Crítica
Ouvimos: Lupe De Lupe, “Um tijolo com seu nome”

- Um tijolo com seu nome é o sexto disco da banda Lupe De Lupe. No novo disco, o quarteto de Belo Horizonte (MG), formado por Gustavo Scholz, Jonathan Tadeu, Renan Benini e Vitor Brauer, lançou 24 faixas curtas, com nomes de pessoas no título.
- Segundo a banda, trata-se de um álbum para ser escutado no aleatório. “Cada canção é uma história, um personagem da vida real ou imaginária. Concebido com o intuito de ser ouvido em qualquer ordem, a banda procurou inspiração tanto em gêneros com músicas super curtas, como nos clássicos do punk, as mixtapes de produtores de hip hop e em lançamentos mais recentes como os da banda paulista Test, quanto nas características do mundo pós-moderno”, dizem.
- Nesta sexta (1), o grupo abre turnê do álbum em Belo Horizonte, fazendo um show por dia, cada um numa cidade diferente, até o dia 9 de setembro.
- Tanto o grupo quanto Jonathan Tadeu foram indicações do nosso podcast Pop Fantasma Documento.
Assim que você chegar na metade de Um tijolo com seu nome, novo álbum da banda mineira Lupe De Lupe, das quatro uma: 1) você vai achar que a banda enlouqueceu de vez; 2) vai detestar o disco; 3) vai adorar o disco; 4) vai pegar lápis e papel e começar a endereçar textinhos e poemas a figuras e situações da sua vida. Ou tudo isso junto, porque dá para passar pelas quatro fases escutando o álbum, um dos lançamentos mais caóticos do rock brasileiro dos últimos anos.
Um tijolo com seu nome tem 24 faixas curtas (a maior tem 2: 25), todas com nomes de pessoas nos títulos. O “tijolo” com o nome de cada umas das pessoas (Eduardo, Paulo, Helena, Jesus, Letícia, Isaac e outros) são textos curtos e diretos, narrando situações ou criando personagens para uma novela das mais estranhas. Às vezes isso rola à maneira da tirinha República dos Bananas, de Angeli, às vezes rola como se fosse um momento de viração de mesa e/ou desespero no meio do caos. Paulo é um cara de 40 anos que se sente velho, Bruna vive uma vida acomodada mesmo com vitórias, Mauricio vive entre a acomodação e a loucura regada a drogas, Ricardo foi passado para trás pela família. E vai por aí. Cabe ainda uma paródia de Relicário, de Nando Reis, na delicada (para os padrões da banda) Melissa.
Não são letras fáceis de ouvir em meio ao barulho que tomou conta do som da banda (dica: está tudo no Bandcamp do Lupe). Alias não são fáceis nem de ouvir nem de ler, por um motivo básico: você vai acabar se enxergando ali, em algum momento. Vai ver até o que não quer ver. Provavelmente vai enxergar as contradições e falsidades do mundo em Lucas (“ver o povo bonito/cantando aquela do Baiana System/em um bairro gentrificado/o DJ toca brasilidades e na parede do bar/tem mais preto do que na pista de dança”). Vai se assustar com a possibilidade de alguém, hoje em dia, mexer com vacas sagradas da cultura em Cauê (“mais de um milhão de royalties/da nova novela da Globo/imagina se fossem nos bares/ele merece o nosso dinheiro todo”).
Largando de lado o som mais acessível de Lula (2021), o disco anterior, o Lupe se esmerou em não soar palatável nas 24 faixas do novo disco. O som varia do barulho gritado puro e simples a momentos que lembram o guitar rock dos anos 1980/1990. Há faixas que chegam perto do pós-hardcore, há momentos de desespero sonoro que lembram a época da no wave setentista de Nova York, há músicas mais próximas do punk rock mais purista. Ouça com tempo para absorver.
Gravadora: Balaclava Records/Geração Perdida de Minas Gerais
Nota: 8
Foto: Tiago Baccarin/Divulgação
Crítica
Ouvimos: Jehnny Beth – “You heartbreaker, you”

RESENHA: Jehnny Beth (ex-Savages) retorna com o segundo disco solo, You heartbreaker, you: punk sombrio, art metal e letras viscerais sobre dor e obsessão.
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O segundo álbum solo de Jehnny Beth, ex-vocalista da banda punk Savages, não é para qualquer ouvido – talvez não seja nem para qualquer coração. Trata-se de um disco cheio de camadas musicais e emocionais, no qual Jehnny assume uma persona complexa, instável e que não tem a mínima necessidade de colocar um disclaimer a cada verso ou cada faixa. O som pode ser classificado como punk de terror, art metal, eletrônica apodrecida e distorcida – qualquer coisa que mexa com a imaginação de quem escuta, evitando classificações comuns.
Musicalmente, o som de You heartbreaker, you coloca Jehnny a meio caminho de Rollins Band e Nine Inch Nails – mas com emanações de Babes In Toyland. As três primeiras faixas, Broken rib, No good for people e Obsession, estabelecem o clima ameaçador, com vocais que vão do berro ao sussurro, e gritos que parecem entalar na garganta. Faixas como Out of my reach, Reality e Stop me now vibram mostrando um punk rock que não precisa ser rápido para manter o peso e a intensidade. I still believe, recheada de beats eletrônicos, abre com um baixo que já põe medo.
As letras de You heartbreaker, you são um caso à parte. Jehnny fala sobre relacionamentos abusivos e violentos (Broken rib), apagamentos fatais (“sou muito crítica / você não encontrou um modo de me matar ainda / eu ainda estou de pé”, vocifera em No good for people) e sobre dores, culpas, problemas que não são seus, e projeções bem estranhas das imagens de outras pessoas – tudo isso reunido na sombria e pesada I see your pain, que encerra o disco. Também encarna a mulher que passa por relacionamentos obsessivos, em faixas como Obsession e I still believe (“um dia nós os faremos acreditar em você e em mim juntos / até lá, ainda acreditarei em você e em mim, para sempre”). Em Reality, une hedonismo, menage à trois e autoestima cagada. Stop me now fala sobre reencontros que causam gatilhos e memórias doloridas.
Já High resolution sadness, a faixa mais ágil do disco, une sexo, bagunça emocional e isolamento, concluindo que “o mundo é uma máquina triste”. You heartbreaker, you dá ao/à ouvinte a estranha sensação de ter presenciado uma explosão de carro-bomba sem se dar conta de que estamos todos dentro dele.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 10
Gravadora: Fiction Records
Lançamento: 29 de agosto de 2025
Crítica
Ouvimos: Guma – “Virando noite”

RESENHA: Trio recifense Guma mistura indie pop, tecnobrega, jovem guarda e ecos 80s em Virando noite, estreia festiva e cheia de balanço.
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O Guma é um trio recifense – Katarina Nápoles (voz), Carlos Filizola (guitarra e produção) e Caio Wallerstein (bateria) – que enxerga na dança, o melhor remédio. Virando noite, o disco de estreia do grupo, é um álbum de indie pop com ramificações no tecnobrega, no rock jovemguardista e até em estilhaços do rock nacional dos anos 1980.
Daria pra dizer que o Guma dá uma mirada numa espécie de Brat recifense, mas nesse ponto, o trio é mais discreto: falam de liberdade no pop-brega-funk O muro, lembram de ideias hedonistas que não saem da cabeça no reggae-rock safado Pecadinho e fazem um Love theme que soa como um desvio vaporwave dos discos de pop orquestral dos anos 1970, com guitarra, baixo, bateria, efeitos e voz declamada.
A vibe festeira de Virando noite ocupa todo o repertório, em faixas como o balanço rock-brega de Mozinho (com Bruna Alimonda) e Só quando lembro (com Uana), e a fanfarra de Novesfora, com teclados imitando metais e um clima que envolve até música cigana. Chegando perto do final, o grupo se aventura numa espécie de new wave recifense, Paraíso astral, que faz lembrar o Metrô (sim, a banda nacional dos anos 1980) e The Cure. E também no pop sonhador e quase psicodélico de Sonhar ou viver. Ouça correndo.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Independente
Lançamento: 4 de setembro de 2025.
Crítica
Ouvimos: Zac Farro – “Operator”

RESENHA: Zac Farro (Paramore) lança Operator, disco que mistura soft rock 70s, yacht rock e indie-pop vintage, com letras sobre amor e falhas de comunicação.
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Em meio a todo o processo de lançamento de Ego death at a bachelorette party, o (agora sim!) novo disco solo de Hayley Williams, Zac Farro, baterista do Paramore – banda de Hayley, você deve saber – também lança álbum próprio. Operator traz o músico se rendendo à onda soft rock requentada, e igualmente surfando de pranchão no indie-pop, mas com cara vintage.
Quase tudo de Operator só existe porque houve músicos unindo rock leve, folk, soul, baladas e estilos afins nos anos 1970. Ou seja: basicamente Zac fez um disco de yacht rock extratexturizado, com boas composições, só que com cara cult. Faixas como Operator, o pop pré-disco Second chance, o pop pós-disco 1 e o decalque de Steely Dan Simple actions soam como se alguém achasse num armário os tapes de um disco pop dos anos 1970 que sairia por uma gravadora de fundo de quintal, mas acabou sendo engavetado.
De certa forma, esse clima meio cult meio pop já é algo que Hayley havia trazido para suas gravações recentes – o que acaba fazendo com que Operator soe como um outro lado da moeda de Ego death, só que com letras mais estranhas. Zac tende a observar assuntos como amor, paixões e perdas de forma bem própria, muitas vezes abordando tudo pelo viés das falhas de comunicação, das mensagens nunca enviadas e nem mesmo entendidas (a faixa-título diz coisas como “quando tentei ligar pra você, falei com a operadora / então você me retornou / foi muito mais tarde”).
Zac também faz baladinha de AM com vibe psicodélica em I need you, som robótico e solar em Gold days (uma canção no estilo “quando olho no espelho / estou ficando velho e acabado” na qual ele, nascido em 1990, admite que não consegue mais controlar o tempo) e uma espécie de pop kraftwerkiano em Sunday driving – uma música para dirigir, unindo estilhaços de rock, soul e reggae, com efeitos sonoros imitando carros que passam. Dá para dizer que Operator é um disco pop com energia de novelty record, aquela curiosidade bem humorada que faz bem aos ouvidos.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8,5
Gravadora: Congrats Records
Lançamento: 18 de julho de 2025.
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