presença do cantor Tony Bennett (1926-2023), mas ela afirmou que o sentiu próximo durante toda a gravação.
Lady Gaga é o nome recente da música pop que conseguiu mais pontos na prova para “artista completo” (aquela coisa do dança, canta, compõe, sapateia, atua etc). E ainda fez isso mostrando para todo mundo que realmente sabe cantar, já que sua concepção de jazz, voltada para a magia das big bands, rendeu discos com Tony Bennett, vários shows, uma temporada em Las Vegas. Nos últimos tempos, ainda que Chromatica, seu último disco pop (2020) tenha rendido hits, quem não é 100% seguidor de Gaga tem tido até mais encontros com esse lado “adulto” da cantora.
A Gaga de Harlequin é a Stefani Joanne Germanotta (nome verdadeiro dela, você deve saber) que estudou piano e atuação na adolescência. E a cantora preparada para agradar ouvintes de jazz interessados em grandes canções, e que dispensam misturas com outros estilos. Uma turminha bem específica e, vá lá, potencialmente mais velha que a turma que é fã de hits como Poker face, ou das saladas rítmicas e sonoras que o jazz tem se tornado nos últimos anos.
O disco funciona como um complemento a ao filme Coringa: Loucura a dois da mesma forma que I’m breathless, álbum de Madonna de 1990, complementava o filme Dick Tracy. Mas é incrível que com sua aventura jazzística, Gaga soe com mais cara de “tá vendo? Mais um território conquistado!” do que acontecia no caso de Madonna.
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
O repertório de Harlequin, mesmo extremamente bem cantado, soa mais como um souvenir do filme do que como um álbum original de Gaga, já que boa parte do repertório é de covers, e não necessariamente de músicas pouco conhecidas: Smile, Happy, World on a string, (They long to be) Close to you e If my friends could see me now já foram mais do que regravadas ao longo de vários anos e estão lá.
De inéditas, tem Folie à deux e Happy mistake, que inacreditavelmente soam como covers diante do restante. Vale dizer que Gaga e seu arranjador Michael Polansky deram uma de Carlos Imperial e ganharam créditos de co-autores pelo retrabalho em quatro das treze faixas – até mesmo no tradicional When the saints go marching in.
Michael Cragg, no periódico The Guardian, foi bem mais maldoso com o álbum do que ele merece, dizendo que “há um cheiro forte de banda de big band do The X Factor que é difícil mudar”. Mas é por aí. Tá longe de ser um disco ruim, mas ao mesmo tempo é mais uma brincadeirinha feita por uma cantora profissional do que um caminho a ser seguido.
Nota: 7
Gravadora: Interscope.
Crítica
Ouvimos: Coldplay, “Moon music”
Aparentemente, o Coldplay está vivendo um dilema que muitos artistas de porte enorme (não existe nada deles que não seja mega, está no DNA da banda) passam a viver assim que olham para o lado e enxergam a cordilheira de fãs que já conseguiram conquistar: como permanecer fazendo coisas diferentes, e ao mesmo tempo, fazendo música para todo mundo ouvir? Ainda mais levando-se em conta que o Coldplay sempre teve um público extremamente ecumênico?
Bom, por ecumênico, entenda-se: existem fãs de sertanejo, de gospel, de MPB e gente que nem tem o hábito de ouvir música (!) que ama Coldplay, e já esteve na plateia de pelo menos um show deles no Brasil. O mesmo, vale dizer, acontecia com o R.E.M – números dos anos 1990 mostraram para a Warner, gravadora deles, que o álbum Out of time, megasucesso de 1991, foi comprado por gente que nem sequer costumava comprar discos. Muita gente deve ter comprado um toca-discos pela primeira vez para ouvir o álbum de Shiny happy people, e muita gente deve ter ido a um show “de rock” pela primeira vez porque precisava assistir ao Coldplay e se envolver com a música e com o espetáculo visual do grupo.
Explicar o papel e definir a postura de cada um desses nomes (R.E.M. e Coldplay) diante desse frege todo do mercado, parece fácil. Difícil é entender, hoje em dia, para que lado vai, musicalmente falando, a banda de discos excelentes como a estreia Parachutes (2000). Autodefinido como uma banda que fala de “maravilhamento” (o cantor Chris Martin já mandou essa numa entrevista), o Coldplay parece entregue em Moon music, o novo álbum, à vontade de investir de vez no segmento de trilhas para time-lapse de construção de shopping center, e vídeo motivacional pra empresas.
Isso faz de Moon music um disco ruim? Não, pode crer que tem coisas legais ali, além de algumas ideias boas que se perdem em finalizações meia-boca. Destaco o clima ABBA + ELO de iAAM, quase uma sobra do primeiro disco da banda; o house bacaninha de Aeterna (que mesmo assim encerra num clima de música de louvor) e a baladinha de piano All my love. Além da abertura “espacial” com Moon music, que tem participação do produtor de música eletrônica Jon Hopkins. Vale citar as mensagens de autoaceitação e autoestima da banda – sim, isso faz diferença, ainda que em termos de política, as letras do Coldplay sejam mais rasas do que piscina infantil.
- Temos episódio do nosso podcast sobre o começo do Coldplay
- Apoie a gente e mantenha nosso trabalho (site, podcast e futuros projetos) funcionando diariamente.
Por outro lado, Jupiter é um folk pop bacaninha, mas do tipo que você vê artistas em todo canto fazendo igual. A faixa 6, cujo título é identificado com um arco-íris, é parece feita de encomenda para os tais vídeos motivacionais. We pray é cheia de truques batidos da união de pop, gospel e hip hop. Em vários momentos, o Coldplay parece estar mirando, mercadologicamente, no que parece mais rentável para a banda: na trilha sonora dos seus shows, e não especialmente em discos que mudem a história do grupo. Não dá para culpá-los, mas ao fim do disco novo, a sensação é a de ter escutado um EP esticado ao máximo.
Moon music soa como música ambient produzida não por Brian Eno, mas por um produtor ou diretor de TV, ou um desses diretores criativos que surgiram na onda dos influenciadores digitais. O Coldplay de Music of the spheres (2022) parecia bem menos estandardizado e bem mais ousado. Mas foi rebate falso.
Nota: 5,5
Gravadora: Universal Music
-
Cultura Pop4 anos ago
Lendas urbanas históricas 8: Setealém
-
Cultura Pop4 anos ago
Lendas urbanas históricas 2: Teletubbies
-
Notícias7 anos ago
Saiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
-
Cinema7 anos ago
Will Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
-
Videos7 anos ago
Um médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
-
Cultura Pop8 anos ago
Barra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
-
Cultura Pop6 anos ago
Aquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
-
Cultura Pop7 anos ago
Fórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?