Crítica
Ouvimos: Porridge Radio, “Clouds in the sky they will always be there for me”

- Clouds in the sky they will always be there for me é o quarto disco da banda inglesa Porridge Radio, que começou como projeto individual da cantora e guitarrista Dana Margolin, e atualmente inclui Georgie Stott nos teclados e backing vocals, Sam Yardley na bateria e teclados, e Dan Hutchins no baixo (substituindo Maddie Ryall, que saiu em 2023).
- Dana disse à Billboard que o material do disco começou como poesias. “Todas as faixas começaram comigo escrevendo com mais foco nas palavras. Eu estava me desafiando a escrever melhor”, conta. No texto de lançamento do álbum, ela recorda que o álbum começou a nascer no começo de 2023, época de um burnout vindo da enorme quantidade de shows no ano anterior.
- Sobre a intensidade das letras, ela confessou à Billboard que “até alguns anos atrás, nunca havia percebido realmente que nem todo mundo vivencia o mundo como eu. E foi bem chocante para mim descobrir que a maioria das pessoas não tem esse tipo de experiência constante de suas emoções”, disse.
Uma das coisas que sempre chamaram atenção na banda britânica Porridge Radio é a intensidade. Em especial a intensidade de Dana Margolin como cantora e compositora. Já estava claro desde Every bad (2016), o segundo disco (e o álbum que apresentou quase todo mundo à banda), que ouvir Nina é uma experiência bastante emocional, em que vocais doces podiam passar a soar desorientados, e evoluirem em poucos segundos para urros e súplicas. Uma sonoridade que está mais para um encontro entre Dolores O’Riordan (Cranberries), Yoko Ono , Sinéad O’Connor e Siouxsie, com direito a momentos quase guturais.
Clouds in the sky they will always be there for me, por sinal, tem um título doce como os textos que Yoko escrevia em poemas nos anos 1960, sugerindo novas observações de fatos triviais, ou dando listas de tarefas diárias. É só impressão: o quarto álbum do Porridge Radio é emocionalmente pesado, uma montanha russa de emoções, de relacionamentos, de idas e vindas, e de tristezas com as quais é preciso aprender a lidar.
É o que acontece no discurso pós-amoroso de God of everything else, uma balada quase violenta musicalmente (a letra: “foi doentio amar você/eu acordo engasgando em sonhos com você/acordo chorando de amar você/vou a todos os lugares só pra ficar longe de você”). E no desespero de You will come home, lembrando Ian Curtis e o John Lennon da música Mother (“eu faria qualquer coisa só para ver o que estou esperando”, frase repetida várias vezes).
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Sleeptalker, uma balada que abre em tom quase infantil e vira uma torrente de barulho lá pela metade, soa quase insana: na letra, a personagem se entrega a uma relação tóxica sem nem questionar o assunto (“poderia esperar para sempre por você/vou fazer um pedido em um poço, mergulho direto e luto por você”). As coisas ficam menos complexas em músicas como a balada sombria In a dream I’m a painting e no folk shoegaze Pieces of heaven, um hino do fim da tristeza (“a dor que você me fez passar/estou cansada de esperar e cansada de te querer”), encerrando com a auto-explicativa Sick of the blues (“estou cansada da tristeza/e apaixonada pela minha vida de novo”).
Clouds in the sky é muita, mas muita emoção. Como acontece também em Lóki?, de Arnaldo Baptista, Unknown pleasures, do Joy Division, In utero, do Nirvana, Heart food, de Judee Sill, Blue, de Joni Mitchell, e outros discos vindos de encontros e desencontros pessoais. Não é para qualquer ouvido. Talvez fure o universo indie e invada o mundo dos futuros clássicos, talvez não – depende da atenção que ele poderá ter.
Nota: 8,5
Gravadora: Secretly Canadian
Crítica
Ouvimos: John Fogerty – “Legacy: The Creedence Clearwater Revival years (John’s version)”

RESENHA: John Fogerty, aos 80 anos, recupera direitos das músicas de sua ex-banda Creedence Clearwater Revival e relança vinte clássicos em versões idênticas às originais.
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Aos 80 anos, John Fogerty, ex-vocalista, guitarrista, compositor e déspota do Creedence Clearwater Revival, conseguiu ganhar finalmente todos os direitos sobre suas composições da época do grupo – sim, porque todos os hits autorais da banda foram compostos por ele. Para comemorar, o músico decidiu regravar 20 canções do CCR na base da “versão do John”.
Na prática, são substituições, e não versões. Em Legacy: The Creedence Clearwater Revival years (John’s version) Fogerty revisitou canções como Have you ever seen the rain, Born on the bayou, Proud Mary, Lodi, Who’ll stop the rain, Green river e Fortunate son em leituras quase 100% iguais aos originais – em timbres, arranjos, detalhes e até gritos e uivos. Facilita o fato da voz de John estar igualzinha a antigamente. Detalhe: até no Bandcamp as músicas novas estão – visão, o cara tem.
- Ouvimos: The Doobie Brothers – Walk this road
- Ouvimos: Faces – Faces at the BBC: Complete BBC concert and session recordings 1970-1973
Alguma diferença do original? Bom, Long as I can see the light teve uma pequena mudança de tom, Have you ever seen the rain teve mudanças discretas nas linhas vocais do refrão, e de modo geral todas as músicas ganharam mais peso na bateria e nas guitarras – mas praticamente tudo soa como os originais dos anos 1960 e 1970 remixados ou remasterizados.
De modo geral, não é um lançamento dos mais úteis para fãs antigos – serve mais como um demarcador de independência, já que John oferece aos fãs as versões gravadas por ele. O complicado é entender como se comportar diante de um lançamento que reembala o material oldies e apenas isso. Acaba tendo mais graça ouvir os antigos álbuns do Creedence.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7
Gravadora: Concord
Lançamento: 22 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Thistle. – “It’s nice to see you, stranger” (EP)

RESENHA: Thistle., da Inglaterra, une grunge e shoegaze em It’s nice to see you, stranger, EP coeso que ecoa Nirvana, Dinosaur Jr e My Bloody Valentine.
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Vindo de Northhampton, Inglaterra, o Thistle. (sim, existe um ponto após o nome do grupo) tem uma onda grunge + shoegaze séria no seu som – a ponto de, numa audição inicial, ser possível imaginar que a banda vem dos cafundós dos Estados Unidos. Num papo com a newsletter First Revival, eles citam o Nirvana como sua banda grunge favorita, e um dos integrantes diz não ter se entusiasmado especialmente com o shoegaze quando descobriu o estilo.
Um outro detalhe sobre o EP It’s nice to see you, stranger é que o grupo precisou de quase um ano para gravá-lo, já que cada integrante tem seu trabalho e ninguém pediu folgas. “Por isso é que ele é um EP, e não um álbum”, afirmam. Soa estranho descobrir isso, já que as cinco faixas do disco têm peso, coesão e emanações que vão de Nirvana e Dinosaur Jr a Idlewild e The Cure. Cobble/mind funde barulho, melodia e vocais doces, enterrados na música. A faixa-título volta aos anos 1990 e faz lembrar My Bloody Valentine e Sonic Youth. Fleur rouge abusa da beleza triste, com guitarras melódicas e passagens bem ruidosas, do meio para o fim.
No final, o Thistle. adere a um punk repleto de guitarras emparedadas e sensações turvas, em Holy hill, e faz a melhor fusão grungegaze do EP, com Wishing coin. Ouça.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Venn Records
Lançamento: 4 de julho de 2025.
- Ouvimos: Water From Your Eyes – It’s a beautiful place
- Ouvimos: Superchunk – Songs in the key of yikes
Crítica
Ouvimos: Camaelônica – “Eletrotropical”

RESENHA: Camaleônica mistura samba, rock, macumba e psicodelia em Eletrotropical, disco pesado e cheio de invocações.
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“Rock, macumba e samba”, trio de referências que embandeira o som do Camaleônica, pode querer dizer muita coisa – pode afirmar inclusive que a banda apenas revisita sons dos anos 1990 (Planet Hemp, Chico Science, O Rappa) e mais nada. Eletrotropical, primeiro disco de Felipe Dantas e Fernando Reis – os dois do grupo-dupla – faz qualquer ideia preconcebida cair por terra quando se percebe que a vocação do grupo é para um experimentalismo que faz tudo soar bem palpável e pesado no som deles.
A música de Felipe e Fernando soa mais como um retropicalismo pesado e turbinado, que une samba, umbanda e rock psicodélico na faixa-título, além de jazz, rock e afrosambas em Capoeira. Rola uma mescla de samba, reggae e grunge em Maravilhoso e Caprichoso. Nessa última, a percussão é forte e os tambores são tocados com raiva. E falando nisso, Língua e revolta é axé, MPB e ódio pulsando contra apagamentos históricos (“quem é você pra me dizer aqui / que eu não sou ninguém?”).
Muito de Eletrotropical são invocações – canções em que melodia, letra, percussão e indignação (e guitarras) unem-se quase numa mesma massa. No samba psicodélico e pesado de Boa noite, por exemplo, coaches, big techs e exploradores do trabalho alheio são cozidos no mesmo caldeirão a partir de raízes e histórias (“toda malandragem será perdoada/ tudo que delira, toda vadiagem”). Geral abre com vocal solitário pedindo “muita luz, saúde e axé pra geral”, e vai seguindo com tristeza herdada do blues, guitarras e percussões.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Fliperama Lab
Lançamento: 27 de junho de 2025.
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