Cultura Pop
Sparks: descubra agora!

O “descubra agora”, para muita gente, é literal. Apesar da banda americana Sparks, formada pelos irmãos Russell (voz) e Ron (teclados) Mael, já ter uma carreira de mais de 40 anos, o Brasil insiste em ignorar a trajetória deles. E olha que álbuns importantes como Kimono my house e Propaganda (ambos de 1974) foram lançados aqui em LP e são queridos por uma galera enorme.
Sparks é uma banda que tem detalhes bastante curiosos na biografia. Para começar, apesar do jeitão de grupo britânico ou novaiorquino, eles são de Los Angeles. Quando eram uma banda de verdade (com guitarrista, baixista, baterista) e se chamavam Halfnelson, chamaram a atenção do produtor Todd Rundgren e do selo Bearsville Records (do empresário-de-Janis-e-Dylan Albert Grossman). Lançaram lá o primeiro disco, Halfnelson (1972), mas acabaram resolvendo mudar de nome para Sparks. Muita gente pensa que o nome foi tirado de Sparks, tema instumental de Tommy, ópera-rock do Who. Mas a ideia da dupla foi fazer um trocadilho com os irmãos Marx.
A definição mais tranquila que qualquer pessoa pode dar para os Sparks é glam rock. Afinal, eles nasceram na mesma era de David Bowie e Marc Bolan, contavam com a atuação de palco espalhafatosa de Russell, e lançavam canções operísticas como Amateur hour. Bom, não apenas isso, mas também. A dupla, que adorava inserir referências intelectualizadas em suas músicas (antigos musicais, obras de Shakespeare, etc), abusou do pioneirismo: os dois já faziam new wave e pós-punk alguns anos do próprio punk surgir, lá por 1974.
Mesmo com a pandemia, os já naturalmente isolados irmãos Sparks (sabe-se bem pouco a respeito da vida pessoal deles) continuam aprontando das suas. Ron e Russell acabam de fazer roteiro e trilha sonora de um filme musical, Annette, dirigido por Leos Carax e ganhador do prêmio de melhor direção em Cannes. Ano passado saiu o 24º disco, A steady drip, drip, drip. E o diretor Edgar Wright (Em ritmo de fuga) lançou há pouco o documentário Sparks Brothers, sobre a história ds dois irmãos. O filme estreou no dia 18 de junho e ainda não está disponível oficialmente no Brasil – só nos torrents amigos.
E antes que você possa achar Sparks Brothers para assistir, segue aí nossa listinha de 16 músicas que todo mundo precisa ouvir do grupo, mais dois bônus.
“HIGH C” (do disco Sparks/Halfnelson, 1971). Com referências inusitadas para um grupo de rock (ópera, o cenário erudito de Viena e o tal “dó maior” do título), o grupo estreava meio intimidado no estúdio, mas com apoio total do produtor Todd Rundgren, que queria manter o clima meio cru que tinha ouvido numa demo.
“GIRL FROM GERMANY” (do disco A woofer in tweeter’s clothing, 1973). Último disco dos Sparks com o quinteto original, e também o último pela Bearsville. O som do grupo parecia um pouco mais próximo da onda de nostalgia roqueira levantada por bandas como T.Rex e Mott The Hoople. Esse single acabaria só fazendo sucesso após a banda invadir as paradas com seus próximos lançamentos, pouco depois.
“THIS TOWN AIN’T BIG ENOUGH FOR THE BOTH OF US” (do disco Kimono my house, 1974). O mercado nem estava sequer acostumado com o conceito de “clipe” e lá vinham os Sparks com um filme promocional tão dinâmico e bem editado que nem parecia coisa de 1974. O tom operístico da música, além do riff intermitente de teclado da abertura, abriram portas para o grupo, que adiantaria o trabalho de grupos como Depeche Mode e Devo em vários anos. Em tempo: contamos as histórias desse clipe e da capa de Kimono my house.
“HERE IN HEAVEN” (do disco Kimono my house, 1974). Romeu e Julieta combinam o pacto de morte. Só que, inesperadamente, Julieta desiste do pacto e Romeu tira a própria vida antes dela. O rapaz chega no paraíso, descobre que a namorada o havia abandonado, e o que resta é escrever uma carta e rogar um monte de pragas para ela. Isso é Here in heaven, uma das canções shakesperianas do grupo.
“NEVER TURN YOUR BACK TO MOTHER EARTH” (do disco Propaganda, 1974). Lançado com poucos meses de espaço após Kimono my house (para aproveitar o sucesso do álbum), o quarto disco dos Sparks não chegou a ser um grande hit e foi recebido com certo desdém pela crítica. Mas estourou esse hit repleto de ironia. Essa música chegou a ser gravada pelo Depeche Mode num flexidisc especial para fãs em 1987.
“I WANT TO BE LIKE EVERYBODY ELSE” (do disco Big beat, 1976). Os Sparks saíram da Island Records, voltaram para os EUA, assinaram com a Columbia e transformaram-se numa dupla acompanhada de músicos de estúdio. O sexto disco investia num glam rock que àquela altura já parecia meio “fora de moda” diante do início do punk, mas trazia grandes canções como essa (que nem foi single).
“A BIG SURPRISE” (do disco Introducing Sparks, de 1977). Os Sparks andavam bastante sumidos das paradas nessa época. Recorreram à ironia: batizaram seu sétimo disco de “apresentando os Sparks”. Não comoveram nem mesmo os fãs de Kimono my house: o álbum foi considerado um fracasso tão grande que demorou até mesmo para ser editado em CD. Essa música, lembrando Beach Boys, foi um dos dois singles.
“THE NUMBER ONE SONG IN HEAVEN” (do disco The nº1 in heaven, de 1979). Pronto: os Sparks acharam seu caminho. Largaram o esquema comum de banda de rock, chamaram Giorgio Moroder para produzir o oitavo disco e adotaram uma sonoridade meio pós-disco, meio synth pop. O álbum saiu-se bem melhor que os anteriores e fez sucesso na Inglaterra.
“SEXTOWN USA” (do disco Angst in my pants, de 1982). O 11º disco dos irmãos trazia a icônica foto de capa em que Ron e Russel apareciam vestidos de marido e mulher. O grupo voltava em fase new wave, acompanhado por músicos de rock (o grupo Bates Motel). Pouco depois disso, fariam o tema do filme malucão Get crazy (que no Brasil seria exibido em estações como Band e Manchete como Na zorra do rock).
“MUSIC THAT YOU CAN DANCE TO” (do disco Music that you can dance to, de 1986). Mais uma mudança de fase no som dos Sparks: o grupo voltava totalmente influenciado pela nascente onda de dance music e Hi-NRG. Não chegaram a conseguir um grande sucesso com o novo álbum, mas a faixa-título do álbum chegou a ganhar remixes para serem tocados em clubes.
“MADONNA” (do disco Interior design, de 1988). Os Sparks largavam em definitivo as grandes gravadoras e ingressavam no selo independente Fine Art. Restava a ironia, sempre ela: o disco encerrava com uma faixa, Madonna, na qual a dupla narrava um elegante dating com a rainha do pop. “Bem, ela me levou de volta para sua cobertura/e me mostrou todos os seus discos de platina/e é claro que havia muitos/então nós sentamos no sofá”. Depois desse disco, o grupo sumiria e só voltaria em 1994.
“NOW THAT I OWN THE BBC” (do disco Gratuitous sax & senseless violins, de 1994). Zoeira com a emissora britânica – cujo Top of the pops havia divulgado bastante a banda no começo – em clima meio parecido com o som dos Pet Shop Boys. O 16º disco da banda (e primeiro nos anos 1990) passou meio batido nos EUA e Inglaterra mas conseguiu se dar bem na Alemanha.
“SUBURBAN HOMEBOY” (do disco Lil’ Beethoven, de 2002). Inspirado por um job que haviam feito recentemente (a dupla foi convidada por uma rádio alemã para comporem música em cima de samples do comentarista esportivo Günther Koch), o álbum de 2002 do grupo trazia os Sparks numa de “pop de câmara”. O álbum era repleto de temas meio pop, meio clássicos, e algumas experimentações de estúdio.
“DICK AROUND” (do disco Hello young lovers, 2006). O vigésimo disco dos Sparks era conceitual: falava de “amor moderno”, trazia uma capa zoeira (a imagem de um grupo de coelhos) e tinha um single mais sacana ainda – a ponto de ter ficado preso na peneira de obscenidades da rádio BBC.
“JOHNNY DELUSIONAL” (do disco FFS, de 2015, gravado ao lado do Franz Ferdinand). Os Sparks e a banda escocesa Franz Ferdinand sempre foram fãs um do outro. A colaboração entre ambas as partes foi acontecendo devagar e gerou um disco em conjunto, em 2015 – por sinal o primeiro álbum com o nome dos Sparks a sair no Brasil em vários anos.
“MISSIONARY POSITION” (do disco Hippopotamus, de 2017). Com esse disco, o Sparks retornou ao Top 10 britânico (estava sumido de lá desde 1974). O lyric video dessa música, que não chegou a ser lançada como single, traz várias obras de arte que, a partir de efeitos especiais de quinta categoria, aparecem rebolando ou fazendo sacanagem ao som da música. A letra zoa a vidinha besta de alguns casais, entre outros assuntos (“missionary position” é o popular “papai-e-mamãe”).
Já que você chegou até aqui, pega aí dois bônus: aquela vez em que os Sparks se juntaram com outra dupla (os franceses do Les Rita Mitsouko) e fizeram o maior sucesso com o single Singin in the shower, em 1988…
… e aquela vez em que Paul McCartney, no clipe de Coming up, de 1980 (no qual ele e Linda McCartney interpretavam todos os integrantes de uma banda), encarnou um sósia do Ron Mael.
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Cultura Pop
Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.
Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.
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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).
Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).
Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.
Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”
Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.
Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.
“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.
E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).
Cultura Pop
Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.
O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.
Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.
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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.
O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.
Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.
Foro: Keira Vallejo/Wikipedia
Crítica
Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.
Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.
Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.
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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.
É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).
Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.
O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.
Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.
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