Cultura Pop
Life, Sex & Death: uma banda de rock liderada por um (suposto) mendigo

Em 1992, trabalhar para uma grande gravadora devia ser divertido. Com o sucesso do grunge, bandas alternativas passaram a ser cortejadas pelas majors e a simples menção de Kurt Cobain a algum nome do underground já bastava para a assinatura de um polpudo contrato. O Melvins, por exemplo, foi parar na Atlantic, casa de Toni Braxton. E o Butthole Surfers passou a ser colega de gravadora dos Beatles e Neil Diamond, a Capitol Records.
Com o Nirvana, Soundgarden, Chili Peppers e outras tantas bandas a validar o apelo comercial do “rock alternativo”, era fácil deduzir, na visão do executivo de gravadora, que a geração fã de grunge, GWAR e Beavis & Butthead amaria uma banda como o Life, Sex & Death (LSD). Afinal, como não curtir o grupo que tinha um mendigo como frontman?
No Brasil, a banda provavelmente ficou conhecida através de algum episódio de Beavis & Butthead (confira no vídeo abaixo) ou pelo Fúria Metal, na MTV.
Lembro do Gastão Moreira anunciando as estreias do programa e destacando a banda de Los Angeles cujo vocalista mendigo tinha passado por maus bocados e começava a ficar famoso no LSD. O clipe era o de School is for fools, estrelando 3 caras com look à Alice in Chains, com riffs à Twisted Sister. E o tal Stanley, ou Chris Stann, o vocalista mendigo, entoando com voz punk um protesto juvenil sobre a escola servir apenas para otários. Ouvindo quase três décadas depois, dá pra falar: e não é que o som era bom?
Reza a lenda que a Warner havia assinado a banda por uma quantia de sete dígitos. Afinal, a história do “mendigo do rock” era tão vendável a ponto de atrair a atenção de grandes executivos. Olha aí a banda ladeada por Jimmy Iovine (produtor de discos clássicos do U2 e Tom Petty e co-fundador da Interscope Records). A foto postada no twitter do LSD prova que realmente a banda foi bastante disputada (Iovine é o segundo da esquerda)…
Já a matéria abaixo diz que os caras foram disputados por TREZE gravadoras:
Quanto a Stanley, o sujeito sempre pareceu mendigo de verdade. Tinha uma baita presença que colocava o LSD no panteão de bandas singulares: você se lembra de algum outro grupo com história parecida?
E não só pela suposta conexão com a mendicância. Silent majority (1992), único disco dos caras, tinha metal, grunge, industrial, punk e baladas bêbadas ao piano.
Sobretudo, o álbum representa uma era de transição no rock, quando o glam de LA passou a ser ofuscado pelo grunge e pelo metal alternativo. Ouvindo o disco, nota-se uma banda atenta ao levante grunge, mas sem abrir mão de certos maneirismos do hard rock farofa. Ouça Fuckin’ shit ass, que parece uma improvável jam entre Faith no More e Poison.
Em outros momentos, o LSD soava como se Tom Waits tivesse sido jogado no meio de um show do Van Halen. O disco era bem gravado, produção de hard rock de arena, mas a esquisitice e a demência das letras engraçadas e escatológicas de Stanley se sobressaíam. Sem contar que era um vocalista de muita personalidade.
Não à toa, o álbum virou cult. Além do peculiar vocalista “Tony Clifton-versão-trash”, o disco tinha musicalidade e temáticas viscerais, enraizada na experiência da banda que na realidade era de Chicago e já bem rodada nos cafundós do Meio Oeste dos EUA.
Como resumiu o site Loudersound, Silent majority é um dos grandes álbuns de rock esquecidos dos anos 1990. E quem presenciou os shows do LSD afirma que Stanley era um performer bombástico, o que não é difícil de acreditar vendo os vídeos ao vivo da época:
A fama do Stanley fedido vem desde a época das primeiras turnês, quando havia dois quartos para acomodar a banda e roadies. Por causa da catinga, o vocalista acabou tendo um quarto exclusivo.
E as histórias sobre o mendigo envolvem toda sorte de nojeiras. Nessa entrevista, o guitarrista do LSD, Alex Kane (que acabou formando o Antiproduct e tocou nas bandas de Marky Ramone e Richie Ramone) conta detalhes do ex-companheiro de LSD e revela que atualmente Stanley vive uma vida tranquila, pois na realidade o homem é um esperto investidor.
Kane também conta que sempre ouve elogios de roqueiros famosos, como Corey Taylor (Slipknot) e Marylin Manson, sobre a trabalho do LSD. “Só que ninguém comprou o disco, exceto por esses caras que viriam a liderar bandas de rock multiplatinadas”, diverte-se o guitarrista.
Em prévia incarnação, o LSD era apenas um grupo comum de glam rock de Chicago. Num raro clipe da banda, provavelmente gravado no final dos anos 1980, vemos Chris Stann (que depois viraria o podrão Stanley) em look hard rock farofa. Usava calça de couro e cabelo cacheado, sem nada que remetesse ao mendigo de ternos rasgados e boca torta do início dos anos 1990.
Em vários blog posts sobre o LSD, há comentários de gente afirmando que Chris Stann vem de família rica e hoje lucra com a gestão dos vários imóveis que possui. E de fato, uma googlada com o nome “Christopher Leonard Stann” (o nome verdadeiro do homem) revela que esta pessoa possui imóveis em Malibu e Chicago.
Em um vídeo postado no YouTube, o suposto Stanley revela-se completamente diferente do vocalista do LSD. Ele é o cara do meio.
Mais uma evidência de que o tio do vídeo acima é o nosso Stanley: um registro da prisão deste mesmo cara em 2015, por dirigir alcoolizado em Barrington, pertencente à região metropolitana de Chicago.
Em resumo: tudo não passou de mais uma grande armação do rock, levada a cabo por um ótimo ator que enganava BEM no papel do pobre coitado achado em alguma caçamba de lixo.
Pela internet, os fãs do LSD esperam uma segunda insurreição de Stanley, o que não seria má ideia em 2020, com o rock tão necessitado de uma boa chacoalhada…
Cultura Pop
Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.
Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.
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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).
Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).
Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.
Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”
Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.
Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.
“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.
E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).
Cultura Pop
Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.
O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.
Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.
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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.
O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.
Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.
Foro: Keira Vallejo/Wikipedia
Crítica
Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.
Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.
Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.
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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.
É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).
Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.
O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.
Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.
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