Crítica
Ouvimos: Swans – “Birthing”

RESENHA: Em Birthing, os Swans mergulham em faixas longas, som sombrio e climas ritualísticos. Um disco denso, assustador e feito pra afastar ouvintes casuais (se é que existem ouvintes casuais do Swans).
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A era do CD transformou os experimentalistas radicais dos Swans – e seu líder, o malucão Michael Gira – numa banda sem limites. Os álbuns do grupo foram passando a ter 60, 70, 80, 90 minutos de duração, até que no disco anterior, The beggar (2023, resenhado pela gente aqui), Gira e seus amigos acharam que estava na hora de lançar uma canção de 43 minutos (!), The beggar lover (Three).
Birthing, o novo álbum, tem sete faixas, duas delas com mais de 20 minutos. Quem é admirador radical do grupo vai encontrar assunto no disco: Gira, seus colaboradores e convidados (a cantora alemã Laura Carbone entre eles), voltam em clima de missa pagã e de celebração musical insociável, oscilando entre no wave e krautrock. Músicas como The healers mostram Michael vibrando em direção a alguma coisa bem estranha e caótica, com climas entre o sombrio e o ambient, vocais meditativos e versos que parecem ter sido achados no baú de Genesis P-Orridge (“eu sou a mãe do nosso massacre / eu quebro seus ossos para alimentar nossa filha”).
Todo o repertório de Birthing soa como cartas de um tarô próprio, como na missa quase satânica de I am a tower, que segue com mantras estranhos, sons apocalípticos e sombrios, uma massa bruta de guitarras e baterias, e um corte bruto ambient, substituído por uma sonoridade que lembra Velvet Underground. Lou Reed, criador do Velvet, é evocado mais vezes: uma delas, no clima Berlin da faixa-título, uma viagem sonora de 22 minutos que abre em clima tristonho e celestial, ganha um som das cavernas, migra para vapores sonoros indianos e ganha sonoridades meditativas e fantasmagóricas. E (Rope) away é um funeral ruidoso de 19 minutos, que soa como despedida, e emenda com um clima que lembra All tomorrow’s parties, do Velvet.
- Ouvimos: Home Is Where – Hunting season
- Ouvimos: University – McCartney, it’ll be OK
- Ouvimos: Laura Carbone – The cycle
Essa ligação velvetiana é o máximo que um fã de rock “normal” vai encontrar de familiar em Birthing. Gira continua com as mesmas obsessões mórbidas, em letra e música, e une a elas a disposição para criar sonoridades desérticas e climas que lembram pregações sombrias. É o que rola no pós-punk Red yellow e na fantasmagoria de Guardian spirit, herdeira do clima perturbador de A montanha sagrada, filme de Alejandro Jodorowsky – cuja sonoridade passa pelo blues indianista e pelo pós-punk pesado e violento.
Já The merge lembra as colagens sonoras do terceiro disco do Faust, Faust 3, com sons eletrônicos que, se fossem traduzidos em imagens, poderiam causar convulsões. Uma curiosidade dessa faixa é que alguns vocais ritualísticos lembram Milton Nascimento (!), mas só de longe. No fim das contas, há muita beleza em Birthing, mas para achá-la, é preciso enfrentar a vontade dos Swans de chocar ouvintes e críticos musicais pela longa duração das faixas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 7,5
Gravadora: Young God/Mute
Lançamento: 30 de maio de 2025
Crítica
Ouvimos: Frankie Cosmos – “Different talking”

RESENHA: Frankie Cosmos vira banda em Different talking, disco que fala sobre amadurecimento e envelhecimento, entre inseguranças, celulares e punk-pop confessional.
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Greta Kline, a cantora e atriz novaiorquina que usa o codinome Frankie Cosmos, fez 31 anos em março. A chegada aos 30 fez com que seu sexto disco, Different talking, soasse tanto como uma volta ao passado quanto um assombro com o futuro. O disco foi lançado pela Sub Pop, mas parece um álbum lançado por algum selo bem menor, acostumado a trabalhar com artistas altamente ensimesmados e chegados ao lo-fi. O álbum tem 17 músicas em menos de 40 minutos – o que significa que boa parte delas é bem curtinha. Em alguns casos, parece que Greta e sua turma mandaram subir as demos e não tiveram muito saco para ficar lambendo as faixas.
Eu disse “Greta e sua turma?”. Sim, porque dessa vez, Frankie Cosmos virou uma banda, com Alex Bailey, Hugo Stanley e Katie Von Schleicher ajudando mais intensamente em arranjos e na produção. Não por acaso, é o disco dela que tem mais “cara de banda” – mesmo com o desleixo estudado do indie, faixas como a docinha Pressed flower, o soft indie rock One of each e a noventista Against the grain, que abrem o álbum, soam bastante seguras.
Different talking é um disco sobre envelhecimento – e vá lá, sobre envelhecimento da perspectiva de quem chega aos 30. Ou seja: qualquer cabelo branco assusta (como na punk One! Grey! Hair!). Por outro lado, Greta já começa a ver que a cidade em que ela vive não é mais aquele ambiente não-gentrificado que ela conheceu (o easy listening distorcido Porcelain fala exatamente disso) e nota que nem sequer conheceu o mundo sem a existência do celular – em Bitch heart, canção tristinha lembrando Pixies, ela diz sentir “falta de quem eu era / apenas porque não posso passar um dia / sem botar a mão nesta porra de telefone”.
Já em Vanity, indie pop que soa tão melancólico quanto fora de controle, o assunto é um relacionamento cagado que não é amor, é cilada – mas aparentemente ela sai por cima, no verso “você ligou de novo para ouvir / que tudo acabou?”. A musicalidade de Different talking abarca também muita coisa ligada aos 60’s, como o folk rock denso e minimalista de Life back, o clima meio Kinks de Margareta e a vibe espacial de You become.
Perto do fim, Wonderland é um indie rock funkeado e com clima quase infantil, em que Greta nota que às vezes, envelhecer é mandar um foda-se geral: “estou mais velha agora do que antes / eu me conheço ainda mais / encontro maneiras de me achar bonita / endureço e sigo meus rituais”. E é isso aí.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Sub Pop
Lançamento: 27 de junho de 2025
Crítica
Ouvimos: Girlpuppy – “Sweetness”

RESENHA: Com raízes que vão de Fleetwood Mac a Avril Lavigne, Girlpuppy mistura indie rock e dreampop em Sweetness, disco doce e sombrio sobre amores e ciladas.
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“Minha mãe gosta de Fleetwood Mac, The Beatles, ela ouvia Shania Twain. Meu pai era o completo oposto, um grande fã de country no rádio – Brad Paisley, toda aquela turma. Meu irmão do meio, no entanto, é o grande culpado por todo o meu gosto musical. Foi ele que me apresentou a Avril Lavigne e Hilary Duff”.
O trecho acima foi tirado de uma entrevista de Becca Harvey, a popular Girlpuppy, ao site Under The Radar. Pelas raizes musicais da cantora, que acaba de lançar o segundo disco com o nome artístico, Sweetness, dá para entender um terço da missa, e só isso. Girlpuppy equlibra-se entre estilos como indie rock e dreampop, e faz um som tão onírico, doce e vaporoso quanto a imagem da capa de Sweetness (“doçura” em inglês).
Daria para dizer que é indie rock e dreampop de FM, se houvesse FMs realmente interessadas nesse tipo de estética, pelo menos aqui no Brasil. I just do! volta ao rock “alternativo” dos anos 1990 e ganha guitarras crescentes, que formam uma bela parede lá pelas tantas. Champ é som indie de época, com charme sonoro lembrando bandas como Cardigans e guitarras distorcidas fazendo a costura. In my eyes une desencantos dos anos 1980 e 1990, enquanto Since april tem estileira entre dreampop e grunge.
Num disco desses, claro, não podiam faltar sons mais tranquilos e concessões à popular esquina entre indie rock e soft rock – daí tem baladinhas com I was her too e Windows, e o quase folk Beaches. No final, I think I did põe magia sonora lembrando Beach Boys e Queen em Sweetness.
As letras de Sweetness, por sua vez, lembram uma fase de pouca doçura na vida de Becca, já que o disco começou a surgir após o fim de um relacionamento que, pelo que dá pra ver no disco, era a mais completa cilada. Versos como “eu simplesmente não pensei que você pudesse fazer isso comigo / dormir com ela enquanto minhas roupas cobriam seu chão” (de I was her too) e “acho que sou masoquista / eu sei que você pode me machucar / e eu estou deixando / porque eu gosto de você” (de I just do!) já mostram a zona e a lona da época. Nem tudo no dreampop de Girlpuppy foi feito para sonhar, enfim.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Captured Tracks
Lançamento: 28 de março de 2025
Crítica
Ouvimos: Kesha – . (Period)

RESENHA: Period marca a libertação de Kesha de Dr. Luke e resgata o pop debochado dos velhos tempos. Zoeira, libertação e hits prontos pro Tik Tok.
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Kesha passou a maior parte de sua carreira presa ao produtor Dr. Luke – que acusou de agressão sexual, e com o qual passou um bom tempo brigando nos tribunais, ainda que estivesse ligada a ele sob contrato. Um acordo entre os dois livrou a cantora de ter que lançar seus discos pelo selo de Luke, ainda que ele não fosse o único produtor dos álbuns, e este Period (cujo título, na verdade, é um ponto final) é o primeiro lançamento independente de Kesha, lançado por um selo com o nome dela.
O disco é um ponto final (não é só um título, enfim) numa história que deu muita dor de cabeça para a cantora – e que vazou para álbuns mal-humorados ou tristes, como High road (2020) e Gag order (2023). Na real, é igualmente uma volta ao passado: já que Lady Gaga descobriu que seus fãs preferem suas criações mais pop, Kesha não pensou duas vezes e retornou à falta de limites dos primeiros tempos.
A Kesha de Period nem é tão diferente da Charli XCX de Brat, pelo menos na nota zero em comportamento – o disco tem uma dance music em que ela admite que adora se envolver em relações perigosas (Red flag), uma new wave selvagem sobre fazer sexo com todo mundo (Boy crazy) e temas dance punk sobre diversão até o fim do mundo (Freedom e Joyride).
Tem também as dancinhas de Tik Tok de Glow, que fala de uma garota que mandou o namorado encostado passear, a tecladeira quase (eu disse quase) experimental de Delusional, e a dance music texturizada de Love forever – esta, uma canção meio breguinha em que ela diz que quer mesmo é um amor que dure pra sempre, e que soa até meio ingênua comparada ao todo do disco.
Dá pra fazer analogias entre Period e Brat mas para por aí: o disco de Kesha provavelmente não vai nem chegar perto de ser considerado o disco do ano, nem tem a pretensão de se tornar um manifesto pop – nem de longe. É mais zoeira e diversão do que arte, e basicamente é Kesha fazendo de tudo para mostrar que ela sempre foi a mesma pessoa, com e sem o tal do Dr. Luke ao lado.
De presente para os fãs, tem o pop de grito de torcida Yippee-ki-yay, o soft rock + tecnopop Too hard e o clima quase hispânico das palmas intermitentes de Trashman – música na qual Kesha fala grosso com quem merece: “eu não preciso de nenhum homem para me dizer como estou, como estou me sentindo / jogue suas opiniões no saco de lixo, canalha (…) /o patriarcado está tremendo, eu e as vadias não temos medo de você / não seja tão egocêntrico”.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Kesha Records
Lançamento: 8 de julho de 2025
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