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Cultura Pop

Lookout! Records: descubra agora

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Lookout! Records: descubra agora

Em janeiro de 2012, uma notícia abalava o punk norte-americano. Famosa por ter lançado os primeiros discos do Green Day, a gravadora Lookout! Records anunciava o encerramento das suas atividades. O fechar de portas aconteceu após várias demissões, mudanças de rota, problemas financeiros e brigas com ex-contratados.

“Concluímos que o melhor uso de nossas energias seria fechar as portas de uma vez por todas. Para o legado da gravadora, para as bandas e para o benefício dos relacionamentos e amizades com artistas, parceiros e partes interessadas”, afirmava o presidente do selo, Chris Appelgren, em um comunicado. O material seria retirado de catálogo e devolvido aos artistas. De lá para cá, muita coisa já ressurgiu nas plataformas, como os álbuns do Green Day, do Operation Ivy e das Donnas lançados originalmente pela gravadora. Mas, além disso, com o fim da Lookout!, ia embora muito do romantismo da cena underground da Califórnia dos anos 1980 e 1990.

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Appelgren, último presidente do selo, era funcionário da gravadora desde a adolescência, e assumira o cargo quando o fundador da empresa já não estava mais lá. O nome do selo vinha de um fanzine dirigido a partir de 1984 por um sujeito chamado Larry Livermore, 37 anos, interessado em contracultura e punk (havia escrito para revistas underground nos anos 1960). Larry, que aliás passava por um inferno pessoal naquele ano (falta de grana, um pé-na-bunda amoroso, etc), decidiu pôr na rua o jornalzinho Lookout – sem a exclamação. Mas o objetivo era basicamente falar de política e dos problemas da pequena cidade em que morava, Laytonville, Califórnia.

O zineiro só não contava que tanto os hippies locais quanto os rednecks da região ficassem putos com o conteúdo do jornal – aliás, por causa disso, Larry escapou de ter sua casa incendiada. Em seguida, o editor passou a se concentrar apenas na cena punk californiana, que já vinha esmiuçando graças a contatos com bandas e com outros zines e rádios. Em 1985, montou uma banda chamada The Lookouts, na qual compunha, cantava e tocava guitarra – tendo como baterista um garoto de 12 anos conhecido como Tré Cool, que depois tocaria no Green Day. Para lançar o álbum de estreia, One planet, one people (1987), cheio de canções explosivas como My mom smokes pot (“minha mãe fuma maconha”), Fuck religion e Fourth reich (Nazi Amerika), lançou o selo Lookout! e o resto é história.

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Livermore acabou se juntando a um sócio, David Hayes, em 1987. Mas a sociedade durou poucos anos, com a dupla tendo desentendimentos em relação a assuntos básicos como a comercialização das bandas. Sobretudo porque Hayes defendia, segundo Livermore, que a gravadora não fosse um negócio capitalista de fato.

O selo prosperou bastante entre o fim dos anos 1980 e a metade dos anos 1990, e deixou Livermore realmente famoso e bem de vida. Só que o sucesso e a grana acabaram deixando o chefão da gravadora sem motivações. Larry começava a ficar de saco cheio de tocar um negócio pequeno, mas que rendia grana o suficiente para atrair a receita federal. Os vários telefonemas de amigos, a qualquer hora do dia ou da noite, para falar sobre discos e demos, também começaram a irritá-lo. Finalmente, ele deixou o selo em 1997, com Applegren assumindo o cargo.

Passados mais de trinta anos de sua estreia no selo, o Green Day não precisa fazer muito para voltar à mídia. Aliás, recentemente lançaram uma versão remasterizada do quarto disco (e segundo pela Warner), Insomniac, e o líder do trio, Billie Joe Armstrong, andou falando que quer se candidatar à presidência dos EUA. Enquanto isso, a história da Lookout tem sido pouco relembrada, mas não é nada que o POP FANTASMA não possa dar uma ajudinha. Então, pega aí 12 discos para você não apenas maratonar e recordar a história de um dos maiores selos da história recente do punk americano (colaborou Luciano Cirne).

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THE LOOKOUTS – “ONE PLANET, ONE PEOPLE” (1987). O marco inicial da gravadora. A banda do patrão Larry (voz, músicas, guitarra), Kain Kong (baixo) e do adolescente Tré Cool (bateria e, principalmente, voz de moleque em The mushroom is exploding) estreava com 22 faixas espremidas em 22 minutos. Mas além do corrosivo material autoral, tinha covers de The last time (Rolling Stones, em 58 segundos!) e It’s all over now, baby blue (Bob Dylan).

OPERATION IVY – “ENERGY” (1989). Banda que deu origem ao Rancid (Tim Armstrong e Matt Freeman vieram de lá) e que se tornou símbolo do chamado “East Bay Sound”. Em virtude disso, viraram um dos grupos mais importantes da história da Lookout!. Mas duraram pouco: apenas um EP e um álbum (o próprio Energy). Além disso, saiu uma coletânea dupla no estilo “obras completas” lançada pela gravadora em 1991.

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NEUROSIS – “THE WORLD AS LAW” (1991). Espécie de ovelha negra da Lookout!, essa banda da Califórnia abriu os trabalhos fazendo punk e hardcore. Até transitar para gêneros como industrial, sludge metal e coisas parecidas. The world…, o segundo disco, abria caminho para sons mais experimentais.

GREEN DAY – “KERPLUNK!” (1991). Segundo disco do trio, estreia de Tré Cool (ex-baterista dos Lookouts) na cozinha. Foi o disco mais vendido da gravadora até aquele momento, e como resultado, fez diferença nos cofres da Lookout!. Christie road, 2000 light years away, Who wrote Holden Caulfield? e a primeira versão de Welcome to paradise (que depois regravariam no Dookie) se destacam.

TILT – “PLAY CELL” (1993). Único disco dessa banda, liderada pela cantora Cinder Block, a sair pela Lookout! Aliás, o primeiro álbum deles. Crying jag, uma das principais faixas, apareceu na trilha de Tempo de mudança, comédia americana com Ben Affleck e Alyssa Milano. Abriram shows para o Green Day na turnê de Dookie (1994).

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THE QUEERS – “DON’T BACK DOWN” (1996). Retorno “triunfal” da banda de punk politicamente incorreto (a do disco Love song for the retarded, de 1993), produzido pelo próprio Larry. A ideia do grupo era voltar no limiar entre Ramones e Beach Boys. Tom Trauma, do site Punknews.org, afirmou que o disco “é um documento de como o verão deve soar”.

PANSY DIVISION – “WISH I’D TAKEN PICTURES” (1997). Expoente do queercore (punk feito pela comunidade LGBT), teve seu terceiro disco lançado por uma junção da Lookout! com um selo canadense, Mint. Considerado um clássico, o álbum trazia faixas como Dick of death, Horny in the morning e Pee shy. Entre mudanças de formação (o posto de baterista foi rotativo durante alguns anos), existem até hoje.

PINHEAD GUNPOWDER – “GOODBYE ELISTON AVENUE” (1997). Antes mesmo do Green Day ficar famoso, a banda já tinha spin off, inicialmente com Billie Joe na voz e na guitarra, mais Aaron Cometbus (bateria e letras), Bill Schneider (baixo) e Jason White (guitarra e voz). Mas na prática, era uma banda “de verdade”, com várias mudanças de formação, EPs gravados pela Lookout! e, além disso, crises internas quando Billie decidiu assinar com a Reprise como integrante do Green Day. Em 1997 saiu o único álbum cheio, Goodbye…, com a formação do começo reunida.

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PHANTOM SURFERS – “THE GREAT SURF CRASH OF 97” (1997). Essa banda de punk-surf existe até hoje, após várias mudanças de formação. Aliás, o disco atraiu atenções para a banda até mesmo no Brasil. “Se você acredita que rock é humor e despretensão, entregue-se já aos Phantom Surfers”, escreveu Álvaro Pereira Junior na Folha.

AUNTIE CHRIST – “LIFE COULD BE A DREAM” (1997). Um supergrupo punk daqueles: o AC reunia Exene Cervenka (X), Matt Freeman (Rancid) e D.J. Bonebreaker (X, The Germs, Eyes). O único disco dessa turma trouxe clássicos como The future is war, e mostrava um punk bem cru e simplificado. Mas, infelizmente, não fez muito sucesso.

GROOVIE GHOULIES – “FUN IN THE DARK” (1999). Contratada ainda na época de Larry, essa banda de Sacramento, inspiradíssima pelo universo dos Ramones (e por filmes de terror) ainda permaneceria na gravadora por mais alguns discos após a saída dele. Fun in the dark, o quarto disco, trazia clássicos como She’s my vampire girl, She gets all the girls. Mas havia a curiosa Carly Simon, um punk rock nervoso com o verso “é como Carly Simon já dizia/as coisas estão voltando a acontecer” (referência a um hit dela, Coming around again).

THE DONNAS – “THE DONNAS TURN 21” (2001). Lançado já num período de baixa da Lookout!, esse quarto disco das Donnas trazia as meninas de Palo Alto – que haviam lançado os primeiros discos ainda na adolescência – completando 21 anos. No repertório, canções cheias de atitude, como Are you gonna move it for me? e 40 boys in 40 days. No auge do indie rock daquele ano, a grandalhona Atlantic levaria as meninas, mas a relação com o veterano selo só geraria dois discos.

 

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Urgente!: E não é que o Radiohead voltou mesmo?

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O Radiohead (Foto: Tom Sheehan/Divulgação).

Viralizações de Tik Tok são bem misteriosas e duvidosas. Diria, inclusive, que bem mais misteriosas do que as festas regadas a cocaína, prostitutas de Los Angeles e malas de dólares que embalavam os nada dourados tempos da payola (jabá) nos Estados Unidos. Mas o fato é que o Radiohead – que, você deve saber, acaba de anunciar a primeira turnê em sete anos – conseguiu há alguns dias seu primeiro sucesso no Billboard Hot 100 em mais de uma década por causa da plataforma de vídeos. Let down, faixa do mitológico disco Ok computer (1997), viralizou por lá, e chegou ao 91º lugar da parada

A canção, de uma tristeza abissal, já tinha “voltado” em 2022 ao aparecer no episódio final da primeira temporada da série The bear – mas como o Tik Tok é “a” plataforma hoje para um número bem grande de pessoas, esse foi o estouro definitivo. Como turnês de grandes proporções nunca são marcadas de uma hora pra outra, nada deve ter acontecido por acaso. E tá aí o grupo de Thom Yorke anunciando a nova tour, que até o momento só incluirá vinte shows em cinco cidades europeias (Madri, Bolonha, Londres, Copenhague e Berlim) em novembro e dezembro.

O batera Phillip Selway reforçou que, por enquanto, são esses aí os shows marcados e pronto. “Mas quem sabe aonde tudo isso vai dar?”, diz o músico. Phillip revela também que a vontade de rever os fãs veio dos ensaios que a banda fez no ano passado – e que já haviam sido revelados em uma entrevista pelo baixista Colin Greenwood.

“Depois de uma pausa de sete anos, foi muito bom tocar as músicas novamente e nos reconectar com uma identidade musical que se arraigou profundamente em nós cinco. Também nos deu vontade de fazer alguns shows juntos, então esperamos que vocês possam comparecer a um dos próximos shows”, disse candidamente (esperamos é a palavra certa – a briga de faca pelos ingressos, que serão vendidos a partir do dia 12 para os fãs que se inscreverem no site radiohead.com entre sexta, dia 5, e domingo, dia 7, promete derramar litros de sangue).

Enfim, o que não falta por trás desse retorno aí são meandros, reentrâncias e cavidades. O Radiohead, por sua vez, investiu no lado “quando eu voltar não direi nada, mas haverá sinais”. Em 13 de março, dia do trigésimo aniversário do segundo disco da banda, The bends, o site Pitchfork noticiou que a banda havia montado uma empresa de responsabilidade limitada, chamada RHEUK25 LLP. – sinal de que provavelmente alguma novidade estava a caminho. Poucos dias depois, um leilão beneficente em Los Angeles sorteou quatro tíquetes para “um show do Radiohead a sua escolha”. Muita gente levou na brincadeira, mas algumas fontes confirmaram que o grupo tinha reservado datas em casa de shows da Europa.

Depois disso – você provavelmente viu – surgiram panfletos anunciando supostos shows do grupo em Londres, Copenhague, Berlim e Madri, ainda sem nada oficialmente confirmado, até que tudo virou “oficial”. Pouco antes disso, dia 13 de agosto, saiu um disco ao vivo do Radiohead, Hail to the thief – Live recordings 2003-2009 (resenhado pela gente aqui). Com isso, possivelmente, os fãs até esqueceram a antipatia que Thom Yorke causou em 2024, ao abandonar o palco na Austrália, quando foi perguntado por um fã sobre a guerra entre Israel e Palestina.

O site Stereogum não se fez de rogado e, quando a turnê ainda não estava oficialmente anunciada (mas havia sinais) chegou a perguntar num texto: “E aí, será que eles vão tocar Let down?”. No último show da banda, em 1º de agosto de 2018 (dado no Wells Fargo Center, Filadélfia), ela era a nona música, logo antes da hipnotizante Everything in its right place. Seja como for, já que bandas como Talking Heads e R.E.M. não parecem interessadas em retornos, a volta do Radiohead era o quentinho no coração que o mercado de shows, sempre interessado em turnês nostálgicas, andava precisando. Que vão ser vários showzaços e que muitas caixas de lenços serão usadas, ninguém duvida.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Tom Sheehan/Divulgação

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Urgente!: E agora sem o Ozzy?

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Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre.

Todo mundo que um dia se sentiu meio estranho e ouviu Ozzy Osbourne na hora certa, foi levado para um universo bem melhor, e para sempre. Tudo começou com uma banda, o Black Sabbath, que já era um verdadeiro errado que deu certo – um ET musical que fazia som pesado quando mal havia o termo “heavy metal” e que falava de terror na ressaca do sonho hippie. E prosseguiu com a lenda de um sujeito que gravou álbuns clássicos como Blizzard of Ozz (1980), Diary of a madman (1981) e No more tears (1991) – eram quase como filmes.

Ozzy pode ser definido como um cara de sorte – e também como um cara que abusou MUITO da sorte, mas pula essa parte. A depender daqueles progressivos anos 1970, não havia muito o que explicasse o futuro de Ozzy Osbourne na música. Em várias entrevistas, Ozzy já disse que não sabia tocar nenhum instrumento quando começou – na verdade nunca nem chegou a aprender a tocar nada. Tinha a seu favor uma baita voz (mesmo não ganhando reconhecimento algum da crítica por isso, Ozzy sempre foi um grande cantor), um baita carisma, ouvido musical e a disposição para encarnar o estranho e o inesperado no palco em todos os shows que fazia.

Imortalizada em livros como a autobiografia Eu sou Ozzy, a história de Ozzy Osbourne é um daqueles momentos em que a realidade pode ser mais desafiadora que a ficção. Afinal, quem poderia imaginar que um garoto da classe trabalhadora britânica se tornaria o que se tornou? Talvez tenha sido até por causa das dificuldades, que também moveram vários futuros rockstars ingleses da época – ou pelo fato de que o rock e a música pop do fim dos anos 1960 ainda eram quase mato, universos a serem desbravados, com poucos parâmetros. Seja como for, se hoje há artistas de rock que se dedicam a discos e a projetos que parecem ter saído da cabeça de algum roteirista bastante criativo, Ozzy teve muita culpa nisso.

Fora as vezes que o vi no palco, estive frente a frente com Ozzy apenas uma vez, numa coletiva de imprensa do Black Sabbath – da qual Tony Iommi não participou, por estar se recuperando de uma cirurgia (havia tido um câncer). Seja lá o que Ozzy pensasse da vida ou de si próprio, me chamou a atenção o clima de quase aconchego da sala de entrevistas (acho que era no hotel Fasano): um lugar pequeno, com ele e Geezer Butler (baixista) bem próximos dos repórteres. Que por sinal não eram inúmeros.

Já havia feito entrevistas internacionais antes mas nunca imaginei estar tão perto de uma lenda do rock que eu ouvia desde os doze anos. Fiz uma pergunta, ele respondeu, e eu, que sempre fiquei nervoso em entrevistas (imagina numa coletiva com o Black Sabbath!) voltei pra casa como se tivesse ido cobrir um buraco que apareceu numa rua no Centro. Não que não tenha me dedicado à pauta, mas era o Ozzy e eu estava… numa tranquilidade inimaginável.

Ozzy também já me deu uma entrevista por e-mail, em 2008, em que reafirmou sua adoração por Max Cavalera, disse que não tinha ideia se a série The Osbournes havia levado seu nome a um novo público, e reclamou da MTV, “que virou uma versão adulta da Nickelodeon”. Também disse que nunca diria nunca a seus então ex-companheiros do Black Sabbath (“nos falamos por telefone e quando as agendas permitem, nos encontramos”).

Nesse papo, Ozzy só se irritou quando fiz uma pergunta que envolvia o Iron Maiden, que tinha passado recentemente pelo Brasil, ou estaria vindo – não lembro mais. “Bom, não sei te responder, pergunta pro Iron Maiden!”, disse, em letras garrafais (todas as respostas foram em caixa alta). Lembro que ri sozinho e fui bater a matéria.

Até hoje só acredito que isso tudo aí aconteceu (e não é nada perto do que uns colegas viveram com Ozzy e o Black Sabbath) porque vi as matérias impressas. Mas acho que antes de tudo, consegui humanizar na minha mente um cara que eu ouvia desde criança. Ozzy era de carne e osso, respondia perguntas, tinha lá seus momentos de irritação e, enfim, mesmo tendo o fim que todo mundo vai ter, viveu bem mais do que muita gente. E mudou vidas.

Texto: Ricardo Schott – Foto: Divulgação

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Crítica

Ouvimos: Justin Bieber – “Swag”

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Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

RESENHA: Swag, novo disco-surpresa de Justin Bieber, mistura lo-fi, trap e synth pop com vibe indie e desleixo calculado. Musicalmente rico, mas com letras rasas.

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Justin Bieber opera hoje num universo de, vamos dizer assim, venda fácil e compreensão difícil. Ser um cantor branco de r&b significa basicamente que você vai ter que fazer shows, gravar discos e existir no show business, de modo geral, no limite da polêmica. Afinal, tanto r&b quanto rap são áreas de artistas negros, ligadas a um histórico que se estende ao soul, e a vivências pessoais – e o mundo mudou o suficiente para que o mercado quase entenda o peso de certas coisas.

Por quase entenda, leia-se que, na maioria dos casos, tudo pode ser resolvido por uns posts nas redes sociais e uma tour pelos lugares certos, com as pessoas corretas. Mas pra piorar um pouco, nos últimos tempos, Justin andava brotando mais no noticiário de fofoca do que nos cadernos de cultura. As notícias eram sobre cancelamentos de shows, brigas com a mulher Hailey, relacionamentos supostamente mais do que íntimos com o rapper P. Diddy e supostos abusos de substâncias.

E, bom, o que faz um astro como Justin Bieber numa hora dessas? Para calar a boca de uma renca de gente durante um bom tempo, ele simplesmente lança um disco novo do mais absoluto nada – e este disco é Swag, uma epopéia de quase uma hora, com 21 faixas. E antes de mais nada, Swag consegue colocar de vez Justin numa espécie de “espírito do tempo” pop no qual artistas como Taylor Swift, Rihanna, Beyoncé e Miley Cyrus já se encontram há um bom tempo.

Esse tal (hum) zeitgeist significa que tais artistas – seguindo uma linhagem que inclui de Beatles a Marvin Gaye – decidiram se libertar de amarras para fazerem o que bem entendem. Ou seja: discos de protesto, álbuns com design musical troncho, feats que os fãs vão estranhar, projetos com produtores pino-solto, singles com referências que o fã-clube vai ter que buscar no Google, lançamentos com fotos de divulgação distorcidas – ou capas no estilo meu-sobrinho-fez.

De modo geral, são artistas que podem se dar ao luxo de perder alguns fãs, em nome de verem seus álbuns se tornarem (vá lá) pretensos barômetros do nosso tempo, ou pelo menos crônicas pessoais-autoficcionais. Alguns exemplos: Brat, de Charli XCX, trouxe a zoeira da noite de volta. Hit me hard and soft, de Billie Eilish, foi importante na onda de música sáfica. GNX, de Kendick Lamar, explora misérias existenciais e brigas no showbusiness. Vai por aí. Fazer disco com “desencucação” virou, mais do que nunca, coisa de roqueiro – aposto que você se divertiu muito com Cartoon darkness, de Amyl and The Sniffers, e ficou assustado/assustada com as teorias geradas por Brat.

Se a essa altura do meu texto você já está prestes a desistir de ler, por eu ainda não ter dito se Swag vale seu tempo precioso, aqui vai: vale, e muito. Justin já vinha de uma tradição de álbuns ligadíssimos na atualidade – o melhor deles é Purpose, de 2015. Swag tem um subtexto de “libertação”, já que Bieber acaba de dar adeus a seu empresário de vários anos, Scooter Braun (um adeus que vai lhe custar mais de 30 milhões de dólares, por sinal). E traz o cantor investindo em climas lo-fi, sons texturizados, vibes derretidas e muita coisa que virou moda de uma hora para a outra.

O G1 disse que Swag é um disco chato. Eu discordo bastante, mas o The Guardian chegou perto da realidade ao dizer que as letras prejudicam o novo álbum – de fato, a poética de Swag tem a profundidade de um pires. Já musicalmente, a diversão é garantida até para quem nunca ouviu nada do cantor. Bieber e sua turma de produtores e parceiros transformam trap e sons lo-fi em pop adulto, em faixas muito bem feitas e bem acabadas, como All I can take, a estilingada Daisies, o bedroom pop Yukon e a viajante Go baby.

O design musical de Swag é minimalista, e boa parte das músicas têm aquele clima de desleixo estudado do indie pop atual. Things you do tem guitarras decalcadas do The Police e silêncios entre vozes e sons, Butterflies é uma gravação quase caseira que vai crescendo, e faixas como First place, Way it is, Sweet spot e Walking away unem synth pop, modernidades, sons derretidos e tentativas de emular Michael Jackson.

Dadz love, com o rapper Lil B, evoca Prince, com tecladeira dos anos 1980 e texturas de 2025. A vibe dos Rolling Stones, e das voltas do grupo britânico em torno do soul e do r&b, dáo as caras em Devotion e na vinheta Glory voice memo. Uma curiosidade é o trap da faixa-título, com participações de Cash Cobain e Eddie Benjamin, e um verso proscrito sobre cocaína (“seu corpo não precisa / de nenhuma linha prateada”) que aparentemente só o Spotify transcreveu.

Vale dizer que, tentando tomar de volta o controle da própria narrativa, Justin derrapa feíssimo ao decidir colocar em Swag três diálogos com o comediante negro norte-americano Druski. Num deles, o humorista diz a ele que “sua pele é branca, mas sua alma é negra, Justin” (o cantor só responde um “obrigado” desajeitado) – em outro, o assunto inclui paparazzi e redes sociais. No final, quem ouve o disco inteiro é “premiado” com a estranhíssima presença do cantor gospel Mavin Winans ocupando sozinho a última música – o cântico religioso Forgiveness.

Enfim, é Bieber buscando legitimidade para o autoperdão e para a própria carreira de cantor branco de r&b – e mandando recados de maneira tão desajeitada que Swag, um excelente disco, quase rola escada abaixo. Swag não resolve todas as questões em torno de Justin Bieber – mas quando acerta, lembra que, às vezes, é melhor fazer do que explicar.

Texto: Ricardo Schott

Nota: 8,5
Gravadora: Def Jam
Lançamento: 11 de julho de 2025

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