Cultura Pop
Aquela vez em que Brian Wilson virou rapper

Um compromisso sério fez parte da vida do beach boy Brian Wilson por vários anos: ter projetos abortados ou discos simplesmente rejeitados pelas gravadoras. Smile, álbum dos Beach Boys que deveria ter saído em 1967, demorou décadas para chegar a público. Nos anos 1970, foram vários discos rejeitados em sequência. Entre eles o malucão Adult/Child, sobre o qual você já leu no POP FANTASMA, que foi considerado um desastre pelo selo Reprise, e engavetado.
Em 1988, seis anos após concordar em voltar a fazer terapia com o controverso doutor Eugene Landy, Wilson assinou contrato com o selo Sire. Em seguida, se preparou para fazer seu primeiro disco solo. Brian Wilson saiu em 12 de julho daquele ano, atualizava a veia pop e experimental do compositor e trazia Landy como compositor em várias músicas. Aliás, Landy colocou na ala de compositores até mesmo sua namorada, Alexandra Morgan.
Testemunhas afirmam que a gravação do disco foi bastante problemática e que Wilson era visto carregando um verdadeiro arsenal de remédios no estúdio. Embora se tratasse de um excelente retorno e de um dos álbuns daquele ano.
BAÚ DE BRIAN WILSON
Mas o fantasma dos projetos jogados numa gaveta voltou a assombrar Brian pouco depois disso. Aliás, justamente numa época em que o selo Sire esperava ansiosamente por um segundo disco solo. Sweet insanity começou a ser gravado em 1990 (com aproveitamento de faixas gravadas entre 1986 e 1989) para lançamento em 1991.
Na época, Wilson não era mais paciente de Landy, mas os dois continuavam ligados, tanto que Landy produziu o disco com Brian. Só o que seria o segundo disco de Brian Wilson pela Sire acabou nunca saindo. O cantor reclamou que as fitas de Sweet insanity desapareceram e o álbum não saiu. Pelo menos não oficialmente, já que existem discos piratas com as canções.
E foi nesse disco que surgiu o insuspeito lado rapper (!) de Brian Wilson, graças a uma parceria pra lá de estranha entre ele e Landy, Smart girls. Olha aí o cantor seguindo a linha do “meu nome é fulano”, comum nos discos e shows dos primeiros MCs.
ABERRAÇÃO?
A música das garotas espertas é definida por este texto como “uma aberração estultificante. Um glorioso sonho febril onde o gênio que escreveu e compôs Good vibrations cospe os compassos mais bregas que você já ouviu em uma série de bum-bap de bateria e risos de pré-adolescentes”.
Não chegava a tanto, e ora bolas, era Brian Wilson abraçando o rap, o que já era novidade. Mas não era das coisas que um fã de discos como Pet sounds (1966) esperava escutar naquele momento. E talvez não fosse igualmente o tipo de rap que um fã do estilo colocaria no toca-discos.
Cabe aqui a lembrança básica: em 1991, rap era “tendência”. E mesmo que os Beastie Boys já houvessem unido o estilo ao rock em Licensed to ill (1985), o show business inteiro não parecia saber lidar com aquilo direito. Tanto que choviam debates do tipo “rap é música?”.
Aliás, volta e meia nomes do rock faziam crossovers super estranhos com rap que causavam arrepios nos fãs dos dois estilos. Foi aliás o caso do Guns N Roses com My world, faixa de encerramento do pacotão Use your illusion (1991). Isso, claro, bem antes do heavy metal começar a entrar em lua de mel com o estilo via nu-metal.
ANTI-MACHISMO
Existe uma outra versão segundo a qual Sweet insanity foi (adivinhe só) recusado pela Sire, que detestou o resultado. Ainda que o álbum trouxesse colaborações de Bob Dylan e até da estrela pop Paula Abdul. Wilson anos depois escreveu no livro de memórias Eu sou Brian Wilson que foi forçado por Landy a fazer o disco. E que o ex-psiquiatra sugeriu até o nome Sweet insanity, com a ideia de mostrar que os problemas de Wilson podiam ser positivos.
A canção, aliás, partiu de uma observação interessante de Brian Wilson sobre o rap. Ao assistir o Yo MTV raps! com Alexandra Morgan, achou que todas as músicas eram machistas e que deveria fazer um rap cuja letra exaltasse as mulheres. Pelo menos é o que está escrito na autobiografia Wouldn’t it be nice: My own story que tem fama de ter sido escrita totalmente por Landy. A canção ganhou produção de Matt Dike, produtor de rap que trabalhara com os Dust Brothers e sampleou vários clássicos de Wilson para a canção.
Smart girls não fez sucesso, não saiu comercialmente, mas Wilson chegou a promovê-la em alguns programas. Ainda que o próprio artista a encarasse de maneira bem despretensiosa e visse a canção como uma brincadeira com seu passado, a Sire não curtiu nem um pouco a ideia.
Anos depois a música foi incluída num disco pirata dos Beach Boys, Endless bummer, que compila só momentos alegadamente não-gloriosos da banda e de Wilson (e sobre o qual você leu aqui). Mas hoje dá pra dizer que o beach boy estava subvertendo dois estilos ao mesmo tempo: o rock e o próprio rap, adiantando-se numa discussão sobre feminismo nas rimas que levaria anos para acontecer. Certo ou não?
Cultura Pop
No nosso podcast, Alanis Morissette da pré-história a “Jagged little pill”

Você pensava que o Pop Fantasma Documento, nosso podcast, não ia mais voltar? Olha ele aqui de novo, por três edições especiais no fim de 2025 – e ano que vem estamos de volta de vez. No segundo e penúltimo episódio desse ano, o papo é um dos maiores sucessos dos anos 1990. Sucesso, aliás, é pouco: há uns 30 anos, pra onde quer que você fosse, jamais escaparia de Alanis Morissette e do seu extremamente popular terceiro disco, Jagged little pill (1995).
Peraí, “terceiro” disco? Sim, porque Jagged era só o segundo ato da carreira de Alanis Morissette. E ainda havia uma pré-história dela, em seu país de origem, o Canadá – em que ela fazia um som beeeem diferente do que a consagrou. Bora conferir essa história?
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: Capa de Jagged little pill). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
Ouça a gente preferencialmente no Castbox. Mas estamos também no Mixcloud, no Deezer e no Spotify.
Mais Pop Fantasma Documento aqui.
Cultura Pop
No nosso podcast, Radiohead do começo até “OK computer”

Você pensava que o Pop Fantasma Documento, nosso podcast, não ia mais voltar? Olha ele aqui de novo, por três edições especiais no fim de 2025 – e ano que vem estamos de volta de vez. Para abrir essa pequena série, escolhemos falar de uma banda que definiu muita coisa nos anos 1990 – aliás, pra uma turma enorme, uma banda que definiu tudo na década. Enfim, de técnicas de gravação a relacionamento com o mercado, nada foi o mesmo depois que o Radiohead apareceu.
E hoje a gente recorda tudo que andava rolando pelo caminho de Thom Yorke, Jonny Greenwood, Colin Greenwood, Ed O’Brien e Phil Selway, do comecinho do Radiohead até a era do definidor terceiro disco do quinteto, OK computer (1997).
Edição, roteiro, narração, pesquisa: Ricardo Schott. Identidade visual: Aline Haluch (foto: reprodução internet). Trilha sonora: Leandro Souto Maior. Vinheta de abertura: Renato Vilarouca. Estamos aqui de quinze em quinze dias, às sextas! Apoie a gente em apoia.se/popfantasma.
Ouça a gente preferencialmente no Castbox. Mas estamos também no Mixcloud, no Deezer e no Spotify.
Mais Pop Fantasma Documento aqui.
4 discos
4 discos: Ace Frehley

Dizem por aí que muita gente só vai recordar de Gene Simmons e Paul Stanley, os chefões do Kiss, quando o assunto for negócios e empreendedorismo no rock – ao contrário das recordações musicais trazidas pelo nome de Ace Frehley, primeiro guitarrista do grupo, morto no dia 16 de outubro, aos 74 anos.
Maldade com os criadores de uma das maiores bandas de rock de todos os tempos, claro – mas quando Frehley deixou o grupo em 1982, muita coisa morreu no quarteto mascarado. Paul Daniel Frehley, nome verdadeiro do cara, podia não ser o melhor guitarrista do mundo – mas conseguia ser um dos campeões no mesmo jogo de nomes como Bill Nelson (Be Bop De Luxe), Brian May (Queen) e Mick Ronson (David Bowie). Ou seja: guitarra agressiva e melódica, solos mágicos e sonoridade quase voadora, tão própria do rock pesado quanto da era do glam rock.
Ace não foi apenas o melhor guitarrista da história do Kiss: levando em conta que o grupo de Gene e Paul sempre foi uma empresa muito bem sucedida, o “spaceman” (figura pela qual se tornou conhecido no grupo) sempre foi um funcionário bastante útil, que lutou para se sentir prestigiado em seu trabalho, e que abandonou a banda quando viu suas funções sendo cada vez mais congeladas lá dentro. Deixou pra trás um contrato milionário e levou adiante uma carreira ligada ao hard rock e a uma “onda metaleira” voltada para o começo do heavy metal, com peso obedecendo à melodia, e não o contrário.
Como fazia tempo que não rolava um 4 Discos aqui no Pop Fantasma, agora vai rolar: se for começar por quatro álbuns de Ace, comece por esses quatro.
Texto: Ricardo Schott – Foto: Reprodução
“KISS: ACE FREHLEY” (Casablanca, 1978). Brigas dentro do Kiss fizeram com que Gene, Paul, Ace e o baterista Peter Criss lançassem discos solo padronizados em 1978 – adaptando uma ideia que o trio folk Peter, Paul and Mary havia tido em 1971, quando saíram álbuns solo dos três cujas capas e logotipos faziam referência ao grupo. Ace lembra de ter ouvido uma oferta disfarçada de provocação numa reunião do Kiss, quando ficou definido que cada integrante lançaria um disco solo: “Eles disseram: ‘Ah, Ace, a propósito, se precisar de ajuda com o seu disco, não hesite em nos ligar ‘. No fundo, eu dizia: ‘Não preciso da ajuda deles’”, contou.
Além de dizer um “que se foda” para os patrões, Ace conseguiu fazer o melhor disco da série – um total encontro entre hard rock e glam rock, destacando a mágica de sua guitarra em ótimas faixas autorais como Ozone e What’s on your mind? (essa, uma espécie de versão punk do som do próprio Kiss) além do instrumental Fractured mirror. Foi também o único disco dos quatro a estourar um hit: a regravação de New York Groove, composta por Russ Ballard e gravada originalmente em 1971 pela banda glam britânica Hello. Acompanhando Frehley, entre outros, o futuro batera da banda do programa de David Letterman, Anton Fig, que se tornaria seu parceiro também em…
“FREHLEY’S COMET” (Atlantic/Megaforce, 1987). Seguindo a onda de bandas-com-dono-guitarrista (como Richie Blackmore’s Rainbow e Yngwie Malmsteen’s Rising Force), lá vinha Frehley com seu próprio projeto, co-produzido por ele, pelo lendário técnico de som Eddie Kramer (Jimi Hendrix, Beatles, Led Zeppelin) e Jon Zazula (saudoso fundador da Megaforce). Frehley vinha acompanhado por Fig (bateria), John Regan (baixo, backing vocal) e Tod Howarth (guitarras, backing vocal e voz solo em três faixas).
O resultado se localizou entre o metal, o hard rock e o rock das antigas: Frehley escreveu músicas com o experiente Chip Taylor (Rock soldiers), com o ex-colega de Kiss Eric Carr (Breakout) e com John Regan (o instrumental Fractured too). Howarth contribuiu com Something moved (uma das faixas cantadas pelo guitarrista). Russ Ballard, autor de New York groove, reaparece com Into the night, gravada originalmente pelo autor em 1984 em um disco solo. Típico disco pesado dos anos 1980 feito para escutar no volume máximo.
“TROUBLE WALKING” (Atlantic/Megaforce, 1989). Na prática, Trouble walking foi o segundo disco solo de Ace, já que os dois anteriores saíram com a nomenclatura Frehley’s Comet. A formação era quase a mesma do primeiro álbum da banda de Frehley – a diferença era a presença de Richie Scarlet na guitarra. O som era bem mais repleto de recordações sonoras ligadas ao Kiss do que os álbuns do Comet, em músicas como Shot full of rock, 2 young 2 die e a faixa-título – além da versão de Do ya, do The Move. Peter Criss, baterista da primeira formação do Kiss, participava fazendo backing vocals. Três integrantes do então iniciante Skid Row (Sebastian Bach, Dave Sabo, Rachel Bolan), também.
“10.000 VOLTS” (MNRK, 2024). Acabou sendo o último álbum da vida de Frehley: 10.000 volts trouxe o ex-guitarrista do Kiss atuando até como “diretor criativo” e designer da capa. Ace compôs e produziu tudo ao lado de Steve Brown (Trixter), tocou guitarra em todas as faixas – ao lado de músicos como David Julian e o próprio Brown – e convocou o velho brother Anton Fig para tocar bateria em três faixas. A tradicional faixa instrumental do final era a bela Stratosphere, e o spaceman posou ao lado de extraterrestres no clipe da ótima Walkin’ on the moon. Discão.
Cultura Pop5 anos agoLendas urbanas históricas 8: Setealém
Cultura Pop5 anos agoLendas urbanas históricas 2: Teletubbies
Notícias8 anos agoSaiba como foi a Feira da Foda, em Portugal
Cinema8 anos agoWill Reeve: o filho de Christopher Reeve é o super-herói de muita gente
Videos8 anos agoUm médico tá ensinando como rejuvenescer dez anos
Cultura Pop7 anos agoAquela vez em que Wagner Montes sofreu um acidente de triciclo e ganhou homenagem
Cultura Pop9 anos agoBarra pesada: treze fatos sobre Sid Vicious
Cultura Pop8 anos agoFórum da Ele Ela: afinal aquilo era verdade ou mentira?







































