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Crítica

Ouvimos: Mateus Fazeno Rock – “Lá na zárea todos querem viver bem”

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Mateus Fazeno Rock expande o rock de favela em Lá na zárea todos querem viver bem, misturando soul, rap, trap e protesto em um disco afiado e esperançoso.

RESENHA: Mateus Fazeno Rock expande o rock de favela em Lá na zárea todos querem viver bem, misturando rock, samba, rap e protesto em um disco afiado e esperançoso.

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Do primeiro ao terceiro disco, o rock de favela do cearense Mateus Fazeno Rock ganhou outras perspectivas, em letra, música, arranjo e confronto. Mateus afronta o roqueiro “médio” radical brasileiro louvando Djavan e inserindo referências de soul, rap e trap em sua música. Seu discurso vai pelo ponto de vista de quem realmente passa por sofrimentos e privações – como no racismo e no vácuo social de faixas como Pose de malandro/Me querem morto, Ultraviolência e Jesus Ñ voltará, verdadeiros choques de realidade.

Terceiro álbum de Mateus e sua estreia na Deck, Lá na zárea todos querem viver bem investe numa noção de rock brasileiro voltada para o dia a dia, para a cultura de rua, para sons que estão no DNA da música alternativa brasileira – incluídos aí Chico Science e Nação Zumbi, Devotos, Paralamas do Sucesso, Cidadão Instigado (banda do co-produtor do disco, Fernando Catatau). Acima de tudo, Mateus sabe que está falando com um público que assiste Vale tudo, quer que a vida melhore, quer ter esperança em alguma coisa e, em algum momento, enxerga pequenas vitórias no horizonte.

  • Ouvimos: Pedro Bienemann – Ondas de choque e calor
  • Ouvimos: Mateus Fazeno Rock – Jesus Ñ voltará

Vai daí que Lá na zárea soa afiado e ao mesmo tempo, venturoso, otimista – mesmo quando Mateus une poesia, protesto e intensidade no manifesto Arte mata (“Brasil mata, ou morre o sonho, ou morre o sonhador”, diz a letra). A faixa-título, entre mumunhas de trap, funk, música eletrônica e batuques lembrando Nação Zumbi, afia o discurso avisando que as favelas só querem paz. E passa a visão de paz: “eles querem ter filhos, querem ter netos / querem terraços com planta e insetos / querem ter vida ao seu redor, perante o mundo bem pior”. Rola o mesmo no vaporwave tranquilo de Melô do sossego. E nas lições aprendidas do dream pop carnavalista de Saturno e a intuição (“nego, o tempo é rei / fiquei bem, fiquem bem vocês / não me envenenei”).

O álbum novo de Mateus embica também no soul romântico (na sonhadora Daquilo que nois merece e no balanço djavaneado de Quando você volta), no rap-samba (O braseiro e as estrelas) e até num som punk que cruza Devotos e Ministry (Licença pra desabafar). Completando, tem ainda a hipnótica Mercado das miudezas e a eminenemente roqueira Rec.cordações, unindo emanações ultratexturizadas de Jimi Hendrix e até de Barão Vermelho. Ouça correndo.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Deck
Lançamento: 1 de agosto de 2025

Crítica

Ouvimos: Pavement – “Hecklers choice – Big gums and heavy lifters” (coletânea)

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RESENHA: Coletânea irônica do Pavement, Hecklers choice reúne hits e lados B que viraram virais, reafirmando a influência e o humor do indie noventista.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Matador
Lançamento: 18 de setembro de 2025

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Lembra quando saíam séries de coletâneas como “Os grandes sucessos de fulano/fulana”? Muitas vezes com uma lista de músicas que trazia apenas um ou dois hits (porque a ideia na prática era aproveitar o êxito do artista em outra gravadora e tentar reposicionar o material fracassado que ele deixou em outro selo)? Pois bem, hoje em dia, com as redes sociais e as plataformas digitais, qualquer música pouco lembrada pode viralizar de uma hora pra outra e virar hit – sabemos que você sabe disso, mas é só pra contextualizar.

O Pavement sentiu isso quando Harness your hopes, um lado B de compacto do grupo, lançado no fim dos anos 1990, virou sucesso na pandemia. Isso teria acontecido graças à função autoplay do Spotify e às manias momentâneas do Tik Tok (contamos essa história aqui). Mas o fato é que não rolou só com Harness: muita coisa do Pavement andou sendo devidamente recordada nos últimos tempos. Mais do que isso: a nova história do indie rock simplesmente não pode ser contada sem a influência do Pavement e de sua sonoridade despojada e inspirada – já que a cada dia parece que descobrem uma banda nova que ama o som de Stephen Malkmus e seus amigos.

Corta para Hecklers choice, coletânea de hits “virais” do Pavement, que mesmo tendo esse ar de “os grandes sucessos” (ou “a arte de Pavement”), patina na ironia e na corrosão conhecidas do grupo. A começar pelo título do disco – heckler é um termo britânico usado para definir aquelas pessoas sem-noção que atrapalham peças, shows e discursos para falar coisas.

Não que o Pavement tenha desprezo pelos seus próprios hits, até porque a compilação cai dentríssimo do material de Crooked rain, crooked rain (1994), segundo álbum, com faixas como Cut your hair, Gold soundz, a provocativa Range life. E, claro, traz também Harness your hopes e Spit on a stranger – essa última, um hit do álbum Terror twilight (1999), e uma baita balada que muita gente põe na conta do Radiohead (faz sentido, já que Nigel Godrich, costumeiro produtor da turma de Thom Yorke, cuidou desse disco).

A estreia Slanted and enchanted (1992) foi deixada de lado aqui em nome de músicas como a ruidosa Stereo, e de canções que mostram que sempre houve “algo” mais acessível na argamassa do Pavement. O grupo fez balada com ar country (a linda Major Leagues), promoveu uma curiosa união de Nirvana e Roy Orbison (Shady lane) e apresentou também canções que lembram aquela ocasião em que Bob Dylan se apresentou com uma banda punk novata na TV (Unfair, Date w/IKEA). Já Summer babe, com um pouco mais de intensidade sonora, chega perto do shoegaze.

Com o passar do tempo, dá para perceber também o quanto o piano do finalzinho de Range life deve às intervenções de Nicky Hopkins nos discos setentistas dos Rolling Stones – e até a álbuns clássicos como Blonde on blonde, de Bob Dylan (1966). Hecklers choice é o relatório das vezes em que o Pavement decidiu brincar de “escalar” a banda – e das vezes em que o destino fez isso por eles.

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Crítica

Ouvimos: Snakeheads – “Belconnen highs”

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Belconnen highs é o único disco dos Snakeheads, que começou a ser gravado em 2019 e chega só agora como homenagem ao saudoso integrante Pete Lusty. Punk australiano fundamentado nas bandas britânicas do estilo.

RESENHA: Belconnen highs é o único disco dos Snakeheads, que começou a ser gravado em 2019 e chega só agora como homenagem ao saudoso integrante Pete Lusty. Punk australiano fundamentado nas bandas britânicas do estilo.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 9
Gravadora: Cassell Records
Lançamento: 29 de agosto de 2025

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Essa banda faz punk como antigamente: rápido, quase hardcore, lembrando bandas como The Damned, The Clash, Sex Pistols, os australianos do Radio Birdman e outros clássicos. Pensando bem, o Snakeheads é uma banda de antigamente, que ficou mais de dez anos rodando pelo mar numa garrafa. Foi formada em 2014 na Austrália por dois amigos de infância, que passaram a vida tocando em várias bandas de Sydney – até que perderam o contato, se reencontraram, e decidiram ensaiar todas as segundas-feiras.

A James Roden e Pete Lusty, os tais amigos, juntaram-se Kit Warhust, Graeme Trewin (ambos na bateria) e Harry Roden (baixo). A turma começou a trabalhar em sons autorais, inspirados pelo punk britânico e pelo hardcore dos EUA – mas igualmente havia partículas de estilos como glam rock e de sons dos anos 1960. Tudo isso está presente na argamassa sonora das 17 faixas de Belconnen highs, o único álbum dos Snakeheads.

Iniciado em 2019 e só agora lançado, Belconnen highs é um renascimento e, simultaneamente, um fechamento de ciclo. A começar porque Pete Lusty morreu de câncer em 2020, uma semana antes do início da pandemia, quando o álbum sequer estava concluído. Roden seguiu em frente e terminou o disco como homenagem a Lusty, que por sinal, além de tocar em várias bandas, também foi uma figura importante do ecossistema musical da Austrália – foi empresário do The Vines e um dos fundadores do selo Ivy League.

  • Ouvimos: Half Japanese – Adventure

Não há espaço para melancolia em Belconnen highs. São canções curtas e ágeis, com bases inspiradíssimas no Clash, e com letras que falam em jogo sujo da indústria musical, tentativas de alcançar o sucesso, manipulação, merdificação da música e outros temas instigantes. Smash hits e Top of the pops fazem a crônica do jabá, dos altos e baixos, e da concentração cagada de grana da música (“nós estávamos no topo das paradas / agora estamos tocando em estacionamentos”, diz Top of the pops).

Músicas como All I want, Kontrol, Exocet, Sonic manipulation (esta, a cara do The Damned de faixas como Hit or miss) e Dumb enough são demasiadamente cascudas e passadas no alho para serem definidas como “punk pop” – unem raiva, rapidez e, às vezes, palmas a la Ramones, dando um clima amigável para qualquer fã do estilo. Savile Row, por sua vez, é um desdobre punk-sixties da batida de Bo Diddley. Já Out of control again tem partículas de Green Day, mas também tem detalhes que lembram The Who e The Jam. O disco do Snakeheads é um resgate musical com peso, inconformismo e singeleza em altas doses.

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Ouvimos: Black Eyes – “Hostile design”

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O Black Eyes volta após 20 anos com Hostile design, mistura de punk, jazz e afrobeat produzida por Ian McKaye, intensa e experimental.

RESENHA: O Black Eyes volta após 20 anos com Hostile design, mistura de punk, jazz e afrobeat produzida por Ian McKaye, intensa e experimental.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Dischord Recordss
Lançamento: 10 de outubro de 2025

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Vindo da cena ruidosa de Washington DC, o Black Eyes lançou dois álbuns entre 2003 e 2004, mas se separou logo em seguida. Dan Caldas, Daniel Martin-McCormick, Hugh McElroy, Jacob Long e Mike Kanin acabaram retornando com o grupo em 2023 para uma série de shows e o primeiro disco inédito após essa reunião sai só agora. Hostile design é considerado um álbum pela banda em entrevistas e no release distribuído pela gravadora Dischord – mas no Spotify ele está classificado como EP. De qualquer jeito, são seis músicas cruas e cáusticas em pouco menos de meia hora, com produção de Ian McKaye (Fugazi).

O Black Eyes deu recentemente uma entrevista à newsletter Last Donut Of The Night e passou a limpo a fase inicial do grupo – no entendimento da banda, o fim acabou sendo muito abrupto e muito tempo da preparação de Cough, o segundo disco (2004) foi gasto com discussões que não levavam a nada. Com mais maturidade e foco, Hostile design volta andando no corredor do art punk e das experimentações musicais que partem do punk para o jazz, o afrobeat e outros estilos. Nada muito estranho para quem se lembra dos discos anteriores do grupo, mas a banda – cuja formação incomum inclui tambores, guitarra, baixo e saxofone – soa agora bem mais experimental do que apenas afrontosa.

  • Ouvimos: New Brutalism – Requiescat record (EP)

Hostile começa em clima de marchinha art-punk com Break a leg, com vocal gritado e bateria, num clima que mais parece um “a chuva cai, a rua inunda” do barulho – mas vai ganhando cara afropunk com baixo à frente, coral e sax. Burn une gritos e lamentos, ganhando uma aparência de metal-punk artístico, de no-wave melodiosa. Under the waves mistura na guitarra detalhes de high life e mumunhas ruidosas lembrando The Fall. Já faixas mais curtas como o single Pestilence e a urgente Yeah right investem num lado maníaco que conversa bem mais com os fãs da fase anterior.

No final, TomTom tem ares de dub pós-punk, com vocal mântrico, som bem percussivo – e faz lembrar bandas como Public Image Ltd (na fase do Metal box, 1979) e Slits. O lado “hostil” do grupo está nos sons, mas está presente mais ainda nas letras, que estão sempre do lado mais sangrento e cru da vida, como no destino trágico de Yeah, right (“conseguiu um lugar à mesa / e isso lhe custou a vida”) e Break a leg (“a infecção continua se espalhando / não importa o que eu tente “).

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