Crítica
Ouvimos: J Mascis, “What do we do now”

- What do we do now é o quarto disco solo de J Mascis, criador da banda Dinosaur Jr. O próprio cantor e guitarrista produziu o álbum, além de tocar guitarra, baixo e bateria. Com ele no estúdio, Matthew “Doc” Dunn (pedal steel) e Ken Mauri (piano, teclados).
- O disco foi gravado no próprio estúdio do cantor. Mascis diz que dessa vez focou mais “no que posso fazer apenas com um violão, até mesmo nos solos. Claro, desta vez adicionei bateria completa e solos elétricos, embora as partes rítmicas ainda sejam todas acústicas”, contou no release de lançamento.
- Numa entrevista com o The Guardian, Mascis diz que ainda não pensou a respeito dos 40 anos do Dinosaur Jr, comemorados em 2024.
- O clipe de Can’t believe we’re here traz participações dos comediantes Fred Armisen, David Cross e Eugene Mirman, além da banda Idles. Todo mundo aparece em telas, como nas lives da pandemia.
Tocando, compondo e cantando alguns tons abaixo de sua banda Dinosaur Jr – conhecida pelo som ruidoso e pela manipulação de guitarras – J Mascis faz hoje lembrar mais a “outra” banda que manteve por alguns anos com dois integrantes do Cobra Verde, o Sweet Apple. What do we do now é um disco de sonoridade meio folk, meio power pop, repleto de violões entremeados com guitarras, e até um pouco mais acessível que o trabalho “histórico” de Mascis.
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O álbum traz uma improvável união de Bruce Springsteen, Neil Young e The Cure como design musical. No disco, Old friends, End is gettin shaky e Hangin out lembram bastante um desvio violeiro do grupo de Robert Smith – que de todo jeito, parece ser a grande fonte dos vocais de Mascis. O lado estradeiro da carreira do artista, por sua vez, surge com força no folk-rock da faixa-título e de Set me down, na violada punk de Can’t believe we’re here, no blues-rock de It’s true, e em quase todo o disco.
Em termos de letras, o repertório de What do we do now gira em torno das dores, perdas e felicidades inalcançáveis – mas parece haver sempre um destinatário ali, ou vários destinatários. Quem sabe até seus companheiros (ex-companheiros?) do Dinosaur Jr, com quem sempre teve um relacionamento um tanto conflituoso, entre idas e vindas e mudanças de formação.
Old friends parece entregar tudo (“velhos amigos/defendem uma postura com a qual eu não concordo”), You don’t understand me idem, End is getting shaky encerra o disco trazendo a conclusão de uma conversa amarga (“não há mentira para dizer a você”). Ou não. Num papo recente com o jornal The Guardian, o lacônico J Mascis dá a entender (mas só dá a entender) que as coisas não iam tão bem assim entre ele e seus amigos. Vai saber.
Nota: 7,5
Gravadora: Sub Pop
Foto: Divulgação
Crítica
Ouvimos: Kerub – “Aphantasia”

RESENHA: Kerub funde trance, ambient e experimentações em Aphantasia, disco hipnótico e existencial que ecoa Bowie, Ultravox e o apocalipse dançante.
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“Sonhos são para aqueles que não os deixam de lado”, afirma o artista canadense Kerub em Dreams, canção eletrônica e hipnótica desse Aphantasia, seu segundo álbum. Um disco em que o envolvimento trance serve quase como um subtexto sonoro, com faixas que soam como fantasias musicais, repletas de efeitos, ecos, ambientações, experimentalismos.
Com raízes no conceito de Eterno Retorno de Nietzsche, e em sensações pessoais experimentadas quando mudou-se para Toronto, Kerub fez de Aphantasia um disco cujos lados mais acessíveis apontam para as fases mais vanguardistas de artistas conhecidos. O David Bowie da fase Berlim e o dos anos 1990 pairam sobre quase todo o disco, que ainda faz lembrar a primeira fase do Ultravox em faixas como Ankle monitor, Bottles (repleta de psicodelia nos vocais e teclados) e Calm. Essa última, um relato de depressões, perdas e constatações (“resiliência é um mito feito por nós / estaria eu com medo da mudança?”, se pergunta), em meio a noites mal-dormidas e tentativas de juntar os pedaços.
- Ouvimos: Ethel Cain – Willoughby Tucker, I’ll always love you
- Ouvimos: Lutalo – The academy (versão deluxe)
- Ouvimos: Alex G – Headlights
Marathon é um ambient que chega a dar nervoso – o barulho de alguém respirando forte após correr uma maratona – note o título, enfim – é o “som de fundo” em alguns momentos). Cicadas é drum’n bass com interferências nos vocais e climas perturbadores. Acid rain soa como um time-lapse do fim do mundo – ganha uma cara dançante depois, mas é um baile no apocalipse. Atavism tem algo que não encaixa totalmente – seria a delicadeza da melodia ou o peso da batida? Ou a combinação de ambos?
No final, Salivary glands e Airport traffic trazem mais sons hipnóticos. A primeira, funcionando como um tema dance; a última soando como uma brincadeira sonora etérea, quase um som de videogame, que até traz leveza para um disco em que eletrônica e existência andam de mãos dadas.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Kopi Records
Lançamento: 24 de julho de 2025.
Crítica
Ouvimos: Astrofella – “Love ever young”

RESENHA: Astrofella estreia com Love ever young: eletrônica gelada, krautrock sensível e pop espacial vindo de Istambul via Berlim.
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O Astrofella é uma banda secretíssima que vem de Istambul, mas que se baseou em Berlim. O som deles é autodefinido como “a personificação de um astronauta melodramático, falando consigo próprio em órbita”. Love ever young, primeiro disco deles, é uma surpresa bem curiosa, misturando tecladeira gélida, guitarras climáticas econômicas e ocasionalmente, percussões e beats variados – sempre apostando na viagem sonora eletrônica.
A Berlin vacation, faixa de abertura, vai subindo para o espaço com órgão, ruídos eletrônicos e guitarra com um só acorde. Segue com uma vibe de pop francês em Modern wedding, com guitarra e bateria patinantes, sintetizador kraftweriano e argamassa de krautrock sensível – e os vocais de Danae Palaka. For Charlotte tem batida afropop e sonoridade minimalista, com um teclado que cresce aos poucos. She just wants to disappear, com vocal feminino que remete a Nina Hagen, vai do meditativo ao tenso.
Love ever young ainda tem climas mais apocalípticos e sombrios em Old times’ sake (canção de ritmo torto, quase jazzístico, e clima oriental) e na sintetizada Time. No Bandcamp, além das músicas, há ainda um vídeo mostrando como a capa de Love ever young, realizada de modo artesanal, foi feita.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 8
Gravadora: Independente
Lançamento: 8 de agosto de 2025.
Crítica
Ouvimos: Dana and Alden – “Speedo”

RESENHA: Speedo, estreia dos irmãos Dana e Alden McWayne, mistura jazz, psicodelia, política e grooves diversos em 18 faixas luminosas e surpreendentes.
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Demoramos um pouco para resenhar esse disco, lançado em junho. Vindos do Oregon, os irmãos Dana (sax) e Alden McWayne (bateria) fazem em Speedo, seu primeiro álbum, uma espécie de jazz mágico, que não cabe em quase nenhuma definição comum, porque as faixas trazem às vezes várias referências. Norm, a faixa de abertura, parece uma espécie de easy listening espiritualista, como as músicas de Todd Rundgren, e evolui para um jazz voador e bombástico, com beats eletrônicos e tímpanos dando o ritmo. Lisbon in rain ameaça um jazz-fusion na abertura, mas o que vem na sequência são sons que se alternam e brilham como luzes. Já a curta Wyckoff Deli Chicken over rice leva o idioma do jungle para o som da dupla.
Vibes psicodélicas e quase lo-fi, comuns em todo o álbum, vão surgindo aos poucos em faixas como Melange, o funk de garagem Don’t run, a bossa floydiana Fisherman’s dream, o jazz ruidoso e luminoso Charif’s Place, os temas de séries imaginárias Childhood crush e Super Beaver full moon love song, e o soul-reggae de faroeste Obsidian. Além disso, o material de Speedo une música, política e anti-imperialismo, com duas faixas, a já citada Norm e o jazz psicodélico e elegante Leila, feitas em homenagem a ativistas pró-Palestina (Norman Finkelstein e Leila Khaled, respectivamente).
Disco extenso – dezoito faixas, 50 minutos – e cheio de recantos musicais, Speedo invade também as áreas da guitarrada hispânica (Rick Pablo), do dream pop solar (Who do you even talk to me, Daydrinking in Springfield), do easy listening clássico e elegante (Kelp Forest Place) e do jazz-soul latino (Cacio e Pepe, cheia de detalhes psicodélicos e sons que rangem). A faixa-título, melódica, sinuosa e romântica, tem algo do som esparso do Khruangbin, só que reduzido a saxofone, baixo e bateria. No fim, o som voador e luminoso de Babe, you’re gonna miss that plane. Uma ótima surpresa.
Texto: Ricardo Schott
Nota: 9
Gravadora: Concord Jazz
Lançamento: 27 de junho de 2025
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