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Cultura Pop

Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

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Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

Para quem é fã do punk rock clássico, aquele que fez história nos EUA e na Inglaterra do fim dos anos 1970, Stiv Bators é um nome conhecido e celebrado. Vocalista dos Dead Boys, Bators tornou-se conhecido pelas performances viscerais e selvagens que fazia, em muito inspirado por seu ídolo Iggy Pop.

Gimme danger little stranger

Duas histórias notáveis, inclusive, tornaram-se emblemáticas em sua adoração por Iggy Pop. Na primeira delas, Stiv disse aos quatro cantos que foi ele o responsável por entregar o pote de manteiga de amendoim com o qual o Iguana se besuntou e andou heroicamente sobre (literalmente) a platéia no Cincinatti Pop Festival de 1970, algo considerado como pura lenda por seus amigos.

A segunda foi em um jantar em Cleveland em 1977, quando os Dead Boys abriram para o ex-stooge como parte da turnê de seu primeiro álbum. Nervoso por conhecer seu ídolo, Bators ingeriu alguns Quaaludes, como era conhecido o fármaco metaqualona, que fora criado para combater a insônia, mas servia para deixar o pessoal mais, digamos, ousado. Chapadaço da substância, Bators não segurou a bronca e caiu de cara em seu prato de sopa justamente quando jantava com seu herói, em história retratada no já clássico livro Mate-me por favor.

Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

David Quinton Steinberg, Stiv Bators, George Cabaniss e Frank Secich gravando o álbum Disconnected em agosto de 1980 no Perspective Studios, em Sun Valley, Califórnia. Foto de Theresa Kereakes.

Jovem, barulhento e arrogante

Com o grupo, Stiv Bators lançou dois álbuns. O cultuadíssimo Young, loud and snotty (1977), uma das pedras fundamentais do punk americano, e o segundo disco do grupo, We have come for your children (1978), álbum de menor impacto que seu antecessor mas também repleto de petardos enfurecidos da banda de Cleveland, ainda hoje apontada como uma das mais selvagens da sua geração.

>>> Veja também no POP FANTASMA: Stiv Bators: o “outro nome” do punk em documentário

A selvageria vista no palco não era mera encenação. Na época de Dead Boys, Stiv teve um romance com a famosa groupie Bebe Buell, que já havia namorado músicos como Todd Rundgren, Rod Steward e Steven Tyler, do Aerosmith, com quem teve a filha Liv Tyler. Buell, inclusive, relembrou a relação com Stiv em um texto para o site Please Kill Me, de Legs McNeil, autor do já citado livro de mesmo nome. Ao longo de sua curta e intensa vida, o vocalista usou e abusou das drogas e fez parte da hoje famosa turma festeira que frequentava o CBGB e a boemia do Bowery na Nova York do fim dos anos 70.

Com o fim dos Dead Boys, Bators decidiu se reinventar como um cantor de power pop, fechando um contrato com a gravadora Bomp! e se mudando para Los Angeles. Foi dessas sessões que surgiu o álbum Disconnected (1980), apontado como uma obra-prima pouco explorada desse vocalista também pouco celebrado em comparação com alguns de seus contemporâneos e amigos de cena.

Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

Os músicos de It’s cold outside: Eddy best, Rickbremmer, Stiv Bators e Frank Secich em Los Angeles, abril de 1979. Foto de Donna Santisi.

Do punk rock ao power pop

Para compor o álbum, Bators recrutou o baixista Frank Secich, seu amigo de longa data e conterrâneo de Ohio, estado natal do vocalista, também conhecido por ter sido o baixista da banda de power pop Blue Ash, que chegou a abrir shows para Stooges, Aerosmith, Bob Seger e Ted Nugent, alcançando relativo sucesso no underground americano de meados dos anos 70.

Juntos, Bators e Secich compuseram um punhado de excelentes canções power pop, entremeadas a versões de The Electric Prunes (I had too much to dream) e The Choir (It’s cold outside, que só constou no relançamento do disco de 1987), denotando a paixão de ambos pelos grupos garage dos anos 1960. Uma curiosidade é que boa parte do álbum foi gravado em uma quadra de basquete que ficava ao lado do estúdio, já que, segundo Secich, o espaço oferecia uma sonoridade mais “viva”.

Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

Michael Monroe (Hanoi Rocks), Stiv Bators (Dead Boys) e Lemmy (Motörhead)

Outra curiosidade é que Disconnected foi coproduzido por Stiv Bators e Thom Wilson, marcando seu primeiro trabalho na função. Mais tarde, Wilson tornaria-se conhecido por produzir discos clássicos do punk americano como o homônimo dos Adolescents, de 1981, Mommy’s little monster (1983), álbum de estreia do Social Distortion, e os três primeiros discos do Offspring, entre uma longa lista que inclui ainda Bad Religion, Dead Kennedys, Iggy Pop e T.S.O.L., pra ficar só em alguns.

Mas, de volta a Disconnected, o álbum não chegou a ter uma verdadeira turnê de divulgação, e nem atraiu grande atenção da mídia no período. Seu reconhecimento veio com as décadas, em especial de fãs dos Dead Boys e do Lords Of The New Church, banda que Bators formou com Brian James, ex-guitarrista do Damned, em 1980, quando saiu de Los Angeles direto para Londres, onde antes formou o grupo de curta vida The Wanderers, com ex-integrantes do Sham 69.

Senhores da Nova Igreja e morte em Paris

Com o supergrupo gótico, que incluía ainda o ex-baixista do mesmo Sham 69 e o ex-baterista dos The Barracudas, Stiv conheceu o sucesso que tanto buscava. Sua história foi inclusive contada em um recente documentário, do qual já falamos aqui.

A posterior dissolução dos Lords of the New Church, seus outros projetos musicais (incluindo uma curiosa banda com Johnny Thunders dos New York Dolls e Dee Dee Ramone, que terminou em briga motivada pelo vício em droga dos dois), e sua trágica morte após ser atropelado em Paris, onde residia com a namorada em 1990, são parte da mística que envolve o vocalista, morto aos 40 anos e ainda festejado como um dos mais autênticos e simbólicos de sua geração.

Reconectando Stiv Bators: entrevista com Frank Secich

Mais de quarenta anos depois de seu lançamento, Disconnected segue como uma daquelas pérolas que os fãs do vocalista exaltam, mas que não chegaram a ultrapassar a barreira do underground, apesar do evidente potencial pop que dispunha.

Para saber mais sobre a concepção e gravação do disco, conversamos via e-mail com Frank Secich. Escute o disco e confere o papo aí embaixo:

Como você conheceu Stiv Bators, e como a ideia de tocar em seu disco solo surgiu?

Conheci Stiv em uma casa de hippies na faculdade de Youngstown, Ohio, em 1967. Nós viramos amigos rapidamente. Costumávamos ir às boates e casas de shows para adolescentes de Youngstown, como o Carouseel Teen Clubs, o Freak Out, o Champion Rollarena, o Bug Out e outros onde vimos bandas como The Human Beinz, Pied Pipers, James Gang, New Hudson Existe e The Holes In The Road. As primeiras bandas de Stiv, como Steve Bator Band e Mother Goose frequentemente abriam para minha banda Blue Ash no começo dos anos 1970.

Depois que os Dead Boys acabaram em 1978 após gravarem seu segundo álbum, Stiv queria fazer algo diferente. Em outubro de 1978, começamos a compor canções juntos. Em novembro daquele ano, nós (Stiv, Jimmy Zero, Johnny Blitz [todos membros do Dead Boys] e eu) fizemos demos de The last year, It’s cold outside e It’s alright no estúdio After Dark, em Cleveland. Stiv então acompanhou sua namorada da época, Cynthia Ross, em uma viagem para Los Angeles, onde tocou as demos para Greg Shaw (dono da gravadora Bomp!), que ficou de queixo caído com as músicas. Alguns meses depois, Greg ofereceu um contrato para mim e Stiv.

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O single alemão de It’s cold outside da Line Records, de 1979

Vocês escreveram ótimas canções juntos. Como foi este processo?

Nós fazíamos de diferentes maneiras. Para The last year, Stiv tinha o título, o começo da melodia e o refrão. Eu o ajudei a terminá-la e compus a ponte. Nós dois escrevemos as letras. Not that way anymore e Circumstantial evidence eram basicamente canções minhas nas quais Stiv ajudou com as letras. Em I wanna forget you (just the way you are), Stiv surgiu com o título e escreveu a maior parte da letra, e eu escrevi a música e a melodia, e foi igual com Ready anytime. Nós sempre fazíamos diferente, mas Stiv era mais um compositor de letras e eu era mais alguém da melodia, apesar de ambos sabermos fazer as duas coisas. Uma das melhores canções do LP é Bad luck charm, que foi composta por David Quinton Steinberg e George Cabannis.

Tem uma história ótima por trás dessa música. Antes de gravar o álbum nós estávamos fazendo uma turnê naquele verão, e, em Nova York, Johnny Thunders se juntou conosco no palco do Heat Club. Thunders tinha um colar com o que parecia ser a pata de um alce pendurado. No camarim, David e George vieram até mim e disseram: “O que é aquilo no pescoço do Johnny?”. Eu disse: “É seu amuleto de má sorte! Vocês deviam compor uma música sobre isso”. Eles então a fizeram e é uma excelente música. Isso era um pouco do nosso processo criativo!

E como foi o processo de gravação do Disconnected? O álbum segue sendo cultuado por seus fãs e entusiastas de power pop em geral.

Nós nos divertimos muito gravando Disconnected no estúdio Perspective em Sun Valley, na Califórnia, no fim de agosto e começo de setembro de 1980. Greg Shaw da Bomp! Records nos deu liberdade para gravar o álbum e eu o amei por aquilo. O disco foi gravado em uma quadra de basquete que era adjacente ao estúdio. O piso de madeira tinha um som extremamente “vivo”, então fizemos a maior parte das canções ali. Funcionou especialmente bem para músicas como Evil boy, Make up your mind e Bad luck charm.

Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

A foto da contracapa de Disconnected, de 1980. Fotos de Theresa Kereakes.

Nós fizemos um monte de experimentos e gravamos bastante de forma improvisada. Às vezes funcionava bem, como quando Cynthia Ross e as fabulosas B-Girls do Canadá vieram à cidade para colocar harmonias e palmas em Swinging a go-go, e no som de explosão de Too much to dream, quando Stiv e eu derrubamos um amplificador Fender Twin Reverb (alugado, é claro) de uma escada e gravamos.

Quando estávamos gravando Ready anytime, Stiv não estava conseguindo alcançar o vocal que queria. Ele disse que tinha que ir até Hollywood para se inspirar. Nós fizemos os overdubs até ele voltar quatro horas depois muito bêbado com uma garota. Ele então foi até a cabine do microfone e começou a gravar enquanto ela “performava” nele na nossa frente. E usamos aquela gravação.

Às vezes não funcionava. Para culminar com o verdadeiro clímax do álbum, eu queria um final do tipo Abertura de 1812 (de Tchaikovsky) para I wanna forget you (Just the way you are) – grande, bombástico e que se destacasse. Era para ser uma canhonada de áudio das Guerras Napoleônicas! Nós pedimos a nosso amigo Kent Smythe que trouxesse centenas de fogos de artifício. Colocamos microfones estrategicamente posicionados em volta deles e o produtor Thom Wilson começou a rodar a fita enquanto eu e Stiv os acendemos, no que foi uma falha de cálculo da nossa parte.

Enquanto os fogos queimavam para fora, o estúdio rapidamente ficou cheio de fumaça. No meio de todas as explosões, Stiv e eu não conseguiamos enxergar ou respirar. Estávamos nos sufocando e tossindo e tivemos que literalmente nos arrastar até o lado de fora do estúdio para sobreviver enquanto David, George, Thom Wilson e Kent estavam caindo no chão de tanto rir. Nós passamos o resto da sessão tirando a fumaça do estúdio. Quando tocamos para ver, soava uma bosta, e não conseguimos usar. A famosa fotógrafa de rock Theresa Kereakes estava lá o tempo todo e registrou muito daquela insanidade para a posteridade.

Stiv falava com orgulho dos Dead Boys?

Sim, ele tinha muito orgulho de ter sido um Dead Boy, e com razão. Eles foram uma banda lendária e absolutamente fantástica ao vivo e a cores. A fusão de guitarras de Cheetah (Chrome) e Jimmy Zero era muito legal, e eles eram ótimos compositores, e Johnny Blitz era um incrível baterista que sabia conduzir o som. Stiv tinha uma presença marcante e carismática. Eles eram originais e únicos, e é por isso que seguem sendo lendários até hoje. Eu tive a felicidade de ser parte disso por um tempo (Secich realizou uma turnê com os Dead Boys por um curto período, quando substituiu o baixista Jeff Magnum).

Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

Frank Secich e Stiv Bators na festa de Kim Fowley para a banda Orchids, em 1979. Foto de Lisa Secich.

Nós ouvimos histórias de como Stiv era um “verdadeiro rock star” e um punk rocker selvagem. Ele era assim o tempo todo?

Stiv era um cara bem tranquilo, como Clark Kent, quando não estava no palco. Ele era sempre muito gentil com os fãs e sempre tinha tempo para dar autógrafos e posar para fotos, ou só para bater papo. No palco, ele era um performer consumado e um verdadeiro homem selvagem! Você nunca sabia o que esperar de um show para outro. Nunca havia tédio.

Vocês mantiveram contato ao longo dos anos? Como soube da morte dele?

Nós mantivemos contato durante os anos 1980 até sua morte. Ele me mandava cartões postais hilários e cartas de todos os cantos do mundo quando estava em turnê com os Lords of the New Church. Logo depois que Stiv morreu, eu recebi um telefone de um amigo em comum, Bobby Brabant. Ele disse: “Frank, eu tenho péssimas notícias”. Eu soube pelo tom em sua voz. Eu perguntei: “Como ele morreu?”. Foi um dia muito triste.

Você acha que Stiv teria seguido um caminho musical diferente se estivesse vivo?

Eu tenho certeza que ele seguiria trilhando caminhos e sendo criativo. Ele possivelmente teria feito mais filmes. Ele era um vocalista muito bom e conseguia sempre se expressar bem. Estava sempre três passos à frente do seu tempo e sabia o que fazia. Ele conseguia se reinventar em qualquer cena musical. Ele teria amado a internet e todas as suas possibilidades.

>>>Foto do abre da matéria: a banda que gravou Disconnected com Stiv Bators em agosto de 1980. David Quinton Steinberg, George Cabaniss, Frank Secich e Stiv Bators. Foto de Theresa Kereakes.
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Entrevista: Frank Secich fala sobre a pouco lembrada (e ótima) carreira solo de Stiv Bators

Stiv Bators em 1979

Jornalista e roteirista. É codiretor do documentário “O Último Voo – Os Anos 80 da Editora Brasiliense” (2012), cotradutor da coletânea literária “Porque eu Odeio”, do poeta jamaicano Claude McKay (2019), e coautor do livro "Vou Lá e Faço – A vida-obra de Oswaldo Diniz" (2020). Atuou em veículos como Billboard Brasil e Revista Brasileiros, e já colaborou com publicações como Playboy Brasil e Galileu.

Cultura Pop

Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

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Urgente!: O silêncio que Bruce Springsteen não quebrou

Tá aí o que muita gente queria: Bruce Springsteen vai lançar uma caixa com sete álbuns “perdidos”, nunca lançados oficialmente. O box vai se chamar Tracks II: The lost albums (é a continuidade de Tracks, caixa de 4 CDs lançada em 1998) e nasceu de uma limpeza que Bruce fez nos seus arquivos durante a pandemia. Pelo que se sabe até agora, o material inclui sobras das sessões de Born in the USA (1984) e gravações da fase eletrônica dele, no comecinho dos anos 1990 – inclusive um disco inteiro desse período, que nunca viu a luz do dia.

Essa notícia caiu nos sites na semana passada e trouxe de volta um detalhe que os fãs de Bruce já conhecem bem: ele tem muito material inédito guardado – e material bom. Em uma entrevista à Variety em 2017, ele mesmo comentou que sabia ter feito mais discos do que os que lançou, mas que havia motivos sérios para manter alguns deles nas gavetas.

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“Por que não lançamos esses discos? Não achei que fossem essenciais. Posso ter achado que eram bons, posso ter me divertido fazendo, e lançamos muitas dessas músicas em coleções de arquivo ao longo dos anos. Mas, durante toda a minha vida profissional, senti que liberava o que era essencial naquele momento. E, em troca, recebi uma definição muito precisa de quem eu era, o que eu queria fazer, sobre o que estava cantando”, disse na época (o link do papo tá aqui – é uma entrevista longa e bem legal).

Com o tempo, vários desses registros acabaram saindo em boxes e coletâneas. Um deles foi The ties that bind, um disco de pegada punk-power pop que seria lançado no Natal de 1979 – e que acabou virando uma espécie de esboço inicial do disco duplo The river, de 1980. Pelo menos saiu uma caixa em 2015 chamada The ties that bind: The River collection, com todo o material dessa época, inclusive o tal disco descartado (além de um material que formava quase um suposto disco de punk + power pop que teria sido abandonado).

Um texto publicado na newsletter do músico Giancarlo Rufatto recorda que Bruce infelizmente deixou de fora do novo box alguns álbuns que realmente mereciam ver a luz do dia. Um deles é um álbum solo (sem a E Street Band, enfim), com uma sonoridade country ’n soul, que foi gravado em 1981. Esse disco teria sido abandonado durante um período de depressão, que resultou em isolamento e na elaboração do disco cru Nebraska (1982), feito em casa com um gravador de quatro canais, só voz e violão.

Bruce até parece fazer referência a esse álbum perdido na entrevista da Variety. “Esse disco é influenciado pela música pop da Califórnia dos anos 70”, contou. “Glen Campbell, Jimmy Webb, Burt Bacharach, esse tipo de som. Não sei se as pessoas vão ouvir essas influências, mas era isso que eu tinha em mente. Isso me deu uma base pra criar, uma inspiração pra escrever. E também é um disco de cantor e compositor. Ele se conecta aos meus discos solo em termos de composição, mais Tunnel of love e Devils and dust, mas não é como eles. São apenas personagens diferentes vivendo suas vidas.”

Outro material bastante esperado pelos fãs – e que também não está na caixa – é o Electric Nebraska, a tentativa de Bruce de gravar com a E Street Band as músicas que acabaram no Nebraska. Nem ele, nem o empresário Jon Landau, nem os co-produtores Steven Van Zandt e Chuck Plotkin gostaram do resultado, e as gravações foram trancadas a sete chaves. Nem em bootlegs esse material apareceu até hoje. Pra você ter ideia, Glory days, que só sairia no Born in the USA (1984), chegou a ser ensaiada e gravada junto.

Quase todo mundo próximo a Bruce acredita que ele nunca vai lançar oficialmente essas gravações elétricas do Nebraska. Max Weinberg, baterista da E Street Band desde 1974 (com algumas pausas), confirmou a existência desse material em 2010, numa entrevista à Rolling Stone, e disse que adoraria ver tudo lançado.

“A E Street Band realmente gravou todo o Nebraska, e foi matador. Era tudo muito pesado. Por melhor que fosse, não era o que Bruce queria lançar. Existe um álbum completo do Nebraska, todas essas músicas estão prontas em algum lugar”, revelou. Bruce pode até guardar discos inteiros na gaveta, mas esse é um daqueles casos em que o silêncio guarda várias histórias – que podem render surpresas bem legais.

E ese aí é o lyric video de Rain in the river, uma das faixas programadas para Tracks II (a faixa sai num disco montado durante a elaboração do box, Perfect world).

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Cultura Pop

Urgente!: Supergrass, Spielberg e um atalho recusado

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Coisas que você descobre por acaso: numa conversa de WhatsApp com o amigo DJ Renato Lima, fiquei sabendo que, nos anos 1990, Steven Spielberg teve uma ideia bem louca. Ele queria reviver o espírito dos Monkees – não com uma nova versão da banda, como uma turma havia tentado sem sucesso nos anos 1980, mas com uma nova série de TV inspirada neles. E os escolhidos para isso? O Supergrass.

O trio britânico, que fez sucesso a reboque do britpop, estava em alta em 1995, quando lançou seu primeiro álbum, I should coco. Hits como Alright grudavam na mente, os vídeos eram cheios de energia, e Gaz Coombes, o vocalista, tinha cara de quem poderia muito bem ser um monkee da sua geração. Spielberg ouviu a banda por intermédio dos filhos, gostou e fez o convite.

Os ingleses foram até a Universal Studios para uma reunião com o diretor – com direito a recepção no rancho dele e papo sobre fase bem antigas da série televisiva Além da imaginação. O papo sobre a série, diz Coombes, foi proposital, porque a banda sacou logo onde aquilo poderia dar. “Talvez eu estivesse tentando antecipar a abordagem cafona que seria sugerida, tipo a banda morando junta como os Monkees”, contou Coombes à Louder, que publicou um texto sobre o assunto.

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A proposta era tentadora. Mas eles disseram não. “Foi lisonjeiro e muito legal, mas ficou óbvio para nós que não queríamos pegar esse atalho”, explicou o vocalista, afirmando ter pensado que aquilo poderia significar o fim do grupo. “Você pode acabar morrendo em um quarto de hotel ou algo assim, ou então a produção quer apenas um de nós para a próxima temporada. Foi muito engraçado, respeitosamente muito engraçado”.

O tempo passou. E agora, em 2025, I should coco completa 30 anos (mas já?). O Supergrass, que se separou no fim dos anos 2000, voltou para tocar o disco na íntegra e alguns hits em festivais como Glastonbury e Ilha de Wight.

Aqui, o trio no Glastonbury de 2022.

Foro: Keira Vallejo/Wikipedia

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Crítica

Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

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Ouvimos: Lady Gaga, “Mayhem”

Tudo que é mais difícil de explicar, é mais complicado de entender – mesmo que as intenções sejam as melhores possíveis e haja um verniz cultural-intelectual robusto por trás. Isso vale até para desfiles de escolas de samba, quando a agremiação mais armada de referências bacanas e pesquisas exaustivas não vence, e ninguém entende o que aconteceu.

Carnaval, injustiças e polêmicas à parte, o novo Mayhem foi prometido desde o início como um retorno à fase “grêmio recreativo” de Lady Gaga. E sim, ele entrega o que promete: Gaga revisita sua era inicial, piscando para os fãs das antigas, trazendo clima de sortilégio no refrão do single Abracadabra (que remete ao começo do icônico hit Bad romance), e mergulhando de cabeça em synthpop, house music, boogie, ítalo-disco, pós-disco, rock, punk (por que não?) e outros estilos. Todas essas coisas juntas formam a Lady Gaga de 2025.

Algo vinha se perdendo ou sendo deixado de lado na carreira de Lady Gaga há algum tempo, e algo que sempre foi essencial nela: a capacidade de usar sua música e sua persona para comentar o próprio pop. David Bowie fazia isso o tempo todo – e ele, que praticamente paira como um santo padroeiro sobre Mayhem, é uma influência evidente em Vanish into you, uma das faixas que melhor representam o disco. Aqui, Gaga entrega dance music com alma roqueira, um baixo irresistível e um batidão que evoca tanto a fase noventista de Bowie quanto o synthpop dos anos 1980.

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Mais coisas foram sendo deixadas de lado na carreira dela que… Bom, sao coisas quase tão difíceis de explicar quanto as razões que levaram Gaga a criar um álbum considerado “difícil” como Artpop (2013), enquanto simultaneamente mergulhava no jazz com Tony Bennett e preparava-se para abraçar o soft rock no formidável Joanne (2016), um disco autorreferente que talvez tenha deixado os fãs da primeira fase perdidos. Em outro tempo, Madonna parecia autorizada a mudar como quisesse, mas quando Gaga fazia o mesmo, deixava no ar notas de desencontro e confusionismo. O pop mudou, as décadas passaram, o público mudou – e todas as certezas evaporaram.

É nesse cenário que Mayhem equilibra as coisas, entregando um pop dançante, consciente e orgulhoso de sua essência, mas ao mesmo tempo sombrio e marginal. Há momentos de caos organizado, como em Disease e Perfect celebrity – esta última começa soando como Nine Inch Nails, mas, se você mexer daqui e dali, pode até enxergar um nu-metal na estrutura. Killah traz uma eletrônica suja, um refrão meio soul, meio rock que caberia num disco do Aerosmith, enquanto Zombieboy aposta no pós-disco punk, evocando terror e êxtase na pista (por acaso, Gaga chegou a dizer que o disco tem influências de Radiohead, e confirmou o NiN como referência).

Na reta final, o álbum se aventura por outros terrenos: How bad do U want me e Don’t call tonight flertam com o pop dinamarquês dos anos 90 (e são, por sinal, as únicas faixas pouco inspiradas do disco); The beast tem cara de trilha sonora de comercial de cerveja; e Lovedrug mergulha na indefectível tendência soft rock que surge hoje em dia em dez entre dez discos pop. Essa faixa soa como um híbrido entre Fleetwood Mac e Roxette – como se Gaga  estivesse pensando também na programação das rádios adultas de 2035.

O desfecho de Mayhem chega como um presente para o ouvinte: Blade of grass é uma balada melancólica de violão e piano, que ecoa tanto a tristeza folk dos anos 70 quanto a melancolia do ABBA, crescendo em inquietação à medida que avança. E então, como quem perde um pouco o tom, o álbum termina com… Die with a smile, a já conhecida balada country-soul gravada em parceria com Bruno Mars, lançada há tempos como single. Dentro do contexto do disco, ela soa mais como um apêndice do que como um encerramento – uma nota de rodapé onde se esperava um ponto final. Nada que chegue a atrapalhar a certeza de que Lady Gaga conseguiu, mais do que retornar ao passado, unir quase todos os seus fãs em Mayhem.

Nota: 8,5
Gravadora: Interscope
Lançamento: 7 de março de 2025.

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