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Ouvimos: New Order, “Brotherhood (Definitive edition)”

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Ouvimos: New Order, “Brotherhood (Definitive edition)”

Pode ser algum problema de atenção ou de audição, mas não percebi nenhuma diferença no som dessa edição definitiva de Brotherhood em relação à remasterização “de colecionador” do disco, lançada em 2008 (e vale lembrar que o quarto álbum do New Order, de 1986, já teve seus bastidores recordados aqui mesmo no Pop Fantasma). Dois anos antes do quadragésimo aniversário do Sgt Pepper’s às avessas do grupo, no entanto, a definitive edition lançada pela Rhino é a melhor forma de comemoração, por reunir num só lançamento o antes, durante e depois do álbum.

Resumindo a história em poucas linhas: Brotherhood saiu numa época de transição para o New Order, uma banda cujas vendas ajudavam a dar sustentação ao selo indie britânico Factory, mas que não vivia uma vida de grupo do primeiro time – com direito a shows nos cafundós, camarins zoados e uma certa sombra de desprestígio. O álbum era dividido entre um lado A mais roqueiro e um lado B mais eletrônico. As duas faces eram balizadas por uma espécie de pós-punk-country (Paradise, com letra inspirada nas “canções de partida” do estilo musical) e um futuro clássico dance-pop (Bizarre love triangle).

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Mas ainda havia no álbum rocks de pista (Broken promise, Way of life), outro pós-punk dançante (Weirdo, com abertura “falsa”), uma canção acústica pop e quase sixties (As it is when it was), dance music ambient (All day long), dance music sombria e lisérgica (Angel dust) e o encerramento com Every little counts, cantada por Bernard Sumner aos risos (ele chega a interromper a música para rir) e fechada com alguns minutos de psicodelia e ruídos.

A nova edição dá som a histórias sempre contadas a respeito do grupo, trazendo por exemplo, as músicas da demo gravada por eles no Japão em 1985, em meio a uma turnê por lá. A versão de State of the nation não é exatamente imperdível, mas a de As it is when it was vale a audição: vem mais tecnopop, sem violão, sustentada pelo baixo agudo de Peter Hook, e com certa cara de The Cure.

Evil dust, que já havia sido lançada na edição de colecionador de 2008, retorna – é uma versão “maligna” de Angel dust, com mais espaço para os vocais da cantora libanesa Dusya Yusin, sampleados de duas músicas de Brian Eno e David Byrne, The carrier e Regiment (ambas do disco My life in the bush of ghosts, de 1981). O material composto pelo New Order para o filme Salvation! (1987), de Beth B, aparece na íntegra, dos temas instrumentais (como as quase progressivas Salvation theme e Sputnik) ao single bem sucedido Touched by the hand of god.

Das inéditas lançadas na nova edição de Brotherhood, tem uma para escutar no último volume: Every little counts aparece em sua lendária versão completa, com alguns minutos a mais de psicodelia ruidosa e assustadora no final, um segundinho de silêncio e… o ruído de toca-discos pulando. Era para ser mais parecido ainda com A day in the life, fechamento do Sgt Peppers, dos Beatles, e era para dar mais sensação ainda de desnorteio. Brotherhood é uma ousadia que ainda permanece atual.

Nota: 9
Gravadora: Rhino

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Ouvimos: Clara Bicho, “Cores da TV” (EP)

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Ouvimos: Clara Bicho, "Cores da TV" (EP)

“Artista visual, musicista e jornalista pela UFMG”, como se define em seu instagram, Clara Bicho oferece mais do que apenas música em seu aguardado primeiro EP, Cores da TV – o disco é um universo esperando para ser desvendado. As melodias tem ar indie pop, as letras têm clima de diário, os cenários mostram Clara interagindo com todos os lugares dos quais ela fala nas letras.

A paleta indie pop do disco traz influências de disco music na faixa-título Cores da TV (parceria com Sophia Chablau), que traz sonoridade remetendo a grupos como Girl Ray, enquanto Meu quarto é mais experimental, soando como um passeio introspectivo pelos guardados de Clara Bicho e pelas recordações de uma vida (“faz um tempo ue eu tento me organizar / mas disso tudo aqui eu não quero me livrar”).

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Quase sempre, o som de Cores da TV parece “derreter”, como numa psicodelia pop, herdada tanto de Mutantes quanto de Flaming Lips. Rola isso na bossa indie Música do peixe, que depois se transforma numsamba-rock, e também no pop adulto oitentista (city pop, digamos) de A rua. Luzes da cidade, quase na mesma vibe, é um pop de quarto que remete ao boogie dos anos 1980, cujo vocal tem sujeira de gravação feita em casa.

No final, o som luminoso e repleto de recordações de Árvores do fundo do quintal, gravada ao lado da banda catarinense Exclusive Os Cabides (“as árvores do fundo do quintal / mandam lembranças / de quando a gente era criança”). Uma música, e um EP, em que passado e afeto são tão importantes quanto o futuro, e formam uma visão nova de música pop.

Nota: 9
Gravadora: Bolo de Rolo
Lançamento: 5 de maio de 2025.

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Ouvimos: Maré Tardia, “Sem diversão pra mim”

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Ouvimos: Maré Tardia, “Sem diversão pra mim”

Lançada em 2022, a estreia epônima do Maré Tardia era um disco bastante juvenil, mais ligado a uma combinação de indie rock e surf music. Mas já indicava o caminho que a banda seguiria com Sem diversão pra mim, seu segundo álbum. O Maré Tardia atual soa mais explosivo, apresenta composições bem mais afiadas e parece ancorado em diversas fusões estilísticas que se alternam: punk dos anos 1970, indie dos anos 2000, pós-punk (tanto o original quanto o revisitado a partir da virada do milênio) e, em especial, sonoridades que remetem a bandas como Libertines e Television Personalities.

Essa mistura aparece em faixas como Leviatã, Já sei bem, Junkie food (com um clima surfístico-misterioso que lembra o início do Dead Kennedys) e na faixa-título – cujos vocais evocam a fase punk do Ultravox e, não por acaso (note o nome do disco), também têm algo de Titãs. Tarde demais traz vários riffs, vocais gritados, uma pegada grunge e, surpreendentemente, encerra com um clima de maracatu punk, com percussões marcantes e guitarras inspiradas. Uma inesperada brasilidade também marca Nunca mais, última do álbum, com batida discreta de bossa nova e um improviso samba-rock no final.

Ian Curtis, que homenageia o saudoso vocalista do Joy Division, tem guitarras que lembram o U2 do início e grupos pouco lembrados do pós-punk, como Comsat Angels. Já a despojada Nadavai, lançada como single, é punk indie com batidas à la Dave Grohl e um vocal descolado que remete ao rock dos anos 2000 (Arctic Monkeys, Strokes). Sem diversão pra mim, o disco, carrega por acaso muito do romantismo que permeou o rock brasileiro de vinte anos atrás – aquela estética de falar de si e dos sentimentos como quem comenta o mundo, firmando posição diante de tudo. Ouça correndo.

Nota: 8,5
Gravadora: Deck
Lançamento: 30 de abril de 2025.

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Ouvimos: Y3ll, “Entre samples roubados & cerveja barata”

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Ouvimos: Y3ll, "Entre samples roubados & cerveja barata"

Direto do extremo leste de São Paulo – entre Guaianases e Cidade Tiradentes -, Daniel Oliveira, o popular Y3ll, soltou nas plataformas Entre samples roubados & cerveja barata, álbum de título certeiro e alma 100% urbana. Aqui, o rap vira quase city pop, mesmo nos momentos em que a estética japonesa não está diretamente presente. É trilha sonora de rolê pela cidade — real ou imaginária —, desses que começam na quebrada e terminam em algum lugar no controle remoto ou nas profundezas das plataformas de streaming.

A faixa Livre já dá o tom: sample do tema do programa do Datena no SBT misturado com Estou livre, de Tony Bizarro. Não se vão carrega peso e ironia: um rap encorpado por grooves de disco music e sonoridades de flashback, com Y3ll fazendo a pergunta que vale um milhão: “por que idiota falando bosta atrai multidão?”. Em Coral — que traz o título do disco num dos versos —, o clima muda: sambinha-rap suave, tranquiilo. Pela Leste, por outro lado, volta pro grave e dançante: batidão pesado, com sample até do programa do João Kléber.

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Os temas variam entre prazeres simples e duras realidades: sábado à noite, boletos, tretas, polícia, morte. Estão todos ali na sombria Dono do pedaço, com um riff de teclado de influência árabe, e no rap falado, lento e quase confessional de Não sei. Interlúdios dão o respiro: Comerciais simula um dial girando entre anúncios, Interlúdio traz papos paralelos, e Viva a vida é um velório vem com ninguém menos que Zeca Pagodinho filosofando sobre os enterros felizes no bairro carioca de Irajá.

No fim das contas, Entre samples roubados & cerveja barata é um disco-vinheta. Um mosaico sonoro da quebrada, da vida, da cidade — daqueles que não contam só uma história, mas várias ao mesmo tempo.

Nota: 8,5
Gravadora: Independente/Tratore
Lançamento: 9 de maio de 2025.

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